PARECER    :

MPTC/27756/2014

PROCESSO nº  :

REP 13/00617516    

ORIGEM       :

Prefeitura de Laguna

INTERESSADO  :

Jose Luiz Siqueira

ASSUNTO      :

Irregularidades concernentes a licitação e contrato para obras de recuperação da Avenida Calistrato Muller Salles.

 

1 – RELATÓRIO

Trata-se de Representação formulada por vereador de Laguna, Senhor José Luiz Siqueira, comunicando suposta irregularidade em licitação e contrato para obras de recuperação asfáltica (fls. 2/30).

Auditores da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações - DLC sugeriram o conhecimento da Representação e audiência do Sr. Everaldo dos Santos, prefeito (fls. 43/49).

Opinei na mesma direção (fl. 50).

O Exmo. Relator conheceu a Representação e determinou a audiência (fls. 51/53).

O responsável apresentou justificativas (fls. 57/58).

Por fim, auditores da DLC sugeriram decisão de irregularidade de um dos atos analisados, com aplicação de multa ao responsável (fls. 61/64).

 

2 – MÉRITO

O representante informou a realização de processo licitatório para recuperação asfáltica da principal via de acesso da cidade de Laguna, sem prévia previsão orçamentária (fls. 2/3 e 16/19).

Além disso, averiguou-se incorreta classificação da despesa (fl. 48).

A responsabilidade foi atribuída ao prefeito, Sr. Everaldo dos Santos.

Ele se defendeu dizendo que o procedimento foi realizado antes da aprovação da lei que criou os créditos adicionais por equívoco, em razão da celeridade que o caso necessitava, uma que vez que a situação da via pública era crítica (fls. 57/58).

O projeto de lei dispondo sobre a abertura de crédito adicional data de 10-9-2013 (fls. 24/25).

Conforme as justificativas do referido projeto (fls. 22/23), “os recursos serão destinados às obras de pavimentação asfáltica da Av. Calixto Muller Salles, [...]”.

Os empenhos referentes à obra são do mês de agosto de 2013 (fl. 16).

Ou seja, inegável que a Lei [municipal] nº 1625/2013 é posterior à homologação da licitação.

Auditores da DLC entenderam por desconsiderar a restrição (fl. 62-v), “uma vez que houve a efetiva abertura de crédito adicional especial, mediante instrumento legal compatível”.

Eis Prejulgados da Corte de Contas sobre o assunto:

 

Prejulgado 0241

É possível a abertura de crédito especial pelo Município, para o caso de despesas novas; deverá ser precedida, de autorização legislativa e será efetivada por decreto Executivo. É necessária a existência de recursos e de justificativa aceitável; tudo isto nos termos dos artigos 42 e 43 da Lei Federal nº 4.320/64 e observados as peculiaridades de cada Lei Orgânica Municipal. (Grifo meu)

 

Prejulgado 1002

1 – Para a realização de despesas que não constam do orçamento, necessário se faz a abertura de crédito especial pelo Município, devendo ser precedida de autorização legislativa e ser efetivada por decreto Executivo, sujeitando-se ainda à existência de recursos disponíveis e de exposição justificativa, nos termos dos arts. 41, II, 42 e 43 da Lei Federal nº 4.320/64, devendo ainda serem observados os ditames do art. 167, V, VII e §1º, da CF, devendo ser incluído na LDO e Lei de Meios, quando for o caso. (Grifado)

 

O art. 42 da Lei nº 4.320/64 estabelece:

 

Art. 42 – Os créditos suplementares e especiais serão autorizados por lei e abertos por decreto executivo.

 

Rogério Sandolini de Oliveira comenta o dispositivo legal:[1]

 

Sendo o orçamento uma lei e os créditos adicionais, mecanismos de correção da previsão inicial, ou seja, mecanismos que alteram a lei orçamentária, nada mais lógico que a abertura de créditos adicionais seja feita por meio de prévia autorização legislativa. (Grifei)

 

Veja-se trecho de voto proferido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, na ADIn nº 3.401-4-SP:[2]

 

Trata-se de dispositivo inserido na seção dos orçamentos, que se justifica por tornar mais rígido o controle da execução orçamentária. As programações orçamentárias são projetadas pelo Poder Executivo e aprovadas pelo Poder Legislativo, de modo que a lei orçamentária retrata um projeto que, em tese, está exteriorizando a vontade da sociedade representada pelos legisladores. (Grifo acrescido)

 

Decorre da Lei, da orientação do Tribunal de Contas e da doutrina, que a Lei autorizativa deve preceder a abertura de créditos adicionais, motivo pelo qual o gestor deverá ser sancionado a respeito, pelo descumprimento dos arts. 4º e 42 da Lei nº 4.320/64.

A questão relativa ao lançamento da licitação sem previsão de recursos na Lei Orçamentária guarda íntima relação com o apontamento tratado acima, motivo pelo qual deixo de analisá-la de forma específica, apenas acrescentando o art. 7º, § 2º, III, da Lei nº 8.666/93, na fundamentação da sanção.

No que concerne à classificação econômica, esta deu-se como “despesas de custeio”.

Conforme auditores da DLC, em seu relatório de audiência (fl. 48):

 

[...] não se tratam [trata] de despesas de custeio, bem como não são [se trata de] prestação de serviço, mas sim obras, de forma que a classificação econômica das despesas constantes nas notas de empenho ns. 4756, 4764 e 4765 (fl.31) estão incorretas [está incorreta], ou seja, não poderia o edital indicar recursos orçamentários com a classificação 3.3.90.39 (serviços de terceiros pessoa jurídica), isto tendo em conta o objeto licitado (fls. 37 e 40). A empresa contratada não teria seu empenho respectivo contabilizado nesta dotação.

Aqui, faz-se oportuno enfatizar que segundo as notícias veiculadas pela mídia local (fls. 08, 10 e 15), corroboradas pelas fotografias juntadas aos autos (fls. 20 a 30), não se trata de mera manutenção ou conservação da pavimentação, vez que houve a instalação de uma nova tubulação de saneamento básico.

 

Em suas justificativas (fl. 57), o responsável defendeu se tratar de “recuperação de camada asfáltica”, o que resultaria na regularidade da classificação constante dos empenhos – “outras despesas correntes/outros serviços de terceiros” (fls. 17/19).

Muito embora o edital de tomada de preços que deu origem à contração (fl. 38) e as notas de empenho (fls. 17/19) tenham indicado recursos orçamentários com classificação econômica correspondente a despesas de custeio/serviços de terceiros, os créditos adicionais aprovados após esses eventos contemplam em grande parte classificação correspondente a despesas de capital (fls. 24/25).

Portanto, as despesas serão efetivamente suportadas por créditos que contemplam a classificação na categoria econômica “despesas de capital”.

Por certo, o descompasso originou-se do fato de ter havido licitação e empenhamento de despesas sem prévia aprovação dos créditos orçamentários correspondentes, constando dotação imprópria no edital e nas notas de empenho.

Neste passo, opino por multa ao gestor pela classificação de despesas em categoria econômica imprópria, contrariando o disposto no art. 12 da Lei nº 4.320/64 e a Portaria Interministerial nº 163/2001.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, com amparo na competência conferida pelo artigo 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela adoção das seguintes providências:

3.1 – DECISÃO de PROCEDÊNCIA dos fatos objeto da REPRESENTAÇÃO, tendo em vista a IRREGULARIDADE dos seguintes atos, com base no art. 36, § 2º, a, da Lei nº 202/2000:

3.1.1 – Lançamento de processo licitatório e empenhamento de despesas, sem autorização em lei orçamentária e/ou sem prévia aprovação de créditos adicionais, em contrariedade com os arts. 4º e 42 da Lei nº 4.320/64, bem como art. 7º, § 2º, III, da Lei nº 8.666/93;

3.1.2 – Classificação de despesas em categoria econômica imprópria, contrariando o disposto no art. 12 da Lei nº 4.320/64 e a Portaria Interministerial nº 163/2001.

3.2 - APLICAÇÃO de MULTAS ao Sr. Everaldo dos Santos, prefeito à época, com supedâneo no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, pela prática das irregularidades acima descritas.

Florianópolis, 13 de abril de 2015.

 

ADERSON FLORES

Procurador



[1] In: Oliveira, Rogério Sandolini de. Orçamentos públicos: a Lei 4.320/1964 comentada. 2ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 150.

[2] Idem. p. 151.