PARECER nº:

MPTC/23626/2014

PROCESSO nº:

REP 13/00667378    

ORIGEM:

Fundo Municipal de Saúde de Salto Veloso

INTERESSADO:

Nilson Feliciano de Araujo

ASSUNTO:

Peças de Ação Trabalhista - contratação temporária irregular.

 

 

 

Trata-se de representação encaminhada pela Vara do Trabalho de Videira-SC, na qual traz a conhecimento dessa Corte de Contas o acórdão proferido nos autos do recurso ordinário 0000455-90.2013.5.12.0020 e a sentença proferida nos autos do Processo n. 455/2013, referente à ação trabalhista movida por Meryeli Donadel em face do Fundo Municipal de Saúde de Salto Veloso (fls. 2-7).

Na referida decisão, o fundo municipal foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios e indenização à funcionária, em face da sua demissão sem justa causa quando estava grávida, em afronta à garantia de emprego.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal apresentou relatório técnico (fls. 17-18), por meio do qual opinou pelo conhecimento da representação, para considerá-la improcedente, por entender que não houve descumprimento da norma legal, uma vez que a confirmação da gravidez da contratada ocorreu posteriormente à sua demissão.

Da análise do feito verifica-se que o mesmo está em ordem quanto aos aspectos da legitimidade da autoria, da sujeição do responsável à jurisdição dessa Corte de Contas e da formulação em linguagem clara e objetiva, em conformidade com as disposições contidas no Regimento Interno dessa Corte.

A hipótese descrita na representação é passível de fiscalização pelo Tribunal de Contas, consoante atribuições previstas nos dispositivos legais e normativos vigentes (art. 59, da Constituição Estadual, art. 1º, inciso XVI, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 e art. 1°, inciso XVI, da Resolução TCE/SC n. 6/2001 - Regimento Interno) e o representante trouxe elementos hábeis a deflagrar o processo fiscalizatório nessa Corte de Contas.

Após análise da documentação constante dos autos, verifico que se encontram presentes todos os requisitos necessários ao conhecimento da presente representação.

A autora da reclamação trabalhista, Meryeli Donadel, foi contratada, em caráter temporário, para laborar na função de auxiliar administrativo, na Secretaria Municipal de Saúde e Assistência Social do Município de Salto Veloso. Em 20/12/2012 foi dispensada e em 21/01/2013 confirmou a gravidez com exame clínico, com data provável da concepção em 02/12/2012.

O pedido foi julgado procedente pelo juízo de primeiro grau (fls. 9-11), que condenou o Fundo Municipal de Saúde de Salto Veloso a pagar a indenização equivalente à estabilidade gestacional, com salários contados de 21/12/2012 até 5 meses após o parto bem como ao pagamento de honorários advocatícios em 15% sobre a condenação líquida imposta.

O réu recorreu ao TRT da 12ª Região que declarou a incompetência material da justiça do trabalho para apreciar e julgar o feito, considerando que se tratava de causa instaurada entre o Poder Público e uma servidora (relação jurídico-administrativa), eximindo o réu da condenação a ele imposta.

Acerca da matéria a ser discutida, discordo da instrução quando afirma que não houve descumprimento da norma legal por parte do administrador.

Ainda que a confirmação da gravidez tenha ocorrido após a demissão, o fato é que o exame por ela apresentado aponta para a concepção antes da sua exoneração.

A Súmula nº 244 do TST garante a estabilidade provisória da empregada gestante e assinala que o desconhecimento da gravidez não afasta a mesma. Veja-se:

Súmula nº 244 do TST

GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (redação do item III alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT).

 II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

 III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.

Portanto, muito embora a confirmação tenha vindo depois, a servidora informou o responsável ainda durante o período de estabilidade, e, nesse contexto, caberia a reintegração ao emprego e a manutenção da sua estabilidade por até 5 meses após o nascimento.

Para fins de garantia de estabilidade provisória da empregada na gravidez equipara-se as servidoras públicas, inclusive as contratadas a título precário e temporário, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição Federal e do art. 10, II do ADCT.

Acerca do assunto o Tribunal de Justiça de Santa Catarina já decidiu:

CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. SERVIDORA GESTANTE. ENCERRAMENTO DO VÍNCULO EM RAZÃO DA CONVOCAÇÃO DE CANDIDATOS APROVADOS EM CONCURSO PÚBLICO. APONTADA ILEGALIDADE DA DISPENSA. VEROSSIMILHANÇA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA GARANTIDA ATÉ O 5º MÊS POSTERIOR AO NASCIMENTO. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO DESPROVIDO.   Apesar de serem reiterados os julgamentos em que esta Câmara considerou legítima a dispensa da servidora gestante pelo advento do termo final do contrato temporário, o STF é firme no sentido de que "as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto" (AgR no AI n. 804.574/DF, min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 30-8-2011). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.018696-7, de Chapecó, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. 04-12-2012).

 

SERVIDORA MUNICIPAL. AGENTE COMUNITÁRIA DE SAÚDE. CONTRATO TEMPORÁRIO. RESCISÃO DURANTE O PERÍODO DE GRAVIDEZ. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO.    "O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição do Brasil e do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias" (RE 600057 AgR/SC). (TJSC, Apelação Cível n. 2010.036070-1, de Capivari de Baixo, rel. Des. Newton Janke, j. 02-08-2011).

 

Tal entendimento também é pacífico no Superior Tribunal Federal, conforme se verifica nos seguintes julgados:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE n. 600.057-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009 e RMS n. 24.263, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 9.5.03. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI 804574 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 30/08/2011, DJe-178 DIVULG 15-09-2011 PUBLIC 16-09-2011 EMENT VOL-02588-03 PP-00317 RT v. 100, n. 913, 2011, p. 491-494)

 

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDORAS PÚBLICAS E EMPREGADAS GESTANTES. LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 10, II, "B", do ADCT. O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição do Brasil e do art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 600057 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 29/09/2009, DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-10 PP-02124)

 

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA MATERNIDADE. MILITAR. ADMISSÃO EM CARÁTER TEMPORÁRIO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. ISONOMIA. ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO E ART. 10, II, b, DO ADCT. AGRAVO IMPROVIDO. I – As servidoras públicas e empregadas gestantes, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o art. 7º, XVIII, da Constituição e o art. 10, II, b, do ADCT. II – Demonstrada a proteção constitucional às trabalhadoras em geral, prestigiando-se o princípio da isonomia, não há falar em diferenciação entre servidora pública civil e militar. III - Agravo regimental improvido. (RE 597989 AgR, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 09/11/2010, DJe-058 DIVULG 28-03-2011 PUBLIC 29-03-2011 EMENT VOL-02491-02 PP-00347)

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LICENÇA MATERNIDADE DE MILITAR TEMPORÁRIA. ART. 7º, XVIII, E ART. 142, VIII, CF/88. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A estabilidade provisória advinda de licença maternidade decorre de proteção constitucional às trabalhadoras em geral. 2. O direito amparado pelo art. 7º, XVIII, da Constituição Federal, nos termos do art. 142, VIII, da CF/88, alcança as militares. 3. Inexistência de argumento capaz de infirmar o entendimento adotado pela decisão agravada. 4. Agravo regimental improvido. (RE 523572 AgR, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 06/10/2009, DJe-204 DIVULG 28-10-2009 PUBLIC 29-10-2009 EMENT VOL-02380-06 PP-01132)

 

Como se depreende dos julgados acima, o Supremo Tribunal Federal já decidiu há muito que a servidora possui direito à estabilidade provisória na gravidez, bem como a sua indenização no caso de não ser possível mais a sua reintegração.

No presente caso, o administrador recusou o pedido de reintegração da servidora, que o requereu dentro do período da estabilidade, implicando no sério risco de indenizá-la, e acarretando, dessa forma, na realização de despesas sem a contraprestação do trabalho, o que poderá causar prejuízo ao erário.

Conforme informado inicialmente, a competência para apreciação da matéria é da Justiça Comum, em virtude da relação de trabalho ter ocorrido com a administração pública.

Em consulta ao sistema de processos do Poder Judiciário de Santa Catarina, constatou-se que foi autuada na 2ª Vara Cível de Videira, sob o número 079.13.007608-0, uma ação reclamatória trabalhista movida por Meryeli Donadel, em face do Fundo Municipal de Saúde de Salto Veloso, e que até a presente data os autos estão conclusos ao juiz para sentença (tramitação anexa a este parecer).

Portanto, considerando que, além do descumprimento de uma norma legal, a conduta do responsável poderá implicar futuramente na obrigação de devolver verbas indenizatórias e honorários em função da referida ação, entendo pertinente aguardar o trânsito em julgado para efetuar a devida audiência ou citação do responsável nestes autos.

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar n. 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO da presente representação e pela DETERMINAÇÃO do sobrestamento dos autos até o trânsito em julgado da ação nº 079.13.007608-0 e, ainda, pela sua remessa à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal para que efetue o controle quanto à tramitação da referida ação e informe o Relator o seu resultado após o trânsito em julgado.

Florianópolis, 4 de abril de 2014.

 

 

Cibelly Farias

Procuradora