PARECER
nº: |
MPTC/24705/2014 |
PROCESSO
nº: |
RLA
13/00242873 |
ORIGEM : |
Prefeitura
de Ipuaçu |
ASSUNTO : |
Auditoria in loco, relativa a atos de
pessoal, do período de 1º-1-2012 a 3/2013 |
1 - RELATÓRIO
Trata-se de auditoria
ordinária in loco, realizada na Prefeitura de Ipuaçu, abrangendo o
período de janeiro de 2012 a março de 2013, com o objetivo de verificar a
regularidade de atos de pessoal (fls. 2/345-v).
Auditores da Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP sugeriram
a audiência do Sr. Denilso Cabral e do Sr. Emerson Pedro Base, respectivamente,
prefeito e secretário de administração no período auditado, para apresentação
de justificativas acerca das seguintes restrições (fls. 346/354):
- promover/manter excessivo número de
contratações temporárias de pessoal – ano após ano e para funções corriqueiras
e permanentes da administração pública municipal (no exercício de 2010,
efetuaram-se 80 contratações temporárias; em 2011, 151; em 2012, 67; e em 2013,
até a data da auditoria – 26-4-2013, um total de 77 contratações temporárias),
apesar de existirem vagas permanentes relacionadas a cargos efetivos não
preenchidos, de forma contrária ao imposto pela Constituição em seu art. 37, II
e IX, à Lei Municipal Autorizativa nº 12/2005, bem como em desconformidade com
o Prejulgado nº 2003, configurando burla ao instituto do concurso público;
- omitir-se no dever de dispor em norma legal a
forma de controle de frequência dos servidores públicos municipais, bem como em
supervisionar o cumprimento integral da jornada laboral de todos os servidores,
propiciando a ausência de controle da frequência dos servidores lotados na sede
da Prefeitura, em desacordo com o art. 1º, § 3º, da Lei Municipal nº 13/2005,
Lei Orgânica Municipal, em seu art. 91, XXXIX, bem como com os princípios da
Legalidade, Moralidade e Eficiência insertos no art. 37, caput, da Constituição.
A audiência foi determinada (fl. 355).
Os responsáveis
apresentaram justificativas (fls. 360/521 e 525/551).
Por fim, auditores da
DAP sugeriram decisão de irregularidade dos atos, com aplicação de multas ao
prefeito, bem como determinações ao gestor (fls. 565/571).
2 – MÉRITO
2.1 – Excessivo número de contratações de
servidores em caráter temporário, em desrespeito ao art. 37, II e IX, da
Constituição.
Auditores da DAP
evidenciaram excessivo número de contratações temporárias, apesar de haver
cargos permanentes e efetivos com vagas não preenchidas, conforme se vislumbra na
tabela abaixo, baseada em informações constantes de fl. 348:
Ano |
Servidor temporário (quantidade) |
2010 |
80 |
2011 |
151 |
2012 |
67 |
2013 até 26-4-2014 |
77 |
Em resposta, o Sr.
Denilso Cabral justificou que (fls. 361/362): - a contratação de servidores
temporários deve-se ao grande número de programas federais implantados no Município,
os quais necessitam de servidores para sua efetivação; - em decorrência do
caráter temporário de tais programas a efetivação de servidores seria um risco
para a administração; - a cedência de servidores para outras esferas de Poder
onera a Prefeitura; realizou concurso público em 2012, objetivando a
contratação para cargos efetivos, e gradativamente estão sendo substituídos os
ACT’s.
Eis análise dos
auditores da DAP (fls. 567/568):
[…] restou clara a utilização de subterfúgio ao se efetuar
admissões de servidores em caráter temporário para laborarem no ente público,
preterindo as admissões via concurso público – que é a regra, e não a exceção.
Isto porque, as contratações temporárias se dão em vários exercícios
consecutivos para funções permanentes, as quais integram vários cargos
permanentes e efetivos da esfera do executivo municipal, além de existirem
diversos casos de recontratações sucessivas que afrontam dispositivos de Lei
Municipal Autorizativa, desconfigurando desta feita, os pressupostos de
excepcionalidade, temporariedade e transitoriedade, que se constituem em
condição sine qua non a possibilitar
as contratações em caráter temporário.
A Constituição prevê
exceção à regra do concurso público, por meio de contratação por tempo
determinado, nos termos do art. 37, IX, in verbis:
IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo
determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse
público;
Sobre a
excepcionalidade da contratação de servidores temporários, ensinamento de Lucas
Rocha Furtado:[1]
A contratação temporária deve (ou deveria) ser utilizada em
caráter excepcional, e exatamente por isso o texto constitucional o reserva
para situações transitórias de excepcional interesse público. O motivo para o
regime ser utilizado como excepcionalidade decorre do fato de que os servidores
temporários não precisam se submeter ao concurso público em razão de não
ocuparem cargo ou emprego público.
Segundo Ferreira,[2]
a utilização dessa exceção é muito perigosa, por se tratar de uma válvula de
escape para fugir à obrigatoriedade dos concursos públicos.
Os requisitos
obrigatórios para a utilização da contratação temporária são:
- excepcional
interesse público;
- temporariedade da
contratação;
- hipóteses
expressamente previstas em lei editada pelo ente contratador.
Sobre a questão, o
teor do Prejulgado nº 676, cujo caráter é normativo para os jurisdicionados do
Tribunal de Contas de Santa Catarina:
1. A
investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso
público de provas ou de provas e títulos (art. 37, II, CF), podendo o município
contratar por prazo determinado, para atender à necessidade temporária de
excepcional interesse público, que deve se pautar na temporariedade que está
intrinsecamente ligada à questão da necessidade, que justifique o interesse
público da contratação, nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal. […]
No caso dos autos, a
Lei Municipal nº 12/2005 possibilita contratações por prazo determinado para atender
a necessidade temporária de excepcional interesse público em determinadas
hipóteses (fls. 179/182).
A questão que se deve
perquirir não é o número de contratados em caráter temporário, mas sim se as
contratações se enquadram nas hipóteses legais.
Assim, resta saber se
as contratações realizadas pela Prefeitura se enquadram na previsão legal.
A relação de
contratados temporários no exercício de 2013 se encontra na fls. 169/171, de
onde se extrai as seguintes informações:
2013 – contratos temporários |
Nº de cargos |
|
Professores (sem titulação, I,
II) |
62 |
|
Técnico em Enfermagem |
3 |
|
Operador de Máquina Rodoviária |
2 |
|
Motorista |
3 |
|
Auxiliar de Serviços Gerais |
1 |
|
Agente de Copa e Limpeza |
1 |
|
Conselheiro Tutelar |
1 |
|
Farmacêutico |
1 |
|
Operador de Máquina Agrícola |
1 |
|
Agente Administrativo |
1 |
|
Técnico em Agropecuária |
1 |
|
TOTAL |
77 |
Veja-se que a grande maioria das
contratações temporárias é de professores, 62 de um total de 77.
Entre as hipóteses permissivas
para contratação temporária está o “preenchimento de vagas no Magistério
Público Municipal para atender à variação da demanda de alunos nas modalidades
de educação infantil, ensino fundamental e educação de jovens e adultos”.
Conforme salienta o
responsável, em 2012, foi realizado concurso público para provimento de cargos
efetivos em diversas áreas (fls. 270/308).
A homologação do
resultado final do concurso consta das fls. 270/277, datada de 17-4-2013,
constando a aprovação de 31 professores (fls. 275/276).
De outro lado, do
edital de concurso, datado de dezembro de 2012, consta a quantidade de
19 vagas de professor que deveriam ser preenchidas (fls. 382/396).
Há nos autos editais
de chamamento de candidatos aprovados, datados de 23-4 a 2-7-2013, num
total de 51 servidores efetivos (fls. 413/421), conforme demonstra a tabela
abaixo:
Chamamento candidatos cargos efetivos |
Nº de cargos |
Professores (sem titulação, I,
II) |
7 |
Técnico em Enfermagem |
1 |
Operador de Máquina Rodoviária |
4 |
Motorista |
9 |
Auxiliar de Serviços Gerais |
4 |
Agente de Copa e Limpeza |
7 |
Farmacêutico |
1 |
Técnico em Agropecuária |
1 |
Veja-se que a relação de
contratados temporários referente ao ano de 2013 é decorrente de requisição de
documentos levada a efeito por auditores do Tribunal em 22-4-2013 (fl.
169).
Dentro desse contexto, levando em
consideração a cronologia dos fatos, com lançamento de concurso público no
final de 2012 e chamamento de aprovados durante o primeiro semestre de 2013,
não me parece que o responsável tenha ficado inerte diante dos fatos.[3]
Desta feita,
comprovada a realização de concurso público, e como consequência a gradativa contratação
de servidores efetivos, parece-me que o caso não é para sanção do responsável.
De outro norte, opino
por recomendação ao gestor que efetue contratação dos aprovados no Concurso
Público nº 1/2012,[4]
especialmente para os cargos de Professor; e, na ausência de candidatos
aprovados, promova novo concurso, de modo a dar efetividade à regra do art. 37,
II, da Constituição.
2.2 – Ausência de controle formal
da jornada de trabalho dos servidores lotados na sede da Prefeitura, em
desrespeito ao art. 1º da Lei Municipal nº 13/2005.
Constatou-se a
inexistência de controle de frequência dos servidores que laboram na sede da
Prefeitura, sendo que existe o controle de ponto apenas nas unidades de Saúde e
Educação (fl. 350-v).
A responsabilidade
foi atribuída ao Sr. Denilso Casal, prefeito, e Sr. Emerson Pedro Base,
secretário de administração (fl. 353/353-v).
Este último
demonstrou que estava licenciado para tratamento de saúde, em diversos períodos
a partir de 18-5-2011 (fls. 533/546); fato que levou os auditores da DAP a
considerarem excluída sua responsabilização (fl. 570).
Em suas
justificativas, o prefeito afirmou o seguinte (fl. 362):
Em relação ao controle de frequência/ponto dos servidores, antes
mesma da realização da auditoria pelos técnicos da DAP a administração
municipal vinha realizando estudos com intuito de implantar o controle de ponto
digital em todas secretarias, departamento e setores do município, […].
Conforme documentação encaminhada em anexo mantivemos contato com
a empresa BETA sistemas (locadora dos sistemas de contabilidade, tributação RH
e outros), para que disponibilize a [à] administração um sistema eficiente de
controle de ponto mediante a implantação de equipamentos 100% digitais e
possivelmente em tempo real, para que o setor de RH tenha controle diário do
ponto de todos os servidores.
[…]
Para demonstrar suas
alegações, o prefeito juntou cotação comercial de sistema de ponto eletrônico,
datada de 26-6-2013 (fls. 368/371).
Referida proposta é
posterior ao período da auditoria.
Inexiste nos autos
comprovação de que as medidas necessárias ao controle de jornada dos servidores
tenham se efetivado.
Sem o devido controle
pela Administração, não há como aferir o cumprimento da jornada de trabalho,
inviabilizando a regular liquidação da despesa.
Por isso, opino por
aplicação de multa ao prefeito, com determinação ao gestor que adote sistema
efetivo de controle de jornada dos servidores públicos municipais, demonstrando
ao Tribunal de Contas em prazo a ser estipulado pelo Exmo. Relator
3 - CONCLUSÃO
Ante o exposto, o
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência
conferida pelo art. 108, II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela
adoção das seguintes providências:
3.1 - DECISÃO de IRREGULARIDADE,
na forma do art. 36, § 2º, a, da Lei Complementar nº 202/2000, do
seguinte ato:
3.2 – Ausência de controle formal
da jornada de trabalho dos servidores lotados na sede da Prefeitura, em
desrespeito ao art. 1º da Lei Municipal nº 13/2005.
3.3 - APLICAÇÃO de MULTA prevista
no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, ao Sr. Denilso Casal,
prefeito, pela prática da referida irregularidade.
3.4 - DETERMINAÇÃO ao gestor que
adote sistema efetivo de controle de jornada dos servidores públicos
municipais, demonstrando ao Tribunal de Contas em prazo a ser estipulado pelo
Exmo. Relator.
3.5 - RECOMENDAÇÃO ao gestor que
efetue contratação dos aprovados no Concurso Público nº 1/2012, especialmente
para os cargos de Professor; e, na ausência de candidatos aprovados, promova
novo concurso, substituindo os admitidos em caráter temporário, de modo a dar
efetividade à regra do art. 37, II, da Constituição.
Florianópolis, 2 de junho de
2014.
Aderson Flores
Procurador
[1] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito
administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 894.
[2] Citado por MORAES,
Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª Ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 316.
[3] Não
obstante, em 8-1-2013, tenha sido lançado processo seletivo para formação de
cadastro de reserva para admissão em caráter temporário para a rede municipal
de ensino, sob o fundamento que o Concurso Público nº 1/2012 tinha data
prevista para homologação após o início do ano letivo (fls. 183/188).
[4] Cuja validade é de dois anos a partir da
publicação da homologação (fl. 394); a homologação deu-se em 17-4-2013 (fl.
277).