PARECER nº:

MPTC/24838/2014

PROCESSO nº:

REC 13/00232991    

ORIGEM:

Câmara Municipal de Salete

INTERESSADO:

Osni Kuhnen

ASSUNTO:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo PCA-07/00155112

 

 

 

 

Versam os autos sobre Recurso de Reconsideração (fls. 3-9) interposto pelo Sr. Osni Kuhnen, Vereador da Câmara Municipal de Salete, em face do Acórdão n. 163/2013, dessa Corte de Contas, que imputou débito ao recorrente em face da seguinte irregularidade:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição Estadual e no art. 1º da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, inciso III, alínea “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as presentes contas anuais referentes aos atos de gestão do exercício de 2006 da Câmara Municipal de Salete, e condenar os Responsáveis adiante relacionados ao pagamento dos montantes de sua responsabilidade, em face do recebimento indevido de subsídio de agente político do Legislativo municipal, sem atender ao disposto nos arts. 39, 4º, c/c o art. 37, X, da Constituição Federal, e 6º da Lei (municipal) n. 1.295/2004, repercutindo em pagamento a maior (item 5.1.2.1 do Relatório DMU n. 2669/2012), fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, até a data do recolhimento, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):

[...]

6.1.7. de responsabilidade do Sr. OSNI KUHNEN – Vereador do Município de Salete em 2006, CPF n. 636.674.799-72, o montante de R$ 216,21 (duzentos e dezesseis reais e vinte e um centavos).

A Consultoria Geral dessa Corte de Contas emitiu o Parecer n. 11/2014 (fls. 10-15), opinando pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração e, no mérito, pelo seu desprovimento, mantendo na íntegra os termos do acórdão recorrido.

É o relatório.

O Recurso de Reconsideração, com amparo no art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000 é o adequado em face de decisão proferida em processo de prestação de contas, sendo a parte legítima para a sua interposição, uma vez que figurou como responsável pelo ato de gestão irregular descrito no acórdão recorrido.

A decisão foi publicada na imprensa oficial em 11/4/2013 e a peça recursal protocolizada nessa Corte de Contas no dia 6/5/2013, portanto, tempestiva.

Logo, encontram-se presentes os requisitos de admissibilidade do presente recurso.

Quanto ao mérito, o tema em questão não trata de nenhuma novidade, é corrente o entendimento desse Tribunal de Contas, já fixado em casos semelhantes ao ora analisados, no sentido de que reajustes nos subsídios dos Vereadores concedidos dentro dos limites relativos aos índices oficiais podem ser considerados como revisão geral anual, todavia, o excedente não encontra amparo legal para sua percepção, devendo ser imputado o respectivo débito ao beneficiário.

Nesse sentido, os seguintes acórdãos desse Tribunal de Contas: Acórdão n. 153/2014 (PCA 08/00081358), Acórdão n. 224/2014 (PCA 08/00066472), Acórdão n. 82/2013 (PCA 09/00018852), Acórdão n. 6/2013 (PCA 07/00137645), Acórdão n. 1.204/2012 (PCA 07/00136916), Acórdão n. 1.222/2012 (PCA 08/00068254), Acórdão n. 476/2013 (PCA 07/00152105), Acórdão n. 1.233/2013 (PCA 07/00142134) e Acórdão n. 6/2013 (PCA 07/00137645).

O argumento apresentado pelo recorrente, relativo à não declaração de inconstitucionalidade da norma municipal que concedeu o referido reajuste, não prospera.

Eis o que diz a Súmula 347 do STF:

O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público.

No presente caso, ao decidir que a Câmara Municipal de Agrolândia não poderia aplicar o reajuste integral previsto na Lei Complementar Municipal n. 42/2006, por violar uma disposição constitucional, nada mais fez essa Corte de Contas do que exatamente declarar a inconstitucionalidade dessa norma para esse caso concreto, afirmando, assim, a impossibilidade de sua aplicação e a necessidade de retificação dos efeitos jurídicos e financeiros dela decorrentes.

O recorrente alegou ainda que não houve dolo ou má-fé na aplicação aos agentes políticos do mesmo percentual destinado aos servidores.

Convém esclarecer que, no que compete a esse Tribunal de Contas, não há qualquer dispositivo na Lei Complementar n. 202/2000 que exija comprovação de má-fé como requisito para imputabilidade. Mais ainda, no âmbito do direito administrativo, não há que se indagar sobre a boa ou má-fé do agente. Sobre o tema, destaco as palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello[1], que bem sintetiza esse entendimento:

11. (d) Princípio da exigência de voluntariedade para incursão na infração – O Direito propõe-se a oferecer às pessoas uma garantia de segurança, assentada na previsibilidade de que certas condutas podem ou devem ser praticadas e suscitam dados efeitos, ao passo que outras não podem sê-lo, acarretando consequências diversas, gravosas para quem nelas incorrer. Donde, é de meridiana evidência que descaberia qualificar alguém como incurso em infração quando inexista a possibilidade de prévia ciência e prévia eleição, in concreto, do comportamento que o livraria da incidência na infração e, pois, na sujeição às sanções para tal caso previstas. Note-se que aqui não se está a falar de culpa ou dolo, mas de coisa diversa: meramente do animus de praticar dada conduta.

No presente caso, a imputação do débito se dá não só àqueles que autorizaram o pagamento irregular, mas também aos que foram beneficiados pelo referido dispêndio, conforme entendimento que já se solidificou no âmbito dessa Corte de Contas a partir do julgamento do Processo PCA-06/00089118, cujo voto condutor, transcrito pela instrução às fls. 14-15, evidencia claramente os argumentos que levaram a tal responsabilização.

E quanto ao enunciado do Prejulgado 1686, mencionado pelo recorrente em sua defesa, conforme dito pela instrução, esse Tribunal de Contas evoluiu seu entendimento sobre o assunto, sendo que o Prejulgado 2102 é atualmente o que melhor consolida o tema, ao afirmar que o percentual utilizado para a revisão geral anual “deve seguir um índice oficial de medida da inflação”.  

No mais, o recorrente novamente limitou-se a reapresentar os mesmos argumentos de defesa já utilizados na fase cognitiva, sem acrescentar nenhum novo fato ou argumento que pudesse excluir a restrição constatada ou mesmo a responsabilidade do ora recorrente, razão pela qual resta mantida, no meu entender, a mesma conclusão do Acórdão n. 163/2013.

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar n. 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO do presente Recurso de Reconsideração e, no mérito, pelo seu DESPROVIMENTO, mantendo hígido o teor do Acórdão n. 163/2013.

Florianópolis, 26 de maio de 2014.

 

 

Cibelly Farias

Procuradora

 



[1] Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 20ª ed., p. 805.