Parecer no:

 

MPC/32.943/2015

 

 

Processo nº:

 

REP 11/00190241

 

 

 

Un. Gestora:

 

Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina

 

 

 

Assunto:

 

Representação do Ministério Público de Contas – acerca da concessão de vantagem remuneratória sem amparo constitucional

 

Trata-se de Representação formulada pelo Ministério Público de Contas, tendo por finalidade relatar irregularidades na concessão de vantagem remuneratória a servidores que exerceram mandato eletivo na Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, com base no art. 31, § 2º, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010.

Junto com a inicial (fls. 03-40), foram acostados aos autos os documentos de fls. 41-745.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, através do relatório nº 2019/2011, sugeriu conhecer da representação, realizar diligências e fixar a urgência na tramitação dos autos (fls. 796-806).

Às fls. 809-812, o Relator requisitou a remessa dos autos ao gabinete, a fim de analisar o pedido cautelar, o qual consistiu na abstenção da ALESC em realizar pagamentos com fulcro no art. 31, § 2º, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010.

O Ministério Público de Contas, através do saudoso Procurador Mauro André Flores Pedrozo, ratificou os termos da representação e manifestou-se pelo seu conhecimento (fls. 814-817).

À fl. 818, o Sr. Dirceu Dresch veio aos autos requerer a análise da representação com a máxima urgência, ante o grave e iminente risco de lesão ao erário público. Na oportunidade, juntou os documentos de fls. 819-1.052.

Ato contínuo (fls. 1.053-1.080), o Relator elaborou proposta de voto, a qual conclui pelo conhecimento da representação, pela concessão da medida cautelar, pela realização de diligências e pela fixação de urgência na tramitação dos autos.

Levada a proposta de voto ao Plenário, o Conselheiro Júlio Garcia pediu vista dos autos e apresentou voto divergente. Na ocasião, propôs o conhecimento da representação e o arquivamento dos autos, ante a perda de objeto, já que o art. 31, § 2º, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010 foi declarado inconstitucional, além de ser revogado pela ALESC (fls. 1.134-1.138).

À fl. 1.143, o Relator determinou a realização de diligências, a fim de saber se a Unidade Gestora estava efetuando o pagamento com base na lei declarada inconstitucional.

Em resposta, o Diretor-Geral da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina acostou os documentos de fls. 1.149-1.160.

Às fls. 1.164-1.165, o Relator afirmou que “há indícios de que a Representação perdeu seu objeto, tornando inócua a cautelar concedida”. Entretanto, apontou que a diligência sugerida pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal não foi cumprida em sua integralidade e, por conseguinte, determinou a realização de novas diligências.

A Secretaria do Estado da Administração, através do ofício juntado à fl. 1.168, trouxe aos autos os documentos de fls. 1.169-1.173.

A área técnica elaborou o seu relatório derradeiro, sob o nº 5.449/2014, concluindo nos seguintes termos (fls. 1.175-1.177):

 

3. CONCLUSÃO

À vista do exposto sugere-se ao Sr. Relator do presente processo o seguinte encaminhamento para que possa o Tribunal Pleno, com fulcro no art. 59 da Constituição Estadual, no art.1º, inciso XVI, da Lei Complementar nº 202/00 e no art. 1º, inciso XVI do Regimento Interno (Res. n. 06/01), adotar a seguinte decisão:

3.1. Conhecer da Representação que versa sobre irregularidade quanto à vantagem pessoal concedida pelo §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010 a servidores que tenham exercido mandato eletivo, por preencher os pressupostos de admissibilidade previstos nos arts. 65 e 66 da Lei Complementar nº 202/2000, para considerá-la procedente.

3.2. Determinar aos Poderes e Órgãos do Estado de Santa Catarina que se abstenham de aplicar o revogado §2º do art. 31 da Lei Complementar Estadual nº 485/2010, para o fim de conceder qualquer vantagem ou determinar pagamento sob o mesmo título a servidor público com fundamento no aludido dispositivo, salvo se decorrente de decisão judicial, situação em que o Poder ou Órgão deverá manter o acompanhamento da ação judicial, informando a este Tribunal de Contas a decisão após o trânsito em julgado no Poder Judiciário.

3.3. Determinar arquivamento dos autos.

3.4. Dar conhecimento da competente decisão plenária ao Representante e Representados.

 

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, arts. 22, 25 e 26, da Resolução TC nº 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº 06/2001).

 

1. Da concessão da vantagem remuneratória criada pelo art. 31, § 2º, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010

 

Registre-se, primeiramente, que ao propor a Representação sustentei a inconstitucionalidade formal e material da lei que criou a possibilidade de servidores públicos que exerceram mandato eletivo continuarem a perceber, após o término da representação, os valores pagos a título de subsídio no cargo eletivo.

Com efeito, destaco que o Relator, através da proposta de voto juntada às fls. 1.053-1.080, reconheceu a gravidade da situação e, com maestria, destrinchou o imbróglio criado pelo legislador, pois, em suas palavras, a redação da mencionada lei “possui complexidade habitual em preceitos legais que criam vantagens contrárias à isonomia”.

Dito isso, cabe assinalar que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, através da ADI nº 2010.027007-9[1], reconheceu a inconstitucionalidade da norma em comento, nos seguintes moldes:

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 485/2010 QUE DISPÕE SOBRE O QUADRO DE PESSOAL DOS SERVIÇOS JURÍDICOS DAS AUTARQUIAS E FUNDAÇÕES E ADOTA OUTRAS PROVIDÊNCIAS. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE DO COORDENADOR DO CECCON E VÍCIO NO PROCESSO LEGISLATIVO. REJEIÇÃO. EXIGÊNCIA DA INSCRIÇÃO NA

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL PARA A POSSE NO CARGO DE ASSISTENTE JURÍDICO, PREVISTA NA ALÍNEA "A" DO INCISO II DO ARTIGO 21. INCONSTITUCIONALIDADE INEXISTENTE. PARÁGRAFOS 2º E 3º DO ART. 31 QUE PERMITEM, RESPECTIVAMENTE, TRANSFORMAR SUBSÍDIO DE DEPUTADO EM GRATIFICAÇÃO E INCORPORAR NA REMUNERAÇÃO DOS SERVIDORES QUE ASSUMIRAM MANDATO ELETIVO, BEM COMO A TRANSPOSIÇÃO DE CARGOS SEM A REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA COM EFEITO EX TUNC. PROCEDÊNCIA PARCIAL. (Grifou-se)

 

De igual sorte, observa-se que o § 2º, do art. 31, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010 foi revogado pela Lei Complementar Estadual nº 543/2011, nos seguintes termos:

 

Art. 1º Fica revogado o § 2º do art. 31 da Lei Complementarnº 485, de 11 de janeiro de 2010, que dispõe sobre o Quadro de Pessoal dos Serviços Jurídicos das Autarquias e Fundações e adota outras providências.

Art. 2º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a partir do dia 11 de janeiro de 2010, respeitado o disposto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal.

 

Dessarte, vê-se que os autos perderam o seu objeto, já que os pedidos feitos na exordial consistiam em:

 

1) A autuação da presente representação e sua recepção pela Corte.

2) A  determinação cautelar, inaudita altera pars, para que a Assembleia Legislativa de Santa Catarina se abstenha de conceder a vantagem remuneratória criada pelo parágrafo 2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010, e que, caso já tenha iniciado alguma pagamento com este fundamento, que o suspensa até a decisão final da Corte.

3. Comunicação dos fatos que constituem objeto desta representação ao Ministério Público Federal para que aquele órgão atue, se assim entender pertinente, propondo Ação Direta perante o Supremo Tribunal Federal, em face da regra prevista no art. 31, parágrafo 2º da Lei Complementar nº 485/2010, por afronta ao disposto no art. 22, XII, c/c art. 22, § 2º da Constituição Federal.

4) A audiência da Administração da Augusta Assembleia Legislativa para que, querendo, manifeste-se sobre o conteúdo desta representação.

 

Logo, entende-se que, no presente momento, não há razão para dar continuidade à representação, já que a lei, expressamente declarada inconstitucional, não se encontra mais no mundo jurídico.

Outrossim, cabe aqui mencionar que a Lei Complementar Estadual nº 543/2011 retroagiu os seus efeitos à data de 11.01.2010, momento em que foi publicada a Lei Complementar Estadual nº 485/2010.

De igual modo, denota-se que a decisão proferida pela Corte Catarinense de Justiça é cristalina ao dispor que os seus efeitos são ex tunc, não se falando, portanto, em direito adquirido (art. 5º, inciso XXXVI, CRFB/88).

Por fim, cabe sublinhar que consta nos autos que o Sr. Jair Silveira está recebendo a vantagem indevida, com base em uma decisão proferida pelo Judiciário Catarinense.

Nesse caso, embora se reconheça a ilegalidade da concessão, não vislumbro qualquer medida a ser adotada, mormente porque o processo encontra-se em tramitação perante o Superior Tribunal de Justiça[2].

Para arrematar, perfilho o entendimento da área técnica e entendo ser prudente fazer uma determinação à Unidade Gestora, para que se abstenha de, futuramente, realizar o pagamento da vantagem ora discutida nestes autos.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1. Pelo conhecimento da representação, com base nos fundamentos elencados pelo Relator às fls. 1.107-1.115.

2. Pela determinação aos Poderes e Órgãos do Estado de Santa Catarina para que se abstenham de aplicar o revogado § 2º, do art. 31, da Lei Complementar Estadual nº 485/2010.

3. Pelo arquivamento dos autos.

4. Pela comunicação da decisão proferida pelo TCE/SC ao Ministério Público de Contas, à Secretaria do Estado da Administração e à Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina.

Florianópolis, 04 de maio de 2015.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 

 

 

 

 



[1] SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. ADIN nº 2010.027007-9, da Capital. Rel. Lédio Rosa de Andrade. J. 21 set. 2011. Disponível em: www.tjsc.jus.br. Acesso em: 29 abril 2015.

[2] Informação obtida através de consulta ao processo nº 2012.068305-2, disponível no site www.tjsc.jus.br