PARECER nº: |
MPTC/29790/2014 |
PROCESSO nº: |
TCE
07/00347020 |
ORIGEM: |
Prefeitura
Municipal de Santa Cecília |
INTERESSADO: |
|
ASSUNTO: |
Referente ao
Processo - RPJ - 070034702 - Tomada de Contas Especial |
Trata-se
de Representação Judicial
convertida em Tomada de Contas Especial, objetivando apurar desvio de dinheiro público
nos exercícios financeiros de 2001 a 2004, na Prefeitura Municipal de Santa
Cecília, consoante conclusões de auditoria externa contratada pelo Prefeito à
época.
Foram juntados os documentos
pertinentes às fls. 2-235.
A Diretoria de Controle dos
Municípios – DMU, por meio do Ofício nº 18.638 (fl. 236) e de acordo da Decisão
Normativa nº 002/2006 e art. 10 da Lei Complementar nº 202/2000, sugeriu que o
Município instaurasse Tomada de Contas Especial na esfera administrativa, nos
termos da Instrução Normativa nº 01/2001.
A Relatora Substituta determinou o
retorno dos autos a DMU para diligências, objetivando a verificação quanto à
adoção ou não de providências para instauração de Tomada de Contas Especial e,
no caso de omissão, para que se identificassem os responsáveis, a quantificação
do dano e a responsabilidade dos agentes omissos (fls. 239-240).
Realizada a diligência (fl. 244),
foram apresentados novos documentos (fls. 247-258).
A Diretoria de Controle dos
Municípios - DMU, por meio do Relatório nº 250/2008 (fls. 260-267), sugeriu a
conversão dos autos em Tomada de Contas Especial e a definição da
responsabilidade solidária dos Srs. Gilberto Carvalho, Ari Felipe Farias,
Samuel Arbegaus e Sra. Odete Maria Rodrigues da Silva, a citação para
apresentarem suas alegações de defesa acerca das restrições atribuídas a cada
um, apontadas nos itens 2.1 e 3.1 da conclusão do relatório da instrução,
totalizando R$ 305.445,70 de dano ao erário e o Sr. João Rodoger de Medeiros,
para apresentar alegações de defesa acerca das restrições descritas nos itens 2.1,
3.1 e 4.1 do referido relatório, esta última, referente a não adoção de
providências com vistas à instauração de tomadas de contas especial para
apuração dos fatos e identificação dos responsáveis e quantificação do dano.
Este Ministério Público de Contas
acompanhou a sugestão da DMU (fls. 271-274).
O Relator acompanhou parcialmente a
posição sugerida pela DMU, excluindo apenas a restrição do item 4.1 do
relatório de instrução (fls. 278-281).
O Tribunal Pleno acatou a sugestão do
Relator e decidiu pela conversão dos autos em Tomada de Contas, pela definição
da responsabilidade solidária e pela determinação da citação dos responsáveis
(fls. 282-283).
Realizadas as citações dos
responsáveis, a Sra. Odete Maria Rodrigues da Silva apresentou sua defesa às
fls. 290-293, o Sr. João Rodoger de Medeiros às fls. 297-333, o Sr. Gilberto
Carvalho ofereceu sua defesa às fls. 334-357, o Sr. Samuel Arbegaus foi citado
por Edital fl. 360 e o Sr. Ari Felipe Farias apesar de devidamente citado (fl.
285-v) não se manifestou.
A Diretoria de Controle
dos Municípios – DMU emitiu novo relatório (fls. 363-367), opinando pela
anulação da Decisão nº 2104/2004[1]
e atos posteriores, diante da ausência da necessária admissibilidade[2]
para na sequência conhecer a Representação e determinar a realização de
providências necessárias para apuração dos fatos apontados como irregulares.
O Ministério Público de
Contas ratificou o posicionamento (fls. 368-369).
O Relator não acolheu a
sugestão da DMU e determinou o retorno dos autos àquela Diretoria para
reinstrução e análise de mérito (fls. 372-374).
Por fim, a DMU apresentou
relatório de reinstrução e concluiu que o relatório de auditoria externa é “vazio
em sua argumentação, não apresentando elementos comprobatórios dos fatos ali
discriminados” e que “não há nos autos existência de materialidade que comprove
o desfalque ao erário público”, motivo pelo qual sugere ao Tribunal Pleno o arquivamento
dos autos.
A fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida
entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos
constitucionais, legais e normativos vigentes (Art. 59, IV, da Constituição
Estadual, Art. 25, inciso III, da Lei Complementar n. 202/2000 e Resolução n.
16/94).
Após análise de toda a documentação
dos autos e alegações de defesa apresentadas pelos responsáveis, divirjo dos argumentos apresentados
pela Área Técnica (fls. 375-380-v) que afirma não existir materialidade que
comprove o desfalque ao erário público e sugere o arquivamento diante da
ausência de provas materiais das irregularidades apontadas.
A meu ver, há nos autos prova
suficiente de indícios de irregularidades, pois os documentos acostados às fls.
5-235 demonstram cabalmente que valores foram desviados das respectivas contas
bancárias, e que houve a prática de contabilidade fictícia, pois os saldos
contábeis eram sempre superiores aos saldos bancários, e para justificar essas
diferenças eram registrados em conciliação bancária.
A Diretoria de Controle dos
Municípios – DMU, em seu Relatório nº 00250/2008, fls. 263, considerou os
resultados da auditoria externa realizada pela empresa LJ – AUD Escritório
Contábil S/C e assim concluiu:
O resultado dos exames da auditoria externa realizada pela
empresa LJ – AUD Escritório Contábil S/C e constantes do Relatório de Auditoria
nº 14/2005, apontou, entre outras irregularidades, inconsistência contábil, contabilização
fictícia, fraude contábil, estelionato e peculato.
Consoante o mencionado relatório de auditoria externa,
constatou-se desvio de recursos financeiros de diversas contas bancárias de
titularidade da Prefeitura Municipal e do Fundo Municipal de Saúde, que, em
31/12/2004, totalizavam R$ 305.445,70.
[...]
Na forma configurada no relatório de auditoria externa, os
atos praticados na Administração Municipal de Santa Cecília evidenciam
desfalque de valores da ordem de R$ 305.445,70, sendo R$ 299.015,46 da
Prefeitura Municipal e R$ 6.430,24 do Fundo Municipal de Saúde, em afronta aos
princípios constitucionais de administração pública estabelecidos no art. 37 da
Constituição Federal, em especial o da moralidade.
A conciliação bancária é o instrumento que faz o cotejo entre os
lançamentos contábeis e os extratos bancários. A conciliação bancária, contendo
os débitos e os créditos ainda não lançados pelo banco e/ou pela contabilidade,
deverá ser apresentada quando houver diferença entre o saldo financeiro das
disponibilidades em bancos e o saldo bancário registrado em extrato, de forma a
justificá-la.
Assim,
os lançamentos que não tenham sido acusados pelo
banco, poderão ser "suspensos" até que o saldo conciliado coincida
com o saldo no extrato. Por outro lado, os lançamentos que já tenham sido
acusados pelo banco, poderão ser marcados e eliminados do movimento, pela
contabilidade, de forma que os remanescentes sejam exatamente os lançamentos
pendentes.
Essa prática é utilizável na boa
contabilidade para eventuais situações e ainda assim, passageiras, e não como
acontecia no Município de Santa Cecília, que por vários anos esses saldos
ficavam desajustados, possivelmente para encobrir o desvio das contas
bancárias.
Várias situações foram evidenciadas
no Relatório de Auditoria Externa, por exemplo:
a) “uma conciliação bancária no valor
de R$ 79.561,80 identificado apenas como avisos de débitos não considerados
pela contabilidade desde o dia 19/03/2003, portanto um ano e oito meses em
conciliação. (anexo 02)”[3];
b) “lançamento de R$ 11.100,00,
inserido na conciliação bancária, [...] este valor está apenas consignado como
Aviso de Débito Não Considerado pela Contabilidade e identificado apenas pelo
nº 6621 sem nenhuma explicação”[4];
c) o valor de R$ 21.135,72, como
sendo uma transferência para o Fundo Municipal de Saúde, e que ficou em
conciliação bancária por muito tempo, conforme relato de fls. 75-76 e
documentos de fls. 32, 70-75, 77 e 84.
Destaca-se
que este Tribunal de Contas já realizou Auditoria in loco nos registros contábeis do município de Santa Cecília,
referente ao exercício de 2003 (Processo ARC 04-04105106), e constatou
irregularidades semelhantes na contabilidade do município, o que resultou na
aplicação de multas ao responsável Gilberto Carvalho, conforme Acórdão nº
0204/2009, que segue:
1. Processo n. ARC - 04/04105106
2. Assunto: Grupo 4 – Auditoria de
Registros Contábeis e Execução Orçamentária – Exercício de 2003
3. Responsável: Gilberto Carvalho -
ex-Prefeito Municipal
4. Entidade: Prefeitura Municipal de
Santa Cecília
5. Unidade Técnica: DMU
6. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes
autos, relativos à auditoria ordinária sobre registros contábeis e execução
orçamentária, realizada na Prefeitura Municipal de Santa Cecília, pertinente ao
exercício de 2003.
Considerando que foi efetuada a
audiência do Responsável, conforme consta na f. 26 dos presentes autos;
Considerando que não houve
manifestação à audiência, subsistindo irregularidades apontadas pelo Órgão
Instrutivo, constantes do Relatório DMU n. 3871/2008;
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de
Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das
razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da
Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer do Relatório da
Auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Santa Cecília, com abrangência
sobre registros contábeis e execução orçamentária relativos ao exercício de
2003, para considerar irrregulares, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea
"a", da Lei Complementar n. 202/2000, os atos relativos aos registros
contábeis e execução orçamentária analisados.
6.2. Aplicar ao Sr. Gilberto Carvalho
- ex-Prefeito Municipal de Santa Cecília, CPF n. 260.833.370-20, com fundamento
no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do
Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30
(trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial
Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao
Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o
encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts.
43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais),
em face dos valores registrados em conciliação bancária como depositados pela
contabilidade e não creditados pelo banco, ou saídas consideradas pela
contabilidade e não debitadas pelo banco infringindo norma legal destacada nos
arts. 83 e 85 da Lei n. 4.320/64, bem como os princípios fundamentais de
contabilidade (item 1.1 do Relatório DMU);
6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais),
em razão dos valores constantes nas conciliações bancárias referentes a
movimentação de entradas e saídas de contas correntes que podem estar
lastreando o Ativo Financeiro da Prefeitura e que já deveriam ter sido
baixados, contrariando os arts. 60 da Lei n. 4.320/64, 70 e 74 da Constituição
Federal, 58, 62 e 113 da Constituição Estadual, 60 e 64 da Lei Complementar n.
202/2000 e 128 e 132 da Resolução n. TC-06/2001 (item 1.2 do Relatório DMU).
6.3. Recomendar à Prefeitura Municipal
de Santa Cecília que, doravante, com o auxílio do controle interno, adote
medidas necessárias à correção das faltas relacionadas nesta deliberação,
prevenindo a ocorrência de outras semelhantes
6.4. Dar ciência deste Acórdão, do
Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n.
3871/2008, à Prefeitura Municipal de Santa Cecília e ao Sr. Gilberto Carvalho -
ex-Prefeito daquele Município.
7. Ata n. 07/09
8. Data da Sessão: 25/02/2009 -
Ordinária
9. Especificação do quorum:
9.1. Conselheiros presentes: José
Carlos Pacheco (Presidente), Wilson Rogério Wan-Dall, Luiz Roberto Herbst,
Salomão Ribas Junior, Otávio Gilson dos Santos, César Filomeno Fontes e Sabrina
Nunes Iocken (Relatora - art. 86, caput, da LC n. 202/2000).
10. Representante do Ministério
Público junto ao TC: Mauro André Flores Pedrozo.
11. Auditores presentes: Cleber Muniz
Gavi e Adircélio de Moraes Ferreira Junior.
Eis
um trecho do voto condutor que evidencia as irregularidades semelhantes às
verificadas nestes autos. Veja-se:
Tratam
os autos de auditoria in loco de registros contábeis e execução
orçamentária realizada na Prefeitura Municipal de Santa Cecília, com
abrangência no exercício de 2003, em obediência ao que dispõe o art. 59, inciso
IV, da Constituição Estadual e o art. 25, inciso II, da Lei Complementar nº
202/2000.
A
Diretoria de Controle dos Municípios – DMU elaborou relatório nº 3871/2008, o
qual faz a reinstrução do relatório de inspeção nº 4534/2007, fls. 19 a 22,
anteriormente formulado, em que se procedeu a audiência do responsável em
22/02/2008. Expirado o prazo para as manifestações e justificativas, e em não
havendo qualquer manifestação do responsável em relação às restrições
evidenciadas, conclui a DMU por permanecerem inalterados os seguintes
apontamentos:
1-
Valores
registrados em conciliação bancária como depositados pela contabilidade e não
creditados pelo banco, ou saídas consideradas pela contabilidade e não
debitadas pelo banco infringindo norma legal destacada nos artigos 83 e 85 da
lei 4320/64, bem como os princípios contábeis geralmente aceitos (item 1.1, do
relatório DMU nº 3871/2008);
2-
Valores
constantes nas conciliações bancárias referentes a movimentação de entradas e saídas de contas
correntes que podem estar lastreando o Ativo Financeiro da Prefeitura e que já
deveriam ter sido baixados, contrariando o
artigo 60 da lei 4320/64, bem como os artigos 70 e 74 da Constituição
Federal; 58, 62 e 113, da Constituição Estadual; 60 e 64 da Lei Complementar nº
202/2000, Lei Orgância do Tribunal de Contas e 128 e 132 da Resolução
TC-06/2001 (item 1.2, do relatório DMU nº 3871/2008).
Encaminhado
os autos ao MPJTC, foi emitido Parecer MPTC nº 6620/2008, o qual acompanha o
entendimento apontado no relatório técnico, haja vista que não foram
apresentados documentos e esclarecimentos hábeis ao saneamento das
irregularidades apontadas. Corroborando, portanto, em considerar irregulares os
atos analisados, com a aplicação de multa ao responsável.
É
o relatório.
O mecanismo da conciliação bancária
existe para superar uma lacuna temporal nos registros que envolvem a
movimentação financeira, entre os registros financeiros na unidade e os
registros constantes nos extratos bancários. Neste sentido, a finalidade é
ajustar a realidade dos saldos das contas envolvidas, proporcionando maior
clareza na identificação das disponibilidades existentes, e evitando futuros
imprevistos capazes de gerar déficits de caixa.
Valores registrados como entradas ou
saídas na contabilidade da unidade, os quais não correspondem aos valores
destinados as entradas e saídas bancárias, bem como as entradas e saídas de
contas correntes sem a devida conciliação, podem corromper os demonstrativos
contábeis, não demonstrando adequadamente a situação patrimonial, o que pode
gerar uma interpretação equivocada do resultado financeiro.
Desta forma, considerando que a
Instrução Técnica elaborou, inicialmente, relatório de instrução, e que foi
procedida a audiência do responsável (fls. 25/25), dando-lhe o direito do
contraditório e ampla defesa, e;
Considerando que não houve qualquer
manifestação ou esclarecimentos afim de regularizar os atos apontados como
irregulares, em relação aos registros contábeis e execução orçamentária, no
exercício de 2003, acompanho o entendimento da instrução, bem como do parecer
do MPJTC, no sentido de considerar os atos analisados como irregulares.
Quanto às irregularidades referentes
a desvio de recursos financeiros da ordem de R$ 299.015,46, de contas bancárias
de titularidade da Prefeitura Municipal de Santa Cecília e desvio de recursos
financeiros da ordem de R$ 6.430,24, de conta bancária de titularidade do Fundo
Municipal de Saúde de Santa Cecília, houve a citação dos responsáveis, sendo
apresentadas alegações de defesa por alguns deles, vejamos.
O responsável Sr. Ari Felipe Farias,
Secretário de Finanças do Município de Santa Cecília no exercício de 2014 foi
devidamente citado[5] e não
apresentou alegações de defesa.
O responsável Samuel Arbegaus,
Contador do Município de Santa Cecília, foi citado por edital[6] e
não se manifestou.
A responsável Sra. Odete Maria
Rodrigues da Silva, Secretária da Saúde do Município de Santa Cecília, apresentou
alegações defesa[7],
argumentou a ausência do contraditório e afirmou que era responsável pela parte
burocrática da referida Secretaria, e não pela movimentação e aplicação
financeira dos recursos.
O responsável, Sr. João Rodoger de
Medeiros, Prefeito do Município de Santa Cecília, gestão 2005/2008, ofereceu
suas alegações de defesa[8] e
arguiu, em suma, que após assumir a referida Prefeitura contratou empresa para
que realizasse auditoria externa com o intuito de apurar irregularidades na
gestão que o antecedeu, que após a conclusão da auditoria comunicou esse
Tribunal de Contas sobre as irregularidades apontadas. Que foi notificado que a
documentação referente à auditoria externa não contemplava todas as exigências
da Decisão Normativa nº 002/2006 e que seria necessária a realização de tomada
de contas em especial. Em razão de ter nomeado Comissão Especial para Tomada de
Contas e Levantamento do Patrimônio Público Municipal em 2005, acreditou que
essa providência já estaria satisfeita. Por fim, aduz que não teve relação
alguma com as irregularidades apontadas, não devendo figurar como responsável
solidário.
O responsável, Sr. Gilberto Carvalho,
prefeito à época dos fatos, aduziu em suas alegações de defesa[9],
principalmente, que não houve direito ao contraditório e à ampla defesa.
Afirmou ainda que a LOA dos exercícios de 2001 a 2004 não contemplava
vinculação específica dos recursos financeiros com a aplicação de despesas
orçamentárias e sua programação era feita no princípio geral e os recursos eram
controlados através das contas bancárias: recursos ordinários e recursos
vinculados.
Com relação à
responsabilidade dos gestores (Secretários e Prefeito), é importante
lembrar que cabe também a responsabilização em face da sua culpa in eligendo e culpa in vigilando.
Por "culpa in eligendo" entende-se ser a responsabilidade atribuída
àquele que deu causa à má escolha do representante ou preposto e a "culpa in vigilando" refere-se à ausência
de fiscalização das atividades dos subordinados, ou dos bens e valores sujeitos
a esses agentes.
A responsabilidade do gestor decorre do seu
comportamento omissivo quanto ao dever de fiscalizar, o que se tornou, no caso
concreto, uma das causas determinantes das irregularidades.
Esse Tribunal de Contas, mediante o inciso
III do art. 1º de sua Lei Orgânica n. 202/2000, descreve como uma de suas
competências julgar as contas dos
administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores da
administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades
instituídas e mantidas pelo Poder Público do Estado e do Município.
Em função do cargo ocupado, os então gestores
(neste caso, Secretário de Fianças, Secretária de Saúde e Prefeito) se amoldavam
Art. 133. Em todas as
etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de atos sujeitos a
registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada aos responsáveis
ou interessados ampla defesa.
§ 1º. Para efeito do
disposto no caput, considera-se:
a) responsável aquele que figure no
processo em razão da utilização, arrecadação, guarda, gerenciamento ou
administração de dinheiro, bens, e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou
o Município respondam, ou que, em nome destes assuma obrigações de natureza
pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou outra irregularidade de
que resulte prejuízo ao erário [grifei].
Além disso, cumpre registrar
que a execução de tarefas ordinárias da entidade configura
Ainda na seara da responsabilização do
gestor, trago da jurisprudência do Tribunal de Contas da União alguns julgados,
que refletem o entendimento ainda mais restritivo daquela Corte de Contas, pois
nem mesmo a delegação formal de competência afastaria a responsabilização do
gestor em face da sua culpa in elegendo
e in vigilando. Veja-se:
1. Acórdão 1.843/2005-TCU-Plenário:
LICITAÇÃO. PEDIDO DE
REEXAME. AUSÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO DE ATOS DELEGADOS. (...)
A delegação de competência não exime o
responsável de exercer o controle adequado sobre seus subordinados incumbidos
da fiscalização do contrato [ grifei].
Suas argumentações
não obtiveram êxito na pretensão de afastar sua responsabilidade. A delegação
de competência não exime o responsável de exercer o controle adequado sobre
seus subordinados incumbidos da fiscalização do contrato. É obrigação do
ordenador de despesas supervisionar todos os atos praticados pelos membros de
sua equipe, a fim de assegurar a legalidade e a regularidade das despesas,
pelas quais é sempre (naquilo que estiver a seu alcance) o responsável
inafastável.
2. Acórdão 1.619/2004-TCU-Plenário:
É entendimento pacífico no Tribunal que o
instrumento da delegação de competência não retira a responsabilidade de quem
delega, visto que remanesce a responsabilidade no nível delegante em relação
aos atos do delegado (v.g. Acórdão 56/1992 - Plenário, in Ata 40/1992;
Acórdão 54/1999 - Plenário, in Ata 19/1999; Acórdão 153/2001 - Segunda Câmara,
in Ata 10/2001). Cabe, por
conseguinte, à autoridade delegante a fiscalização subordinados, diante da
culpa in eligendo e da culpa in vigilando [grifei].
3. Acórdão 1.432/2006-TCU-PLENÁRIO:
(...)
RESPONSABILIZAÇÃO DO GESTOR PELAS ATRIBUIÇÕES DELEGADAS. FISCALIZAÇÃO DEVIDA.
(…)
(...) 2. Atribui-se a culpa in vigilando do
Ordenador de Despesas quando o mesmo delega funções que lhe são exclusivas sem
exercer a devida fiscalização sobre a atuação do seu delegado [grifei].
Portanto, entendo que não se pode atribuir exclusivamente aos servidores que
executavam as atribuições contábeis a responsabilidade pelas falhas praticadas.
Pode-se até cogitar a possibilidade de aferir
a responsabilização de outros agentes executores de determinado ato
administrativo, o que não afasta a do administrador, que deve ser imputada ao menos de forma solidária com o seu
executor. Trata-se do ônus
inerente ao exercício do cargo que ocupa.
Diante de toda argumentação
assinalada, resta indubitável a responsabilidade do Prefeito Municipal à época
dos fatos, Sr. Gilberto Carvalho (gestão 2001-2004), em face da sua obrigação
de controle acerca das atividades executadas no âmbito da Prefeitura.
A responsabilidade do Sr. Samuel
Arbegaus, contador da Prefeitura à época dos fatos, também se mostra
irrefutável, na medida em que executava diretamente todos os procedimentos
contábeis que visaram encobrir a ausência de valores nos cofres da Prefeitura.
A responsabilidade do Sr. Ari Felipe
Farias, Secretário de Finanças da Prefeitura no exercício de 2004, também é inquestionável
em face da sua vinculação às atividades de contabilidade, exercidas sob sua
orientação e determinação.
A responsabilidade da Sra. Odete Maria
Rodrigues da Silva, Secretária de Saúde da Prefeitura na época dos fatos, advém
do fato de ser a ordenadora de despesas do Fundo Municipal de Saúde.
Por fim, o Prefeito Sr. João Rodoger
de Medeiros (gestão 2005-2008) responde solidariamente em razão de sua omissão
quanto ao dever de apurar os fatos narrados na representação judicial.
Os Srs. Gilberto Carvalho e Odete
Maria Rodrigues da Silva, em suas alegações de defesa, afirmam a ausência do
contraditório por não terem sido comunicados da instauração do processo junto
ao Tribunal de Contas.
Não merece acolhida os argumentos dos
responsáveis, pois foram chamados ao processo no momento correto e oportuno[10],
para apresentarem suas alegações de defesa sobre os fatos que lhes são
imputados, conforme determina o art. 13 da Lei Complementar nº 202/2000[11].
Por fim, na hipótese de o Relator
entender que não se pode considerar os documentos de fls. 5-235 como prova das
irregularidades descritas no presente processo, faz-se necessária a análise
contábil do exercício de 2001 a 2004 das contas bancárias de titularidade da
Prefeitura de Santa Cecília e do Fundo Municipal de Saúde de Santa Cecília pela
Diretoria competente desse Tribunal de Contas, com o objetivo de confirmar as
irregularidades apresentadas pela auditoria externa.
Ressalta-se que a hipótese prevista
nestes autos – dano ao erário – é imprescritível, à luz do disposto no art. 37,
§ 5º, da Constituição Federal, que assim determina: “A lei estabelecerá os
prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou
não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de
ressarcimento.”
Sobre o assunto, Nelson Nery Júnior
(Constituição Federal Comentada, 2006, p. 216) é esclarecedor:
Dano ao erário. Pretensão perpétua. A CF 37 § 5º relega à lei
a fixação do prazo de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente,
servidor ou não, que cause prejuízos ao erário. Trata-se do prazo para o
exercício da pretensão condenatória criminal (ius puniendi), isto é, da ação
penal exercitável contra o funcionário ou servidor. As pretensões civis de ressarcimento do erário, que favorecem o
Poder Público, sejam exercitáveis por ele próprio, pelo MP ou por qualquer
outro co-legitimado à defesa dos direitos meta-individuais em juízo (v.g. ação
civil pública, ação popular, ação de improbidade administrativa), são
perpétuas, isto é, não são atingidas pela prescrição, conforme expressa
determinação da CF 37 § 5º in fine (“ressalvadas as respectivas ações
de ressarcimento‟) [grifei].
Na mesma linha, cita-se também
jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Apelação Cível número
1997.003295-1, Relator Des. Luiz Cezar Medeiros, de 18/03/2002: “AÇÃO CIVIL
PÚBLICA - ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PRATICADOS POR PREFEITO MUNICIPAL
- SÃO IMPRESCRITÍVEIS AS AÇÕES PARA A REPARAÇÃO DE DANOS CIVIS CAUSADOS CONTRA
O ERÁRIO PÚBLICO (ART. 37, § 5º, DA CF)”.
E ainda, do STJ, 1ª Turma, Resp
403153-SP, Rel. Min. José Delgado, 09/09/2003: “É imprescritível a Ação Civil
Pública visando a recomposição do patrimônio público (art. 37, § 5º, CF/88)”.
Ante o exposto, o
1) pela IRREGULARIDADE da presente Tomada de Contas Especial, na forma do
art. 18, III, d, c/c o art. 21, caput,
da Lei Complementar n. 202/2000;
2) pela IMPUTAÇÃO DE DÉBITO aos seguintes
responsáveis solidários:
2.1) Sr. Gilberto Carvalho – Prefeito
Municipal de Santa Cecília (gestão 2001-2004); Sr. Ari Felipe Farias –
Secretário de Finanças do Município de Santa Cecília no exercício de 2004, Sr.
Samuel Arbegaus, Contador do Município de Santa Cecília e Sr. João Rodoger de
Medeiros – Prefeito Municipal de Santa Cecília (gestão 2005-2008) ao
ressarcimento do valor de R$ 299.015,46, acrescidos dos juros legais, em razão
do desvio de contas bancárias de titularidade da Prefeitura Municipal de Santa
Cecília, conforme descrito no item 2.1 da conclusão do Relatório nº 250/2008;
2.2) Sr. Gilberto Carvalho – Prefeito
Municipal de Santa Cecília (gestão 2001-2004); Sr. Ari Felipe Farias –
Secretário de Finanças do Município de Santa Cecília no exercício de 2004 e Sr.
Samuel Arbegaus, Contador do Município de Santa Cecília; Sr. João Rodoger de Medeiros
– Prefeito Municipal de Santa Cecília (gestão 2005-2008) e Sra. Odete Maria
Rodrigues da Silva – Secretária Municipal de Saúde da Prefeitura Municipal de
Santa Cecília, ao ressarcimento do valor de R$ 6.430,24, acrescidos dos juros
legais, em razão do desvio de contas bancárias de titularidade do Fundo
Municipal de Saúde, conforme descrito no item 3.1 da conclusão do Relatório nº
250/2008;
2.3) Sr. João Rodoger de Medeiros –
Prefeito Municipal de Santa Cecília (gestão 2005-2008), por não ter tomado
providências quanto à instauração de tomadas de contas especial para apuração
dos fatos acima relacionados e identificação dos responsáveis e quantificação
do dano, conforme descrito no item 4.1 da conclusão do Relatório nº 250/2008.
3) ALTERNATIVAMENTE, na hipótese de o
Relator entender que faltam elementos necessários à instrução, DETERMINAR o envio dos autos para a Diretoria de Controle dos Municípios –
DMU, para análise contábil das contas referidas na fl. 10 do presente processo
e realização de diligências que se fizerem necessárias para nova análise do
mérito.
Florianópolis,
10 de dezembro de 2014.
Cibelly Farias
Procuradora
[1] Fls. 282/283.
[2] Art. 102,
parágrafo único, c/c art. 96, § 1º do Regimento Interno TCE-SC.
[3] Fls. 10 e 31.
[4] Fls. 11 e 31.
[5] Fls. 285- 285v.
[6] Fls. 359-361.
[7] Fls. 290-293.
[8] Fls. 297-333
[9] Fls. 334-357.
[10] Citações: fls. 284 e 284-v e fls. 288
e 288-v.
[11] Art. 13. O Relator presidirá a
instrução do processo determinando, mediante despacho singular, por sua ação
própria e direta, ou por provocação do
órgão de instrução ou do Ministério Público junto ao Tribunal, antes de
pronunciar-se quanto ao mérito, a
citação dos responsáveis e as demais medidas
previstas no artigo seguinte, podendo ainda sugerir o sobrestamento do
julgamento, após o que submeterá os
autos ao Plenário ou à Câmara respectiva para a decisão do mérito.
Parágrafo único. Citação é o ato pelo qual o responsável
é chamado ao Tribunal para apresentar defesa, por escrito, quanto a atos
irregulares por ele praticados e passíveis de imputação de débito ou de
cominação de multa, verificados em processo de prestação ou tomada de contas.