Parecer no:

 

MPTC/29.934/2014

                       

 

 

Processo nº:

 

REC 14/00572930

 

 

 

Origem:

 

Secretaria de Estado da Administração

 

 

 

Assunto:

 

Recurso de Reconsideração (art. 77, da LCE/SC nº. 202/2000).

 

Trata-se de Recurso de Reconsideração formulado pela Sra. Eliane Ondina Weingartner, com fundamento no art. 77, da Lei Complementar nº. 202/2000, em face da Decisão Plenária prolatada na Sessão Ordinária de 27/08/2014 (Acórdão 0722/2014 – Processo TCE-06/00470202).

A Gestora insurgiu-se contra referida decisão nos termos da petição de fls. 03-10. Procedeu à juntada dos documentos de fls. 11-51. Aduz em sua defesa:

DOS FATOS E DAS RAZÕES

Conforme sessão do Egrégio Plenário do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, quando do julgamento do Processo TCE-06/00470202, conversão do Processo DEN-06/00470202, foi exarada decisão nos seguintes termos:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à Tomada de Contas Especial que trata do desaparecimento de resmas de papel licitadas através do Pregão n. 183/2005 no âmbito da Secretaria de Estado da Administração.

Considerando que os responsáveis foram devidamente citados, conforme consta nas fs. 906 e 911 dos presentes autos;

Considerando as alegações de defesa e documentos apresentados:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1º da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alíneas “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000 (estadual), as contas referentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas na Secretaria de Estado da Administração (Gestora do Fundo de Materiais Publicações e Impressos Oficiais – Pregão 183/2005), no exercício de 2006, em face da denúncia apresentada pela Bancada do Partido Progressista na Assembléia Legislativa.

6.2. Condenar, SOLIDARIAMENTE, os Responsáveis a seguir especificados, nos subitens 6.2.1 a 6.2.3 desta deliberação, ao pagamento do montante de R$ 22.904,70 (vinte e dois mil, novecentos e quatro reais e setenta centavos), em face da não entrega de 2.730 resmas de papel A4, caracterizando irregular liquidação da despesa, infringindo os arts. 62 e 63 da Lei n. 4.320/1964 (federal) e o art. 133 da Lei 6.745/1985 (estadual), fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE-DOTC-e, para comprovarem perante o Tribunal de Contas o recolhimento do débito aos cofres do Estado, atualizado monetariamente e acrescido de juros legais, calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, ou interporem recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento das dívidas para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal);

(...)

6.2.3. Sra. ELIANE ONDINA WEINGARTNER – Analista Técnico em Gestão Pública, ocupante do cargo de Gerente de gestão do Fundo de Materiais e Atos Oficiais (GEMAT) em 2006, desde 15/03/2005 (Portaria n. 644/2005 – f. 803), permanecendo durante o exercício de 2006, responsável pela administração dos almoxarifados da Secretaria de Estado da Administração (Central, DGAO, Capoeiras e Itacorubi) e ordenadora secundária da despesa do Fundo de Materiais, matrícula n. 271760-3-04, CPF n. 551.000.159-34, em razão das seguintes condutas: autorizar recebimento de materiais com carga incompleta; ordenar o pagamento de referido material não recebido e não condizentes com a marca licitada no Pregão n. 183/2005; ordenar o pagamento de várias notas de recebimento sem a assinatura e sem o carimbo de quem estava recebendo a mercadoria (item 9 do relatório da comissão de sindicância); pelo descontrole nos almoxarifados de Itacorubi e DGAO, o que favoreceu o desvio de 2730 resmas de papel A4; ausência de formalização, a que deveria se submeter junto ao setor de Protocolo das SEA, para emissão de ofício subscrito pela mesma, para reclamar a falta das 2.730 resmas de papel A4 junto à empresa Trevo News, contrariando o que estabelecia a Instrução Normativa n. 03/2006, de 09/01/2006, que revogou a IN n. 09/2003, sendo que referido ofício não se encontrava no arquivo da GEMAT, sem número e com data de 03/02/2006, endereçado à empresa Trevo News, aos cuidados da Sra. Vanessa (j. 742), restando comprovada a não veracidade de tal documento, considerando que no referido ofício fugiu do padrão estabelecido pela SEA e não foi enviado via correio ou por qualquer outro meio (Termo de Diligência da Comissão de Sindicância – fs. 212 e 213) – item 2.1.4 do Relatório DCE).

6.3. Condenar a Sra. ELIANE ONDINA WEINGARTNER – já qualificada, no ao pagamento do montante de R$ 31.957,51 (trinta e um mil, novecentos e cinquenta e sete reais e cinquenta e um centavos), relacionado a 3.809 resmas de papel A4, ao preço unitário de R$ 8,39, em virtude da ausência de controle, desvio desse material sendo de responsabilidade da referida gerente e falta de zelo com a coisa pública, tendo como obrigação funcional cuidar dos “bens e materiais sob sua guarda ou sujeitos a seu exame ou fiscalização”, de acordo com as funções do cargo e das responsabilidades como servidora pública, cuja conduta está desconforme ao previsto no art. 132, caput e parágrafo único, inciso II, da Lei n. 6.745/1985 (estadual) – item 2.2 do Relatório DCE, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico – DOTC-e, para comprovar perante o Tribunal de Contas o recolhimento do débito aos cofres do Estado, atualizado monetariamente e acrescido de juros legais, calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, ou interpor recurso na forma da Lei, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, do mesmo diploma legal).

(...)

Inicialmente, cumpre destacar que, conforme consta nos autos, a citação da Responsável Eliane foi feita por meio de edital, vale dizer, de forma ficta, e nesse contexto foi declarada a revelia da responsável, conforme Edital de Citação publicado em 19/09/2012 (fls. 943/944).

O processo prosseguiu, assim, sem a oitiva da responsável, e sem juntar aos autos suas alegações de defesa, resultando na condenação pelo Acórdão nº 0722/2014.

Vejamos:

Lei 8.443/92

Art. 22. A citação, a audiência, a comunicação de diligência ou a notificação far-se-á:

I – mediante ciência do responsável ou do interessado, na forma estabelecida no Regimento Interno;

II – pelo correio, mediante carta registrada, com aviso de recebimento;

III – por edital publicado no Diário Oficial da União quando o seu destinatário não for localizado.

Vale destacar que o Regimento Interno do Tribunal de Contas (Resolução nº TC 06/2001) prevê a aplicação subsidiária da legislação processual nos casos de omissão. In verbis:

Art. 308. Os casos omissos serão resolvidos mediante aplicação subsidiária da legislação processual ou, quando for o caso, por deliberação do Tribunal Pleno.

A respeito do réu revel citado por edital, o Código de Processo Civil exige a nomeação de curador especial. É o que preceitua o art. 9º do Código de Processo Civil:

Art. 9º. O juiz dará curador especial:

I – ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele;

II – ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa.

A citação por edital é cabível nos casos em que seja ignorado o paradeiro do responsável:

Art. 231. Código de Processo Civil. Far-se-á a citação por edital:

II – quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar;

Antes da citação por edital, porém, faz-se necessário o esgotamento de todos os meios de convocação pessoal do demandado. Esse é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina:

AGRAVO DE INSTRUMENTO, INTERPOSTO POR CURADOR ESPECIAL, OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL E ATOS PROCESSUAIS SUBSEQUENTES – NECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS DE CONVOCAÇÃO PESSOAL DO DEMANDADO – EXEGESE DOS ARTS. 224, 231, I A III, 232, I, E 233, TODOS DO CPC, BEM COMO DO ART. 50, LIV e LV, da CRFB – INVALIDADE DECRETADA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(Agravo de instrumento 2004.031682-6, Relator: Des. Marco Aurélio Gstaldi Buzzi, Data da Decisão: 17/02/2005).

Dessa forma, em face da inexistência, nos autos, de diligências que pudessem esgotar os meios de convocação pessoal e, ainda, em virtude da falta de nomeação de curador especial ao Responsável revel, a decretação da nulidade do ato citatório, de ofício, é medida que se impõe.

A nulidade da citação importa, inexoravelmente, na anulação de todos os atos subsequentes.

Com efeito, a Resolução n. 06/2000, em vigência, cuida da citação da seguinte forma:

Art. 3º. O encaminhamento da citação e da audiência determinadas pelo Tribunal Pleno, pelas Câmaras ou pelo Relator far-se-á:

I – pelo correio, mediante carta registrada, com aposição de assinatura do destinatário no Aviso de Recebimento – Mão Própria (AR-MP);

II – por edital publicado no Diário Oficial do Estado, quando o destinatário não for localizado ou se recusar a assinar o respectivo expediente.

§ 1º A citação e a audiência de que trata o caput deste artigo poderão ser feitas mediante ciência do responsável ou interessado na cópia do expediente, obtida por servidor designado, sempre que este procedimento for mais conveniente para o Tribunal de Contas.

§ 2º Considera-se não localizado, para fins do disposto no inciso II deste artigo, o destinatário que estiver em lugar ignorado, incerto ou inacessível e quando o correio informar, no AR-MP, que o destinatário não foi localizado, por três vezes, no endereço indicado pelo Tribunal.

§ 3º Se o destinatário não for localizado pelo correio ou por edital, este será considerado revel, dando-se prosseguimento ao processo, nos termos do art. 38, § 3º, da LC nº 31/90.” G.n.

Veja-se que, a teor da Res. N. TC-06/2000, a citação por edital apenas será procedida se o destinatário não for localizado ou se recusar a receber o expediente, o que não é o caso, pois o Responsável é funcionária pública da Secretaria de Estado da Administração, e não estava em local ignorado, incerto ou não sabido, ficando evidente que a citação editalícia está viciada.

Importante salientar que em outras oportunidades a Responsável recebeu intimações todas e sempre no local de trabalho, o que desta vez não aconteceu, repito, não foram esgotados todos os meios para o sucesso da intimação.

DO REQUERIMENTO

Pelo exposto, presente as razões de fato e de direito, resta solicitar a reconsideração da Decisão, para que:

1) Seja conhecido o Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 0722/2014, exarado na Sessão de 27/08/2014, nos autos do Processo n. TCE-06/00470202;

2) Seja anulada a decisão recorrida, para que se promova nova citação da Responsável;

3) Requer a suspensão do prazo para o pagamento da condenação, e a não inclusão em dívida ativa;

4) Requer a juntada dos documentos em anexo, que são novos documentos e seriam juntados quando da defesa da Responsável.

A Diretoria de Recursos e Reexames elaborou o Parecer Técnico de fls. 52-55v, concluindo:

3.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração interposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, contra a Deliberação nº 0722/2014, exarada na Sessão Ordinária de 27/08/2014, nos autos do Processo nº TCE 06/00470202, e no mérito dar provimento para:

3.1.1. Anular a Deliberação Recorrida, em relação à Recorrente para que promova nova citação da mesma, Sra. Eliane Ondina Weingartner, no seu local de trabalho, a fim de apresentar a este Tribunal alegações de defesa sobre as restrições apontadas no Processo nº TCE-06/00470202.

3.1.2. Manter na íntegra quanto aos demais responsáveis, a Decisão nº 722/2014, os quais foram devidamente citados.

3.2. Dar ciência da Decisão, à Sra. Eliane Ondina Weingartner e à Secretaria de Estado da Administração.

É o relatório.

A sugestão da Consultoria Técnica, pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração, merece ser acolhida, tendo em vista preencher os requisitos de admissibilidade.

Especificamente quanto à tempestividade, a Decisão recorrida foi publicada no DOTC nº. 1548 de 11/09/2014 (quinta-feira), e o recurso protocolizado em 19/09/2014 (sexta-feira), portanto, dentro do prazo máximo de 30 dias estabelecido pelo art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.

A Recorrente reclama a nulidade da Decisão combatida, a qual restaria maculada ante a nulidade da citação realizada no âmbito do processo TCE 06/00470202.

Arguiu que não foram esgotados todos os meios possíveis para a citação da Recorrente e que não lhe fora nomeado curador especial, consoante determinação contida no art. 9º, II do CPC –  aplicado subsidiariamente aos processos em trâmite perante o Tribunal de Contas de Santa Catarina por força do art. 308[1] da Resolução nº TC 06/2001.

A Diretoria Técnica afastou o argumento referente à necessidade de nomeação de curador especial no âmbito do Tribunal de Contas Catarinense, mas acolheu a tese de nulidade de citação, ante o não esgotamento de todas as possibilidades de chamamento da Recorrente ao processo.

Não merece reparos a conclusão a que chegou a Douta Consultoria da Corte. De fato, restou caracterizado o cerceamento de defesa da então Responsável, decorrente da irregular citação realizada nos autos do processo TCE 06/00470202.

Da análise do feito, verificou-se que foram efetuadas três tentativas de citação por AR de mão própria (fl. 942), sendo que nas três oportunidades a tentativa deu-se em horário semelhante (15:35h, 14:19h e 14:18h), na mesma semana (dias 14, 15 e 16/08/2012) e no mesmo endereço (Rua José Antônio Tonolli, 399, Capoeiras).

Constata-se, portanto, que todas as tentativas deram-se durante o horário de trabalho, sendo inviável o recebimento do expediente pela Recorrente. Ademais, era possível conhecer o local em que a então responsável poderia ser localizada, já que servidora pública da Secretaria de Estado da Administração (SEA), à época ocupante do cargo de Gerente de Gestão do Fundo de Materiais e Atos Oficiais (GEMAT).

A citação editalícia, sendo forma de citação ficta, somente deve ser utilizada em casos excepcionais, quando não for possível localizar o responsável e não restar alternativa para cientificá-lo da demanda que contra ele corre.

No caso dos autos, era plenamente possível proceder à nova tentativa de citação, seja em local diverso (local de trabalho) ou em hora distinta (período matutino).

A repetição do procedimento citatório, nas mesmas condições em que fora realizado anteriormente, sem êxito, não constitui meio apto de exaurimento das vias de cientificação pessoal.

Sendo assim, restou ausente o embasamento que justificaria a citação por edital, qual seja, o desconhecimento ou a inacessibilidade do local em que a mesma se encontrava.

Diante de tais razões, impõe-se a anulação parcial da decisão e a realização de nova citação da responsável para apresentação de justificativas, ante a violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa, insculpidos no art. 5º, LV da CRFB/88.

Quanto à análise da necessidade de nomeação de curador no feito, resta esta prejudicada, em razão da constatação da irregularidade do procedimento citatório.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração interposto pela Sra. Eliane Ondina Weingartner, por atender os requisitos da Lei Complementar nº. 202/2000 (art. 77).

2) no mérito, pelo provimento do recurso, para anular a deliberação recorrida no que tange à responsabilização da Recorrente, bem como para realizar nova citação da Sra. Eliane Ondina Weingartner, em seu local de trabalho, a fim de apresentar alegações de defesa sobre as restrições apontadas no Processo nº TCE 06/00470202;

3) pela ciência da decisão à recorrente.

 Florianópolis, 09 de dezembro de 2014.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] Art. 308. Os casos omissos serão resolvidos mediante aplicação subsidiária da legislação processual ou, quando for o caso, por deliberação do Tribunal Pleno.