Despacho no: |
GPDRR/82/2015 |
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Processo nº: |
REP 15/00086271 |
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Origem: |
Município de Taió |
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Assunto: |
Representação do Ministério Público de Contas - irregularidades nos Editais de Concurso nº 001/2015 e de Processo Simplificado nº 001/2015 |
Trata-se de Representação proposta pelo Ministério Público de Contas às fls. 02-22, versando acerca de irregularidades constatadas no Edital de Concurso Público nº 01/2015 e no Edital de Concurso Público nº 001/2015, pleiteando ainda a suspensão cautelar dos certames.
As restrições apontadas no edital de concurso concernem: a) à limitação da inscrição e da interposição de recursos somente por meio eletrônico; b) à ausência de isenção de taxas de inscrição aos hipossuficientes; c) à ausência de delimitação de quotas para portadores de deficiência.
Quanto ao edital de processo seletivo, as irregularidades concernem: a) à inscrição exclusivamente presencial; b) ao prazo exíguo de inscrição; c) seleção exclusivamente por prova de títulos (demonstrativo de tempo de serviço); d) à interposição de recurso apenas de forma presencial; e) à ausência de previsão e delimitação de quotas para portadores de deficiência.
Foram acostados documentos de suporte às fls. 23-65.
A Diretoria Técnica elaborou o Relatório de Admissibilidade nº 979/2015, sugerindo o conhecimento da Representação, para considerar regulares os Editais em análise, elencando as seguintes recomendações:
4.3.1. que em futuro Concurso Público e Processo Seletivo Simplificado, quando o número de vagas permitir, atentar para o percentual de (5%) das vagas destinadas a candidatos com deficiência, conforme a Lei Estadual 12.870/04;
4.3.2. que reconsidere o prazo de inscrição em Processo Seletivo futuro, considerando o tempo mínimo de 10 (dez) dias úteis;
4.3.3. que observe em futuros editais de concurso público e processo seletivo, em todas suas etapas (inscrição e recurso), a acessibilidade ampla na forma presencial, por procuração e pela internet.
4.4. Determinar o arquivamento dos autos.
4.5. Dar ciência ao Representante e à Prefeitura Municipal de Taió.
É o relato necessário.
Do Edital de Concurso Público nº 001/2015
A Diretoria Técnica considerou regular o referido edital, em que pese as restrições verificadas em seu bojo.
Quanto à inscrição e interposição de recursos apenas via internet, é flagrante a ofensa à acessibilidade, visto que obsta a inscrição no certame daqueles que não dispõem de acesso à rede mundial de computadores.
No que concerne à ampla acessibilidade, já se manifestou o Tribunal de Contas de Minas Gerais:
Edital de Concurso Público. Inscrição pela Internet e por Procuração. O Edital previu somente como forma de inscrição a presencial, excluindo a inscrição via internet ou por procuração. Ressalte-se, neste particular, que a possibilidade de inscrição via internet é sempre devida, pois possibilita o acesso de um maior número de candidatos, bem como deve ser admitida a inscrição por procuração, tendo em vista a hipótese de impossibilidade do próprio candidato fazer sua inscrição. Por essa razão, a Administração deverá adequar o Edital, prevendo também a inscrição via internet e por procuração. (Grifei)[1]
EMENTA: EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO — EXECUTIVO MUNICIPAL — IRREGULARIDADES
(...)
IV. EXCLUSIVIDADE DE INSCRIÇÃO PELA INTERNET — PRAZO DE INSCRIÇÃO INFERIOR A 30 DIAS — RESTRIÇÃO À ISENÇÃO DE TAXA DE INSCRIÇÃO PARA HIPOSSUFICIENTES — RESTRIÇÃO DE ENTREGA DE TÍTULOS E CERTIFICADOS AO DIA E LOCAL DA PROVA OBJETIVA — GARANTIA DE AMPLO ACESSO AOS CARGOS PÚBLICOS — VIOLAÇÃO
VI. INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS — VIA CORREIOS COM A.R. — NECESSÁRIA EXTENSÃO À ENTREGA PESSOAL E PELA INTERNET
(...)
4. Violam o princípio do amplo acesso aos cargos públicos a impossibilidade de inscrição por meio diverso à internet, a limitação da isenção da taxa de inscrição apenas aos candidatos abrangidos pelo Decreto n. 6.593/08 e a determinação de entrega de títulos e certificados no dia e local da prova objetiva, em detrimento de outros meios, como correios (Sedex ou AR).
(...)
6. A forma de interposição de recursos deve abranger não apenas o envio pelos correios, mas também pela internet e a entrega pessoal em local indicado pela prefeitura. (grifei)[2]
O acesso à internet em determinados municípios ainda não é uma realidade, conforme estudo[3] já mencionado na peça inicial de Representação. Especificamente no tocante ao estado de Santa Catarina, apenas 41,66% dos domicílios dispõem deste serviço.
Causa espécie, portanto, que a restrição (pelo menos em tese) à participação de mais da metade da população catarinense não constitua, aos olhos do Corpo Técnico, limitação à ampla acessibilidade do certame.
Ademais, defende-se aqui a adoção de métodos simples, que permitiriam ampliar em muito a participação de parcela populacional sem acesso à internet. A possibilidade de inscrição via postal ou mesmo mediante procuração já sanaria a problemática aqui apresentada, sem constituir ônus significativo ao ente que promove o concurso.
Portanto, com a implementação de práticas simples, seria garantida a ampla acessibilidade ao certame.
O Corpo Instrutivo arguiu que o item 3.2.4 do Edital[4] afastaria qualquer óbice à inscrição dos interessados no certame. No entanto, só a afasta em relação aos candidatos que moram na localidade e que, portanto, possuem fácil acesso à sede da Prefeitura.
A solução proposta, no entanto, não beneficia aos demais. Àquele que não reside no Município não será suprido o obstáculo da inscrição apenas via internet. A menos que se considere o deslocamento até o Município (sede da prefeitura), com a perda de um ou mais dias de trabalho, e com os custos que tal locomoção envolve, sinônimo de acessibilidade.
O mesmo raciocínio serve à propositura de recursos exclusivamente por via eletrônica. O candidato sem acesso à internet enfrentará duplo entrave: o concernente à realização da inscrição e à propositura de recursos.
Tal como sustentado na peça de Representação, este tem sido o posicionamento adotado, por exemplo, pela Corte Mineira de Contas, que defende a implementação de meios amplos de acesso ao candidato, tanto na fase de inscrição quanto na fase de interposição de recursos, devendo os editais se adequarem a tais ditames.
Quanto à inexistência de isenção de taxa de inscrição aos hipossuficientes, entendo que o argumento apresentado pelo Corpo Instrutivo - valores de inscrição de R$ 41 a R$ 82 - mostra-se insuficiente para justificar o afastamento da restrição.
É previsível que dentro da gama de cidadãos interessados em preencher tais vagas existam aqueles para os quais o desembolso da quantia de R$ 41 torne inviável sua participação no processo seletivo.
O valor pode parecer irrisório aos que detêm uma posição confortável dentro da atual sociedade - como os Auditores de Controle Externo do TCE/SC -, mas impacta de modo significativo no orçamento de famílias que, por vezes, não possuem o mínimo para suprir suas carências básicas.
Basta lembrar que há 13,9 milhões de famílias brasileiras[5] que dependem do programa social Bolsa Família, o qual atende a camada de população que percebe um renda mensal per capita inferior a R$ 154,00[6]. O valor médio do benefício concedido no mês de agosto de 2014, para citar como exemplo, foi de R$ 169,90 por pessoa.
Quem se encontra em tal situação não possui meios para arcar com a inscrição de um certame público, qualquer que seja o seu valor.
Independentemente do argumento de ser o valor da taxa de inscrição acessível ou não - o que, como exposto acima, mostra-se relativo, a depender da situação financeira daquele que arcará com o custo - a previsão de sua isenção impõe-se a qualquer certame, como meio de concretizar o princípio da ampla acessibilidade aos cargos e empregos públicos.
Já proferiu entendimento nesse sentido o Tribunal de Contas de Minas Gerais, no âmbito do Processo n. 772.958, de relatoria do Conselheiro substituto Licurgo Mourão:
Não há dúvida de que tal previsão não pode prosperar. A isenção do pagamento de taxa de inscrição e os critérios para sua concessão para aqueles que por razões financeiras não podem arcar com os custos têm amparo constitucional, e sua ausência contraria os princípios da isonomia e da ampla acessibilidade aos cargos, empregos e funções públicas previstos no caput do artigo 5° e inc. I do art. 37 da Constituição Republicana.
Na jurisprudência pátria, é pacífico o entendimento de que a omissão de previsão para concessão de isenção do pagamento de taxa de inscrição no edital de concurso público, ou sua vedação, contraria as normas legais regulamentadoras da matéria e fere de morte os preceitos da Constituição da República de 1988.[7]
No mesmo sentido, o entendimento proferido no âmbito do Processo n. 797.073, de relatoria do Conselheiro Antônio Carlos Andrada:
Com efeito, para que efetivamente se possibilite o cumprimento do objetivo da isenção da taxa de inscrição, deverá ser incluída no Edital cláusula que possibilite ser beneficiado pela isenção aquele que comprovadamente seja hipossuficiente, ou seja, sofra limitações financeiras de modo que o pagamento da inscrição venha a comprometer o próprio sustento ou de sua família, ainda que receba renda familiar igual ou superior ao salário mínimo. Assim, a Administração deverá adequar o item indicado, a fim de possibilitar a participação no certame daqueles que, em razão de limitações de ordem financeira, não podem pagar a taxa de inscrição.[8]
O edital deve prever a isenção do pagamento da taxa de inscrição para os candidatos hipossuficientes, assim entendidos como todos aqueles que, comprovadamente, não possam arcar com o pagamento da taxa de inscrição sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Esta é, sem dúvida, mais uma forma de concretizar o princípio da isonomia (art. 5º, caput da CRFB/88), bem como garantir a ampla acessibilidade dos brasileiros aos cargos, empregos e funções públicas (art. 37, I, CRFB/88), devendo ser rechaçados normativos que impeçam a efetivação de tais postulados.
Não havendo lei municipal sobre o tema, deve-se aplicar por analogia (art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) os Decretos Federais n.º 6.944/09 e n.º 6.593/08:
Decreto Federal n.º 6.944/09
Art. 15. O valor cobrado a título de inscrição no concurso publico será fixado em edital, levando-se em consideração os custos estimados indispensáveis para a sua realização, e ressalvadas as hipóteses de isenção nele expressamente previstas, respeitado o disposto no Decreto no 6.593, de 2 de outubro de 2008.
Decreto Federal n.º 6.593/08
Art. 1º Os editais de concurso público dos órgãos da administração direta, das autarquias e das fundações públicas do Poder Executivo federal deverão prever a possibilidade de isenção de taxa de inscrição para o candidato que:
I - estiver inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico, de que trata o Decreto no 6.135, de 26 de junho de 2007; e
II - for membro de família de baixa renda, nos termos do Decreto nº 6.135, de 2007.
§ 1º A isenção mencionada no caput deverá ser solicitada mediante requerimento do candidato, contendo:
I - indicação do Número de Identificação Social - NIS, atribuído pelo CadÚnico; e
II - declaração de que atende à condição estabelecida no inciso II do caput.
§ 2º O órgão ou entidade executor do concurso público consultará o órgão gestor do CadÚnico para verificar a veracidade das informações prestadas pelo candidato.
§ 3º A declaração falsa sujeitará o candidato às sanções previstas em lei, aplicando-se, ainda, o disposto no parágrafo único do art. 10 do Decreto no 83.936, de 6 de setembro de 1979.
Desta forma, entende-se deva ser considerada procedente tal ponto da Representação.
Quanto à ausência de especificação do quantitativo de vagas destinadas aos portadores de deficiência, a Diretoria entendeu que a falta de relação e delimitação das quotas não é empecilho para a Administração preencher as referidas vagas, caso haja nomeações em número suficiente para cumprimento da norma.
A ausência do quantitativo correspondente à reserva de vagas destinadas a candidatos portadores de deficiência afronta ao art. 37, inciso VIII da Constituição Federal e ao art. 37, §1º e ao 39, I do Decreto n. 3.298/99 e ao art. 35, §1º da Lei Estadual 12.870/04.
A delimitação prévia das vagas mencionadas (uma em cada cinco, uma em cada vinte) assegura o conhecimento prévio de quantas serão reservadas aos portadores de deficiência, independentemente de tratar-se ou não de caso de cadastro de reserva, restringido a margem de discricionariedade do gestor e evitando discussões acerca do número exato de vagas, em caso de a aplicação do percentual redundar em número fracionado e no caso de chamamento sucessivo de candidatos.
O edital menciona que serão asseguradas 5% das vagas por cargo (item 2.1, fl. 24). Menciona, ainda, que caso a aplicação do percentual resultar em número igual ou superior a 0,5 este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente (item 2.2, fl. 24).
Pois bem. Tomemos como exemplo os cargos com previsão de uma vaga, mais formação de cadastro de reserva. Caso se considere que o percentual de 5% seja aplicado ao número de vagas total (1), ter-se-á como resultado o número de 0,05. Quanto a estes cargos não haveria, a princípio, vagas reservadas para deficientes.
No entanto, no eventual chamamento de dez candidatos (para citar-se como exemplo), a aplicação do percentual mencionado geraria a fração de 0,5. Com o arredondamento previsto no edital, deveria restar reservada pelo menos uma vaga para portadores de necessidades especiais.
A questão que se põe, portanto, é a seguinte: aplicar-se-á o percentual sobre o número de vagas inicialmente previsto ou sobre o montante total, a medida que houver o chamamento? Acaso se adote a primeira das opções, restará esvaziado o sentido da norma de reservar um percentual mínimo aos portadores de necessidades especiais, visto que os editais poderão utilizar de tal artifício para burlar a norma. Acaso se adote a segunda das opções, não haverá certeza quanto ao número de vagas de fato reservado, visto inexistir certeza quanto ao número de candidatos total a ser chamado.
Deixar a critério da administração o modo de preenchimento das vagas que já deveriam desde já constar de modo expresso no edital, ou aguardar para que o Tribunal futuramente delibere a respeito de seu cumprimento, em surgindo alguma divergência ou restrição quanto ao ponto, não é alternativa viável a se adotar no presente caso.
A delimitação das vagas serve para assegurar aos candidatos (principalmente aos portadores de necessidades especiais) o conhecimento claro e certo quanto ao modo como se procederá ao preenchimento de cada vaga, tanto as já previstas como as que porventura venham a surgir no decorrer do período de validade do certame.
A correção de tal falha mostra-se simples. Em outro dos editais analisados, por exemplo o deflagrado no âmbito do Município de Arroio Trinta - SC (Anexo I), foram especificadas o número de vagas para portadores de necessidades especiais. Tanto para os cargos com previsão de uma ou duas vagas, como para os cargos com previsão de cadastro de reserva, foram previstas zero vagas para deficientes. No entanto, em seu item 3.16, foi estabelecido que a reserva de vagas corresponderia a 5% para cada cargo e que o primeiro candidato classificado como pessoa com deficiência seria nomeado para assumir a 20ª vaga e assim, sucessivamente, a cada 20 vagas. Tal previsão afasta possíveis dúvidas e discussões a respeito do total de vagas reservadas.
Entendo, ante o exposto, restarem plenamente atendidos os requisitos de admissibilidade para o conhecimento de todas as restrições apontadas na peça de representação.
Do Edital de Processo Seletivo nº 001/2015
A Diretoria Técnica também considerou regular o referido edital.
Quanto à inscrição apenas presencial, é flagrante a ofensa à acessibilidade, visto que obsta a inscrição daqueles que não residem no Município.
O Corpo Instrutivo entendeu não haver irregularidade por se tratar de processo seletivo para atender à necessidade temporária e por ter sido deflagrado em Município de 17.959 habitantes.
Ora, não entendo que tal fato justifique o menor rigor ao atendimento de regras que visam assegurar a mais ampla acessibilidade no certame. Afinal, em que pese se tratar de um processo para seleção de funcionários por prazo determinado, estes servirão para substituir os servidores efetivos quando de sua ausência - devendo restar preservada a mesma qualidade da prestação dos serviços de interesse público - ou para suprir outra demanda de natureza excepcional e temporária.
A ampla acessibilidade a quaisquer certames - seja concurso ou processo seletivo simplificado - assegura também uma maior competitividade entre os interessados, ampliando, pelo menos em tese, a qualidade dos candidatos selecionados.
O tamanho do município e a modalidade da contratação não são subsídios que amparem o não atendimento à plena acessibilidade dos cargos e empregos públicos, seja de forma permanente, seja de forma temporária.
A aplicação de um certame público, mesmo que simplificado, busca assegurar a participação ampla e isonômica de quaisquer interessados. Essa é a razão de se proceder a tal expediente para contratação. Não há sentido em se realizar determinado procedimento - independente do seu grau de complexidade - e, a mesmo tempo, dispensar a acessilidade a sua inscrição.
O prazo exíguo de inscrição resta plenamente caracterizado ante a concessão de apenas cinco dias úteis para sua realização.
Mesmo em se adotando analogamente o prazo estipulado pelo Decreto Federal nº 4.748/2003, tem-se como período mínimo o prazo de 10 dias úteis, o dobro do previsto para o processo seletivo em análise.
A instrução colaciona julgado e argumenta no sentido de que tal prazo, embora exíguo, fora imposto a todos os candidatos de modo isonômico, sem beneficiar ou prejudicar potenciais interessados.
Discordo do posicionamento adotado.
Primeiro, por impor obstáculos mais gravosos aos interessados que não residem na localidade, visto que terão de se deslocar até o Município para a realização da inscrição. Tal fato impede que se possa considerar a similitude do impacto aos possíveis candidatos em participar do processo seletivo.
Segundo porque a imposição de inscrição presencial, em horário extremamente restrito (das 8h às 11h, fl. 50), somada ao prazo de apenas cinco dias úteis prejudica a todos os interessados e reduz, ainda, a própria publicização que se espera de um certame dito público. O exíguo prazo reduz o amplo conhecimento do processo pelos interessados em nele se inscreverem.
Quanto à seleção exclusivamente por prova de títulos, entendeu a Diretoria por afastar a restrição, utilizando como fundamento o parecer COG 706/2009, acompanhando pela Decisão nº 815/2010, a qual dispõe que cabe à administração a escolha dos critérios a serem adotados no processo seletivo.
Entendo, no entanto, que o posicionamento exposto mostra-se equivocado, devendo ser revisto pela Corte.
Pertinente o seguinte julgado da Corte Federal de Contas, o qual reconheceu a ilegalidade de contratação de profissionais sem aplicação de prova escrita, em consideração aos princípios da isonomia, impessoalidade, finalidade, razoabilidade e proporcionalidade:
II. Da não previsão de provas escritas para o processo seletivo simplificado
32. Em que pesem as argumentações do responsáveis sobre a inaplicabilidade da lei 8.745/93 e do Decreto 4.748/2003, ainda que exista lei disciplinadora deixando os critérios do processo seletivo ao talante dos órgãos interessados e respectivos editais, não merecem ser acolhidas as argumentações dos responsáveis, isto porque algumas regras constitucionais devem ser observadas, essencialmente os princípios constitucionais insertos no artigo 37 da Constituição Federal.
33. Nesse sentido, quando o constituinte diferenciou o processo de seleção pública para o preenchimento de cargos efetivos (concurso público) do processo de seleção pública para a contratação temporária de pessoal no serviço público (processo seletivo), primou-se pela simplificação do trâmite e consequente redução do tempo de duração do certame, mas de nenhuma forma se vislumbrou a redução das exigências profissionais, haja vista que, se assim fosse, esse dispositivo conflitaria com outras exigências constitucionais, dentre elas a da eficiência, que impõe à Administração Pública a manutenção da qualidade no serviço público, qualidade essa que, dentre outras medidas para se mantê-la ou aprimorá-la, passa necessariamente pela aferição dos conhecimentos dos candidatos através de um processo objetivo.
34. Nesse diapasão, o Decreto 4.748/2003, (regulamentador da Lei 8.745/93), dispôs, na parte que interessa, o que se segue:
‘art. 4º A contratação de pessoal de que trata este Decreto dar-se-á mediante processo seletivo simplificado, compreendendo, obrigatoriamente, prova escrita e, facultativamente, análise de curriculum vitæ, sem prejuízo de outras modalidades que, a critério do órgão ou entidade contratante, venham a ser exigidas. [...]
38. Como já abordado em instrução preliminar, esse Tribunal já reconheceu a ilegalidade de contratação de profissionais sem aplicação de prova escrita (Acórdão 1289/2005 – TCU – Plenário), que embora tenha abordado caso relativo à competência na esfera federal, os preceitos são os mesmos para todas as esferas administrativas, em prestígio aos princípios da isonomia, impessoalidade, finalidade, razoabilidade e proporcionalidade. Assim, a seleção restrita à análise curricular só é aceitável quando há parâmetros objetivos que permitam correlacionar o produto desejado com a formação especializada dos candidatos. Em nenhum momento o edital definiu objetivamente os critérios para análise curricular. (grifei)[9]
Portanto, embora se trate de processo seletivo simplificado, entende-se que a aplicação de prova escrita asseguraria maior objetividade na avaliação dos candidatos que exercerão (ainda que provisoriamente) atividades públicas.
A adoção do critério tempo de serviço, além de não aferir o nível de conhecimento dos candidatos, não garante nem mesmo a avaliação do atendimento a exigências profissionais mínimas. Serve, apenas, para beneficiar aqueles que exercem há mais tempo a profissão.
Portanto, o critério adotado, para além de não isonômico, é contrário ao princípio da eficiência, assegurado pelo caput do art. 37 da CRFB/88, visto que não alcança nem mesmo a escolha dos melhores profissionais para o desempenho da atividade pública.
Não restaram estabelecidos, nem mesmo, os critérios mínimos para considerar a adoção do tempo de serviço como meio razoável de seleção - locais em que se laborou, horas trabalhadas por semana, especificação das funções desempenhadas, dentre outros.
Por tais razões, em que pese restar afastada a aplicação de multa ao responsável, tal não impede a análise do presente tópico e reconhecimento da inadequação de tal critério aos princípios constitucionais, em especial a isonomia e a eficiência.
Em virtude da clara incompatibilidade entre o seu teor e os parâmetros constitucionalmente estabelecidos no caput do art. 37, entende-se necessária, ainda, a reforma do Prejulgado nº 2041, com a supressão da parte final do seu texto, a qual aduz que o processo seletivo “poderá ocorrer unicamente com base no exame de títulos”.
Quanto à interposição de recurso somente de forma presencial, as mesmas observações feitas quanto da análise da inscrição presencial cabem aqui. Tal forma de interposição dificulta a rediscussão das etapas do processo seletivo, ocasionando um óbice ainda maior àqueles que residem em outras localidades.
A adoção de medidas simples - como a disponibilização de um endereço de e-mail seguro - já ampliaria em muito a possibilidade de propositura dos recursos, sanando a irregularidade em comento.
Quanto à ausência de previsão de vagas para deficientes, arguiu a Instrução tratar-se de processo com previsão de uma vaga mais cadastro de reserva, sendo dispensável referida reserva.
Em que pese não haver uma multiplicidade de vagas previstas, o eventual chamamento de outros aprovados que não o primeiro colocado já impõe a especificação do número de vagas reservadas aos portadores de necessidades especiais.
Ao deixar de proceder deste modo, a Administração coloca em risco a garantia estabelecida pelo ordenamento a este grupo. Como dito anteriormente, a ausência de previsão de vagas - em especial quando o edital prevê a formação de cadastro de reserva - pode vir a esvaziar o sentido da norma de reservar um percentual mínimo aos portadores de necessidades especiais.
Por tal razão, ainda que inicialmente se preveja a existência de uma vaga para preenchimento, deve haver previsão de vagas aos portadores de necessidades especiais, para o caso de eventual chamamento.
Da medida cautelar
As irregularidades verificadas nos editais supra são capazes de inviabilizar a participação de candidatos aptos e interessados, maculando os certames, conforme sustentado na peça de Representação.
A instrução afastou a necessidade de concessão da medida cautelar, visto que considerou regulares os editais analisados, posicionamento que, conforme exposto, mostra-se inadmissível.
Ademais, o Concurso Público ainda não fora homologado (previsão para 04/05/2015), sendo adequada a suspensão cautelar desde já do certame em análise, na medida que sua concessão pode evitar prejuízos ainda maiores à Administração Pública.
Quanto ao Processo Seletivo Simplificado, em consulta ao endereço eletrônico da Prefeitura, não se obteve informações quanto sua homologação.
Sabe-se que a declaração de nulidade dos editais importará, por consequência, na declaração de nulidade dos atos que lhe sucederem, incluindo a nomeação dos candidatos aprovados nos certames.
A suspensão, portanto, serviria para impedir que os editais em comento, eivado de ilegalidades bastantes para justificar a anulação, continuassem surtindo efeitos que, no futuro, teriam sua aplicabilidade revertida.
Encontram-se, assim, presentes os requisitos autorizadores para a concessão da cautelar pleiteada: o fumus boni iuris - plausibilidade jurídica - e o periculum in mora - possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação.
As irregularidades constatadas constituem clara afronta ao ordenamento vigente (fumus boni iuris), sendo perceptível de pronto que as mesmas a este não se adequam.
Além de restringir a ampla participação que se espera de um certame (o qual, por essência, destina-se a selecionar dentre o maior número de candidatos possíveis os mais aptos ao exercício da função), esvaziando o conteúdo do art. 37, caput, II da CRFB/88, os certames ainda não asseguram adequadamente a inclusão das pessoas portadoras de necessidades especiais (art. 37, VIII) nem a participação dos hipossuficientes (art. 5º, caput e art. 37, inciso I, da CRFB/88).
Resta igualmente atendido o requisito do periculum in mora.
Acaso se prossiga com os certames em análise, suas futuras anulações trarão prejuízos ainda maiores à Administração, visto que restarão maculados pela nulidade desde sua origem, abarcando, portanto, as nomeações e contratações que deles decorrerem.
Por fim, importante mencionar o deferimento da medida cautelar em casos análogos:
EDITAL DE CONCURSO PARA PROVIMENTO DO CARGO DE DEFENSOR PÚBLICO. DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE RONDÔNIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DE ISENÇÃO DE TAXA DE INSCRIÇÃO PARA HIPOSUFICIENTES. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AMPLA ACESSIBILIDADE AOS CARGOS PÚBLICOS E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS OBJETIVOS PARA EXAME PSICOTÉNICO. AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO OBJETIVA E IMPARCIAL NA PROVA ORAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE E DA ISONOMIA. OUTRAS IRREGULARIDADES. SUSPENSÃO CAUTELAR.[10]
E ainda:
Diante do exposto, verifico, neste primeiro momento, a existência de inúmeros vícios no procedimento ora focado, comprometendo a sua legalidade, o que justifica, dessa forma, a adoção de medida acautelatória de suspensão do certame até que a prefeitura municipal tome as providências necessárias de modo a conformá-lo com o ordenamento jurídico em vigor.
Assim, encontrando-se preenchidos os requisitos legais do periculum in mora e fumus boni iuris e, à vista da realização do certame que se anuncia com a possibilidade de violar o ordenamento jurídico, voto pela suspensão cautelar do Concurso Público n. 01/2012, a ser realizado pela Prefeitura Municipal de Rosário da Limeira, com fundamento no inciso XXXI do art. 3º c/c o art. 95 e inciso III do art. 96 da Lei Complementar n. 102/2008.
Proceda-se, com urgência, à intimação, por e-mail e fac-símile do Prefeito Municipal de Rosário da Limeira, Sr. Edson Curi, fixando o prazo de cinco dias para juntada aos autos de prova de publicação da referida suspensão, devendo o ofício conter advertência de que o não cumprimento desta decisão importará na aplicação de multa pessoal, nos termos do art. 85, III, da Lei Complementar n. 102/2008. (grifei)[11]
E ainda, no âmbito do Tribunal de Contas de Santa Catarina, colhem-se as seguintes decisões determinando a suspensão cautelar de certames:
Diante do exposto, DECIDO:
1.1. Conhecer da Representação formulada pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para no mérito, considerá-la procedente.
1.2. Determinar, preliminarmente, ao responsável, Sr. Ademil Antônio da Rosa, CPF n. 773.848.819-00, residente na rua Joaquim Rosa, n. 630, Centro, Brunópolis, a suspensão cautelar do Processo Seletivo n. 03/2014, até manifestação ulterior que revogue a medida ex oficio, ou até a deliberação pelo Egrégio Tribunal Pleno.
(...) (grifei)[12]
Diante do exposto, DECIDO:
1.1. Conhecer da Representação acerca de irregularidades no edital do processo seletivo n. 01/2015, da Prefeitura Municipal de Piratuba, nos termos dos arts. 100, 101 e 102, do Regimento Interno desta Casa (Resolução n° TC-06/2001), com nova redação dada pelo art. 5º, da Resolução n° TC- 05/2005 c/c artigos 65, § 1º e 66 da Lei Complementar n. 202/2000.
1.2. Determinar a suspensão cautelar do certame, até o julgamento de mérito da presente representação.
1.3. Determinar que seja procedida AUDIÊNCIA, nos termos do Art. 29, § 1º, combinado com o Art. 35 da Lei Complementar nº 202/00, do Sr. Claudirlei Dorini – Prefeito Municipal de Piratuba desde 01/01/2013, para apresentação de justificativas a este Tribunal de Contas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, no prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento desta, a respeito da publicação do edital do processo seletivo n. 01/2015, contendo as seguintes irregularidades: (...) (grifei)[13]
Diante do exposto, DECIDO:
1.1. Conhecer da Representação formulada pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para no mérito, considerá-la procedente.
1.2. Determinar, preliminarmente, à responsável, Sra. Inês Terezinha Pegoraro Schons, CPF n. 026.559.619-00, Residente na rua José Martinelli, n. 140, Centro, Celso Ramos, a suspensão cautelar do Processo Seletivo n. 01/2015, até manifestação ulterior que revogue a medida ex oficio, ou até a deliberação pelo Egrégio Tribunal Pleno.
1.3. Determinar a audiência da Sra. Inês Terezinha Pegoraro Schons, nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, para, no prazo de 30 dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b , do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), apresentar alegações de defesa acerca das seguintes irregularidades, ensejadoras de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000: (...) (grifei)[14]
Considero, pois, imperativa a suspensão cautelar dos certames.
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:
1) pelo conhecimento integral da Representação;
2) pela determinação da suspensão cautelar dos Editais de Concurso Público e Processo Seletivo Simplificado nº 001/2015, até o julgamento de mérito da presente representação;
3) pela determinação de readequação dos Editais de Concurso Público e Processo Seletivo Simplificado nº 001/2015;
4) pela realização de audiência do Prefeito Municipal de Taió, Sr. Hugo Lembeck em razão das seguintes irregularidades:
4.1) Quanto ao Edital de Concurso Público nº 001/2015:
4.1.1) Limitação dos meios de inscrição e interposição de recursos, em afronta ao art. 37, inciso I, da CRFB/88;
4.1.2) Não previsão de isenção de taxa de inscrição aos hipossuficientes, em afronta ao art. 5º, caput e ao art. 37, inciso I, da CRFB/88;
4.1.3) Não delimitação das vagas destinadas aos candidatos portadores de necessidades especiais, em afronta ao art. 37, inciso VIII, da CRFB/88, art. 37, §1º e art. 39, I, do Decreto nº 3.298/99, art.35, §1º da Lei nº 12.870/04
4.2) Quanto ao Edital de Processo Seletivo nº 001/2015:
4.2.1) Inscrição de forma exclusivamente presencial, em afronta ao art. 37, inciso I, da CRFB/88;
4.2.2) Prazo exíguo de inscrição, em afronta ao art. 37, inciso I, da CRFB/88;
4.2.3) Seleção exclusivamente por prova de títulos - demonstrativo de tempo de serviço, em afronta ao art. 37, caput e inciso I, da CRFB/88;
4.2.4) Interposição de recurso exclusivamente de forma presencial, em afronta ao art. 37, inciso I, da CRFB/88;
4.2.5) Não delimitação das vagas destinadas aos candidatos portadores de necessidades especiais, em afronta ao art. 37, inciso VIII, da CRFB/88, art. 37, §1º e art. 39, I, do Decreto nº 3.298/99, art. 35, §1º da Lei nº 12.870/04.
5) pela reforma do Prejulgado nº
2041, com a supressão da parte final do seu texto, a qual
aduz que o processo seletivo “poderá ocorrer unicamente com base no exame de
títulos”.
Florianópolis, 7 de abril de 2015.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador do Ministério
Público de Contas
[1] TCE/MG, Edital de Concurso Público n. 797.240/2009, da Prefeitura Municipal de Volta Grande, Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 29/09/2009
[2] TCE/MG, Edital de Concurso Público n. 863.084, da Prefeitura Municipal de Rosário da Limeira, Rel. Conselheiro Eduardo Carona da Costa. Sessão do dia 22/03/2012
[3] Mapa da Inclusão Digital / Coordenação Marcelo Neri – Rio de Janeiro: FGV, CPS, 2012, p. 23, 24 e 42 e. Disponível em: <http://www.cps.fgv.br/cps/bd/mid2012/MID_sumario.pdf>. Acesso em: 30/03/2015
[4] O candidato com dificuldades em acesso à internet poderá buscar auxílio junto à Prefeitura Municipal, onde haverá durante todo o período de inscrições, de segunda-feira a sexta-feira, das 08 às 12 e das 13h30min às 17h30min, um colaborador da empresa Click Soluções para auxiliar na realização das incrições
[5] http://www.mds.gov.br/saladeimprensa/noticias/2014/agosto/bolsa-familia-atende-a-mais-de-13-9-milhoes-de-familias-em-agosto
[6] http://www.mds.gov.br/falemds/perguntas-frequentes/bolsa-familia/bolsa-familia/gestor/bolsa-familia-institucional
[7] Tribunal de Contas de Minas Gerais. Segunda Câmara — Sessão: 26/03/09. Relator: Conselheiro substituto Licurgo Mourão. Edital de Concurso Público n. 772.958. Fundação Uberlandense de Turismo, Esporte e Lazer — FUTEL.
[8] Tribunal de Contas de Minas Gerais. Edital de Concurso Público n. 797.073. Rel. Conselheiro Antônio Carlos Andrada. Sessão do dia 15/09/2009
[9] TCU, Representação TC-020.315/2013-9, Município de Cacoal. Interessado: Tribunal de Contas do Estado de Rondônia – TCE/RO. Rel. Con. Augusto Sherman Cavalcanti, j. 26-02-2014
[10] TCE/RO, Processo n. 3477/2012, Edital de Concurso Público n.º 01/DPE/RO/2012, da Defensoria Pública do Estado de Rondônia, Rel. Valdivino Crispim de Souza. 16/08/20012
[11] TCE/MG, Edital de Concurso Público n. 863.084, da Prefeitura Municipal de Rosário da Limeira, Rel. Con. Eduardo Carona da Costa. Sessão do dia 22/03/2012
[12] TCE/SC, REP n. 15/00024322, da Prefeitura Municipal de Brunópolis, Rel. Con. Adircélio de Moraes Ferreira Júnior, 11/03/2015
[13] TCE/SC, REP n. 15/00046644, da Prefeitura Municipal de Piratuba, Rel. Con. Cesar Filomeno Fontes, 16/03/2015
[14] TCE/SC, REP n. 15/00068966, da Prefeitura Municipal de Celso Ramos, Rel. Con. Adircélio de Moraes Ferreira Junior, 13/03/2015