PARECER nº:

MPTC/32671/2015

PROCESSO nº:

LCC 14/00279981    

ORIGEM:

Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz

INTERESSADO:

Ricardo Lauro da Costa

ASSUNTO:

4º Termo Aditivo ao Contrato particular de arrendamento firmado entre a HIDROCALDAS e a empresa Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda.

 

 

 

 

Trata-se de análise do 4º Termo Aditivo ao contrato particular de arrendamento firmado entre a Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz – HIDROCALDAS – e a empresa Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., em face da determinação contida no item 6.3 da Decisão n. 1.569/2014, proferida no processo RLI n. 10/00571014.

Foram juntados documentos relativos ao referido processo às fls. 2-116.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações emitiu o Relatório de Instrução n. 371/2014 (fls. 117-124v) sugerindo o conhecimento do relatório e a determinação de audiência dos Srs. José Isaac Duarte da Silva, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz à época dos fatos, Edésio Justen, então Prefeito Municipal de Santo Amaro da Imperatriz, e Francisco José Battistotti, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz à época dos fatos, para encaminhamento de alegações de defesa acerca das irregularidades apontadas nos itens 3.2.1, 3.3.1 e 3.4.1, respectivamente, bem como a determinação de diligência ao Sr. Ricardo Lauro da Costa, atual Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, para apresentação de informações e documentos relacionados aos fatos descritos nos itens 3.5.1 e 3.5.2 da conclusão do mencionado relatório de instrução.

Em igual sentido manifestaram-se este Órgão Ministerial e o Conselheiro Relator (fl. 125).

Efetuadas as audiências e a diligência, o Sr. Ricardo Lauro da Costa encaminhou a petição e os documentos de fls. 137-194, ao passo que as alegações de defesa do Sr. Edésio Justen e do Sr. Francisco José Battistotti foram acostadas às fls. 197-282 e 286-289, respectivamente.

Por sua vez, o Sr. José Isaac Duarte da Silva deixou fluir in albis o prazo para resposta, consoante a informação de fl. 292.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, então, apresentou relatório de reinstrução (fls. 293-300v), pronunciando-se pelo conhecimento do relatório e, preliminarmente, pela inconstitucionalidade do art. 1º, caput e parágrafo único, da Lei Municipal n. 1.997/09, além de opinar pela aplicação de multas aos Srs. José Isaac Duarte da Silva, acima qualificado, em face da anuência na transferência de Contrato de Arrendamento de Fornecimento de Água Termo Mineral a empresa estranha à relação jurídica inicialmente estabelecida, com burla ao processo licitatório, e Francisco José Battistotti, também acima qualificado, em virtude da prorrogação irregular, por meio do 4º Termo Aditivo, do Contrato Particular de Arrendamento de Fornecimento de Água Termo Mineral firmado em 03/11/1981, sugerindo a Área Técnica, ainda, a assinatura dos prazo de 180 e 60 dias para que o Sr. Ricardo Lauro da Costa, acima qualificado, realize respectivamente, a devida licitação para arrendamento de água termo mineral a terceiros, especificamente em relação a fonte utilizada pela empresa Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., visto que o contrato firmado em 1981 já se encontra extinto, e remova a conexão “T” da fonte Caldas, por ser de uso exclusivo do Hotel Plaza, concluindo, finalmente, com a sugestão de emissão de alerta também ao Sr. Ricardo Lauro da Costa, tudo conforme os itens 3.1 a 3.7 da conclusão do relatório técnico em comento.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, arts. 58 e 59, inciso IV, da Constituição do Estado de Santa Catarina, art. 1º, inciso V, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, e art. 8°, c/c o art. 6°, da Resolução TCE/SC n. 6/2001).

Passo, assim, à análise das restrições apontadas pela instrução.

1. Anuência da transferência de contrato de arrendamento de fornecimento de água termo mineral a empresa estranha à relação jurídica inicialmente estabelecida, com burla ao processo licitatório, em ofensa ao art. 37, inciso XXI, da CRFB/88.

A instrução apurou que foi feita a transferência irregular de titularidade do contrato firmado em 03/11/1981 entre a Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz e a Imperatriz Empreendimentos e Participações Ltda., diante da substituição indevida da posição de arrendatária para a Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., com anuência da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, por meio do Contrato Particular de Arrendamento, celebrado em 02/02/1998 (fls. 46-47), em flagrante burla ao procedimento licitatório (art. 37, inciso XXI, da CRFB/88), uma vez que não há qualquer relação societária entre referidas empresas (fls. 109-111).

O responsável pela irregularidade, Sr. José Isaac Duarte da Silva, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz à época, embora devidamente citado à fl. 130, deixou fluir in albis o prazo para resposta, conforme comprova a certidão de fl. 292.

O art. 15, § 2º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 dispõe acerca da revelia gerada em razão do não atendimento às diligências objeto de citação – e, consequentemente, de audiência – no prazo estipulado pelo Tribunal:

Art. 15. Verificada irregularidade nas contas, o Relator ou o Tribunal:

II — se houver débito ou irregularidade passível de aplicação de multa, ordenará a citação do responsável para, no prazo estabelecido, apresentar defesa ou recolher a quantia devida; e

§ 2º O responsável que não acudir à citação será considerado revel, para todos os efeitos, dando-se prosseguimento ao processo.

[...].

Assim, diante da ausência de manifestação, ficaram configurados os efeitos da revelia, reputando-se válida a presente restrição (com a consequente aplicação de multa ao responsável), irregularidade a qual se mostra bastante evidente, aliás, em razão do completo desrespeito à obrigação de licitar – art. 37, inciso XXI, da CRFB/88 – por parte da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, na figura de seu então Diretor Presidente e ora responsável, ao anuir na estranha substituição, por simples Contrato Particular de Arrendamento, da posição de arrendatária do contrato de arrendamento originariamente firmado em 03/11/1981.

2. Inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 1.977/09, por ofensa ao art. 37, inciso XXI, c/c o art. 22, inciso XXVII, da CRFB/88.

Verificou-se que o 4º Termo de Aditamento, pactuado em 23/06/2009, prorrogou indevidamente o prazo do arrendamento por mais 60 meses (fl. 45), postergando a data de encerramento do contrato original de 03/11/2011 – quando completaria 30 anos – para 03/11/2016, com fundamento na Lei Municipal n. 1.977/09, que assim dispôs:

Art. 1º Fica o Chefe do Poder Executivo Municipal, através do Diretor Geral da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, autorizado a firmar termo de aditamento ao contrato particular de arrendamento datado de 03 de novembro de 1981, firmado entre Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz e a Empresa Catarinense de Refrigerantes, como também ao contrato de arrendamento datado de 02 de fevereiro de 1998, tendo como Arrendante Imperatriz Empreendimentos e Participações, e Arrendatária Jan Envasadora de Águas minerais LTDA, cuja minuta segue como anexo, fazendo parte integrante da presente Lei.

Parágrafo Único. Fica dispensada a exigência de processo licitatório, com base no art. 57, inciso II, da Lei 8666/93.

Acontece que a legislação municipal autorizou a prorrogação de um contrato eivado de irregularidades – como, por exemplo, a transferência de titularidade sem a realização de procedimento licitatório observada no item anterior deste parecer –, além de inovar modalidades de dispensa de licitação, o que evidenciou a sua inconstitucionalidade.

Como bem anotado no relatório de instrução (fl. 120), sobre a possibilidade de o Tribunal de Contas apreciar a constitucionalidade de leis e atos do Poder Público, recorda-se o mandamento contido na Súmula 347, do Supremo Tribunal Federal, que deste modo pacificou a questão:

O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público. (grifei)

Em igual sentido anota o Regimento Interno dessa Corte de Contas, em seu art. 149, in verbis:

Art. 149. O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, poderá pronunciar-se sobre inconstitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público.

Elucidativa a leitura de trecho do Voto Condutor do Ministro Relator Benjamin Zymler, no Acórdão n. 945/2013, do Tribunal de Contas da União, in verbis:

18. Em relação à competência do Tribunal para exercer o controle concreto de constitucionalidade, a jurisprudência desta Casa pacificou o entendimento no sentido de que o TCU, ao examinar um ato na sua esfera de competência, pode, para decidir um caso concreto, apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público, interpretando-os para conformá-los à Constituição ou afastando a sua aplicação, no caso em que a incompatibilidade não puder ser superada. Nesse sentido, por exemplo, podem ser citados os seguintes precedentes: Acórdãos nº 2.442/2007, nº 831/2003 e nº 2.195/2008, todos do Plenário.

19. Da mesma forma, o TCU pode negar a aplicação em casos determinados de decretos que se mostrem incompatíveis com os preceitos constitucionais. Nesse sentido, pode-se citar por exemplo o Acórdão nº 1.704/2005 - Plenário, no âmbito do qual foi decidido que o Tribunal de Contas da União, no exercício de suas atribuições, quando estiver estudando um caso específico, pode não aplicar ato normativo que entenda inconstitucional. No que concerne ao mérito da questão então analisada, este Colegiado decidiu negar, por inconstitucionalidade, a aplicação do Decreto nº 2.745/1998, que regulamentou a Lei nº 9.748/1997, tendo em vista que esta Lei não foi recepcionada pelo artigo 173, § 1º, da Constituição Federal, com a redação que lhe conferiu a Emenda Constitucional nº 19/1998.

20. Importa salientar, ainda, que o STF, por meio de sua Súmula 347, deixou assente que "o Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público" (grifei).

O responsável, Sr. Edésio Justen (então Prefeito Municipal de Santo Amaro da Imperatriz), em sede de defesa (fls. 197-282), justificou a prorrogação com fulcro na grave crise financeira pela qual passava a Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz. Segundo ele, pelo exíguo prazo para lançamento de um novo edital, essa medida possibilitou que a empresa não decretasse falência em razão de dívidas trabalhistas, fiscais e tributárias. Além disso, embasou o ato no art. 81, § 2º, da Lei Orgânica Municipal[1], no art. 57, inciso II, da Lei n. 8.666/93[2] e no instituto jurídico do estado de necessidade, oriundo do Direito Penal.

É importante ressaltar, a princípio, que o Contrato Particular de Arrendamento, objeto de análise nos autos, trata da cessão temporária de exploração de água, e não da alienação de bens, à qual tentou induzir o responsável. Frise-se que pelo seu caráter indisponível, não há como conceber que este bem público estaria amparado pelo regime de alienação, disciplinado na legislação orgânica municipal.

Sem maiores divagações sobre o tema, traz-se o seguinte entendimento de José dos Santos Carvalho Filho[3]:

Como o informa a expressão, bens indisponíveis são aqueles que não ostentam caráter tipicamente patrimonial e que, por isso mesmo, as pessoas a que pertencem não podem deles dispor. Não poder dispor, no caso, significa que não podem ser alienados ou onerados nem desvirtuados das finalidades a que estão voltados. Significa, ainda, que o Poder Público tem o dever de conservá-los, melhorá-los e mantê-los ajustados a seus fins, sempre em benefício da coletividade.

São bens indisponíveis os bens de uso comum do povo, porquanto se revestem de característica não-patrimonial. Incluem-se, então, os mares, os rios, as estradas, as praças e logradouros públicos, o espaço aéreo etc., alguns deles, é óbvio, enquanto mantiverem essa destinação.

Além disso, o aludido interesse público, exigência contida no final do § 2º do normativo retro citado, não restou devidamente comprovado, pois não foram colacionados documentos que atestassem a crise financeira da companhia à época e, ainda, a imprescindibilidade desse serviço para a municipalidade.

De igual modo, não é cabível a fundamentação do ato na Lei de Licitações, visto que a possibilidade de interrupção do serviço sem graves prejuízos aos particulares afasta o suposto caráter contínuo atribuído a si.

Nesse sentido, bem discorreu a Unidade Técnica à fl. 121v:

Ressalta-se que os serviços a serem executados de forma contínua são aqueles que, por sua natureza, não podem sofrer interrupção, sob pena de graves consequências. [...]

Exemplos de serviços contínuos seriam o abastecimento de água e a coleta e tratamento de esgoto, além de serviços de saúde e transporte público. O contrato com a empresa Jan Envasadora de Águas Minerais não possui esta natureza de continuidade.

Entende-se que a interrupção do contrato referido para a realização de nova licitação, por parte da Hidrocaldas, não repercutiria em graves consequências ao município e/ou sua população, considerando a existência da prestação do serviço público de abastecimento de água e outras empresas que comercializam águas minerais engarrafadas.

A inconstitucionalidade, dessa forma, pode ser verificada também por meio do parágrafo único do regramento em análise, ao se tentar criar uma nova modalidade de dispensa de licitação: prestação de serviços de forma contínua.

Está constitucionalmente estabelecido que a competência para legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios”[4] é privativa da União, e não dos Municípios, como ocorrido no presente caso.

Por fim, convém ressaltar que a aplicação do instituto jurídico penal do estado de necessidade ao Direito Administrativo tem sido objeto de estudos por alguns segmentos doutrinários. Nessa linha, é possível compreender a temática pelo seguinte conceito de Juliana Gomes Miranda[5]:

O estado de necessidade administrativa é uma espécie de cláusula habilitadora, com efeitos derrogatórios, suspensivos ou até criativos, de uma atuação da Administração Pública interventiva e ordenadora na sociedade, não prevista em lei ou contrária a esta, integrando o conceito de legalidade alternativa, sem prescindir da constatação de circunstâncias excepcionais que clamam por uma ação urgente e necessária, posto o resguardo do interesse maior sopesado e ponderado.

De acordo com esse entendimento, em situações de crises, poderia a Administração Pública transcender o princípio da legalidade a fim de resguardar o interesse público, adaptando o Direito às situações de fato excepcionalmente gravosas à população, por intermédio do princípio da necessidade administrativa. Analogicamente, os doutrinadores defensores dessa teoria citam o Título V da CRFB/88, onde se admite a decretação do estado de sítio e de defesa – sistemas de legalidade excepcional – em casos de crises advindas de “guerra, desordem social e institucional, calamidades públicas, insegurança urbana, terrorismo, tráfico de drogas”, circunstâncias estas distintas das ensejadoras do estado de necessidade administrativa, por sua amplitude[6].

Há que se observar, porém, que a própria Lei de Licitações já elencou em seu art. 24, inciso IV, a possibilidade de dispensa de licitação para os “casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares”, como uma forma de respaldar esse estado de necessidade decorrente de situações gravosas ao Município. Para esses casos, é importante a apresentação de documentação que comprove a conjuntura do Município à época.

O responsável, entretanto, não trouxe nenhum documento que atestasse a citada crise, motivo pelo qual também não merece acolhimento esta justificativa, mantendo-se o apontamento inicial anotado pela instrução, com o consequente pronunciamento dessa Corte de Contas no sentido da inconstitucionalidade do art. 1º, caput e parágrafo único, da Lei Municipal n. 1.997/09.

3. Prorrogação irregular do contrato de arrendamento de fornecimento de água termo mineral firmado em 03/11/1981, em ofensa ao art. 37, inciso XXI, da CRFB/88.

A presente restrição diz respeito à prorrogação do contrato de arrendamento, firmado em 03/11/1981, pelo período de 60 meses, a partir do 4º Termo de Aditamento pactuado em 23/06/2009 (fl. 15), sem a realização de prévio procedimento licitatório, em desrespeito aos ditames do art. 37, inciso XXI, da CRFB/88, na esteira do que fora debatido no item anterior deste parecer.

O responsável, Sr. Francisco José Battistotti (então Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz), em resposta (fls. 286-289), aduziu que não houve modificação na natureza do contrato inicial – o qual seria de vazão, e não de concessão do direito de lavra –, prejuízo à municipalidade e alteração dos quantitativos de água fornecidos, que foi obedecida a legislação, pois houve autorização legislativa (Lei Municipal n. 1.997/09) e pareceres favoráveis emitidos pela Assessoria Jurídica do Executivo e Legislativo Municipal. Ademais, alegou que o valor a ser pago pela empresa Jan Envasadora foi alterado em benefício da Hidrocaldas, que o limite diário de fornecimento de água foi estipulado nos testes de vazão acostados no manifesto de mina e que foi protocolada a solicitação de averbação do aditamento junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral.

Na linha da sustentação apresentada pela instrução e da fundamentação constante deste parecer, convém ratificar o fato de que, embora não tenha havido prejuízo ao Município, o ato de prorrogação foi efetuado de forma irregular, pois desconsiderou a exigência constitucional de prévia licitação.

Ainda que seja tratado como um contrato mercantil de vazão, ele não se caracteriza como um serviço contínuo, conforme já discorrido, o que inviabilizaria sua prorrogação pelo prazo máximo de 60 meses, baseada no art. 57, inciso II, da Lei de Licitações.

O embasamento da prorrogação, de igual modo, não possui suporte legítimo, ante a evidente inconstitucionalidade da Lei n. 1.997, de 07 de julho de 2009, observada pelo Órgão Técnico e por este Órgão Ministerial ao longo desta manifestação.

Portanto, as justificativas apresentadas não foram capazes de alterar o apontamento inicial, de modo que deve ser mantida a irregularidade do 4º Termo Aditivo ao Contrato Particular de Arrendamento, com a consequente aplicação de multa ao responsável, Sr. Francisco José Battistotti, determinando-se prazo para que o atual Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz realize a devida licitação com vistas à concessão do serviço em comento, consoante item a ser acrescentado na conclusão deste parecer.

4. Utilização da fonte “Caldas” pela Jan Envasadora por meio da conexão “T”.

Consta dos autos a informação emitida pelo Departamento Nacional de Produção Mineral a respeito da fiscalização efetuada na área de lavra de água mineral em Caldas da Imperatriz, exarada por meio do Parecer n. 36/2013 (fls. 114-115) nos seguintes termos:

Em 20/05/2013 fizemos vistoria na área desta titular que tem área em fase de lavra de água mineral na localidade Caldas da Imperatriz.

Denúncia encaminhada na mesma data 20/05 pelo Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz por correio eletrônico, relatava situação encontrada após destamponamento da calha que contém a rede adutora da Fonte Caldas que destina-se ao abastecimento da envasadora JAN e do Hotel Plaza.

A vistoria constatou a existência no local assinalado nas fotos fls. 2991 a 2994, de conexão em formato de T no encanamento inferior existente na calha, que conduz água da Fonte Caldas para o Hotel Plaza. Com a existência desta conexão em T, há o fluxo d’água tanto para o reservatório do Hotel Plaza quanto para a envasadora JAN. Propomos exigir que seja retirada a conexão em T que permite o envase de água mineral pela envasadora JAN mas que é destinada ao Hotel Plaza por força de contrato de participação acionária. O motivo de tal exigência é que este fornecimento não está previsto no plano de aproveitamento econômico (PAE) da titular. Propomos aplicação de auto de infração ao Hotel Plaza pela colocação desta conexão e à empresa JAN Ltda, conexão esta que permite o uso da água da Fonte Caldas destinada ao Plaza, em envase pela JAN.

Em resposta à diligência determinada pela Área Técnica em face dessa informação, o Sr. Ricardo Lauro da Costa, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, informou (fls. 137-194) o registro de boletim de ocorrência em 21/05/2013 (fl. 141) e a remessa do Ofício n. 16/2013 (fls. 142-143) ao Controlador Interno Municipal para adoção de providências, bem como acostou cópia do Ofício n. 4.947/2013 (fl. 154), em que o Superintendente do Departamento Nacional de Produção Mineral, considerando os contratos de fornecimento assumidos, manifestou sua concordância com o restabelecimento da conexão pelo prazo de 180 dias, contados a partir de 26/08/2013.

Verifica-se que o prazo de 180 dias concedido pelo Departamento Nacional de Produção Mineral encerrou-se em 27/02/2014, razão por que se sugere a adoção de providências pelo atual gestor da Companhia para remoção da conexão, com a posterior averiguação de seu cumprimento por parte dessa Corte de Contas.

Outrossim, será requerido, ao final deste parecer, o envio das informações aqui salientadas ao Departamento Nacional de Produção Mineral de Santa Catarina e ao Ministério Público competente no Município de Santo Amaro da Imperatriz para a adoção das providências que entenderem cabíveis, diante da gravidade do fato, ainda mais se considerando as informações prestadas pelo atual Diretor Presidente da Companhia de que o repasse de água do Hotel Plaza à Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda. “é feito de forma irregular, escondido justamente por ligações clandestinas que dificilmente são encontradas” (fl. 139).

 

5. Elaboração de estudos que permitam assegurar avaliações quantitativas e qualitativas do recurso hidromineral que se encontra no aquífero Fonte utilizado para fornecimento de água ao Hotel e à Jan.

O Órgão Técnico verificou a necessidade de elaboração de estudos que demonstrassem avaliações quantitativas e qualitativas do aquífero, em decorrência do contrato de arrendamento das águas minerais, firmado pela Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, a fim de assegurar o múltiplo uso das águas, em observância ao princípio do interesse coletivo em detrimento do interesse privado.

O responsável, Sr. Ricardo Lauro da Costa, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, relatou (fls. 137-194) a realização de estudos trienais sobre a qualidade das águas, tendo acostado, inclusive, documentação relacionada aos estudos realizados pelo Laboratório de Análises Minerais acerca da qualidade da água nas fontes Caldas, Figueira e Piscina, referentes ao ano de 2013.

Tais estudos dizem respeito às exigências rotineiras de adequabilidade ao uso da água. O que se pretendia por meio da diligência efetuada era, contudo, analisar a capacidade de suporte do aquífero para os diversos usos a que tem sido destinado, quais sejam: o Hotel Plaza, a Empresa Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., o Hotel Caldas da Imperatriz, as piscinas a própria comunidade.

Sobre este aspecto quantitativo, o responsável, especificamente à fl. 139, informa que o “fornecimento de água é controlado por hidrômetros cuja leitura é realizada diariamente”. Todavia, “após o repasse da água ao Hotel Plaza não há possibilidades de controle do repasse a JAN, haja vista, que o repasse é feito de forma irregular”, conforme já frisado no item 4 deste parecer, situação a qual reforça a necessidade da adoção das providências ao final de tal item determinadas.

6. Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

1. preliminarmente, pela INCONSTITUCIONALIDADE do art. 1º, caput e parágrafo único, da Lei Municipal n. 1.997/09, que contrariou o art. 37, inciso XXI, c/c o art. 22, inciso XXVII, da CRFB/88;

2. pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, do 4º Termo Aditivo ao Contrato Particular de Arrendamento, firmado em 23/06/2009 pela Imperatriz Empreendimentos e Participações Ltda. e pela Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., com anuência da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz;

3. pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos responsáveis, na forma prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, diante das irregularidades abaixo descritas, conforme dispostas na conclusão do relatório de reinstrução (fls. 293-300v), da seguinte maneira:

3.1. ao Sr. José Isaac Duarte da Silva, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz à época dos fatos, em face da anuência na transferência de Contrato de Arrendamento de Fornecimento de Água Termo Mineral à empresa estranha à relação jurídica inicialmente estabelecida, com burla ao procedimento licitatório, em ofensa ao art. 37, inciso XXI, da CRFB/88, e ao art. 2º, da Lei n. 8.666/93;

3.2. ao Sr. Francisco José Battistotti, Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz à época dos fatos, em razão da prorrogação irregular, por meio do 4º Termo Aditivo ao Contrato Particular de Arrendamento de Fornecimento de Água Termo Mineral firmado em 03/11/1981, em ofensa ao art. 37, inciso XXI, da CRFB/88;

4. pela ASSINATURA DE PRAZO para que o Sr. Ricardo Lauro da Costa, atual Diretor Presidente da Companhia Hidromineral Caldas da Imperatriz, realize a devida licitação para arrendamento de água termo mineral a terceiros, especificamente em relação à fonte utilizada pela empresa Jan Envasadora de Águas Minerais Ltda., visto que o contrato firmado em 1981 já se encontra extinto;

5. pela ASSINATURA DE PRAZO para que o Sr. Ricardo Lauro da Costa, acima qualificado, remova a conexão “T” da fonte Caldas, pois de uso exclusivo do Hotel Plaza, sem prejuízo da futura averiguação do cumprimento desta determinação por parte dessa Corte de Contas;

6. pela REMESSA DE INFORMAÇÕES ao Departamento Nacional de Produção Mineral de Santa Catarina e ao Ministério Público competente no Município de Santo Amaro da Imperatriz, diante dos fatos relatados no item 2.4, do relatório de reinstrução (fls. 293-300v), e no item 4 deste parecer;

7. pelo ALERTA descrito no item 3.7 da conclusão do relatório de reinstrução.

Florianópolis, 22 de junho de 2015.

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 

 

 

 

 



[1] Art. 81. A alienação de bens municipais fica subordinada ao interesse público devidamente justificado e será sempre precedida de avaliação técnica e obedecerá aos seguintes requisitos:

[...]

§ 2º A concorrência pode ser dispensada, por lei, quando o uso se destinar à concessionária de serviço público, a entidades assistenciais, ou comprovado relevante interesse público.

[2] Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:

[...]

II – à prestação de serviços a serem executados de fora contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses.

[3] FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 946.

[4] Art. 22, inciso XXVII, da CRFB/88.

[5] MIRANDA, Juliana Gomes. A teoria da excepcionalidade administrativa: a juridicização do estado de necessidade. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2010, p. 116.

[6] PAULA, Carlos Eduardo Artiaga; ALMEIDA, Isabel Arice Koboldt de. Princípio do estado de necessidade administrativo: concepção, fundamentos, justificativas e controle. Disponível em: <https://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=88f0bf2899c59514>. Acesso em: 23 abr. 2015.