PARECER nº: |
MPTC/19653/2013 |
PROCESSO nº: |
TCE
09/00616911 |
ORIGEM: |
Fundo Estadual de
Incentivo ao Turismo - FUNTURISMO |
INTERESSADO: |
|
ASSUNTO: |
Tomada de Contas
Especial relativa à NE n. 694, de 21/11/2006, no valor de R$ 160.000,00,
repassados à RCC Administração Patrimonial Ltda - Balneário Camboriú. |
1 . DO PROCESSO
Para exame e parecer desta
Procuradoria, os autos do processo epigrafado que versa sobre Tomada de Contas
Especial instaurada pela Secretaria de Estado do Turismo, Cultura e Esporte, em
razão de determinação dessa Corte de Contas.
Em
cumprimento ao que determina a Constituição Estadual em seu art.58 e 59, na Lei
Complementar nº 202/00, art. 106, III e o Regimento Interno desse Tribunal
(Resolução TC-06/01), a Diretoria de Controle da Administração Estadual,
realizou auditoria na Prestação de Contas de Recursos Antecipados da Secretaria
de Estado de Turismo, Cultura e Esporte.
2.
DA INSTRUÇÃO
Após tramitação dos
presentes autos em todas as suas fases preliminares no Tribunal de Contas,
incluindo análise dos órgãos técnicos, juntada de documentos e/os
esclarecimentos, a Diretoria de Controle da Administração Estadual, elaborou o
Relatório nº 298/2012, fls. 427-456, e ao final, sugere ao Relator em seu Voto
propugne ao Tribunal Pleno para:
3.1 Julgar
irregulares com imputação de débito, na forma do disposto no art. 18, III,
alíneas c e d c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar Estadual nº
202/2000, as contas realizadas com recursos do FUNTURISMO, transferidos à RCC Administração
Patrimonial Ltda, relativos à
Nota de Empenho nº 694/000, de 21/11/2006, no valor de R$ 160.000,00 (cento e
sessenta mil reais).
3.2 Condenar solidariamente os Srs. Roberto
Carlos Castagnaro, domiciliado na Rua 902, 805 – Centro – Balneário
Camboriú/SC, CPF 552.230.449-91; Gilmar Knaesel, portador do CPF
341.808.509-15, endereço comercial na Avenida Dr. Jorge Luz Fontes, nº 310,
Centro, Florianópolis, CEP 88.020-900; Guilberto Chaplin Savedra, portador do
CPF 225.939.509-00, endereço comercial na Avenida Dr. Jorge Luz Fontes, nº 310,
Centro, Florianópolis, CEP 88.020-900; e Ricardo Luiz Ziemath, portador do CPF
312.052.249/04, endereço residencial na Rua Otto Boehm, s/n, apto 101 - Bairro
Atiradores - Joinville/SC CEP 89201-700 e comercial na Rua XV de novembro, nº
2.075 - Bairro Glória - Hotel Le Canard - Joinville/SC CEP 89.216-200, ao
recolhimento das quantias a seguir especificadas, relativas ao montante de
R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais) da nota de empenho referida
acima, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do
Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE – DOTC-e, para comprovar, perante o
Tribunal, o recolhimento do valor do débito ao Tesouro do Estado, atualizado
monetariamente e acrescido dos juros legais, a teor do arts. 21 e 44 da Lei
Complementar Estadual nº 202/2000, calculados a partir da data de 28/11/2006,
sem o que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à
efetivação da execução da decisão definitiva, consoante art. 43, II, da Lei
Complementar Estadual nº 202/2000, conforme segue:
3.2.1 R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil
reais), relativos ao total das despesas efetuadas com recursos do FUNTURISMO no
projeto do evento Fatboy Slim de música eletrônica, realizado em 25/02/2006,
face à:
3.2.1.1
à aprovação, empenhamento, repasse e execução de projeto desprovido de
interesse público, com violação dos arts. 37 da Constituição Federal, 16 da
Constituição Estadual, 2º da Lei Federal nº 9.784/99, e 140, § 1º, da Lei
Complementar Estadual nº 284/05, nos termos consignados no item 2.2.4 deste
relatório;
3.2.1.2
à comprovação de despesas com documentos fiscais, emitidos somente a partir de
maio de 2007 (cerca de 1 ano e 3 meses após o evento), contrariando o disposto
no art. 60, II, da Resolução N.TC 16/94 e art. 140, § 1º, da Lei
Complementar Estadual nº 284/2005, não se constituindo, portanto,
documentos idôneos para a boa e regular comprovação da aplicação dos recursos,
nos termos consignados no item 2.3.8 deste relatório;
3.2.2 R$ 130.500,00, parte integrante do valor
constante no item 3.2.1 desta conclusão, face à apresentação dos documentos
fiscais (Nota Fiscal nº 55 (fl. 114); Nota Fiscal nº 817 (fl. 117);
Nota Fiscal nº 456 (fl. 116)) sem discriminação precisa, contrariando o
art. 60, II e III, da Resolução N TC 16/94 e o art. 140, § 1º, da Lei
Complementar Estadual nº 284/05, nos termos consignados no item 2.3.2 deste
relatório;
3.2.3 R$ 13.000,00 (treze mil reais), parte
integrante do valor constante no item 3.2.1 desta conclusão, face à comprovação
de despesas com publicidade sem documentação suporte adequada e exigida,
contrariando o que dispõe o art. 65 da Resolução N. TC 16/94 e art. 140, § 1º,
da Lei Complementar Estadual nº 284/05, nos termos consignados no item 2.3.3
deste relatório;
3.2.4 R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais),
parte integrante do valor constante no item 3.2.1 desta conclusão, face à
contratação de serviço de sub-locação de gerador, representado pela Nota Fiscal
nº 78, (fl. 118), de empresa cujo objeto social (limpeza e conservação) é
incompatível com o escopo dos serviços que exige qualificação técnica para
instalação de gerador de energia à rede elétrica para suprir eventual queda ou
excesso de demanda, violando o art. 60, incisos II, da Resolução
N.TC 16/94 e art. 140, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 284/05, nos
termos consignados no item 2.3.5 deste relatório;
3.2.5 R$ 12.000,00 (doze mil reais), parte
integrante do valor constante no item 3.2.1 desta conclusão, face à ausência de
comprovação da destinação de bens adquiridos (03 (três) TVs) com recursos
públicos, representados pela Nota Fiscal nº 560 de 15/05/2007 (fl.112), em
desacordo com o art. 8º, IX, do Decreto Estadual nº 307/03, art. 60, II, da
Resolução nº TC 16/94 e art. 140, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº
284/05, nos termos consignados no item 2.3.6 deste relatório;
3.3 Aplicar aos responsáveis acima qualificados
multa proporcional ao(s) dano(s) causado(s) pelas intercorrências consignadas
nos itens 3.2.1 a 3.2.5 acima, fundamentada no art. 68 da Lei Complementar
Estadual nº 202/00, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da
publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovar, perante este Tribunal, o
recolhimento dos valores ao Tesouro do Estado, sem o que fica, desde logo,
autorizado o encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas para que adote providências à efetivação da execução da
decisão definitiva, consoante aos arts. 43, II e 71 da Lei Complementar
Estadual nº 202/00.
3.4 Aplicar multa(s) fundamentada(s) no art. 70,
II, da Lei Complementar Estadual nº 202/00 aos responsáveis, nominados
abaixo, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do
Acórdão no DOTC-e, para comprovar perante este Tribunal o recolhimento dos
valores ao Tesouro do Estado, sem o que fica, desde logo, autorizado o
encaminhamento de peças processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de
Contas para que adote providências à efetivação da execução da decisão
definitiva, consoante ao art. 43, II e 71 da Lei Complementar Estadual nº
202/00, pelos motivos que se seguem:
3.4.1 ao Sr. Roberto
Carlos Castagnaro, já qualificado, em face:
3.4.1.1
da apresentação do Plano de Trabalho com informação do escopo de despesas
genéricas sem indicadores quantitativos e qualitativos, com descumprimento do
art. 2º, III do Decreto Estadual nº 307/03, nos termos consignados no item
2.2.1 deste relatório;
3.4.1.2 do encaminhamento da prestação
de contas fora do prazo legal, contrariando o art. 8º da Lei Estadual nº
5.867/81, nos termos consignados no item 2.3.1 deste relatório;
3.4.1.3 da não comprovação da divulgação
do apoio da Secretaria de Estado da Cultura, Turismo e Esporte ao projeto,
infringindo o art. 15 da Lei Estadual
nº 13.336/95, nos termos consignados no item 2.3.4 deste relatório;
3.4.1.4
da auto-remuneração e o enriquecimento ilícito, pela inobservância dos
princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, na contratação de
prestação dos serviços de veiculação publicitária do evento Fatboy Slim (Notas
Fiscais nº 816/ 817, fls.115/117) (Cheques nº 000025/6 do BESC ag. 071,
c/c 032451, fls. 114/6) da empresa Vale Europeu Publicidade e Propaganda
Ltda. ME, no valor de R$ 95.000,00 da qual o Sra . Delcy Castagnaro, irmã
do beneficiário, Sr. Roberto Carlos Castagnaro, era sócio-administradora,
detentora de 30% do capital social da empresa (contrato social - fl. 214-19),
contrariando destarte o arts. 37 da Constituição Federal, 16 da Constituição
Estadual, nos termos consignados no item 2.3.7 deste relatório;
3.4.2 ao Sr Gilmar
Knaesel, já qualificado, em face:
3.4.2.1 da aprovação
do Plano de Trabalho com informação do escopo de despesas genéricas sem
indicadores quantitativos e qualitativos, em descumprimento do art. 2º, III, do
Decreto 307/03, nos termos consignados no item 2.2.1 deste relatório;
3.4.2.2 da alteração
do proponente sem prévia análise, em descumprimento do art. 19, I, do Decreto
Estadual nº 3.115/05, nos termos consignados no item 2.2.2 deste relatório;
3.4.2.3 da ausência de análise do plano
de trabalho, em descumprimento do art. 13, V, do Decreto Estadual nº 3.115/05,
nos termos consignados no item 2.2.3 deste relatório;
3.4.2.4 da aprovação, empenhamento e
repasse de recursos a projeto desprovido de interesse público, pela violação do
arts. 37 da Constituição Federal, 16 da Constituição Estadual, 2º da Lei
Federal nº 9.784/99, e 140, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 284/05, nos
termos consignados no item 2.2.4 deste relatório;
3.4.2.5 da falta de providências
administrativas tempestivas antes da instauração da Tomada de Contas Especial,
contrariando o art. 4º do Decreto Estadual nº 442/03, nos termos consignados no
item 2.4.1 deste relatório;
3.4.2.6 da instauração da Tomada de
Constas Especial fora do prazo legal, com 15 (quinze) meses de atraso,
contrariando o art. 3º e 5º do Decr. 442/03, nos termos do item 2.4.2 deste
relatório.
3.4.3 ao Sr Ricardo
Luiz Ziemath, já qualificado, em face:
3.4.3.1 da aprovação,
empenhamento e repasse de recursos a projeto desprovido de interesse público,
pela violação do arts. 37 da Constituição Federal, 16 da Constituição Estadual,
2º da Lei Federal nº 9.784/99, e 140, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº
284/05, nos termos consignados no item 2.2.4 deste relatório.
3.4.4 ao Sr
Guilberto Chaplin Savedra, já qualificado, em face:
3.4.4.1 do
empenhamento e repasse de recursos a projeto desprovido de interesse público,
pela violação dos arts. 37 da Constituição Federal, 16 da Constituição Estadual,
2º da Lei Federal nº 9.784/99, e 140, § 1º da Lei Complementar Estadual nº
284/05, nos termos consignados no item 2.2.4 deste relatório.
3.5 Declarar a
empresa RCC Administração Patrimonial Ltda e o Sr. Roberto Carlos Castagnaro,
impedidos de receber novos recursos do Erário Estadual, até a regularização do
presente processo, consoante dispõe o art. 5º, alínea “c”, da Lei Estadual nº
5.867/81.
3.6 Dar conhecimento,
com envio de cópia do presente relatório e da Decisão do Tribunal, ao Ministério Público do Estado de Santa
Catarina, em virtude das irregularidades passíveis de caracterização de
ilícitos de natureza não administrativa, especialmente as intercorrências
relatadas nos itens 2.3.6 e 3.2.5 deste relatório, para que sejam tomadas as
medidas que entender necessárias;
3.7 Dar ciência da Decisão, do Relatório e
Voto do Relator que a fundamentam à
empresa RCC Administração Patrimonial Ltda e ao Sr. Roberto Carlos Castagnaro e
à Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte – SOL, ao Sr.
Gilmar Knaesel e ao Sr. Guilberto Chaplin Savedra.
3 . DO MINISTÉRIO
PÚBLICO JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS
Este Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ao
analisar os documentos que compõe o presente feito, passa a se manifestar.
Após análise de toda a documentação
dos autos e consoante informa o relatório técnico nº 298/2013, fls. 427-456, tem-se que as impropriedades anteriormente apontadas
não foram saneadas conforme
noticia os autos.
Entretanto, que tange a sugestão do Corpo Técnico em condenar solidariamente o Sr. Gilmar Knaesel em face das irregularidades elencadas nos itens 3.2.1.1 a 3.2.5, peço vênia para externar posicionamento diverso da Instrução.
Em sede
de Tomada de Contas Especial, o Fundamento jurídico para o reconhecimento da
responsabilidade solidária do administrador público perante a administração, no
âmbito do Tribunal de Contas, está prevista no artigo 10 da Lei Complementar nº
202/2000, in verbis:
Art. 10. A autoridade administrativa competente, sob pena
de responsabilidade solidária, deverá imediatamente adotar providências com
vistas à instauração de tomada de contas especial para apuração de fatos,
identificação dos responsáveis e quantificação do dano, quando não forem
prestadas as contas ou quando ocorrer desfalque, desvio de dinheiro, bens ou
valores públicos, ou ainda se caracterizada a prática de qualquer ato ilegal,
ilegítimo ou antieconômico de que resulte prejuízo ao erário.
Como se lhes vê logo à
leitura da norma transcrita, os fatos descritos como irregulares elencadas pela
Instrução Técnica, nos itens 3.2.1.1 a
3.2.5, de fls. 454-455, não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no dispositivo acima
referido, assim como, não transfere a responsabilidade nos termos do
que está na lei, nesse dispositivo.
De outra banda, a
irregularidade descrita no item 3.2.1.1, face a alegada aprovação,
empenhamento, repasse e execução de projeto desprovido de interesse público e
passível de imputação de débito, não há que se falar em irregularidade por
violação de norma, eis que as despesas relacionadas se enquadram
nos pressupostos do dispositivo legal previstos nos incisos
do art. 22 do Decreto nº 3.115/2005, especialmente os incisos VIII
e XI, sanando assim a irregularidade
anteriormente apontada pela Instrução, não sendo passível a imputação de débito
e aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Complementar nº 202/00, ante a
não ocorrência de dano ao erário.
Quanto
as irregularidades elencados nos itens 3.2.1.2, 3.2.2, 3.2.3, 3.2.4 e 3.2.5, de
fls. 454v e 455, consideradas de responsabilidade solidária do senhor Gilmar
Knaesel, cabe esclarecer que o Estado repassou voluntariamente recursos a terceiros com
a intenção de executar um objeto de interesse das partes envolvidas e da
sociedade. Como se trata de uma parceria, há obrigações para ambas as partes,
sendo que no presente caso, o Gestor Público se
incumbiu de fazer a transferência de uma soma de recursos financeiros
destinados a custear as despesas relacionadas à execução do objeto - esse
partícipe é denominado concedente,
representado pelo Estado por meio da Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e
Esporte.
O
outro partícipe é denominado beneficiário, no
presente caso, conforme se verifica às fls. 264, o Sr. Roberto Carlos
Castagnaro, foi identificado como responsável, nos termos da Instrução
Normativa nº TC – 003/2007, o qual estava obrigado por outras tarefas, como a
execução do objeto, prestação de contas da boa e regular aplicação do recurso
público e aporte da contrapartida, quando exigida, que poderá ser prestada por
meio de recursos financeiros ou em bens e serviços, desde que economicamente
mensuráveis.
Desse modo, a comprovação
de despesas com documentos fiscais emitidos somente a partir de maio de 2007;
apresentação dos documentos fiscais sem discriminação precisa, comprovação de
despesas com publicidade sem documentação de suporte adequada e exigida, são
irregularidades que obriga o beneficiário a restituir ao erário público os
valores repassados pela Concedente,
atualizados monetariamente e acrescido de juros legais, na forma da legislação
aplicada aos débitos para com a Fazenda Estadual, a partir da data do seu
recebimento dos recursos.
Por outro lado, o Sr. Gilmar Knaesel, na condição de
Secretário de Estado exercia cargo de natureza
política, portanto, caracterizado como agente
político, e o vínculo que tais agentes
entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política.
Exercem um múnus público.
Em virtude da natureza especial do cargo, por eles ocupados, o agente político
exerce parcela de soberania do Estado e por causa, atuam com a independência
inextensível aos servidores em geral, que estão sujeitos às limitações
hierárquicas e ao regime comum de responsabilidade.
Corroborando
com este entendimento, reproduzo,
aqui, trecho do voto proferido pelo então Min. Luiz Fux,
no RESP nº
456649/MG, in verbis:
"Os agentes
políticos exercem funções governamentais, judiciais e quase-judiciais,
elaborando normas legais, conduzindo os negócios públicos, decidindo e atuando
com independência nos assuntos de sua competência. São as autoridades públicas
supremas do Governo e da Administração, na área de sua atuação, pois não são
hierarquizadas, sujeitando-se apenas aos graus e limites constitucionais e
legais da jurisdição. Em doutrina, os agentes políticos têm plena liberdade
funcional, equiparável à independência dos juízes nos seus julgamentos, e, para
tanto, ficam a salvo de responsabilização civil por seus eventuais erros de
atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou abuso de poder.
(...) Realmente, a situação dos que governam e decidem é bem diversa da dos que
simplesmente administram e executam encargos técnicos e profissionais, sem
responsabilidade de decisão e opções políticas. Daí por que os agentes
políticos precisam de ampla liberdade funcional e maior resguardo para o
desempenho de suas funções. As prerrogativas que se concedem aos agentes
políticos não são privilégios pessoais; são garantias necessárias ao pleno
exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias. Sem
essas prerrogativas funcionais os agentes políticos ficariam tolhidos na sua
liberdade de opção e decisão ante o temor de responsabilização pelos padrões
comuns da culpa civil e do erro técnico a que ficam sujeitos os funcionários
profissionalizados (cit. p. 77)" (Direito Administrativo Brasileiro, 27ª
ed., p. 76).
Da leitura do Voto acima transcrito, vê-se que a responsabilidade do Secretário de
Estado não decorre da mera qualidade de Gestor Público. Trata-se de responsabilidade subjetiva que exige
sua participação pessoal no ato ilegal por ação ou omissão e, em caso de
violação a princípios que regem a atividade administrativa, a conduta dolosa do Secretário de Estado.
De
outra banda, a responsabilidade civil é a de ordem patrimonial, decorrente da
norma de direito civil, segundo a qual todo aquele que causar dano a outrem é
obrigado a indenizá-lo. Nesta responsabilidade é relevante a investigação do
elemento subjetivo (culpa ou dolo). Também, para a sua perfeita configuração, é
indispensável investigar a relação de causalidade entre o dano e o
comportamento do agente.
Ademais, não se evidencia,
pois, qualquer dano ao erário que justifique a sanção de ressarcimento, máxime
porque não se apercebe conduta (omissa ou comissiva) que traduza, propriamente,
qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida, importando enriquecimento
ilícito do Sr. Gilmar Kanaesel. Conforme dito alhures, a jurisprudência não
condena a inércia, inexperiência ou ingenuidade, do gestor público, haja vista
que o que caracteriza o ato ilícito é a má-fé, o dolo ou a culpa, a
contrariedade a lei e a mora por parte do agente.
Conforme salientado acima, a caracterização do dever de indenizar pressupõe a existência de ação negligente, com má-fé,
dolo ou culpa grave, situação que não se verifica nestes autos, com destaque
para o fato de que sequer foi demonstrado prejuízo real ao Erário e seu
respectivo valor mediante prova técnica, que não é suprida apenas pelo
levantamento numérico constante dos autos às fls. 454.
É preciso
verificar se existe indício de má-fé que revele a presença de um comportamento
desonesto do agente público, pois não basta a prática de um ato
ilegal, tendo em vista que, se for inconsistente, não será caracterizador do
dano, eis que a Lei de regência visa punir o agente público desonesto, não o
que comete erro ou ilegalidade.
Dentro do raciocínio
exposto acima, entendo plenamente aplicável ao caso presente a manifestação do
eminente Conselheiro Salomão Ribas Júnior nos autos do processo nº TCE
05/00519625, acatada pelo e. Tribunal Plenário na sessão de 26/10/2009, cujo
Acórdão nº 1.379, assim dispõe:
(...)
O pressuposto
jurídico da obrigação de indenizar é o dano resultante do dolo ou culpa. A
regra geral está inserida no art. 186, do Código Civil: “Aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete o ilícito”. E é complementada
pelo art. 927 do mesmo diploma: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187)
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Decorre daí que a imputação de débito – que importa a
geração de um título executivo extrajudicial, consequentemente, a obrigação de
indenizar – reclama a presença, no mínimo, de culpa, seja por negligência, seja
por imprudência. Sem culpa ninguém pode ser obrigado a indenizar. Este
raciocínio harmoniza-se com o art. 21 da Lei Complementar n. 202/2000, quando
diz: “Julgadas irregulares as contas, e havendo débito, o Tribunal Condenará o
responsável ao pagamento da dívida atualizada monetariamente, acrescida dos
juros de mora devidos, podendo, ainda aplicar-lhe a multa prevista no art. 68
desta Lei”. Veja-se que a lei coloca duas premissas, para efeito de condenação
ao ressarcimento: a existência do débito e a responsabilidade (culpa) do
agente.
Cabe registrar que na sessão realizada em 30/11/2009, o
Tribunal Pleno, apreciando o processo nº TCE 01/00798314, convalidou a
interpretação acima exposta que orientou a decisão então adotada, julgando
irregular sem imputação de débito com fundamento no art. 18, inciso III, alínea
“b”, c/c o art. 21 parágrafo único da Lei Complementar nº 202/2000 as contas
pertinentes à Tomada de Contas.
Desse modo, entendo que não cabe a
responsabilidade ao Sr. Gilmar Knaesel, ao pagamento da quantia sugerida pela
Instrução Técnica, pelos fatos tido por irregulares pela Instrução Técnica,
o que torna suficiente para descaracterizar a
infração, a imputação de débito e a multa do art. 68 da Lei Complementar nº
202/2000.
Além da imputação de débito a
Instrução Técnica sugere aplicação de multa ao Sr. Gilmar Knaesel, em face das
irregularidades descritas.
No que tange a
irregularidade descrita
no item 3.4.2.4, do relatório de fls. 456, face a aprovação, empenhamento e
repasse de recursos a projeto desprovido de interesse público, entendo que não
cabe aplicação de multa, pois esta conduta já fora motivo para o
julgamento irregular das contas e imputação de débito.
Quanto as
demais irregularidades elencadas nos itens 3.4.2.1, 3.4.2.2 e 3.4.2.2, 3.4.2.5
e 3.4.2.6, entendo que as circunstâncias fáticas relativas a este caso concreto
conduziriam ao entendimento de que a infração pode ser considerada de natureza
leve, passível de recomendação.
Ademais,
a falta de providencias administrativas tempestivas antes da instauração da
Tomada de Contas Especial e instauração fora do prazo legal, certamente tal dispositivo deve ser interpretado com certa
parcimônia, uma vez que, nem sempre, a burocracia administrativa permite
reconhecer com facilidade, ou mesmo estimar a data em que o Gestor Público, no
caso ora em análise o Sr. Gilmar Knaesel conheceu os fatos, ou que, em virtude
de suas obrigações, deveria conhecer. A boa ou má-fé do responsável também deve
ser sopesada.
Ademais, a autoridade administrativa competente não poderá ter
ciência formal e efetiva dos fatos se não for comunicada por seus subordinados.
Por fim, quanto
a sugestão da Área Técnica no item 3.7, de fl. 456v, no sentido de remeter ao Ministério Público
Estadual informações acerca dos fatos apurados neste processo para que tome as
providências cabíveis, entendo que
tal comunicação somente deve ocorrer após o trânsito em julgado da decisão,
consoante ao disposto no art. 64, § 5º da Lei Complementar n. 202/2000.
Ante o exposto, o
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência
conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar 202/2000, ao
apreciar a documentação que compõe os autos, manifesta-se por considerar
irregulares com imputação de débito e aplicação de multa proporcional ao dano,
na forma do art. 18, inciso III, alínea “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, e 68,
da Lei Complementar nº 202/00, as contas de recursos repassados a Assessoria Editora Turismo e Eventos e condenar o responsáveis a
recolherem ao Tesouro do Estado, o valor descrito no item 3.1, do relatório de
fl 454, assim como, declarar o Sr. Roberto Carlos Castagnaro e a empresa RCC Administração Patrimonial Ltda., impedidos de receberem novos recursos
do erário, até a regularização do presente processo.
Manifesto-me ainda, pela
não imputação de débito, multa proporcional ao dano ao Sr. Gilmar Knasel, pois
não restou comprovado a responsabilidade solidária deste, bem como não restou
comprovado nos autos que o responsável, agiu com má-fé, dolo ou culpa.
É o Parecer.
Florianópolis, 09 de setembro de 2013.
MÁRCIO DE SOUSA ROSA
Procurador-Geral