Parecer no:

 

MPC/35.227/2015

                       

 

 

Processo nº:

 

RLA 13/00691406

 

 

 

Un. Gestora:

 

Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS

 

 

 

Assunto:

 

Fiscalização referente à movimentação financeira, orçamentária e patrimonial da unidade e ao controle das suas receitas, com abrangência sobre os exercícios de 2012 e 2013, e sobre seu Sistema de Administração Tributária

 

 

Trata-se de Processo de Auditoria instaurado pela Diretoria de Controle da Administração Estadual, objetivando fiscalizar a Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS, no tocante à movimentação financeira, orçamentária e patrimonial e seus respectivos controles, relacionados às receitas da Unidade, com abrangência sobre o exercício de 2012 e 2013, incluindo a operacionalidade de seu Sistema de Administração Tributária do Estado (SAT).

De acordo com os dados coletados, a APSFS, autarquia do Governo do Estado de Santa Catarina, estaria sofrendo, desde longa data, prejuízos econômico-financeiros devido à gestão deficiente por parte de seus administradores.

A equipe de trabalho constatou falhas potencialmente causadoras de dano e as organizou em oito achados:

1. (fls. 11 a 46) Existência de passagem livre interligando a área arrendada à empresa TESC e a área do porto administrada pela APSFS;

2. (fls. 47 a 57) Estorno do registro da receita advinda do SAT;

3. (fls. 58 a 121) Ausência da caução estipulada no contrato com a TESC;

4. (fls. 122 a 143) Apuração da receita realizada por meio de informações de terceiros e não por fiscalização própria;

5. (fls. 144 a 153) Ausência de apuração das responsabilidades pelo pagamento de multas;

6. (fls. 154 a 170) Ausência de prestação de contas do convênio para construção do novo berço de atracação;

7. (fls. 171 a 192) Desenvolvimento de sistema de informática por prolongado período e sem a sua conclusão; e

8. (fls. 193 a 198) Diferença na área arrendada à TESC, utilizada para fins de cálculo do valor de arrendamento.

 

Finalizada a pesquisa de campo, prosseguiu-se ao Relatório DCE 554/2013, que entendeu pela confirmação de irregularidades prejudiciais e determinou a audiência do Sr. Paulo César Côrtes Corsi, Presidente da entidade desde 02/01/2007.

Houve manifestação defensiva às fls. 236 a 353.

Após a análise das alegações e provas trazidas pelo gestor Responsável, em novo Relatório DCE 633/2014, a Diretoria sugeriu:

3.1 Conhecer do Relatório da Auditoria referente a Movimentação Financeira, Orçamentária e Patrimonial e seus respectivos controles relacionados às receitas da Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS, com abrangência sobre o exercício de 2012 e 2013, e também acerca da operacionalidade do Sistema de Administração Tributária do Estado – SAT na unidade.

3.2 Aplicar ao senhor Paulo César Côrtes Corsi, presidente da Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS no período de 02/01/2007 em diante, CPF 697.603.908-25, com endereço na Rua Eugênio Moreira, nº 201, apto 502, Bairro Anita Garibaldi, Joinville, CEP 89202-100, multas previstas no art. 70 da Lei Complementar 202/2000 (estadual), em face do(a):

3.2.1 Não cumprimento do prazo de 5 dias previsto na IN TC 013/2012 e pela omissão de não cobrar o cumprimento dos prazos das comissões de sindicância, causando demora na apuração de responsabilidades pelo pagamento de multas, gerando despesa imprópria da administração pública, consoante art. 37, §5º da Constituição Federal, art. 10 da Lei Complementar (estadual) nº202/2000, art. 88 da Lei Complementar (estadual) 381/2007 e o art. 5º do Decreto (estadual) 2785/2009, bem como inciso II do §1º do artigo 3º da IN TC 013/2012 (item 2.5 deste Relatório).

3.2.2. Ausência, no período anterior a 06/06/2014, da caução estipulada no contrato nº 15/96/PJ com a TESC, em desacordo com o contrato de arrendamento APSFS/TESC, Cláusulas 66 a 73, contrariando a Constituição Federal, art. 37 e o disposto nos incisos I e II do art. 5º do Decreto 2.785/2009 (estadual) combinado com o inciso I do artigo 88 da Lei Complementar 381/2007 (estadual) (item 2.3 deste Relatório);

3.3 Determinar à Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS, na pessoa de seu Presidente, que adote, no prazo a ser assentado por este Egrégio Tribunal, com fundamento no inciso IX do artigo 59 da Constituição Estadual de 1989 e o inciso XII do artigo 1º da Lei Complementar 202/2000 (estadual), as seguintes providências:

3.3.1 Fechamento imediato da passagem livre interligando a área arrendada à empresa TESC e a área do porto administrada pela APSFS. (item 2.1 deste Relatório);

3.3.2 Elabore Plano de Ação para solucionar a questão do estorno do registro da receita advinda do SAT (item 2.2 deste Relatório);

3.3.3 Elabore Plano de Ação que defina prazos para a efetiva utilização de cada módulo do sistema de informática em desenvolvimento. (item 2.7 deste Relatório);

3.4 Alertar a unidade gestora Administração do Porto de São Francisco do Sul, na pessoa de seu representante legal, que o não cumprimento das determinações inscritas no item 3.3 supra implicará na cominação das sanções previstas no inciso VI e parágrafo 1º do artigo 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000 (estadual), conforme o caso, e o julgamento irregular das contas de gestão anual, na hipótese de reincidência, na forma prevista no parágrafo 1º do artigo 18 do mesmo Diploma Legal.

3.5 Recomendar à Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS que adote o seguinte procedimento:

3.5.1 Elabore estudo descrevendo e avaliando a forma de apuração da receita realizada por meio de informações de terceiros (item 2.4 deste Relatório);

3.6 Dar ciência do Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do presente relatório ao Sr. Paulo César Côrtes Corsi, presidente da Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS.

 

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

Diante de irregularidades que acarretam duas consequências distintas, passe-se a analisar os apontamentos elencados pelo corpo técnico de acordo com os tópicos a seguir.

 

DAS RESTRIÇÕES PASSÍVEIS DE MULTA

 

1. Estorno do registro da receita advinda do SAT

 

Em sua defesa, o gestor responsável pela APSFS alegou utilizar único código DARE em prol da economicidade, buscando promover os resultados esperados com menor custo possível, tanto para a Administração quanto para o usuário.

Disse que se optasse por trabalhar com um código SAT para cada um dos 50 itens da tarifa de serviços evitaria a ocorrência dos estornos, mas comprometeria a eficiência no atendimento ao usuário, visto o volume de documentos emitidos e o tempo de emissão.

A prática, porém, é exercida com êxito por diversas outras administrações portuárias e observa a regra contábil padrão, considerando que o estorno deve ser usado como exceção e não como regra, de acordo com a NBC T 2.4, razão pela qual se mantém o apontamento de irregularidade.

 

2. Ausência da caução estipulada no contrato com a TESC

 

Apesar de o contrato prever, no item 66, a prestação de garantia na época de assinatura do contrato, 16/05/1996, verifica-se que a apólice de seguro data do ano de 2014, com vigência de 06/06/2014 a 05/06/2015 (fls. 325 a 330). Não se constataram nos autos outras formas de garantir a execução do contrato nos períodos anteriores.

Não houve, portanto, o devido zelo no cumprimento das cláusulas do Contrato nº 15/96, tanto por parte da APSFS quanto por parte da arrendatária. A falta desta efetiva fiscalização possibilitou à empresa, consequentemente, que permanecesse isenta de penalidades contratuais, oriundas da não prestação da garantia a tempo.

Por todo o exposto, mantém-se o apontamento de irregularidade.

 

 

3. Apuração da receita realizada por meio de informações de terceiros e não por fiscalização própria

 

O Responsável confirmou que a apuração da receita se dá com base em dados fornecidos por terceiros, mas que há a conferência através de cruzamento de informações, tais como o manifesto de carga e o BL (Bill of Landing), documentos da Receita Federal, que devem se equiparar na quantificação e caracterização da mercadoria. Existem também: sistema SISCOMEX, o Departamento de Contêineres (DECON) e o Departamento de Tráfego (DITRA). Disse que as informações são confrontadas em várias etapas e que tais setores do Porto possuem servidores efetivos com responsabilidade de validá-las.

Com vistas a garantir a efetiva arrecadação de receitas, as Leis Complementares nº 101/00 e nº 381/07 preveem, respectivamente:

Lei Complementar nº 101/00

Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação.

Art. 13. No prazo previsto no art. 8o, as receitas previstas serão desdobradas, pelo Poder Executivo, em metas bimestrais de arrecadação, com a especificação, em separado, quando cabível, das medidas de combate à evasão e à sonegação, da quantidade e valores de ações ajuizadas para cobrança da dívida ativa, bem como da evolução do montante dos créditos tributários passíveis de cobrança administrativa.

Lei Complementar nº 381/07

Art. 88. À Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS compete:

XII - fixar os valores e arrecadar a tarifa portuária;

XXV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos do serviço e as cláusulas do contrato de concessão do Porto e demais competências previstas na Lei federal nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993.

 

Não há controle da veracidade das informações que impactam, de forma direta, na arrecadação de receitas, contribuindo para que a administração da entidade fique exposta a erros e distorções.

Por tal motivo, considero imperiosa a manutenção deste apontamento de irregularidade.

No entanto, não se deve desconsiderar a sugestão dada pela área técnica, no sentido de a APSFS proceder a um estudo por meio do qual descreva a metodologia utilizada para avaliar o faturamento de cada receita da APSFS, o papel desempenhado e os interesses dos eventuais atores envolvidos, conferindo maior fidedignidade aos dados fornecidos por terceiros, caso haja dificuldade demasiada na realização de uma efetiva conferência própria.

 

4. Ausência de apuração das responsabilidades pelo pagamento de multas

 

Em defesa[1], alegou-se, com a respectiva documentação, que foram instauradas as devidas sindicâncias e, após, as Tomadas de Contas Especiais para apuração de responsabilidades quanto a pagamentos de multas relacionadas a diversos processos em que figurou num dos polos a autarquia, dentre os quais: Processo Administrativo nº 10921-000.333/2007 da Receita Federal, Processos nº 23.387/2008 e nº 23.933/09 do Tribunal Marítimo, e Processos nº 50300.001028/2009 e nº 50300.0011238/2011 da ANTAQ[2].

Não obstante, os procedimentos administrativos de sindicância não foram instaurados dentro do prazo normativo de cinco dias, conforme art. 3º, §1º da IN TC 13/12, nem finalizados em tempo razoável, visto que muitos dos procedimentos que deveriam findar em 2013 foram encerrados somente em 2014. Ademais, ainda não foram finalizadas as Tomadas de Contas Especiais deflagradas tardiamente.

Observa-se que a demora na instauração das tomadas de contas especiais pode dificultar a identificação do responsável pela ocorrência das multas, permanecendo o débito por conta da entidade.

Sobre este aspecto, dispõe a Lei Complementar Estadual nº 381/07:

Art. 88. À Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS compete:

XXII - lavrar autos de infração e instaurar processos administrativos, aplicando as penalidades previstas em lei (...)

 

Pode-se afirmar que não houve empenho em se buscar o efetivo ressarcimento ao erário das multas geradas, despesas impróprias à satisfação do interesse público, seja pela longa demora na instauração das providências cabíveis, seja pela falta de conclusão quanto aos responsáveis em ressarcir a entidade.

Por tal razão, e sob pena de responsabilidade solidária da autoridade administrativa competente – nos termos do art. 10 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000 – deve-se assinar prazo para que a unidade identifique os responsáveis e acione-os para que haja  ressarcimento ao erário, fazendo prova das medidas efetivadas perante o Tribunal de Contas.

 

5. Ausência de prestação de contas do convênio para construção do novo berço de atracação

 

Trata-se do Convênio nº 17137/2009, celebrado entre a APSFS e a União, para execução de serviços de engenharia de interesse comum, em que se estipulou a realização de prestação de contas no prazo máximo de 180 dias após o recebimento dos recursos, conforme cláusula 6ª[3] do referido instrumento.

Foi fixada como contrapartida a ser prestada pela APSFS o montante de R$ 4.800.000,00 (consoante estipulado no convênio, à fl. 163, frente e verso). O seu reajuste foi previsto no Aditivo nº 11 de 23/05/2013 e alçado em R$ 234.723,50, correspondendo ao exato valor pendente na movimentação contábil de 2012 e 2013, por falta da prestação de contas por parte da União quanto ao repasse anterior.

Nos autos não se comprova o atendimento à prestação de contas no prazo, acarretando bloqueio no repasse de parcela da verba devida a título de contrapartida até o saneamento da pendência.

O responsável manifesta-se alegando que a prestação de contas foi entregue efetivamente em 12/05/2014, e que foram constatadas inconsistências[4] em pagamentos realizados – no valor de R$ 137.622,93 – passíveis de devolução à APSFS, já informados ao 10º BEC[5]. Este valor, atualmente, encontra-se bloqueado no SIGEF – Sistema de Gestão Fiscal do Estado de Santa Catarina – para qualquer repasse de recursos até que seja sanada a pendência.

Sugere-se novamente assinar prazo para que a Unidade comprove ao Tribunal as medidas efetivamente adotadas com vistas ao ressarcimento dos valores mencionados acima junto ao ente responsável, ou mesmo a compensação destes com o restante da contrapartida bloqueada.

 

 

6. Diferença na área arrendada à TESC, utilizada para fins de cálculo do valor de arrendamento

 

Em defesa, informou-se que a área utilizada como base do valor da contrapartida no contrato de arrendamento divergia, de fato, daquele apurado pelo setor de engenharia e meio ambiente.

O erro se originou, em 2009, da resposta do TESC à solicitação do Sr. Paulo César Côrtes Corsi, que incluiu uma planta preliminar da área arrendada com 67.056.19m².

Devido à diferença de área constante nos registros, 67.096,03m²[6], foi determinada a complementação por cobrança nas 3 primeiras faturas de 2010. Depois, em 2012, realizou-se a cobrança dos 37 meses anteriores ao mês de novembro e os faturamentos posteriores foram corrigidos.

Entende-se que as providências foram tomadas de modo a recuperar valores pertencentes ao erário, ainda que a destempo.

 

DAS RESTRIÇÕES QUE ENSEJAM DANO AO ERÁRIO

 

7. Existência de passagem livre interligando a área arrendada à empresa TESC e a área do porto administrada pela APSFS

 

Ficou estabelecido através do Contrato de Arrendamento nº 15/96 que a arrendatária, hoje denominada TESC – Terminal Santa Catarina S.A., construiria, conservaria e exploraria uma instalação portuária de uso público, chamada de Terminal, para movimentação e armazenagem de produtos, em área do Porto de São Francisco do Sul[7].

O conjunto destas instalações incluiu obras portuárias de atracação e acostagem, armazéns, pátios, vias de circulação interna, obras de infraestrutura de acesso aquaviário e aparelhamento do Terminal.

Este ativo fixo reverteria à Administração quando da extinção do contrato, sendo estipulada expressamente a diferença entre o que integraria o arrendamento (instalação portuária construída e mantida pela Arrendatária, bem como o aparelhamento implantado no Terminal) e a parte não integrante do arrendamento (a via principal de acesso ao Terminal, assim como suas calçadas laterais, mesmo se constituindo, a sua construção, encargo da arrendatária[8]).

 Além da incumbência de realizar a instalação portuária, à arrendatária foi atribuída a qualidade de Operadora Portuária, que consiste na pessoa jurídica habilitada para exercer as atividades de movimentação de passageiros ou movimentação e armazenagem de mercadorias, destinadas ou provenientes de transporte aquaviário, dentro da área do porto organizado[9].

As operações portuárias poderiam ser exercidas na área que abrange todo Porto, restando assegurada à TESC a exclusividade nesta prestação de serviço dentro da área do Terminal, isto é, área da construção atribuída à Arrendatária[10].

Denota-se, destas disposições, que a empresa realizaria, por um lado, obras de infraestrutura e prestaria, por outro, serviços de logística.

Os termos aditivos que sobrevieram ao longo dos anos se referiram a alterações em sua razão social (fls. 102 a 117).

Atualmente, existem várias operadoras portuárias no Porto de São Francisco do Sul, cuja exploração dos serviços pode se dar mediante contrato de concessão ou de arrendamento. O art. 2º, inciso IX da Lei nº 12.815/13 define o último como cessão onerosa de área e infraestrutura públicas localizadas dentro do porto organizado, para exploração por prazo determinado. 

Diante de tais informações, passa-se a verificar os documentos colhidos pela área técnica, com vistas a confirmar se a empresa utilizava de forma indevida área não integrante do contrato de arrendamento, o que enseja devolução de valores indevidamente recebidos em prejuízo do Poder Público.

Abaixo, quadros comparativos mostram que a quantidade de contêineres atracados em áreas sob o controle público é superior àquela de contêineres atracados no Terminal arrendado em questão.

 

As fotos a seguir, porém, revelam que a área arrendada contém maior quantidade de carga do que a utilizada diretamente pela autarquia.

Constata-se uma discrepância entre os dados oficiais da ANTAQ[11], que indicam maior recebimento de carga na área controlada diretamente pela APSFS (em relação à área arrendada), e o que efetivamente se observou no local.

Ocorrendo desvio do direcionamento de carga entre os pátios público e privado, a empresa estaria lesando a APSFS, aproveitando-se da falta de fiscalização no local, ao mesmo tempo em que estaria descumprindo o próprio contrato, que não prevê - e nos autos não se comprovou - a permissão de utilizar, com exclusividade, outras vias de acesso além da área do Terminal.

Conforme previsão expressa no acordo, item 91, “a via principal de acesso ao Terminal, assim como suas calçadas laterais, mesmo se constituindo, a sua construção, em encargo da Arrendatária” não integra o contrato de arrendamento.

E, no item 20, “a área de prestação de serviços, ou seja, de realização de operações portuárias, abrange a área do Porto de São Francisco do Sul, assegurando-se, todavia, à Arrendatária, exclusividade na realização de operações portuárias dentro da área do Terminal”.

Se houvesse de fato fiscalização, na forma dos itens 159, 162, 170 e 173 do Contrato nº 15/96, tal conduta ensejaria a rescisão unilateral, nos termos do item 80 “d” – inadequação[12] na realização das operações portuárias – e “f” – descumprimento de obrigações legais ou contratuais.

O gestor responsável, Sr. Paulo César Côrtes Corsi, trouxe, às fls. 276 a 280, documentos que evidenciam a regularidade operacional do Porto, nada dispondo, porém, sobre livre circulação de mercadorias entre as duas áreas.

Nos termos da Lei Complementar Estadual nº 381/07, a APSFS compete no mercado com as demais operadoras, podendo obter como receita não só as provenientes de arrendamento, uso do canal e de atracação, mas também receitas originárias, de exploração do patrimônio, devendo, por iniciativa de seu administrador, zelar pela efetiva arrecadação de verbas:

Art. 88. À Administração do Porto de São Francisco do Sul - APSFS compete:

I - executar a exploração comercial do Porto e complementarmente desenvolver atividades afins, conexas e acessórias, industriais, comerciais e de prestação de serviços;

IV - captar, em fontes internas ou externas, recursos a serem aplicados na execução de sua programação;

XVI - fiscalizar as operações portuárias, zelando para que os serviços se realizem com regularidade, eficiência, segurança e respeito ao meio ambiente;

 XXII - lavrar autos de infração e instaurar processos administrativos, aplicando as penalidades previstas em lei, ressalvados os aspectos legais de competência da União, de forma supletiva, para os fatos que serão investigados e julgados conjuntamente;

 XXV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos do serviço e as cláusulas do contrato de concessão do Porto e demais competências previstas na Lei federal nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993.

O Sr. Paulo César Côrtes Corsi, responsável pela administração da APSFS, negligenciou a observância das normas acima, possibilitando evasões de receitas patrimoniais.

Como bem sustentado pela área técnica, o fato de o dono da carga ter o direito de escolher em que local quer armazená-la, após atracar no porto, não torna a facilitação concedida pela APSFS à TESC razoável ou mesmo lícita.  Frisa-se, como já mencionado, que a existência da passagem (portão) não é prevista no contrato de arrendamento, sendo inadmissível a facilitação das atividades da TESC em relação aos demais competidores.

Vê-se, da análise dos autos, os fortes indícios de dano ao erário, decorrente do uso indevido de área não integrante de contrato de arrendamento, bem como do desvio de produtos e/ou facilitação das atividades da TESC, em detrimento dos demais prestadores de serviço e da própria APSFS.

Por todo o exposto, entende-se pela necessidade de esclarecimento quanto aos valores abstidos da receita pública, devido à prática desleal da empresa, que atuou de forma a deturpar o exercício das atividades que lhe foram concedidas pelo Poder Público.

Em razão do volume de dados envolvidos na análise e visando assegurar a celeridade deste feito, sugere-se o exame do presente apontamento em autos apartados de Tomada de Contas Especial, por meio do qual se procederá à melhor análise dos fatos, quantificação do dano e delimitação das responsabilidades.

Sugere-se, desde já, para a instrução do novo feito, o exame comparativo entre os dados de atracação das embarcações, já constantes dos autos, e demais documentos que permitam averiguar a quantidade de carga efetivamente entregue e armazenada na área arrendada à TESC e na área administrada diretamente pela APSFS, tais como documentação fiscal e alfandegária, além de registros contábeis de posse da TESC e da APSFS, datados como devem ser. Sugere-se, por fim, a realização de diligência à ANTAQ, para que esta preste informações e dados complementares à instrução do novo feito.

 

7.1. Das demais constatações não analisadas no feito, atinentes à atuação das operadoras no Porto de São Francisco

 

Convém ressaltar que grandes operadoras portuárias da região manm ou já mantiveram os mesmos administradores em seus quadros.

O Sr. Alberto Raposo de Oliveira, por exemplo, aparece no alto escalão da operadora em questão TESC, da Litoral Soluções em Comércio Exterior Ltda. e da WRC Operadores Portuários S.A (fls. 12, 19 e 21).

O mesmo ocorre com o Sr. Hélio Figueiredo Freire Filho, mandatário da TESC em período do ano 2006, administrador da Rocha Terminais Portuários e Logística S.A e vinculado à empresa WRC já mencionada (fls. 13, 19v e 28).

O Sr. Nelio Henriques Lima também consta na administração da WRC e da TESC em período que vai de 2013 a 2015 (fls. 15 e 19v).

O próprio representante da APSFS, Sr. Paulo César Côrtes Corsi, fez parte da administração da operadora TESC, em período de 2001 a 2006 (fl. 15v), o que justificaria eventuais vantagens ou facilitações existentes em benefício da TESC, conforme delineado no item antecedente.

Como observado pela Diretoria em um de seus primeiros relatórios[13]a movimentação de um grande percentual de cargas no porto público é realizada por empresas sob uma única administração.

O controle de preços de armazenamento e de clientes por parte de empresas operantes no local se torna uma prática facilitada, pela ausência de fiscalização quanto ao uso indevido de espaços não arrendados, ocasionando conflito de interesses, tal como pode estar ocorrendo com a TESC.

De acordo com o citado relatório, “o livre trânsito de mercadorias promove a vantagem competitiva a todo o grupo TESC/WRC/LITORAL/ROCHA em detrimento, no mínimo, das receitas de armazenagem da APSFS.

A gravidade dos fatos narrados demanda a remessa de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual, para que este órgão, no uso de suas prerrogativas, adote as medidas que considerar pertinentes.

Ademais, impõe-se, igualmente, a adequada apuração dos fatos em autos apartados de Tomada de Contas Especial, consoante exposto no tópico acima.

Sugere-se também, desde já, neste novo feito, a realização de citação dos envolvidos nos fatos narrados para se manifestarem quanto ao uso das vias de acesso fora dos respectivos Terminais, por parte das operadoras: TESC – Terminal Portuário Santa Catarina, Litoral Soluções em Comércio Exterior Ltda e WRC Operadores Portuários S.A.

Da mesma forma, deve-se averiguar o provável dano acarretado ao erário, em detrimento das receitas que deixaram de ser auferidas pela APSFS.

 

8. Desenvolvimento de sistema de informática por prolongado período e sem a sua conclusão

 

O Responsável alegou a ocorrência de problemas estruturais e financeiros para efetiva execução e conclusão do Contrato nº 16/2009, firmado com a empresa Marca Sistemas de Computação Ltda., que se seguiu dos contratos nº 18/2011 e 28/2012, e do termo aditivo deste último, 29/2012[14], reduzindo em 52,97% o preço global de execução: de R$ 4.642.100,00 para R$ 2.183.120,00. Todos foram precedidos de licitação, conforme se extrai dos próprios documentos acostados.

O objeto dos três contratos permanece basicamente o mesmo: “prestação de serviços técnicos especializados em tecnologia da informação para atualização tecnológica do Sistema Integrado de Gestão Portuária”. O pagamento ficou condicionado, nos dois primeiros acordos, à emissão de relatório descritivo dos módulos entregues, das atividades desenvolvidas e quantidade de serviço executado durante o mês, visando à conferência e liquidação dos serviços realizados e valores cobrados[15] e, no terceiro, à apresentação do Termo de Recebimento Provisório de cada módulo executado[16]. 

Quanto a valores, o primeiro ajuste, firmado em R$ 277.849,00, teve empenhadas notas no montante de R$ 229.059,00 e R$ 73.566,95, totalizando R$ 302.625,95; o segundo, estimado em R$ 516.140,70, teve empenhos de R$ 525.961,62 e R$ 12.185,65, somando R$ 538.147,27[17]; para o terceiro, até o momento da auditoria, havia sido empenhado R$ 770.159,20[18].

Não se tem notícia de que algum empenho foi cancelado por deficiências nos serviços prestados, ou mesmo em razão da falta de recursos ou problemas burocráticos organizacionais envolvendo autorizações e exigências, o que poderia justificar o atraso na conclusão do sistema de informática.

Em outras palavras, não se constatou por que os contratos terminam e se renovam sem que se constate uma efetiva evolução nos sistemas informatizados.

O software, por mais complexo que seja, ou está instalado e funciona, ou não, sendo ininteligível um sistema que se adquire por um valor integral e que se mostre apto a uso de forma apenas parcial.

A área técnica ressaltou a urgência de a Unidade elaborar um plano de ação para a sua área de informática, onde estabeleça prazos realísticos para a conclusão dos módulos do sistema de informática, pois embora a área de software esteja em constante evolução, não é razoável que o Porto invista elevados recursos neste sistema e não obtenha resultados deste investimento, pois acaba tendo que se valer de sistemas paralelos e paliativos.

No entanto, entendo que a fixação de prazo para que a Unidade demonstre as medidas adotadas para a efetiva implantação dos sistemas de informação não se mostra suficiente neste caso.

Conforme sustentado acima, não há notícias de cancelamento de quaisquer empenhos, sendo provável que a administração tenha efetuado o pagamento dos importes neles constantes. Ademais, os ajustes perduram desde 2011 e o software não está pronto para uso. Ao que consta dos autos, houve a contratação e, muito possivelmente, o pagamento dos valores pactuados, sem a contrapartida da empresa, qual seja, o fornecimento de software apto ao uso. 

Nos mesmos moldes delineados acima, entende-se cabível a instauração de autos apartados de Tomada de Contas Especial para análise do presente apontamento e chamamento da empresa responsável pelo desenvolvimento do software para se manifestar quanto à restrição, passível de imputação de débito. Sugere-se, desde já, a citação da empresa para apresentação de justificativas e comprovantes de quais sistemas/programas/tecnologias foram desenvolvidos e postos em utilização. Entende-se cabível, ainda, a citação do responsável para que se manifeste sobre a constante renovação dos contratos, sem que haja a conclusão do software.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:

1)        Por considerar irregular a execução dos Contratos 15/96, 16/09, 18/11 e 28/12, e do Convênio 17137/2009;

2)           Por aplicar multa ao Sr. Paulo César Côrtes Corsi, responsável pela Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS, devido à ausência de fiscalização da execução dos referidos contratos, e por:

2.1)  Prática em desacordo com as normas contábeis, NBC T 2.4, quanto ao estorno rotineiro de receitas advindas do SAT;

2.2) Falta de observância do prazo do Contrato 15/96 quando ao recebimento de caução;

2.3) Apuração de receita própria com base exclusivamente em informações de terceiros, vulnerabilizando a aplicação das Lei Complementares nº 101/00, arts. 11 e 13, e nº 381/07, art. 88, incisos XII e XXV;

2.4) Ausência de apuração efetiva das responsabilidades pelo pagamento de multas, despesas impróprias ao interesse público; e

2.5) Ausência de prestação de contas no Convênio nº 17137/2009, gerando bloqueio de repasses e prejuízo ao andamento das operações acordadas;

3) Determinar à Administração do Porto de São Francisco do Sul – APSFS, na pessoa de seu Presidente, que adote, no prazo a ser fixado pelo Tribunal, as seguintes providências:

3.1) Fechamento imediato da passagem livre interligando a área arrendada à empresa TESC e a área do porto administrada pela APSFS;

3.2) Elabore Plano de Ação para solucionar a questão do estorno do registro da receita advinda do SAT;

3.3) Elabore Plano de Ação que defina prazos para a efetiva utilização de cada módulo do sistema de informática em desenvolvimento;

3.4) Identifique os responsáveis pelo pagamento das multas devidas pela APSFS (item 5) e acione-os para que haja o ressarcimento ao erário;

3.5) Comprove o ressarcimento dos valores devidos pelo 10º BEC (item 6), em razão das inconsistências apontadas na prestação de contas referente ao Convênio 17137/2009;

4) Pela instauração de autos apartados de Tomada de Contas Especial, para que se apurem os prejuízos efetivamente causados, bem como os respectivos responsáveis, no tocante às irregularidades expostas nos itens 7 (e subitem 7.1) e 8 deste parecer.

5) Pela remessa de cópia dos autos ao Ministério Público Estadual, para que este órgão, no uso de suas prerrogativas, adote as medidas que considerar pertinentes, no tocante aos fatos averiguados no âmbito deste parecer, notadamente quanto aos itens 7 (e subitem 7.1) e 8.

6) Dar ciência ao responsável, Sr. Paulo César Côrtes Corsi.

Florianópolis, 07 de julho de 2015.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] Fls. 243 a 275

[2] Agência Nacional de Transportes Aquáticos

[3] Fl. 161v.

[4] Atraso na prestação de contas; Pagamento de juros, multa e correção monetária de despesas; Realização de despesas sem prévio empenho; Empenho e pagamento de despesas após a vigência do convênio; Despesas fora do objeto do convênio.

[5] 10º Batalhão de Engenharia de Construção , pertencente à União

[6] Fl. 198

[7] Fl. 66 e art. 4º, §2º, inciso I da Lei nº 8.630/93 - revogada. 

[8] Fl. 80

[9] Lei nº 12.815/13

[10] Fl. 68

[11] Agência Nacional de Transportes Aquaviários

[12] Item 33 “serviço adequado é o que satisfaz as condições de (...) regularidade: a prestação dos serviços nas condições estabelecidas neste contrato.

[13] Relatório DCE 554/2013

[14] Fls. 177 a 192

[15] C. 16/09 e 18/11 cl. 6ª §3º

[16] C. 28/2012 cl. 9ª §1º

[17] Fls. 173 e 174

[18] Fl. 172