Parecer no:

 

MPTC/29.984/2014

                       

 

 

Processo nº:

 

REC 14/00576170

 

 

 

Origem:

 

Secretaria de Estado da Saúde

 

 

 

Assunto:

 

Recurso de Reconsideração (art. 77, da LCE/SC nº. 202/2000).

 

Trata-se de Recurso de Reconsideração formulado pela Sra. Vera Lucia de Oliveira, com fundamento no art. 77, da Lei Complementar nº. 202/2000, em face da Decisão Plenária prolatada na Sessão Ordinária de 01/09/2014 (Acórdão 0738/2014 – Processo TCE-01/02156891).

A Recorrente insurgiu-se contra referida decisão nos termos da petição de fls. 03-08. Aduz em sua defesa que:

ESPÓLIO DE ADILSON VIEIRA DE OLIVEIRA, através de sua Inventariante VERA LUCIA DE OLIVEIRA, brasileira, viúva, do lar, portadora do RG nº 349.705, residente e domiciliada na Rua Catiguá, nº 47, bairro Monte Verde, Florianópolis/SC, CEP 88032-450, vem, à presença de Vossa Senhoria, no prazo legal, apresentar

RECURSO

à Notificação encaminhada pelo Ofício TCE/SEG 15.724, de 09 de setembro de 2014, em face do julgamento do Plenário do TCE, pelos motivos que passa a expor:

PREAMBULARMENTE

Os fatos que foram investigados dizem respeito à eventuais irregularidades com diárias e gastos com combustíveis, relativas aos exercícios de 1996 e 1997, no âmbito da Secretaria de Estado da Saúde.

Em face do decurso de prazo, superior a 5 anos, operou-se a prescrição, a qual deve ser desde logo reconhecida.

A Constituição Federal, que no seu art. 37, § 5º, prevê:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

...

§ 5º. A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.”

A analogia para determinação do prazo prescricional, na hipótese, deve ainda ser estabelecida com o direito administrativo, que sempre teve por regra, ainda quando não expressamente positivada, o prazo de prescrição máximo de 05 (cinco) anos. Verifica-se que o direito administrativo adotou como regra, desde sempre, o prazo máximo de prescrição de 05 (cinco) anos, tanto em favor da Administração, como contra ela. Acompanhe-se a demonstração do argumento, começando por exemplos legislativos:

a) Código Tributário Nacional, art. 174: prazo prescricional de 5 anos para cobrança de crédito tributário;

b) Código Tributário Nacional: prazo decadencial de 5 anos para constituição do crédito tributário;

c) Código Tributário Nacional, art. 168: prazo prescricional de 5 anos para ação de restituição de indébito;

d) Lei 8.884/94 (Lei do Cade), art. 28: infrações da ordem econômica prescrevem em 5 anos;

e) Decreto 20.910/32: prazo prescricional de 5 anos contra a Fazenda Pública;

f) Lei o.112/90, art. 142: ação disciplinar contra funcionário público prescreve, no máximo, em 5 anos (no mesmo sentido dispunha a Lei 1.711/52, antigo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União). Também os prazos prescricionais para punição disciplinar previstos nas Leis Complementares 75/93 e 80/94 (Ministério Público Federal e Defensoria Pública) nunca são superiores a 5 anos;

g) Lei 8.429/92, art. 23: atos de improbidade administrativa prescrevem, no máximo, em 5 anos;

h) Lei 6.838/80, art. 1º: infrações disciplinares de profissionais liberais prescrevem em 5 anos. Também a Lei 8.906/94 (Estatuto da OAB), art. 43, prevê o prazo prescricional máximo de 5 anos para punição.

De todos esses prazos, há de se destacar o contido no artigo 21, da Lei nº 4.717, de 29-06-65, que trata da ação popular, e dispõe quanto à prescrição: “A ação prevista nesta lei prescreve em 5 (cinco) anos.” Como se sabe, qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

Logo, essa ação visa, dentro outras coisas, preservar a moralidade, a probidade administrativa, e está sujeita a prazo prescricional de 05 (cinco) anos.

Seu tratamento, destarte, deve ser rigorosamente o mesmo, inclusive no tocante aos aspectos prescricionais.

Por outro lado, e em face de um tratamento isonômico, muito bem vindo ante o princípio constitucionalizado da igualdade, o que vale para a Fazenda também vale contra ela. Neste sentido, a Lei nº 9.494, de 10-09-1997, com a redação dada pela Medida Provisória nº 2180-35, de 24-09-2001, afirmou, no seu artigo 1º-C, que “prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.”

Ora, se o prazo conta a favor da Fazenda, também deverá ser contado em seu desfavor.

NO MÉRITO

Na época dos fatos, o então servidor público federal ADILSON VIEIRA DE OLIVEIRA, do Ministério da Saúde, estava lotado no Hospital Florianópolis, da Secretaria de Estado da Saúde, por força da Portaria PT/PR-6250/90, do SUS.

Houve a movimentação financeira, decorrente dos Empenhos 25/96 e 1770/96, depositados em conta corrente bancária nº 055.955-8, da qual eram emitidos cheques.

Ocorre que houveram vários pagamentos, com a aquisição de materiais e serviços. Isso restou incontroverso.

Mesmo que contabilmente não possam ter sido regulares, em face da divergência das notas fiscais com os cheques, inexistiu efetivo prejuízo ao patrimônio público.

Tanto é assim, que no Processo Administrativo Disciplinar, havia sido proposta a pena de demissão, a qual foi comutada para suspensão de 30 dias, nos termos da Portaria nº 286, de 19 de março de 2002 (DOE 16.875, de 01/04/2002).

Não poderia, destarte, haver dupla penalidade, sobre os mesmos fatos.

Há que se verificar, outrossim, de que inexistiu prejuízo ao erário público, nem locupletamente ilícito.

Inúmeras declarações de fornecedores, notadamente aquelas colacionadas à fl. 3092 a 3115, atestam que os valores das Notas Fiscais correspondem exatamente às mercadorias adquiridas.

Nos termos dos Arts. 65 e 68, da Lei 4.320/64, embora deva prevalecer o regime normal de pagamento através da tesouraria, há previsão da excepcionalidade do regimento de adiantamento, o que foi efetuado na presente hipótese.

Deste modo, caso persista a penalidade ressarcitória aplicada, haveria um enriquecimento sem causa do Estado, eis que usufruiu das mercadorias e prestações de serviços, e agora quer ser ressarcido das mesmas.

Ex positis, invocando a prescrição, requer que seja acolhido o presente RECURSO, ou por inexistir prejuízo ao erário público, além da evidente ausência de previsão legal para a dupla penalização.

A Diretoria de Recursos e Reexames elaborou o Parecer Técnico de fls. 009-012v, concluindo:

4.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão nº 0738/2014 exarado na Sessão Ordinária de 01/09/2014, nos autos do processo – TCE 01/02156891 e, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra a decisão recorrida.

4.2. Dar ciência da Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam, ao Espólio do Sr. Adilson Vieira de Oliveira e à Secretaria de estado da Saúde.

É o relatório.

A sugestão da Consultoria Técnica, pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração, merece ser acolhida, tendo em vista preencher os requisitos de admissibilidade.

Especificamente quanto à tempestividade, a Decisão recorrida foi publicada no DOTC nº. 1552 de 16/09/2014 (terça-feira), e o recurso protocolizado em 24-09-2014 (quarta-feira), portanto, dentro do prazo máximo de 30 dias estabelecido pelo art. 77 da Lei Complementar nº 202/2000.

Não merece reparos a conclusão a que chegou a Douta Consultoria da Corte. A recorrente não logrou demonstrar a injustiça da decisão que combate.

Insurge-se a Recorrente, inventariante do espólio do Sr. Adilson Vieira de Oliveira, contra a decisão que imputou débito ao Responsável no montante de R$ 3.356,20.

Alegou a Recorrente que a pretensão sancionatória restaria prescrita, e que a irregularidade na movimentação de recursos financeiros públicos não ensejou dano ao erário. Ademais, sustentou que o então responsável já havia sido penalizado com 30 dias de suspensão quando da conclusão do Processo Disciplinar instaurado contra o servidor.

Quanto ao argumento de ocorrência de prescrição administrativa, este não merece prosperar, visto ser inaplicável aos casos em que se constata dano ao erário. O art. 37, §5º da CRFB/89 afasta do manto da prescritibilidade as ações que visem o ressarcimento dos prejuízos acarretados à administração, restando afastada a preliminar arguida.

O suposto bis in idem alegado pela Recorrente também não encontra guarida. O Processo Administrativo Disciplinar, instaurado no âmbito da Secretaria de Estado da Saúde, visou punir o desvio de conduta do servidor; a Tomada de Contas Especial, julgada pelo Tribunal de Contas, buscou impor ao responsável a obrigação de ressarcir o erário. São medidas com finalidades distintas, aplicadas por instâncias independentes. Um mesmo fato pode ensejar, inclusive, a cominação de uma sanção de natureza penal, civil e administrativa, não havendo nenhum óbice a sua aplicação conjunta.

No tocante ao argumento de ausência de prejuízo ao erário, novamente não logrou êxito a recorrente: houve divergência entre os valores constantes das notas fiscais e dos cheques, bem como entre o credor assinalado no cheque e o indicado na nota fiscal; verificou-se a existência de cheques ao portador ou nominais em nome do próprio servidor; além da constatação de retirada pessoal de dinheiro do banco e da manutenção de recursos públicos em caixa dois, dentre outras irregularidades apontadas na decisão combatida.

Por fim, as declarações de fornecedores atestando a compatibilidade dos valores constantes das notas fiscais às mercadorias efetivamente adquiridas não servem como meio hábil de prova, apto a afastar a imputação de débito.

Tal como já afirmado pela Diretoria de Recursos e Reexames, “não se pode pretender que as notas fiscais apresentadas pelo Responsável com valores divergentes dos cheques emitidos, sejam consideradas regulares, por declaração posterior dos fornecedores, visto que estas são divorciadas de conteúdo formal e substancial, do documento fiscal apresentado”.

O Ministério Público entende que a decisão contra a qual se insurge o recurso bem resguardou o interesse público, razão pela qual deve permanecer intacta.

                         

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1) pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração interposto pelo Sra. Vera Lucia de Oliveira, por atender os requisitos da Lei Complementar nº. 202/2000 (art. 77);

2) no mérito, pela negativa de provimento, para manter-se na íntegra a decisão recorrida;

3) pela ciência da decisão à recorrente e à Secretaria de Estado da Saúde.

 Florianópolis, 15 de dezembro de 2014.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas