PARECER nº:

MPTC/36652/2015

PROCESSO nº:

RLA 14/00420080    

ORIGEM:

Câmara Municipal de Florianópolis

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Referida auditoria objetiva verificar a regularidade no pagamento de bolsa estágio e auxilio transporte aos estagiários da Câmara Municipal via Agentes de Integração, durante os exercícios de 2012 e 2013.

 

 

 

 

 

 

Trata-se de auditoria in loco realizada na Câmara Municipal de Florianópolis, para a verificação da regularidade no pagamento de bolsa de estágio e auxílio-transporte aos estagiários da Câmara Municipal via Agentes de Integração, durante os exercícios de 2012 e 2013.

Foram juntados documentos atinentes ao objeto da auditoria às fls. 03-208.

A Diretoria de Controle dos Municípios elaborou relatório de instrução (fls. 209-217v) opinando pela realização de audiência dos responsáveis, Sr. Gean Marques Loureiro, Presidente da Câmara Municipal no exercício de 2009, Sr. Jaime Tonello, Presidente da Câmara Municipal no exercício de 2012 e Sr. César Luiz Belloni Faria, Presidente da Câmara Municipal no exercício de 2013, para apresentação de justificativas a respeito das seguintes irregularidades, conforme a proposta de encaminhamento de fls. 216v-217:

1.1.1 - Contratação das associações Centro de Integração Empresa-Escola do Estado de Santa Catarina (CIEE/SC) e Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC) sem prévio processo licitatório, em desacordo com art. 37, XXI, da CF/88 e art. 2º da Lei nº 8.666/93 (item 3.1 deste relatório);

1.1.2 - Agente de integração atuando como “intermediário” no pagamento da bolsa-auxílio e auxílio transporte aos estagiários, extrapolando a função de “auxiliar” no processo de aperfeiçoamento do instituto do estágio previsto no artigo 5º, da Lei nº 11.788/2008 (item 3.2).

O Relator, à fl. 217v, determinou a realização das audiências propostas, as quais foram efetivadas às fls. 221,222 e 223, com relação, respectivamente, aos Srs. Gean Marques Loureiro, Jaime Tonello e César Luiz Belloni Faria.

O responsável Sr. Jaime Tonello apresentou alegações de defesa e documentos às fls. 224-497, ao passo que o Sr. Gean Marques Loureiro se manifestou por meio da petição de fls. 499-514. Por sua vez, o Sr. César Luiz Belloni Faria deixou fluir in albis o prazo para resposta.

A Diretoria de Controle dos Municípios apresentou novo relatório técnico (fls. 516-531), opinando pelas irregularidades descritas nos itens 4.1.1 e 4.1.2, com a consequente aplicação de multas a todos os responsáveis em razão das restrições apontadas.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, arts. 58 e 59, inciso IV, da Constituição Estadual, art. 1º, incisos V e XI, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, e art. 8°, c/c art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).

Passo à análise das irregularidades levantadas pela Unidade Técnica.

1. Contratação das associações Centro de Integração Empresa-Escola do Estado de Santa Catarina (CIEE/SC) e Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC) sem prévio processo licitatório, em desacordo com art. 37, inciso XXI da CFRB/88 e art. 2º da Lei n. 8.666/93.

Como primeiro “achado de auditoria”, a instrução registrou o fato de ter a Câmara Municipal de Florianópolis contratado o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE/SC) e o Instituto Euvaldo Lodi (IEL/SC) sem prévio processo licitatório, em desacordo com o art. 37, inciso XXI, da CFRB/88 e art. 2º da Lei n. 8.666/93, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações; [...]

Art. 2º As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.

Neste contexto, o Sr. Jaime Tonello, Presidente da Câmara Municipal no exercício de 2012, em sua resposta de fls. 224-497 (especialmente às fls. 245-246), assim se manifestou:

O processo licitatório 05/2012 de 26/06/2012 teve seu inicio por “Dispensa de Licitação”, fundamentado no Inciso XIII, art. 24 da Lei nº 8.666/93, processo licitatórios em anexo.

No quarto trimestre de 2011 tomei conhecimento através do responsável da área de administração/capacitação que o contrato do CIEE operava com a Câmara cobrando uma taxa administrativa de 8% sobre o valor das Bolsas Auxilio pagas aos estagiários, e da existência de outras instituições na Cidade que cobravam taxas inferiores.

De posse desta informação e preocupado com as renovações que vinham ocorrendo, renovei o contrato (convênio) por um período de três meses (termo aditivo 03 ao contrato nº 07/2009) sendo que os estagiários não deveriam sofrer prejuízos, alguns estavam finalizando seus estágios e outros iriam iniciar, para alguns estagiários a bolsa é uma questão de sobrevivência.

O processo licitatório em anexo nº 05/2012 de 06/03/2012 que deu origem ao contrato (convênio) nº 16/2012 embora mencione a Contratação por Dispensa de Licitação, na fls. 24, o gerente de licitação apresenta resumo das propostas apresentadas que transcrevo para melhor compreensão:

[...]

Como não sou especialista em licitação, confio na equipe técnicos da Câmara Municipal, e meu antecessor procedeu por dispensa de licitação, entendo estar correto, embora o processo licitatório efetuado em 2012, tinha tido a participação de outras instituições.

Por sua vez, o Sr. Gean Marques Loureiro, às fls. 499-514, após discorrer sobre os requisitos do art. 24, inciso XIII, da Lei de Licitações, conclui que a Câmara Municipal de Florianópolis observou todas as condições para a dispensa de licitação, inexistindo qualquer irregularidade nas contratações realizadas com os agentes integradores.

Não obstante tais justificativas, as alegações dos responsáveis não merecem prosperar.

Conforme relatado pela Área Técnica às fls. 518v-519v, no exercício de 2009 a Câmara Municipal de Florianópolis firmou convênio com o Centro de Integração Empresa-Escola de Santa Catarina (CIEE/SC) “visando o desenvolvimento de atividades conjuntas capazes de propiciar a promoção da integração ao mercado de trabalho e a formação para o trabalho” (contrato de fls. 4-6) por meio de estágio, consistente em ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho. Ao referido contrato foram acrescidos três termos aditivos (fls. 7-12), que tiveram vigência até 31/03/2012.

Já em 01/04/2012 foi firmado o Contrato de Concessão n. 16/2012 (fls. 16-18) com o Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC), inicialmente pelo período de um ano, acrescido de dois termos aditivos (fls. 19-22) tendo o seguinte objeto:

possibilitar, por meio da realização de estágios, desenvolvimento no ambiente de trabalho, que visa a preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos, nas dependências da Unidade CONCEDENTE, de acordo com a Lei nº 11.788/08, que dispõe sobre o estágio de estudantes.

Ocorre que todos os contratos citados foram celebrados por meio de dispensa de licitação, nos termos do art. 24, inciso XIII, da Lei n. 8.666/93, que assim dispõe:

Art. 24. É dispensável a licitação: [...]

XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação éticoprofissional e não tenha fins lucrativos;

Assim, a questão está em saber se a atividade desenvolvida pelas empresas contratadas se enquadra na hipótese prevista no dispositivo acima transcrito, justificando a dispensa do certame licitatório.

É sabido que a Constituição Federal preceitua, no seu art. 37, inciso XXI, a obrigatoriedade, em regra, de os contratos firmados pela Administração Pública serem precedidos de processos licitatórios. Porém, a Lei n. 8.666/93 trouxe alguns dispositivos que tratam da contratação direta, para hipóteses onde é impossível realizar uma licitação (inexigibilidade) ou quando o processo licitatório puder trazer algum tipo de prejuízo ao interesse público (dispensa).

Merece aqui especial atenção ao termo “dispensável” para a licitação, utilizado no art. 24, caput, da Lei 8.666/93, já transcrito.

Marçal Justen Filho[1] afirma que "a dispensa de licitação se verifica em situações em que, embora viável a competição entre particulares, a licitação afigura-se objetivamente inconveniente ao interesse público".

Na mesma linha Antônio Roque Citadini[2] aduz que "a licitação é dispensada, como se pode ver, em situações descritas pela legislação, nas quais se poderá, em tese, realizar o procedimento licitatório, mas que, pelas razões em cada caso apontado, entende-se desnecessário o certame, já que sua realização não propiciaria ao Poder Público a escolha de proposta economicamente mais adequada, nem o pronto atendimento do interesse público (nacional, estadual ou local) que requer providências imediatas”.

Pode-se concluir assim que, ao afastar a regra básica de que toda a contratação no âmbito do Poder Público requer uma prévia licitação, deve-se fundamentar muito bem todas as razões que levaram o administrador a dispensar um certame licitatório, deve ele comprovar quais os motivos pelos quais a licitação não seria vantajosa ou mesmo seria divergente do interesse público.

É que, considerando a licitação como regra geral a ser seguida antes das contratações, imposta pela própria Constituição, qualquer exceção deve ser interpretada de forma mais restrita possível, sob pena de se abarcar situações para as quais o legislador não previu a dispensa e que podem ferir princípios básicos que devem nortear toda a gestão pública, especialmente as contratações, como a isonomia, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a probidade administrativa.

Nessa linha já se pronunciou o Tribunal de Contas da União, ao tratar da aplicabilidade da regra referente às hipóteses de dispensa de licitação. Veja-se trechos do voto condutor do Ministro Augusto Sherman Cavalvanti, nos autos do Processo TC-019.027/2003:

Ora, se a dispensa de licitação se configura em exceção à regra constitucional e, mais, se o instituto incide sobre situações nas quais a realização de licitação seria viável, claro está que o art. 24 da Lei n° 8.666/93 deve ser aplicado com o máximo de rigor e cautela, de modo a se evitar a utilização indevida da autorização legal para fugir à realização da licitação. Nesse caso, deve operar uma das regras fundamentais da hermenêutica: aquela que determina que as exceções sejam interpretadas restritivamente. Veja-se, assim, que é exatamente nessa linha que segue a jurisprudência desta Corte, bem como a doutrina, ao afirmarem que a enumeração constante do art. 24 da Lei de Licitações é exaustiva, não admitindo interpretação extensiva ou analogia.

[...]

Em consequência dessa restriçãouma determinada situação fática somente será alcançada pela hipótese de dispensa de licitação se apresentar elementos que preencham perfeitamente os requisitos estabelecidos na norma."

O mesmo Tribunal de Contas da União reiterou muito claramente a necessidade de interpretação restritiva desse dispositivo legal, conforme se extrai do Acórdão 388/2004 – 2ª Câmara, Processo 013.259/2000-6:

Como a dispensa é exceção à regra geral da licitação, ambas previstas na Constituição, entendo que o conceito de “desenvolvimento institucional” deve receber interpretação restritiva, vez que as exceções, segundo as normas básicas de hermenêutica, interpretam-se restritivamente.

E para arrematar, a matéria encontra-se devidamente consolidada conforme Súmula 250 do TCU:

A contratação de instituição sem fins lucrativos, com dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, inciso XIII, da Lei n.º 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade com os preços de mercado.

Nessa esteira, pode-se afirmar que a contratação de empresa para promover estágios não é um tipo de objeto que se amoldaria à dispensa de licitação prevista no art. 24, inciso III, da Lei 8.666/93.

Da leitura da citada norma, conclui-se que o objeto a ser contratado pela dispensa deve se referir à “pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional”. Ora, a contratação de estagiários em nada se associa com nenhuma dessas hipóteses.

Com relação aos vocábulos pesquisa e ensino são evidentemente dissociados do objeto em questão. 

Já o conceito de “desenvolvimento institucional” vai muito além de um processo de recrutamento de estagiários. O desenvolvimento institucional pressupõe um conjunto de ações planejadas visando mudanças organizacionais, de procedimentos, de métodos de trabalho e não uma simples ação pontual e corriqueira para recrutamento de pessoal.

Afirmar que a contratação de estagiários – um procedimento relativamente rotineiro (ao menos deveria ser) – está diretamente vinculada ao “desenvolvimento institucional” de uma organização é dar um sentido por demais extensivo a uma norma que deveria ser interpretada com o máximo de cautela, justamente por ser uma exceção à regra fundamental da prévia licitação.

À luz do que restou muito bem delineado pela Diretoria de Controle dos Municípios às fls. 527-527v, no caso em exame não foram observados os requisitos do art. 24, inciso XIII, da Lei n. 8.666/93, notadamente quanto à obrigação de que a instituição contratada seja “incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional”. Veja-se:

Destaca-se ainda que não basta o objeto contratado estar relacionado as atividades de ensino, pesquisa ou desenvolvimento institucional, mas que tais atividades estejam relacionadas no objeto social da instituição. Nas palavras de Marçal Justen Filho:

(...) não há cabimento de invocar o inc. XIII para produzir a execução de objeto que não é inerente à atividade própria da instituição, (...). Muito menos cabível é desnaturar o fim da instituição para agregar outros objetivos (...)

Neste sentido, ainda que as instituições contratadas não tenham fins lucrativos e possuam reputação ilibada, o objeto ‘desenvolvimento institucional’ não condiz com as atividades oferecidas pelas instituições contratadas. Vejamos o objeto constante do convênio firmado entre a Câmara Municipal e a instituição CIEE (fl. 282): “Este convênio estabelece cooperação entre as partes, visando o desenvolvimento de atividades conjuntas capazes de propiciar “a promoção da integração ao mercado de trabalho”, e a “formação para o trabalho”(...)” Do mesmo modo o Instituto Evaldo Lodi – IEL, apresenta como objeto no contrato (fl. 363):

(...) possibilitar, por meio da realização de estágios, desenvolvimento no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.

[...]

Depreende-se que a contratação de empresa para recrutamento de estagiários não se enquadra nos conceitos de ensino, pesquisa e muito menos desenvolvimento institucional, já que não agregam efetivo desenvolvimento da instituição nem influenciam na eficácia e eficiência no desempenho da função institucional.

Poder-se-ia confundir a contratação da empresa para recrutamento de estagiários com o conhecimento empregado pelos estagiários na instituição, no entanto frisa-se que o objeto contratado com as empresas foi a intermediação entre os estudantes e a Câmara Municipal, ou seja, a seleção e recrutamento dos estagiários e encaminhamento a Câmara.

E, ainda que seja defendida a tese de que os estagiários indiretamente agregam conhecimento a instituição, tem-se que tal conhecimento não influencia na eficácia e eficiência do desempenho da Câmara, visto que as atividades realizadas pelos estudantes são atividades normais, rotineiras e continuadas. Apesar da contratação se dar por meio de contrato determinado, são ligeiramente substituídos por outros que venham a desempenhar os mesmos trabalhos. Nada que venha a inovar e/ou influenciar expressivamente o desempenho das atividades da Câmara Municipal.

Os agentes de integração intermediam sim, uma troca de interesses: de um lado o estudante, albergando conhecimentos práticos, de outro, a Instituição contratante – Câmara Municipal.

Denota-se que o termo ‘desenvolvimento institucional’ contido no artigo 24, XIII da Lei 8.666/93 não compreende a contratação de agentes integradores para seleção e encaminhamento de estagiários, vez que tal contratação não agrega conhecimento mensurável a ponto de influenciar a eficácia e eficiência da instituição beneficiada.

[...]

Assim, a contratação de agentes de intermediação entre estudantes e a Câmara Municipal (CIEE e IEL) não está compreendida na exceção de dispensa prevista no art. 24, XIII da Lei 8.666/93, razão pela qual, permanece a regra geral: a realização de certame licitatório.

Por fim, cumpre registrar que essa Corte de Contas, no Prejulgado n. 1283, deixou bastante evidente que além de respeitar os requisitos previstos no art. 24, inciso XIII, da Lei n. 8.666/93, a dispensa de licitação só poderá ocorrer se inexistirem outras instituições que ofereçam semelhantes serviços:

O CIEE - Centro de Integração Empresa-Escola pode ser contratado por órgãos e entidades da administração direta e indireta do Estado por dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, XIII, da Lei Federal nº 8.666/93, desde que o objeto do contrato esteja relacionado a pesquisa e ensino, atendidos aos demais requisitos do referido dispositivo e do art. 26 da Lei de Licitações e, ainda, que não hajam outras instituições que ofereçam semelhantes serviços. (grifei)

Além disso, transcreve-se trecho do Parecer COG n. 346/01, o qual fundamentou a Decisão n. 3440/2002, do Processo CON n. 01/01586000, originando o referido Prejulgado e abordando exatamente esta questão:

E se houver outras instituições ou entidades que prestam semelhantes serviços, a contratação, inevitavelmente, depende de licitação. Nesse sentido também comenta MARÇAL JUSTEN FILHO que “o dispositivo abrange contratações que não se orientam diretamente pelo princípio da vantajosidade. Mas a contratação não poderá ofender o princípio da isonomia. Existindo diversas instituições em situação semelhante, caberá licitação para selecionar aquela que apresente a melhor proposta – ainda que essa proposta deva avaliada segundo critérios científicos. Esse postulado não se altera ainda quando caracterizada a inviabilidade da competição (o que subordinaria a hipótese à regra do art. 25).”

[...]

2.2. É entendimento da abalizada doutrina sobre as licitações e contratações públicas ser necessária a licitação quando houver diversas instituições que podem prestar os serviços vinculados à pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional pretendidos pelo órgão ou entidade públicos contratantes, aplicando-se também aos convênios quando houver transferência de recursos públicos para a entidade conveniada, para que não haja desconsideração do princípio da isonomia. (fls. 61 e 66).

Assim, além de não estarem preenchidos os requisitos do artigo 24, inciso XIII, da Lei n. 8.666/93 – já que o objeto do contrato celebrado não consistia na pesquisa, no ensino ou no desenvolvimento institucional – a Câmara Municipal de Florianópolis deixou de observar o fato de que havia outras instituições que desempenhavam serviços semelhantes aos dos contratados, a exemplo das indicadas pela Área Técnica às fls. 519v-520, razão pela qual o caso não permitia a contratação por dispensa de licitação.

Diante de todo o exposto, pode-se concluir seguramente que a contratação do Centro de Integração Empresa-Escola do Estado de Santa Catarina (CIEE/SC) e do Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC), sem licitação, para operacionalizar a contratação de estagiários para a Câmara Municipal de Florianópolis não encontra amparo legal.

2. Agente de integração atuando como “intermediário” no pagamento da bolsa-auxílio e auxílio-transporte aos estagiários, extrapolando a função de “auxiliar” no processo de aperfeiçoamento do instituto do estágio previsto no art. 5º da Lei n. 11.788/08.

A Área Técnica destacou que os agentes de integração contratados pela Câmara Municipal de Florianópolis desempenhavam atividades que extrapolavam a função de “auxiliar” no processo de aperfeiçoamento do instituto de estágio, porquanto recebiam os recursos referentes à bolsa de estágio e auxílio-transporte e posteriormente repassavam os valores aos estagiários, desrespeitando o previsto no art. 5º, da Lei n. 11.788/08, in verbis:

Art. 5º As instituições de ensino e as partes cedentes de estágio podem, a seu critério, recorrer a serviços de agentes de integração públicos e privados, mediante condições acordadas em instrumento jurídico apropriado, devendo ser observada, no caso de contratação com recursos públicos, a legislação que estabelece as normas gerais de licitação.

§ 1º Cabe aos agentes de integração, como auxiliares no processo de aperfeiçoamento do instituto do estágio:

I - identificar oportunidades de estágio;

II - ajustar suas condições de realização;

III - fazer o acompanhamento administrativo;

IV - encaminhar negociação de seguros contra acidentes pessoais;

V - cadastrar os estudantes.

Pela simples leitura do dispositivo acima transcrito resta claro que não cabe ao agente integrador o recebimento dos valores de bolsa-auxílio e auxílio-transporte, uma vez que tal atividade não se encontra elencada no rol do parágrafo primeiro.

O responsável, Sr. Jaime Tonello, às fls. 246-249, concorda com as razões expostas pela auditoria, porém, alega que sua gestão foi no exercício de 2011 e 2012, razão pela qual não pode responder pela presente restrição. Além disso, apresenta os empenhos emitidos no exercício de 2012 referentes aos pagamentos dos estagiários, nominais ao CIEE/SC e ao IEL/SC.

Novamente as justificativas do responsável não merecem prosperar, porquanto a responsabilidade do Sr. Jaime baseia-se na prorrogação do convênio com o Centro de Integração Empresa-Escola do Estado de Santa Catarina (CIEE/SC) por meio dos termos aditivos firmados em 13/05/2011 (fls. 9-10) e 29/12/2011 (fls. 11-12), bem como na contratação do Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC) em 01/04/2012, ou seja, tudo durante sua gestão. Sobre esse ponto, irretocável a manifestação da reinstrução (fls. 530-530v), a saber:

O Responsável tenta eximir-se da responsabilidade alegando que não foi gestor durante o exercício de 2009, ano em que se iniciaram as contratações com a empresa prestadora de serviços CIEE, todavia cabe esclarecer que o Sr. Jaime Tonello não só deu continuidade a forma irregular de pagamento de bolsa estágio e auxilio transporte aos estagiários: por meio de agente de integração, ao prorrogar o contrato inicial nº 07/2009 (fls. 04 a 06) firmado pelo Sr. Gean Loureiro, como também efetuou nova contratação durante o exercício de 2012 com a empresa IEL – Instituto Euvaldo Lodi, visando a execução dos mesmos serviços, conforme contrato nº 016/2012 (fls. 16 a 18). Assim, a responsabilidade do Sr. Jaime dá-se pela contratação efetuada no exercício de 2012 com a empresa IEL.

Quanto à documentação apresentada pelo responsável, percebe-se que apenas corrobora o fato de que os pagamentos de bolsa-estágio e auxílio-transporte eram realizados diretamente aos agentes integradores.

 

O Sr. Gean Marques Loureiro, por sua vez, não se manifestou expressamente a respeito da irregularidade em comento.

Portanto, tendo em vista que as justificativas e a documentação apresentadas pelo Sr. Jaime Tonello (único responsável a apresentar resposta relacionada ao apontamento em comento) não foram capazes de sanar a restrição, a irregularidade em questão merece ser conservada, com a consequente aplicação de multa aos responsáveis, Sr. Jaime Tonello, Sr. Gean Marques Loureiro e Sr. César Luiz Belloni Faria (não apresentou qualquer manifestação, repita-se), tudo consoante o disposto na conclusão deste parecer.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

1. pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, dos seguintes atos:

1.1. Contratação das associações Centro de Integração Empresa-Escola do Estado de Santa Catarina (CIEE/SC) e Instituto Euvaldo Lodi de Santa Catarina (IEL/SC) sem prévio processo licitatório, em desacordo com art. 37, inciso XXI da CRFB/88 e art. 2º da Lei n. 8.666/93;

1.2. Agente de integração atuando como “intermediário” no pagamento da bolsa-auxílio e auxílio-transporte aos estagiários, extrapolando a função de “auxiliar” no processo de aperfeiçoamento do instituto do estágio previsto no art. 5º da Lei n. 11.788/08.

2. pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos responsáveis, Srs. Gean Marques Loureiro, Jaime Tonello e César Luiz Belloni Faria, na forma prevista no art. 70, inciso II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, diante das irregularidades dispostas nos itens 4.1.1 e 4.1.2 da conclusão do relatório de reinstrução (fl. 531).

Florianópolis, 24 de agosto de 2015.

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 

 

 

 



[1] JUSTEN FILHO, Marçal. "Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos", 11ª ed., São Paulo: Dialética, 2005.



 

[2] CITADINI, Antonio Roque. Comentários e Jurisprudência sobre a Lei de Licitações Públicas. 3ª ed., São Paulo: Max Limonad, 1999.