PARECER nº:

MPTC/24657/2014

PROCESSO nº:

RPA 00/05813131    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Campos Novos

INTERESSADO:

Idernei Antônio Titon (falecido)

ASSUNTO:

Representação de Agente Público acerca de supostas irregularidades envolvendo a doação de imóvel de propriedade do Município com área de 121.000m²

 

Trata-se de Representação formulada pelo Sr. Idernei Antônio Titon, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Campos Novos no exercício de 2000, para apreciação dessa Corte de Contas, tendo o processo culminado na Decisão n. 1.998/2010 (fls. 1044-1045), exarada pelo Tribunal Pleno, vazada nos seguintes termos:

O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, decide:

6.1. Conhecer do Relatório de Instrução n. DMU e considerar descumpridos pelas empresas Bruno Papéis Especiais S/A. e Bruno Industrial S/A. os encargos previstos na Leis (municipais) ns. 1.697/90 e 2.771 e 2.840/03, referentes à doação de imóvel de propriedade do Município de Campos Novos com área de 121.000m², identificado no Registro de Imóveis de Campos Novos sob a matrícula n. 15558.

6.2. Determinar à Prefeitura Municipal de Campos Novos que, no prazo de 90 (noventa) dias, com fundamento no art. 59, IX, da Constituição Estadual, a contar da data da publicação desta Decisão no Diário Oficial Eletrônico deste Tribunal de Contas, adote as providências necessárias com vistas ao exato cumprimento da lei, comprovando-as a este Tribunal, a fim de efetivar o cancelamento do registro da doação e a consequente reversão ao patrimônio do Município do imóvel descrito no item 6.1 do Relatório DMU, adotando-se o procedimento previsto no art. 250, II, da Lei n. 6.015/73, ou, diante da impossibilidade de fazê-lo, proponha a competente demanda judicial, na forma do inciso I do mesmo preceito legal.

6.3. Alertar a Prefeitura Municipal de Campos Novos, na pessoa do Sr. Vilibaldo Erich Schmid - Prefeito Municipal, que o não cumprimento do item 6.2 desta deliberação implicará a cominação das sanções previstas no art. 70, VI e § 1º, da Lei Complementar (estadual) n. 202/00, conforme o caso, e o julgamento irregular das contas, na hipótese de reincidência no descumprimento de determinação, nos termos do art. 18, § 1º, do mesmo diploma legal.

6.4. Determinar à Secretaria Geral - SEG, deste Tribunal, que acompanhe a deliberação constante do item 6.2 retrocitado e comunique à Diretoria Geral de Controle Externo - DGCE, após o trânsito em julgado, acerca do cumprimento da determinação para fins de registro no banco de dados e encaminhamento à Diretoria de Controle competente para juntada ao processo de contas do gestor.

6.5. Recomendar à Prefeitura Municipal de Campos Novos que revise sua legislação, a fim de privilegiar a utilização do instituto da concessão de direito real de uso para o uso de bens públicos por particulares em atividades econômicas.

6.6. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 6356/2008:

6.6.1. ao Sr. Vilibaldo Erich Schmid - Prefeito Municipal de Campos Novos;

6.6.2. ao Sr. Nelson Cruz - ex-Prefeito daquele Município;

6.6.3. às empresas Bruno Industrial Ltda. e Bruno Papéis Especias S.A.

Às fls. 1051-1059, o então Prefeito Municipal de Campos Novos, Sr. Vilibaldo Erich Schmid, noticiou a propositura da ação ordinária de cancelamento parcial de doação cumulada com reversão parcial de imóvel ao patrimônio público, diante da impossibilidade do cancelamento da doação e da reversão do imóvel ao Município de maneira amigável.

A movimentação do referido processo foi acostada às fls. 1061-1063, noticiando-se a suspensão do feito para que fosse elaborado um acordo extrajudicial entre as partes.

A Diretoria de Controle dos Municípios, a partir da informação de fls. 1065-1067, sugeriu a remessa do presente processo à Secretaria Geral para a adoção das providências cabíveis, com o que concordou o Auditor Substituto de Conselheiro Relator, à fl. 1068.

O Coordenador da Secretaria Geral, então, juntou aos autos a informação de fl. 1070, ao passo que o Diretor da Diretoria de Controle dos Municípios remeteu os autos à Inspetoria 2, para a adoção de procedimentos.

Às fls. 1072-1079, as empresas Bruno Industrial Ltda. e Bruno Papéis Ltda. apresentaram petição e documentos requerendo-lhes, em suma, nova doação de parte do terreno – sub judice – da Prefeitura Municipal de Campos Novos.

Nova movimentação do processo n. 014.10.003481-4 foi juntada às fls. 1081-1083, ao passo que, diante da notícia da prorrogação do prazo de suspensão do feito para a elaboração de acordo entre as partes, a Diretoria de Controle dos Municípios, por meio da informação de fls. 1086-1088, sugeriu o encaminhamento do presente processo à Secretaria Geral para que verificasse o cumprimento do item 6.4 da Decisão n. 1.998/2010, sugestão esta acatada pelo Auditor Substituto de Conselheiro Relator, à fl. 1088.

A Divisão de Controle de Prazos da Secretaria Geral, à fl. 1089, noticiou o fim do prazo legal para o atendimento da determinação em comento, não havendo nos autos quaisquer manifestações do responsável acerca da questão.

Assim, a partir do despacho de fl. 1090, o Auditor Substituto de Conselheiro Relator determinou que a Diretoria de Controle dos Municípios realizasse diligência ao Município de Campos Novos, para que fosse informado o andamento do processo n. 014.10.003481-4 e as medidas que estariam sendo adotadas pelo Município.

O então Prefeito Municipal de Campos Novos, dessa maneira, remeteu o ofício de fl. 1093, informando que teria sido firmado acordo com os réus para a reversão total do imóvel ao patrimônio público, remetendo-se, por sua vez, à Câmara de Vereadores projeto de lei autorizando a reversão e a alienação do imóvel.

Em seguida, às fls. 1096-1102, o Prefeito Municipal de Campos Novos remeteu cópia da Lei Municipal n. 3.902/13, a qual demonstraria o efetivo cumprimento do item n. 6.2 da Decisão n. 1.998/2010.

Finalmente, a Diretoria de Controle dos Municípios emitiu a informação de fls. 1104-1104v, tendo o Auditor Substituto de Conselheiro Relator, então, determinado a remessa dos autos a este Ministério Público de Contas (fl. 1105).

Passando-se, enfim, à análise efetiva da questão, é necessário primeiramente destacar o injustificável lapso temporal observado entre o início da presente representação e o desfecho de toda a problemática que a envolve. Com efeito, o presente processo tramita há quase 15 anos, sendo que se refere a uma Lei Municipal de 1990, salientando-se, ainda, que a decisão desse Tribunal Pleno (a ser cumprida em 90 dias) levou praticamente três anos para ser atendida, e de uma maneira bastante enviesada, a propósito, como será frisado oportunamente.

Salienta-se, também, não ser mais cabível a retomada da discussão que permeou todo o processo, já tendo a opinião deste Órgão Ministerial ficado bastante clara com o parecer de fls. 1000-1008, cuja conclusão destacou a irregularidade do item 2.1 da conclusão do relatório técnico n. 6.356/2008, a aplicação de multa ao Prefeito Municipal de Campos Novos no exercício de 2004, as determinações constantes dos itens 3 e 4 da conclusão do mencionado relatório e a fixação de prazo para que o cumprimento de tais obrigações fosse comprovado junto a essa Corte de Contas, além da remessa de informações ao Ministério Público Estadual, diante da existência de fortes indícios que poderiam configurar crimes previstos na Lei de Licitações, crime de responsabilidade e ato de improbidade administrativa. Entretanto, o Auditor Substituto de Conselheiro Relator optou com seu voto (fls. 1009-1044) apenas assinar prazo para que o Poder Executivo Municipal de Campos Novos regularizasse a questão, acrescentando uma recomendação no sentido de que revisasse sua legislação, tendo o Tribunal Pleno dessa Corte de Contas seguido tal voto do Relator.

Neste contexto, restou efetivamente cumprida com um atraso de três anos a determinação para que a Prefeitura Municipal de Campos Novos comprovasse junto a essa Corte de Contas, no prazo de noventa dias (a contar da data da publicação da Decisão n. 1.998/2010 no Diário Oficial Eletrônico desse Tribunal de Contas), a adoção das providências necessárias para efetivar o cancelamento do registro da doação e a consequente reversão ao patrimônio do Município do imóvel em questão, adotando-se o procedimento previsto no art. 250, II, da Lei n. 6.015/73, ou, diante da impossibilidade de fazê-lo, propusesse a competente demanda judicial, na forma do inciso I do mesmo preceito legal.

Isso porque somente em setembro de 2013 o Prefeito Municipal de Campos Novos apresentou a cópia da Lei Municipal n. 3.902/13 (fls. 1096-1102), a qual determinou a reversão do imóvel em discussão no presente processo ao patrimônio municipal. E mesmo que se considerasse cumprida a determinação a partir do momento em que o então Prefeito Municipal apresentou a comprovação da propositura da competente demanda judicial[1], ainda assim a determinação foi cumprida com atraso, tendo em vista que a publicação da Decisão n. 1.998/2010 no Diário Oficial Eletrônico desse Tribunal de Contas ocorreu em 31/05/2010 (fl. 1044), ao passo que o protocolo da petição que noticiou a propositura da demanda possui a data de 08/09/2010 (fl. 1051), superior, portanto, a 90 dias.

Por sua vez, o item 6.5 da citada Decisão n. 1.998/2010 destacou recomendação no sentido de que a Prefeitura Municipal de Campos Novos revisasse sua legislação a fim de privilegiar a utilização do instituto da concessão de direito real de uso para o uso de bens públicos por particulares em atividades econômicas.

Neste ponto, a orientação do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina foi completamente ignorada, e este é o grande problema do instituto da recomendação.

Assim, ao invés de cumprir a recomendação dessa Corte de Contas, a Prefeitura Municipal de Campos Novos, ainda com o advento da Lei Municipal n. 3.902/13, realizou a alienação do imóvel há tanto tempo litigioso à empresa BRUNO INDUSTRIAL LTDA., com a contrapartida de preço obtido por avaliação prévia e uma série de obrigações dispostas no art. 7º do referido diploma.

A edição a referida lei, após tantos anos de discussão e diante de todas as circunstâncias políticas já deixadas bem evidentes no transcorrer do presente processo, a meu ver, ainda não resolve definitivamente a questão, pois se faz necessário verificar se foram efetivamente adotadas providências para a alienação do bem, além de realizar-se um estudo apropriado para analisar se o preço estipulado pela Lei Municipal n. 3.902/13 para a alienação do imóvel em questão não é irrisório e, finalmente, determinar que a empresa BRUNO INDUSTRIAL LTDA. comprove junto a essa Corte de Contas o cumprimento das obrigações relacionadas no art. 7º da Lei Municipal n. 3.902/13.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

1. pela DETERMINAÇÃO para que a Prefeitura Municipal de Campos Novos demonstre a adoção de providências com o intuito de revisar sua legislação, a fim de privilegiar a utilização do instituto da concessão de direito real de uso para o uso de bens públicos por particulares em atividades econômicas (item 6.5 da Decisão n. 1.998/2010);

2. pela DETERMINAÇÃO para que a Prefeitura Municipal de Campos Novos comprove a adoção de providências para efetivar a reversão e a alienação dos bens de que tratam os arts. 1º e 2º da Lei Municipal n. 3.902/2013;

3. pela DETERMINAÇÃO à Diretoria de Controle dos Municípios para que realize estudo detalhado no sentido de que se averigue se o preço estipulado pela Lei Municipal n. 3.902/13 para a alienação do imóvel em questão esteve de acordo com os valores de mercado;

4. pela DETERMINAÇÃO para que a empresa BRUNO INDUSTRIAL LTDA. comprove junto a esse Tribunal de Contas o cumprimento das obrigações mencionadas na nos arts. 4º e 7º da Lei Municipal n. 3.902/13 (pagamento do preço e obrigações da empresa beneficiada);

5. pela FIXAÇÃO DO PRAZO de trinta dias para que sejam remetidas a esse Tribunal de Contas as informações dispostas nos itens 1, 2, 3 e 4 deste parecer.

Florianópolis, 15 de maio de 2014.

 

 

Cibelly Farias

Procuradora

 



[1] Registra-se o longo tempo em que o processo judicial permaneceu suspenso em razão de pedido das partes, conforme evidenciado na movimentação processual do processo n. 014.10.003481-4, juntada às fls. 1061-1063 e 1081-1083.