Parecer nº:

MPC/36.266/2015

Processo nº:

RLA 13/00402668

Origem:

Câmara Municipal de Ibirama

Assunto:

Atos de pessoal no período de 01/01/2012 a 14/06/2013

 

 

 

Trata-se de Auditoria in loco com vistas à verificação da legalidade dos atos relacionados a: comissionados, cessão de servidores, cargos efetivos, controle de frequência e controle interno, ocorridos a partir do exercício de 2012, na Câmara Municipal de Ibirama.

Por meio do Relatório nº 3548/2013, foi sugerida a audiência do Sr. José Vanderlei da Silva, Presidente da Câmara Municipal de 01/01/2013 até a data da auditoria, 10/06/2013, para apresentar justificativas quanto: à falta de definição das atribuições dos cargos efetivos e comissionados; à atribuição de funções de cargo efetivo a servidor ocupante de cargo comissionado; ao estabelecimento de jornada de trabalho especial a referido cargo comissionado; à manutenção de servidor cedido pela Prefeitura; à omissão de controle formal da jornada de trabalho dos servidores efetivos e comissionados; à omissão de supervisão das atividades do Departamento de Recursos Humanos, que não avalia periodicamente o desempenho dos servidores em estágio probatório.

Houve resposta às fls. 52 a 82.

Em Relatório Conclusivo, sugeriu-se:

4.1. CONHECER do Relatório de Auditoria n. 3707/2015, realizada na Câmara Municipal de Ibirama,  com o intuito de verificar a legalidade dos atos de pessoal relativos a cargos comissionados e efetivos, controle interno, servidores cedidos, controle de frequência e controle interno, ocorridos no período de 01/01/2012 a 01/06/2013.

4.2. CONSIDERAR IRREGULARES, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar nº 202/2000, os fatos a seguir relacionados:

4.2.1. Nomear por meio da Portaria n. 98/13, de 05/02/2013, servidor para o cargo comissionado de Assessor Jurídico, com atribuições inerentes às funções permanentes da Câmara Municipal, em desvirtuamento aos pressupostos de direção, chefia ou assessoramento, em descumprimento ao previsto no art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal (item 2.2 deste relatório);

4.2.2. Manter em vigor o recebimento de 01 (um) servidor oriundo da Prefeitura Municipal de Ibirama para trabalhar na Câmara Municipal de Ibirama, em desconformidade com os artigos 116, § 1º, VI, da Lei Federal n. 8.666/93, 62 da Lei Complementar nº 101/00, art. 156 da Lei Complementar Municipal 67/2007, bem como ao art. 37, II, da Constituição Federal ao Prejulgado n. 1009 desta Corte de Contas (item 2.4 deste relatório);

4.2.3. Estabelecer por meio da Portaria n. 102/13, de 01/03/2013, procedimento especial para jornada de trabalho do cargo comissionado de Assessor Jurídico, em desacordo ao art. 37, caput, da Constituição Federal e art. 33 da Lei Complementar 67/2007 (item 2.3 deste relatório);

4.2.4. Omitir-se na supervisão das atividades do Departamento de Recursos Humanos no tocante à não realização de avaliação periódica de desempenho dos servidores se encontram em estágio probatório, em afronta aos princípios da legalidade e eficiência previstos no art. 37, caput e art. 41, § 4º, da Constituição Federal e  art. 24 e 25  da Lei Complementar nº  67/2007  (item 2.6 deste relatório);

4.3. APLICAR MULTA:

4.3.1 ao Sr. . José Vanderlei da Silva, CPF nº. 664.853.399-49, Presidente da Câmara Municipal de Ibirama de 01/01/2013 até 14/06/2013 (data da auditoria), na forma do disposto no art. 70, inciso II, da Lei Complementar n.º 202/2000, e art. 109, II, do Regimento Interno fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do acórdão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas, para comprovar a este Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos art. 43, inciso II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000, pelas irregularidades explicitadas nos itens 4.2.1 a 4.2.4, da conclusão deste Relatório.

4.4. DETERMINAR a Câmara Municipal de Ibirama que:

4.4.1 - no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, comprove a este Tribunal de Contas a alteração de seu quadro funcional, pugnando pela criação e/ou provimento de cargo efetivo vinculado às atividades jurídicas, e a consequente extinção do cargo comissionado de Assessor Jurídico, reservando aos servidores comissionados as atribuições exclusivas de direção, chefia e assessoramento, de acordo com o previsto no art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal e no Prejulgado 1911 deste Tribunal de Contas (item 2.2 deste relatório). 

4.4.2. no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, comprove a este Tribunal de Contas a adoção das providências necessárias visando regularizar a situação dos serviços contábeis na Câmara, definindo a estrutura a ser implantada para atender o volume e a demanda dos seus serviços, através da realização de concurso público, ou a atribuição da responsabilidade pelos serviços contábeis ao Contador da Prefeitura ou outro servidor efetivo do quadro de pessoal dos Poderes Executivo, Legislativo, ou da administração indireta com formação em contabilidade, mediante a concessão de gratificação criada por lei municipal (item 2.4 deste relatório). 

4.4.3. no prazo de 30 (trinta) dias, comprove a este Tribunal de Contas a adoção de providências com vistas a assegurar rigor no controle de frequência de seus servidores efetivos e comissionados, de maneira que fiquem efetivamente registrados em cada período trabalhado os horários de entrada e saída, em obediência aos princípios da eficiência e moralidade previstos no art. 37 da Constituição Federal (item 2.5 deste relatório). 

4.4.4. Encaminhe a este Tribunal de Contas, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da decisão, relatório circunstanciado das medidas efetivamente adotadas quanto ao item 4.4 descrito acima, em observância ao artigo 45 da Lei Complementar Estadual nº. 202/2000 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas).

4.5. DETERMINAR à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP que monitore o cumprimento das determinações expedidas nesta decisão, mediante diligências e/ou inspeções in loco e, ao final dos prazos nela fixados, se manifeste pelo arquivamento dos autos quando cumprida a decisão ou pela autuação de processo de monitoramento específico, se for o caso, quando verificado o não cumprimento da decisão, submetendo os autos ao Relator para que decida quanto às medidas a serem adotadas.

4.6. RECOMENDAR  à Câmara Municipal de Ibirama:

4.6.1. Quando da realização de cessão de servidores observe o disposto no art. 116, § 1º, VI da Lei Federal n. 8.666/93, art. 62 da Lei Complementar n. 101/00, art. 156 da Lei Complementar Municipal n. 67/2007, art. 2º, §1º e art. 3º, caput, e §§ 1º e 2º da Lei Federal n. 6.999/1982, bem como ao art. 37, II da Constituição Federal (item 2.4. deste relatório);

4.6.2. Tenha um sistema de Avaliação Especial de Desempenho durante o Estágio Probatório, em especial quando houver servidores em estágio probatório, em conformidade com os princípios da legalidade e eficiência previstos no art. 37, caput e art. 41, § 4º, da Constituição Federal e art. 24 e 25 da Lei Complementar n. 67/2007 (item 2.6 deste Relatório);

4.6.3. Na criação de cargos de provimento efetivo ou comissionados, estabeleça as respectivas atribuições dos cargos, em consonância com o disposto no art. 37, caput, e incisos I e V da Constituição Federal, e art. 3º da Lei Complementar Municipal n. 67/2007(item 2.1 deste Relatório).

4.7. DAR CIÊNCIA da competente decisão plenária ao responsável e à Câmara Municipal de Ibirama.

 

É o relatório.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições do Tribunal de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (art. 31 da Constituição Federal, art. 113 da Constituição Estadual, art. 1º, inciso III, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, arts. 22, 25 e 26 da Resolução TC nº. 16/1994 e art. 8° c/c art. 6° da Resolução TC nº. 6/2001).

 

1. Ausência de definição de atribuições de cargos de provimento efetivo e em comissão

 

Constam, às fls. 15, 19 e 20, os conjuntos de servidores que exercem função na Câmara Municipal de Ibirama, sendo três comissionados, cinco efetivos e um cedido pela Prefeitura.

Do que se depreende dos autos, não havia, até setembro de 2013 (quando foi editada a Lei Complementar Municipal nº 124/2013), definição expressa das atribuições dos cargos ocupados pelos servidores, salvo com relação ao cargo de Controlador Geral, cujas atribuições foram delimitadas pela Lei Complementar Municipal nº 52/2006 e pelo Decreto Legislativo nº 161/2009[1].

Em resposta, o Responsável alegou que a descrição dos cargos efetivos – agente legislativo, agente técnico legislativo, recepcionista e auxiliar administrativo – se deu no edital do concurso público correspondente, nº 01/2010, Anexo I, fl. 66.

Entende-se que as atribuições dos cargos públicos devem ser previamente estabelecidas em lei, de modo a embasar futuro edital de concurso público para preenchimento das vagas, não bastando a descrição das atividades desempenhadas apenas no instrumento convocatório.

Ademais, a justificativa, mesmo que fosse aceita, sanaria apenas o apontamento relativo aos cargos efetivos.

O advento da Lei serviu para regularizar a situação a partir de sua vigência, mas não serve para sanar a restrição dos atos pretéritos.

Desta forma, como as funções inerentes aos cargos só foram definidas após sua efetiva ocupação pelos servidores, resta comprovada a ocorrência da irregularidade, que perdurou até a edição da Lei Complementar Municipal nº 124/2013.

Portanto, discorda-se do posicionamento adotado pela área técnica neste ponto e opina-se pela cominação de multa ao responsável pela irregularidade averiguada durante a Auditoria.

 

 

2. Servidor ocupante de cargo comissionado de Assessor Jurídico com atribuições inerentes às funções permanentes e existência de procedimento especial para jornada de trabalho do respectivo cargo

 

Constatou-se, às fls. 26 e 27, que existe somente um cargo relacionado a ‘atividades jurídicas’ no quadro da Câmara Municipal de Ibirama, de assessor jurídico, que é ocupado por funcionário comissionado.

Diante da ausência de outros funcionários que exerçam atividades relacionadas à área jurídica, entende-se pela não caracterização dos atributos de “chefia, direção e assessoramento” no que tange ao cargo de assessor jurídico, sendo que seu exercício está atrelado à própria atividade fim da Câmara, inerente às atividades técnicas desempenhadas pela unidade.

Acompanha-se, neste ponto, a conclusão emanada pela área técnica, uma vez que o cargo de comissão deve restringir-se aos casos em que há o desempenho das atribuições de chefia, direção e assessoramento, o que não restou evidenciado no caso.

Ainda com relação a este cargo, a Portaria nº 102/13 fixou em 20h semanais a jornada do assessor jurídico[2] (posteriormente revogada pela Portaria 105/13).

A Lei Complementar Municipal nº 82/10, que dispõe sobre a estrutura e quadro de pessoal da Câmara, prevê uma jornada de trabalho máxima de 40h semanais e permite que os servidores comissionados tenham sua jornada fixada pelo Presidente da Câmara, de acordo com a necessidade do serviço público:

 

Art. 14. O servidor do Poder Legislativo fica sujeito a jornada de trabalho ao máximo de 40 (quarenta) horas semanais, observada a carga horária respectiva aos cargos constantes dos anexos II e III, desta Lei Complementar.

§ 1º. O servidor nomeado para cargo em comissão, poderá ter sua jornada de trabalho fixada pelo Presidente da Câmara, correspondente às atividades desenvolvidas e de acordo com a necessidade do serviço público, sem prejuízo ou redução de sua remuneração.

 

A área técnica entendeu que o dispositivo não poderia se aplicar à Advocacia Pública, devido à proibição expressa na Lei Federal nº 9527/97[3], que dispõe:

 

Art. 4º As disposições constantes do Capítulo V, Título I, da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, não se aplicam à Administração Pública direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como às autarquias, às fundações instituídas pelo Poder Público, às empresas públicas e às sociedades de economia mista.

 

A Portaria então vigente, que fixou a jornada do assessor em 20h semanais, de fato, baseou sua fundamentação no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei nº 8.906/94 – que estabelece:

 

Art. 20. A jornada de trabalho do advogado empregado, no exercício da profissão, não poderá exceder a duração diária de quatro horas contínuas e a de vinte horas semanais, salvo acordo ou convenção coletiva ou em caso de dedicação exclusiva.

§ 1º Para efeitos deste artigo, considera-se como período de trabalho o tempo em que o advogado estiver à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, no seu escritório ou em atividades externas, sendo-lhe reembolsadas as despesas feitas com transporte, hospedagem e alimentação.

 

Em razão do exposto, acompanha-se o entendimento exarado pela área técnica e opina-se também pela manutenção deste apontamento restritivo.

 

 

3. Recebimento de servidor cedido por prazo indeterminado, sem existência de termo de convênio, com ônus para a Prefeitura e sem previsão de ressarcimento por parte do cessionário

 

Às fls. 20 e 21, consta que no quadro da Câmara há um servidor cedido pela Prefeitura Municipal, por tempo indeterminado, desde 02/03/1998, para exercer a função de contador.

Apesar de não haver servidores que desempenhem funções de contabilidade no órgão, entende-se que obstinar a situação desde 1998, sem justificativa plausível, caracteriza prática inadequada e desarrazoada.

Por se tratar de função inerente e permanente à sua manutenção, acompanha-se a área técnica no sentido da necessidade de prover o cargo por meio de concurso público ou, se houver reduzida demanda de serviços contábeis, atribuir referido encargo a servidor efetivo do quadro de pessoal dos Poderes Executivo, Legislativo ou da Administração Indireta, mediante concessão de gratificação criada por lei municipal.

Por todo o exposto, mantém-se o apontamento restritivo.

 

4. Ausência de controle formal da jornada de trabalho dos servidores ocupantes de cargo efetivo e comissionados da Câmara Municipal

 

A Câmara Municipal não forneceu cópia do controle de frequência dos servidores efetivos e comissionados por não ter implementado nenhum sistema de acompanhamento da jornada[4].

Sem controle do efetivo desempenho da função pública exercida por cada servidor, resta prejudicado o princípio da eficiência na Administração (art. 37, caput, CRFB/88), assim como a verificação da legitimidade da contraprestação ante a ausência de controle do trabalho despendido (art. 63 da Lei nº 4320/64).

Deve haver o acompanhamento e registro da frequência dos servidores, independentemente da modalidade de controle adotada, de forma a possibilitar a verificação do cumprimento de sua jornada de trabalho.

Após a inspeção da Corte da Contas, o Responsável buscou adotar providências no sentido de acompanhar o registro da jornada dos servidores.

No entanto, tal não sana a ocorrência da irregularidade até então praticada, devendo ser mantido o presente apontamento.

 

5. Ausência de avaliação especial de desempenho durante o Estágio Probatório

 

A Constituição Federal estabelece que é obrigatória a avaliação especial de desempenho, por comissão instituída para essa finalidade, como condição para adquirir estabilidade no serviço público, nos termos de seu art. 41, § 4º.

A Lei Complementar Municipal nº 67/07 determina que a comissão de avaliação será composta por servidores efetivos e estáveis, indicados pela Secretaria de Administração[5].

Em defesa, o Responsável informou que não existem servidores que atendam ao critério estabelecido pela Lei Municipal, já que seus servidores concursados foram admitidos a partir do final de 2010 (fl. 19).

Não foi apresentada, no entanto, nenhuma providência no sentido de se proceder à referida avaliação, exigida constitucionalmente como condição para estabilidade no serviço público.

É necessário que se providencie a adoção de medidas adequadas no intuito de observar as normas constitucionais, ainda que por meio de acordos de cooperação com o Poder Executivo ou com a Administração Indireta.

Segue-se entendimento da área técnica quanto à permanência do apontamento restritivo.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se por acompanhar parcialmente o Relatório nº 3707/2015, divergindo quanto ao afastamento da:

1)              irregularidade concernente à ausência de definição de atribuições dos cargos efetivos e comissionados da Câmara Municipal de Ibirama, conforme exposto no item 1 deste Parecer, devendo ser mantido o apontamento restritivo;

2)              irregularidade concernente à ausência de controle formal da jornada de trabalho dos servidores ocupantes de cargos efetivos e comissionados da Câmara Municipal, conforme exposto no item 4 deste Parecer, devendo ser mantido o apontamento restritivo;

3)              Dar ciência da Decisão aos interessados.

Florianópolis, 12 de agosto de 2015.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 



[1] Fls. 29, 37 e 68-74.

[2] Fl. 17-18

[3] Ementa “Altera dispositivos das Leis nºs 8.112, de 11 de dezembro de 1990, 8.460, de 17 de setembro de 1992, e 2.180, de 5 de fevereiro de 1954, e dá outras providências”

[4] Fl. 22

[5] Art. 25 § 1º, fl. 60