PARECER  nº :

MPTC/26724/2014

PROCESSO nº :

REP 08/00298179

ORIGEM      :

Prefeitura de Itapema

INTERESSADOS:

Sabino Bussanello e Salomão Ribas Junior

ASSUNTO     :

Supostas irregularidades na realização do concurso público para o provimento de cargos efetivos.

 

1 – RELATÓRIO

Trata-se de Representação formulada pelo Exmo. Sr. Salomão Ribas Junior, Conselheiro da Corte de Contas à época, relatando possíveis irregularidades no concurso público conduzido pelo Edital nº 1/2002, com vistas ao preenchimento de 412 cargos de provimento efetivo na Prefeitura de Itapema.

Auditores do Tribunal efetuaram inspeção nas contratações e demais atos administrativos da municipalidade, sugerindo audiência dos responsáveis (fls. 2316/2361 – Volume VI).[1]

As audiências foram determinadas (fls. 2363/2364 – Volume VI) e cumpridas (fls. 2365 e 2426; 2366 e 2376; 2367 e 2375; 2368 e 2773; 2369 e 2372; 2370 e 2435; 2371 e 2374).

Foram apresentadas justificativas (fls. 2377/2410; 2412/2416; 2418/2424; 2427/2428; 2451/2460; 2464/2466; 2468/2479 – Volume VII).

Após, sugeriram os auditores do Tribunal decisão de irregularidade dos atos analisados, com aplicação de multas aos responsáveis e determinação ao gestor da Unidade (fls. 2481/2615 – Volume VII).[2]

Manifestei-me, naquela oportunidade, por decisão de irregularidade dos atos, com imposição de multas aos responsáveis; como também determinações ao gestor e à Diretoria competente da Corte,[3] como segue (fls. 2626/2627 – Volume VII):[4]

 

3 - CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

- DECISÃO DE IRREGULARIDADE, nos termos do art. 36, § 2º, a, da Lei Complementar nº 202/2000 dos atos descritos nos itens 2.1 (2.1.1 a 2.1.9) e 2.2 (apenas o item 2.2.2) da conclusão do Relatório nº 16/2010 da Diretoria de Atividades Especiais;

- APLICAÇÃO de MULTAS previstas no art. 70, II, da Lei Complementar 202/2000, aos responsáveis, em virtude da prática das referidas infrações;

- DETERMINAÇÃO ao gestor da Prefeitura de Itapema que, no prazo de noventa dias, adote medidas visando à anulação do Concurso Público nº 1/2002, nos termos da Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal, eis que eivado de irregularidades insanáveis, promovendo processo administrativo individual, de forma a assegurar o contraditório e a ampla defesa aos servidores atingidos pela decisão, visando à desconstituição dos atos de nomeação decorrentes do certame;

- DETERMINAÇÃO à Diretoria competente desse Tribunal de acompanhamento do cumprimento da decisão, tendo em vista o disposto no art. 71, X, da Constituição. (Negrito do original)

 

O Tribunal Pleno, no julgamento deste processo, decidiu pela adoção da seguinte providência:[5]

 

6.1. Assinar o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data da publicação desta deliberação no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, deste Tribunal, com fundamento no art. 59, IX, da Constituição Estadual, para que a Prefeitura Municipal de Itapema adote as providências necessárias com vistas ao exato cumprimento da lei, comprovando-as ao Tribunal de Contas, relativamente à abertura de procedimento administrativo visando a demissão dos servidores nomeados de forma irregular, tendo em vista a ilegalidade constatada no concurso público, por infringir os princípios que regem a Administração Pública, conforme exposto no item 2.4 do voto do Relator, onde consta a relação dos candidatos que foram nomeados, com base nos itens considerados irregulares pelo Corpo Instrutivo. (Grifo meu)

 

Tal Decisão foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de 26-4-2013.

Exaurido o prazo assinalado na referida Decisão, auditores da Diretoria de Atividades Especiais diligenciaram junto ao Chefe do Poder Executivo Municipal, consoante se nota da análise constante da fl. 2669 (Volume VII):

 

Por ter esgotado o prazo fixado para o cumprimento da decisão (180 dias), sem ter havido remessa de documentos comprovando a adoção das providências exigidas, este Tribunal de Contas, por meio desta Diretoria de Controle e no uso de suas prerrogativas constitucionais e legais (art. 106, III da LC 202/2000, c/c § 2º do art. 294 do Regimento Interno do TCE/SC), REQUER à Vossa Senhoria a comprovação documental das providências tomadas por essa Prefeitura, com o fim de cumprir a Decisão n. 0664/2013, ou a apresentação de justificativas.

Informa-se, ainda, que o não atendimento da requisição no prazo determinado sujeita o responsável à cominação de multa prevista no artigo 70, inciso III, da Lei Complementar nº 202/00 c/c artigo 109, III do Regimento Interno deste Tribunal. (Negrito do original)

 

A diligência foi realizada (fl. 2670 – Volume VII), todavia, não foi atendida tempestivamente pelo responsável.

Em decorrência da atitude do Sr. Rodrigo Costa, prefeito de Itapema, silente em relação à adoção das providências grafadas na Decisão nº 664/2013, auditores da DAE sugeriram aplicação de multas (fls. 2671/2671-v - Volume VII):

 

Passados 324 dias da Decisão n. 0664/2013 e 90 dias da diligência realizada por esta Diretoria de Controle, não resta alternativa senão a de sugerir aplicação de multas previstas no art. 70 da Lei Complementar nº 202/2000, por:

a) não atender, no prazo fixado, à diligência ou recomendação do Tribunal (inc. III do art. 70); e

b) deixar de cumprir, injustificadamente, decisão do Tribunal (§ 1º do art. 70).

Sugere-se, ainda, que seja notificado o Ministério Público de Santa Catarina, a respeito da Decisão nº 664/2013, para que o mesmo tome as providências judiciais cabíveis, face a inércia do poder público municipal de Itapema. (Negrito do original)

 

Posteriormente, o Sr. Rodrigo Costa, prefeito de Itapema, providenciou resposta à diligência, conforme se percebe da documentação acostada às fls. 2674/2686 (Volume VIII).

Diante desse quadro, auditores da Diretoria de Atividades Especiais sugeriram[6] aplicação de multas ao prefeito; bem como remessa de cópia de alguns documentos destes autos a 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema[7] (fls. 2702/2702-v - Volume VIII):

 

3. CONCLUSÃO

Diante do exposto, a Diretoria de Atividades Especiais sugere ao Exmo. Sr. Relator:

3.1 Considerar não cumprido o item 6.1 da Decisão n. 664/2013 e assinar novo prazo, com fundamento no art. 59, IX, da Constituição Estadual, para que a Prefeitura Municipal de Itapema adote as providências necessárias com vistas ao exato cumprimento da lei, comprovando-as ao Tribunal de Contas, relativamente à abertura de procedimento administrativo visando a demissão dos servidores nomeados de forma irregular, tendo em vista a ilegalidade constatada no concurso público, por infringir os princípios que regem a Administração Pública:

3.2 Aplicar multas ao Sr. Rodrigo Costa, atual Prefeito Municipal de Itapema, com fundamento no art. 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face de:

3.2.1 Não atender, no prazo fixado, à diligência (fl. 2663) do Tribunal de Contas (inc. III do art. 70);

3.2.2 Deixar de cumprir decisão do Tribunal de Contas (§ 1º do art. 70) publicada em 24/04/2013 (passados pelo menos 390 dias).

3.3 Remeter à 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema cópia do relatório técnico de reinstrução (Relatório nº 16/10, fls. 2481/2615), do Parecer nº MPTC/3217/2011 do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (fls. 2617/2627), do relatório e voto do Relator do processo (fls. 2628/2650), e da Decisão nº 0664/2013 do Tribunal de Contas (fls. 2651 e 2651v), com a finalidade de contribuir para a instrução da Ação Civil Pública nº 125.02.005395-2 e o seu julgamento.

3.4 Encaminhar os autos à Secretaria Geral para que operacionalize a reprodução de cópia dos presentes autos (REP 08/00298179), mediante o recolhimento de taxa ao Tribunal de Contas, e remeter as referidas cópias à Prefeitura Municipal de Itapema.

 

Por fim, vieram os autos ao Parquet.

 

2 – MÉRITO

O Sr. Rodrigo Costa, prefeito de Itapema, no intento de justificar o descumprimento da determinação emanada do Tribunal de Contas, apresentou informações às fls. 2674/2686 (Volume VIII), oportunidade na qual pleiteou cópia integral dos autos e manifestação da Corte sobre possível impedimento do exame da questão objeto destes autos na seara administrativa, tendo em vista tramitar na Comarca de Itapema processo judicial, como segue (fls. 2674/2675):

 

2) Tendo em vista a instalação da mencionada Comissão de Processo Administrativo, e o contido no Ofício nº 001/CPA/2014 oriundo daquela Comissão (cópia em anexo), requer-se:

a) A cópia integral dos autos de Representação REP nº 08/00298179 de modo a possibilitar o amplo conhecimento dos fatos e fundamentos que embasaram a decisão no mesmo, para cumprir os Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa;

b) Ainda com base na solicitação da Comissão de Processo Administrativo, requer-se manifestação por parte de Tribunal sobre a possível existência de impedimento do exame desta questão na esfera administrativa, levando em consideração a jurisprudência pátria que entende não ser possível examinar questão na esfera administrativa quando a matéria já está judicializada, a bem de prestigiar-se a segurança jurídica evitando a interferência na atividade jurisdicional do Estado e afastando o riso de decisões conflitantes.

 

No que concerne ao fato de tramitar actio no Judiciário,[8] lembro o teor do princípio da independência das instâncias, pelo qual a discussão da matéria no âmbito do Judiciário não prejudica a análise pela Corte de Contas, porque distintas as consequências e as eventuais sanções a que estão sujeitos os responsáveis em cada seara.

Tal diferenciação fica ainda mais nítida na leitura do voto condutor do acordão do processo nº TCE - 04/01728307, da lavra do Conselheiro Salomão Ribas Junior:[9]

 

Inicialmente, em consulta ao site do Poder Judiciário Catarinense, verifico que a Ação Popular n° 016.04.000822-9, da Comarca de Capinzal, está em curso, atualmente conclusa para Despacho. As últimas movimentações indicam a designação de perito para responder os quesitos abaixo, relativos ao Contrato n° 017/2003:

[...]

De modo geral, o exame das irregularidades evidenciadas nos presentes autos não ficaria prejudicado em razão da Ação Popular em trâmite.

Isso porque a competência atribuída a esta Corte de Contas no exame dos atos administrativos é independente da atribuída ao Poder Judiciário.

Ao Tribunal de Contas, por exemplo, é conferido o poder de imputar débito, em processo de prestação ou tomada de contas decorrente de dano ao erário proveniente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, bem como renúncia ilegal de receita; e ainda aplicar multas aos Responsáveis por atos de gestão ilegais, ilegítimos ou antieconômicos dos quais resultem dano ao erário ou ainda atos praticados com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial.

De outro lado, ao Poder Judiciário incumbe o controle jurisdicional dos atos administrativos, com consequências e eventuais responsabilizações daí decorrentes. (Grifos meus)

 

Em visita ao sítio eletrônico do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina,[10] pude constatar que o processo nº 125.02.005395-2 não possui decisão transitada em julgado.

Destaque-se ser plenamente plausível – e possível – que o fato seja apurado e decidido tanto pelo Poder Judiciário quanto pelo Tribunal de Contas.

Isso porque o Tribunal de Contas detém competência para assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade, conforme art. 71, IX, c/c art. 75 da Constituição, art. 59, IX, da Constituição Estadual, e art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.

Assim, claro está que a matéria objeto destes autos se encontra inserida nas atribuições do Tribunal de Contas.

Nesta vereda, o voto condutor do acórdão no processo nº TCU – 200.029/1998-3, da lavra do Ministro Adylson Motta:[11]

 

O TCU tem jurisdição própria e privativa sobre as pessoas e matérias sujeitas a sua competência, de modo que a proposição de qualquer ação no âmbito do Poder Judiciário não obsta que esta Corte cumpra sua missão constitucional. Assim, face ao princípio da independência das instâncias, matéria esta já pacificada e consignada no Enunciado de Decisão nº 317, não é cabível que se aguarde manifestação do Poder Judiciário no tocante à matéria em questão.

 

Assim, com o intuito de conferir efetividade à jurisdição da Corte de Contas, opino pela reiteração da determinação constante da Decisão nº 664/2013, sob pena de aplicação de multa em caso de inobservância. 

No que toca à sugestão de multas,[12] avalizo o enfoque dado pelos auditores da Diretoria de Atividades Especiais, uma vez que o Sr. Rodrigo Costa não cumpriu o determinado pela Decisão nº 664/2013, tampouco apresentou justificativa apta a validar tal descumprimento.

Da análise dos documentos carreados aos autos pelo gestor, constato que a instauração do processo administrativo referente à Decisão desta Corte somente foi efetuada em 31-3-2014,[13] quando transcorrido quase um ano da publicação da Decisão nº 664, em 26-4-2013.[14]

Logo, efetivamente, o caso é para aplicação de multa ao responsável.

Também no que tange ao não atendimento da diligência do Tribunal (fl. 2669 – Volume VII), corroboro com a abordagem feita pelos auditores da DAE, concluindo pela aplicação de sanção pecuniária ao Sr. Rodrigo Costa.

O AR da mencionada diligência é datado de 16-11-2013 (fl. 2670 – Volume VII).

O responsável, ao seu turno, somente veio a se manifestar nos autos em 13-3-2014, ou seja, praticamente quatro meses após ter tomada ciência da diligência em comento (fl. 2672 – Volume VIII).

Nesta trilha, a jurisprudência da Corte de Contas:[15]

 

Acórdão n. 838/2009:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

[...]

6.2.2. com base no art. 70, III, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, III, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face do não atendimento de diligência deste Tribunal de Contas no prazo fixado, em descumprimento ao disposto no art. 123, § 3º, c/c o art. 124 da Resolução n. TC-06/2001 (item 2.2.2.9 do Relatório DLC).

[...] (Grifo meu)

 

Dessa feita, o caso é para aplicação de multa ao responsável.

No que toca ao pedido de cópia integral dos autos, não vejo óbice para a execução de tal pleito, por ser ato de mero expediente que não precisa ser objeto de decisão por parte do Plenário da Corte de Contas.

Por fim, nada obsta a remessa de cópia de documentos que instruem este processo a 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema, Juízo onde tramita a Ação Civil Pública nº 125.02.005395-2.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

3.1 - REITERAÇÃO da DETERMINAÇÃO constante da DECISÃO nº 664/2013, proferida pela Corte de Contas na sessão de 23-3-2013, sob pena de se aplicação de multa em caso de descumprimento;

3.2 - APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Rodrigo Costa, prefeito de Itapema, por deixar de cumprir, injustificadamente, a Decisão nº 664/2013, com supedâneo no art. 70, § 1º, da Lei Complementar nº 202/2000;

3.3 - APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Rodrigo Costa, prefeito de Itapema, por não atender a diligência do Tribunal no prazo fixado, com supedâneo no art. 70, III, da Lei Complementar nº 202/2000.

Florianópolis, 24 de julho de 2014.

 

Aderson Flores

Procurador



[1] Relatório nº 14/2008.

[2] Relatório nº 16/2010.

[3] Com o fito de acompanhar o cumprimento da decisão.

[4] Parecer nº MPTC/3217/2011 (fls. 2617/2627).

[5] Trecho da Decisão nº 664/2013, exarada na sessão de 23-3-2013.

[6] Relatório nº 14/2014 (fls. 2696/2702-v – Volume VIII).

[7] Juízo onde tramita a Ação Civil Pública nº 125.02.005395-2.

[8] Ação Civil Pública nº 125.02.005395-2.

[9] Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <C:\PROG-TCE\Processos\RepoEletronico\2010\401728307\3361249.htm>. Acesso em: 24-7-2014.

[10] Disponível em: <http://esaj.tjsc.jus.br/cpopg/show.do?processo.codigo=3H0000GZR0000&processo.foro=125>. Acesso em: 24-7-2014.

[11] Tribunal de Contas da União. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/TCU>. Acesso em: 24-7-2014.

[12] Item 3.2 da conclusão do Relatório nº 14/2014 (fl. 2702 – Volume VIII).

[13] Portaria nº 244/2014 (fls. 2677/2679 – Volume VIII).

[14] Referida Decisão assinalou um prazo de 180 dias pra adoção das providências.

[15] SANTA CATARINA. Tribunal de Contas do Estado. Relator: Adircélio de Moraes Ferreira Junior. Data da Sessão: 10-6-2009.