Parecer no: |
|
MPC/31.716/2015 |
|
|
|
Processo nº: |
|
REP 10/00773741 |
|
|
|
Origem: |
|
Município de Nova Erechim |
|
|
|
Assunto: |
|
Irregularidades no repasse dos duodécimos ao legislativo
municipal |
Trata-se de Representação formulada às fls. 02-05
pelos Srs. Neudi Kaefer e Paulo Roberto Dallastra,
vereadores da Câmara Municipal de Nova Erechim, em
razão de suposta ilegalidade
consubstanciada no repasse a menor de duodécimos ao legislativo municipal.
Foram juntados documentos de
suporte às fls. 06-228.
A Diretoria de Controle dos Municípios emitiu Relatório
Técnico nº 4413/2010, às fls.
229-231, manifestando-se pelo conhecimento da
Representação e pela determinação das
providências necessárias à apuração dos fatos narrados.
O Ministério
Público de Contas acompanhou o entendimento exposto supra (fls. 233-234).
No mesmo sentido
fora o despacho do Relator, às fls. 235-236.
Foram acostados
documentos às fls. 238-273.
Após, a
Diretoria Técnica emitiu o Relatório nº 900/2011, às fls. 274-279, sugerindo:
1 – DETERMINAR
à Diretoria de Controle dos Municípios - DMU que proceda, nos termos do artigo
29, § 1º da Lei Complementar n.º 202/2000, à Audiência do Sr. Volmir Pirovano -
Prefeito Municipal, CPF 692.874.069-87, residente à Av. Francisco Losina, 139,
Centro, Nova Erechim – SC, CEP 89.865-000, para, no prazo de 30 (trinta) dias a
contar do recebimento desta:
1.1 – Apresentar
justificativas relativamente à restrição abaixo especificada, passível de
cominação de multa capitulada no art. 70, II, da Lei Complementar n.º 202/2000:
1.1.1 - Repasse de duodécimos a menor para o Poder
Legislativo, perfazendo um montante de R$ 74.194,59, e descumprimento do prazo
estabelecido para o repasse destes recursos financeiros, em desacordo com o art. 168, da Constituição Federal e art. 61
da Lei Orgânica Municipal, podendo caracterizar crime de responsabilidade
previsto no art. 29-A, § 2º, II e III, da CF/88. (item 2.1 deste
Relatório);
A audiência foi
determinada pelo Relator (fl. 279), tendo o responsável acostado justificativas
às fls. 282-313.
Prestados os
esclarecimentos, a Diretoria Técnica emitiu o Relatório nº 4249/2014 (fls. 317-323), ao final
do qual sugeriu:
1 - CONSIDERAR IRREGULAR, na forma do
artigo 36, § 2º, “a” da Lei Complementar n.º 202/2000, o ato abaixo
relacionado, aplicando ao Sr. Volmir Pirovano - Prefeito Municipal, CPF
692.874.069-87, residente à Av. Francisco Losina, 139, Centro, Nova Erechim –
SC, CEP 89.865-000, a multa prevista no inciso II do artigo 70, da Lei
Complementar n.º 202/2000, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da
publicação do acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas para
comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial,
observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n.º 202/2000:
1.1 - Repasse
de duodécimos a menor para o Poder Legislativo, perfazendo um montante de R$
74.194,59, e descumprimento do prazo estabelecido para o repasse dos recursos
financeiros, em desacordo com o art.
29-A, § 2º, incisos II e III e art. 168, da Constituição Federal e art. 61,
inciso XVII, da Lei Orgânica Municipal. (item 2.1 deste
Relatório);
É o relatório.
A fiscalização contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está
inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos
constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal,
art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar
Estadual nº. 202/2000, arts. 22, 25 e 26, da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8°
c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).
1.
Do repasse a
menor, e em atraso, dos duodécimos ao legislativo municipal
O apontamento restritivo tratado neste feito refere-se ao repasse a
menor, e em atraso, de recursos financeiros à Câmara de Vereadores de Nova Erechim, em violação
ao estabelecido no art. 168 da CRFB/88[1],
bem como no art. 61, XVII da Lei Orgânica Municipal[2].
Quanto ao
atraso nos repasses dos duodécimos, este restou inconteste, tendo sido
devidamente analisado pela Diretoria e não refutado pelo responsável em suas
manifestações defensivas. Mantém-se o apontamento neste ponto.
Cabe
analisar, portanto, a procedência ou não da matéria atinente ao repasse realizado
a menor.
Por meio da
Lei Orçamentária nº 1.545/2009 (fls. 09-12v), as despesas do Poder Legislativo
foram fixadas no valor de R$ 560.000,00 (art. 2º), dentro do teto
constitucional previsto pelo art. 29-A, I da CRFB/88[3]
(7% sobre o montante de receita realizada no exercício de 2009).
A princípio,
portanto, não existiriam razões para a supressão parcial do repasse, visto que
o limite constitucional foi respeitado.
No entanto,
ao que consta dos autos, o Prefeito Municipal vem desrespeitando o Cronograma
de Repasse (fl. 28-32) – aprovado pelo Poder Legislativo por meio do projeto de
Resolução nº 5/2010 (fls. 31-32) – transferindo valores inferiores ao fixado e
em atraso ao prazo previsto.
Em sua
defesa, o responsável sustentou que o valor devido a título de repasse à Câmara
depende da análise do comportamento da receita do ano corrente à transferência.
Em virtude de a arrecadação ter sido inferior ao estimado, o repasse também o
fora, respeitadas as devidas proporções.
Cabem algumas
ponderações acerca dos argumentos levantados pelo Responsável, notadamente no
que concerne à arrecadação a menor do que a previsão inicialmente estipulada, o
que pode vir a influenciar o deslinde do feito.
De início,
verifica-se que o repasse a ser efetuado ao Poder Legislativo Municipal –
duodécimo – foi fixado de modo claro na Lei Orçamentária nº 1.545/2009, tendo
como base (consoante previsão constitucional) o conjunto de receitas
efetivamente arrecadadas no exercício anterior.
Nesse
sentido, esclarece o Prejulgado nº 1143:
1. Os
valores relativos aos percentuais a serem repassados ao Poder Legislativo
Municipal não podem incidir sobre a arrecadação mensal do corrente exercício,
pois o art. 29-A, caput, da Constituição Federal determina que a base de
cálculo seja a receita arrecadada no exercício anterior. Os recursos a
serem repassados à Câmara poderão corresponder ao duodécimo da dotação
orçamentária ou o valor da quota estabelecida em programação financeira de que
trata o art. 8º da Lei Complementar nº 101/00, que ao final do exercício
corresponda à dotação acrescida dos créditos adicionais atribuídos ao Órgão.
No referido
Município foi estabelecido, portanto, um valor fixo (com base na receita
efetivamente arrecadada no exercício anterior), e não variável, tal como defende
o responsável. Nessa última hipótese, entendo que seria cabível a alteração do
repasse mensal conforme a concretização (ou não) das receitas previstas no
transcurso do exercício financeiro em que se efetuam as transferências.
No entanto,
não foi essa a opção adotada pelo Poder Municipal naquela ocasião.
O Tribunal já
se manifestou a respeito em outras oportunidades:
Prejulgado nº 1329
[...]
3. O Chefe do
Poder Executivo deve determinar o repasse ao Poder Legislativo dos recursos
financeiros correspondentes à dotação prevista no orçamento anual e em
eventuais créditos adicionais, transferidos conforme a Programação Financeira e
Cronograma de Execução Mensal de Desembolso prevista no art. 8º da Lei
Complementar nº 101/00, sem extrapolar as dotações anuais.
4. Pode caracterizar crime de responsabilidade do
Prefeito Municipal (art. 29-A, § 3º, III, da Constituição Federal), o repasse
ao Poder Legislativo de recursos financeiros inferiores ao previsto na Lei
Orçamentária, salvo se as transferências resultarem em extrapolamento do
percentual indicado no art. 29-A, caput, sobre a efetiva arrecadação tributária
e de transferências constitucionais apurada no exercício anterior, quando o
Prefeito deve determinar a redução do repasse para adequação ao limite constitucional,
caso contrário também poderá incidir em crime de responsabilidade (art. 29-A, §
3º, I, da Constituição Federal). Em caso de eventual conflito de normas,
prevalece a regra da limitação (art. 29-A, § 3º, I, da Constituição Federal).
5. Os percentuais
previstos no art. 29-A, caput, da Constituição Federal, introduzido pela Emenda
Constitucional nº 25/00, representam apenas o limite máximo de despesas do
Poder Legislativo, não significando que a Câmara tenha direito a receitas
correspondentes ao respectivo percentual. [...]
Prejulgado nº 1274
[...]
6. Os percentuais previstos no art. 29-A,
caput, da Constituição Federal, introduzido pela Emenda Constitucional nº
25/2000, representam apenas o limite máximo de despesas do Poder Legislativo,
não significando que a Câmara de Vereadores tenha direito a receitas
correspondentes ao respectivo percentual.
7. A
forma mais adequada de estabelecimento dos recursos destinados ao Poder
Legislativo é a fixação de dotação no Orçamento Anual, observadas as
disposições da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e atendidos a todos os
limites constitucionais ou determinados pela legislação aplicável, não podendo
suplantar os percentuais previstos no art. 29-A, caput, da Constituição
Federal.
O responsável
tem razão ao afirmar que o percentual previsto no dispositivo citado constitui
apenas o teto de despesas da Câmara, não possuindo esta, necessariamente,
direito ao montante correspondente. No entanto, o que se discute aqui não é o
percentual máximo previsto na Constituição, mas justamente o valor fixado no
orçamento, ao qual tem direito a Câmara. E este valor foi desrespeitado.
Apesar de o
valor restar devidamente fixado na Lei Orçamentária nº 1.545/2009, entendo que
as razões de defesa apresentadas pelo responsável não merecem ser ignoradas.
Parcela da
argumentação trazida à baila não encontra guarida. No entanto, não se pode
negar que a arrecadação a menor, dependendo da variação em que ocorra, pode vir
a influenciar no montante a ser repassado à Câmara (bem como a qualquer outra
Unidade Gestora). Mas entendo que tal não deva ocorrer de modo automático.
Passa-se à
melhor análise dos fatos.
O responsável
utiliza como tese principal de defesa a necessidade de realização do repasse de
modo proporcional à receita arrecadada no exercício corrente, embasando-se,
ainda, no teor do Prejulgado nº 1212.
Da leitura de
seu conteúdo, vê-se que este esclarece restar autorizado o repasse nesses
moldes somente se houver previsão dessa forma de transferência na LDO
municipal, não sendo este o caso dos autos, conforme já explanado.
Nesse mesmo
sentido, o Prejulgado nº 1642:
4. Os
percentuais previstos no art. 29-A, caput, da Constituição da República,
introduzido pela Emenda Constitucional nº 25, representam apenas o limite
máximo de despesas do Poder Legislativo, não significando que a Câmara tenha
direito a receitas correspondentes ao respectivo percentual. A forma mais adequada de estabelecimento
dos recursos destinados ao Poder Legislativo é a fixação de dotação no
Orçamento Anual, observadas as disposições da Lei de Diretrizes Orçamentárias e
atendidos a todos os limites constitucionais ou determinados pela legislação
aplicável, não podendo suplantar os percentuais previstos no art. 29-A, caput,
da Carta Magna.
Refoge às regras basilares de orçamentação
a fixação dos recursos para o Poder Legislativo com base em percentual da
receita municipal. Todavia, se a LDO estabelecer repasse em percentual, bem
como as receitas que integrarão a base de cálculo para as transferências, os
repasses à Câmara terão por base a receita efetivamente arrecadada pelo
Município.
É dever
do Chefe do Poder Executivo determinar o repasse mensal ao Poder Legislativo
dos recursos financeiros correspondentes às dotações orçamentárias
estabelecidas na Lei do Orçamento Anual, que deve estar em consonância com as
condições previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias.
No entanto, a
não fixação da despesa de modo variável não impede que, em alguns casos, se
proceda ao repasse a menor do valor de duodécimos estatuído na Lei
Orçamentária.
A Lei de
Responsabilidade Fiscal aponta as diretrizes a serem seguidas caso haja a
necessidade de se proceder a um freio nos gastos públicos. Nestes termos,
dispõem os arts. 8º, 9º e do referido Diploma:
Art. 8o Até
trinta dias após a publicação dos orçamentos, nos termos em que dispuser a lei
de diretrizes orçamentárias e observado o disposto na alínea c do inciso
I do art. 4o, o
Poder Executivo estabelecerá a programação financeira e o cronograma de
execução mensal de desembolso.
Parágrafo único. Os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso.
Art. 9o Se verificado, ao final de um
bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das
metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais,
os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes
necessários, nos trinta dias subseqüentes, limitação de empenho e movimentação
financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.
§ 1o No caso de restabelecimento da
receita prevista, ainda que parcial, a recomposição das dotações cujos empenhos
foram limitados dar-se-á de forma proporcional às reduções efetivadas.
§ 2o Não serão objeto de limitação as
despesas que constituam obrigações constitucionais e legais do ente, inclusive
aquelas destinadas ao pagamento do serviço da dívida, e as ressalvadas pela lei
de diretrizes orçamentárias.
§ 3o No caso
de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público não promoverem a
limitação no prazo estabelecido no caput, é o
Poder Executivo autorizado a limitar os valores financeiros segundo os
critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.
§ 4o Até o
final dos meses de maio, setembro e fevereiro, o Poder Executivo demonstrará e
avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre, em audiência
pública na comissão referida no §
1o do
art. 166 da Constituição ou
equivalente nas Casas Legislativas estaduais e municipais.
§ 5o No prazo
de noventa dias após o encerramento de cada semestre, o Banco Central do Brasil
apresentará, em reunião conjunta das comissões temáticas pertinentes do
Congresso Nacional, avaliação do cumprimento dos objetivos e metas das
políticas monetária, creditícia e cambial, evidenciando o impacto e o custo
fiscal de suas operações e os resultados demonstrados nos balanços.
Convém também
transcrever também o disposto no art. 47 da Lei nº 4.320/64:
Art. 47. Imediatamente após a
promulgação da Lei de Orçamento e com base nos limites nela fixados, o Poder
Executivo aprovará um quadro de cotas trimestrais da despesa que cada unidade
orçamentária fica autorizada a utilizar.
Art. 48 A
fixação das cotas a que se refere o artigo anterior atenderá aos seguintes
objetivos:
a)
assegurar às unidades orçamentárias, em tempo útil a soma de recursos
necessários e suficientes a melhor execução do seu programa anual de trabalho;
b)
manter, durante o exercício, na medida do possível o equilíbrio entre a receita
arrecadada e a despesa realizada, de modo a reduzir ao mínimo eventuais
insuficiências de tesouraria.
Art. 50.
As cotas trimestrais poderão ser alteradas durante o exercício, observados o
limite da dotação e o comportamento da execução orçamentária.
Verifica-se,
assim, que ao Prefeito Municipal não é permitido simplesmente deixar de proceder
ao repasse na data prevista ou no montante fixado, não lhe sendo vedado,
igualmente, utilizar de tal expediente caso haja necessidade de readequar as
despesas às receitas concretamente verificadas no exercício corrente.
Deve,
portanto, haver justificativas plausíveis (e prévias) acerca da impossibilidade
do repasse do numerário no valor inicialmente fixado. O Executivo Municipal
poderá apresentá-las e proceder às medidas necessárias à adequação da despesa
ao comportamento da receita, mas não realizar a supressão automática dos
duodécimos a serem repassados ao Legislativo.
Entendo que
deva ser esse o sentido extraído, consoante julgado proferido pelo Superior
Tribunal de Justiça:
CONSTITUCIONAL
E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. REPASSE DE
DOTAÇÕES ORÇAMENTÁRIAS PELO PODER EXECUTIVO AO LEGISLATIVO. BLOQUEIO.
IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
1.
Mandado de segurança impetrado contra v. Acórdão que denegou segurança
objetivando a liberação de dotação orçamentária, ao entendimento de que o
repasse do duodécimo do Poder Legislativo pelo Executivo deve ser proporcional
à receita efetivamente arrecadada, não podendo ultrapassar esse limite, sob
pena de comprometer a disponibilidade financeira do município.
2. O repasse das dotações orçamentárias pelo
Poder Executivo aos demais Poderes, nos termos previstos no art. 168, da Carta
Magna de 1988, não pode ficar à mercê da vontade do Chefe do Executivo, sob
pena de se por em risco a independência desses Poderes, garantia inerente ao
Estado de Direito.
3. Tal repasse, feito pelo Executivo, deve
observar as previsões constantes na Lei Orçamentária Anual, a fim de garantir a
independência entre os poderes, impedindo eventual abuso de poder por parte do
Chefe do Executivo.
4. O
quantum a ser efetivado deve ser proporcional à receita do ente público, até
porque não se pode repassar mais do que concretamente foi arrecadado.
5. In
casu, inexistem justificativas plausíveis por parte da autoridade coatora -
Prefeito municipal, que motivem a insuficiente arrecadação municipal, não
legitimando, desse modo, a diminuição do repasse dos duodécimos devidos à Casa
Legislativa que deveriam corresponder, dessa forma, às previsões orçamentárias.[4]
Extrai-se do corpo do voto do Relator:
Como sabido, é obrigatório o repasse pelo Executivo ao
Legislativo de dotações orçamentárias previstas em lei, compreendidos os
créditos suplementares e especiais, conforme previsto no art. 168 da Constituição Federal, devendo tal repasse
obedecer a sistema programado de despesas, mediante parcelamento anual,
denominado duodécimos.
Tal repasse de verbas orçamentárias pelo
Executivo, deve observar as previsões constantes na Lei Orçamentária anual, a
fim de garantir a independência entre os poderes, impedindo eventual abuso de
poder por parte do chefe do executivo.
Por outro
lado, impende ressaltar que o quantum a ser efetivado deve ser proporcional à
receita do ente público, até porque não se pode repassar mais do que
concretamente foi arrecadado.
Assim, em tese, sempre que a arrecadação
corresponder à previsão orçamentária, deve-se observar os limites impostos pela
lei orçamentária anual. Na hipótese contrária, cabe ao Chefe do Poder
Executivo, apresentar elementos que justifiquem a não observância das dotações
previstas em lei.
O Supremo
Tribunal Federal também proferiu entendimento nessa mesma linha:
O legislador constituinte, dando consequência a sua
clara opção política - verdadeira decisão fundamental concernente a
independência da Magistratura - instituiu, no art. 168 de nossa Carta Política,
uma típica garantia instrumental, assecuratória da autonomia financeira do
Poder Judiciário. A norma inscrita no art. 168 da Constituição reveste-se
de caráter tutelar, concebida que foi para impedir o Executivo de causar, em
desfavor do Judiciário, do Legislativo e do Ministério Público, um estado de
subordinação financeira que comprometesse, pela gestão arbitraria do orçamento
- ou, até mesmo, pela injusta recusa de liberar os recursos nele consignados -,
a própria independência político-jurídica daquelas Instituições. Essa
prerrogativa de ordem jurídico-institucional, criada, de modo inovador, pela
Constituição de 1988, pertence, exclusivamente, aos órgãos estatais para os
quais foi deferida. O legislador constituinte, na realidade, não a
partilhou e nem a estendeu aos membros e servidores integrantes dessas
instituições. O exercício desse direito e, portanto, intransferível. Só poderá
exercê-lo - dispondo, inclusive, de pretensão e de ação - aquele a quem se
outorgou, no plano jurídico-material, a titularidade exclusiva do seu exercício
[...][5]
Não consta
das manifestações trazidas aos autos a adoção de qualquer medida destinada a
justificar o repasse a menor ao Poder Legislativo, nem a comprovação das
receitas de fato arrecadadas durante o exercício financeiro, ou a forma como se
estabeleceu o controle de gastos no âmbito das demais Unidades.
Concluo,
assim, que há a possibilidade, em alguns casos, de o Poder Executivo proceder
ao repasse a menor dos duodécimos ao Poder Legislativo, desde que devidamente
justificados (de modo prévio) os motivos para a redução do numerário
transferido (adotando-se como base as disposições constantes da Lei nº 101/2000
e Lei nº 4.320/1964), bem como esclarecidas as razões de o abatimento se dar na
proporção em que fora realizado, e atingir o montante constitucional devido à
Câmara.
No caso dos
autos, o Gestor procedeu à redução dos duodécimos sem apresentar quaisquer
razões, efetuando automaticamente a minoração dos valores repassados (em atraso,
inclusive), sem comprovação do auferimento de receitas a menor pela
Municipalidade.
Entendo, por
tais razões, que deve ser mantido o apontamento restritivo.
Ante o exposto, o
Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art.
108, inciso I e II, da Lei Complementar n.º 202/2000, manifesta-se:
1)
Pela aplicação
de multa ao Sr. Volmir Pirovano, Prefeito Municipal de Nova Erechim, nos
termos do art. 70, II da Lei Complementar n.º 202/2000, em razão da seguinte
irregularidade:
1.1) Repasse de duodécimos a
menor para o Poder Legislativo, perfazendo um montante de R$ 74.194,59, e descumprimento do prazo estabelecido para o repasse dos recursos
financeiros, em desacordo com o art. 29-A, § 2º, incisos II e III e art. 168 da
Constituição Federal, bem como ao art. 61, inciso XVII, da Lei Orgânica
Municipal.
2) Dar ciência da decisão ao
Representado, bem como aos Representantes.
Florianópolis,
08
de julho de 2015.
Diogo Roberto Ringenberg
Procurador
do Ministério
Público
de Contas
[1] Art. 168. Os recursos correspondentes às dotações
orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados
aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da
Defensoria Pública, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, em
duodécimos, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9º
[2] Art. 61. Compete ao Prefeito, entre outras atribuições:
[...]
XVII – remeter à Câmara Municipal, até o dia 20 de cada
mês, as parcelas das dotações orçamentárias que devem ser despendidas por
duodécimos.
[3] Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo
Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com
inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao
somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art.
153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior:
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 25, de 2000)
I - 7% (sete por cento) para Municípios com população de
até 100.000 (cem mil) habitantes;
[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RMS 10181/SE. Rel.
Min. José Delgado. J. em: 14/11/2000
[5] BRASIL. Supremo
Tribunal Federal. MS 21291
AgR-QO/DF. Rel. Min. Celso de Melo. J. em 12/04/1991.