PARECER nº:

MPTC/34092/2015

PROCESSO nº:

REC 13/00694260    

ORIGEM:

Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC

INTERESSADO:

Edson Henrique Veran

ASSUNTO:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo TCE-11/00649503

 

 

 

Trata-se o presente processo de Recurso de Reconsideração interposto pelos Srs. Edson Henrique Veran, Vili Segatto e Paulo Ernani de Oliveira, em face do Acórdão n. 0934/2013 exarado na Sessão Plenária de 28/08/2013 no processo de Tomada de Contas Especial 11/00649503, o qual julgou irregulares, com imputação de débito, as contas pertinentes à referida Tomada de Contas Especial, condenando os responsáveis ao pagamento de débitos, na medida de suas responsabilidades, nos seguintes termos:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, em:

 6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial e condenar os Responsáveis a seguir discriminados ao pagamento de débitos, na medida de suas responsabilidades, em razão do pagamento de gratificação de produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul que possuíam mais de 03 (três) dias de faltas justificadas, em desacordo com o estabelecido nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor dos débitos aos cofres da CIDASC, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (art. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, ou interpor recurso na forma da lei, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II da Lei Complementar n. 202/2000):

6.1.1. De responsabilidade do Sr. EDSON HENRIQUE VERAN - Diretor-Presidente da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC - no período de 1º/01/2009 a 31/03/2010, CPF n. 346.773.489/87, o débito no valor de R$ 5.292,39 (cinco mil duzentos e noventa e dois reais e trinta e nove centavos);

6.1.2. De responsabilidade do Sr. PAULO ERNANI DE OLIVEIRA - Diretor-Presidente da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC - no período de 26/04 a 27/08/2010, CPF n. 132.104.160/87, o débito no valor de R$ 35.041,09 (trinta e cinco mil, quarenta e um reais e nove centavos);

6.1.3. De responsabilidade do Sr. VILI SEGATTO - Diretor-Presidente da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC - no período de 28/08 a 31/12/2010, CPF n. 142.566.730/91, o débito no valor de R$ 10.115,10 (dez mil, cento e quinze reais e dez centavos).

6.2. Determinar à Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC - que tome providências:

6.2.1. em relação aos tanques de armazenagem de óleo degomado e ao complexo de silo vertical localizados no pátio do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul, sem uso desde 2005, seja quanto à alienação de tais instalações ou quanto à interligação dos tanques ao corredor de exportação e ativação dos mesmos, em atendimento ao princípio da eficiência previsto no caput do art. 37 da Constituição Federal, bem como ao art. 153 da Lei n. 6.404/76;

6.2.2. no sentido de rever os valores que são devidos pelas empresas parceiras, referente ao não cumprimento destas do volume mínimo de armazenamento de grãos no TGSFS, acordado na Resolução CAP de 14/12/2005, seja através de cobrança de multas ou mesmo de uma nova tentativa de renegociação.

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como Relatório de Reinstrução DCE/Insp.3/Div.8 n. 068/2013, aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação e à Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC (grifei).

 

A Diretoria de Recursos e Reexames emitiu parecer de fls. 95-99, opinando pelo conhecimento do presente Recurso de Reconsideração e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, nos seguintes termos:

3.1.1. Modificar o item 6.1 da Deliberação Recorrida, que passa a ter a seguinte redação:

3.1.1.1. 3.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea c, c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à Tomada de Contas Especial, que trata de auditoria realizada na Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina – CIDASC, para verificação da condição da estrutura física e de pessoal do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul, em razão do pagamento de Gratificação de Produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul que possuíam mais de 03 (três) dias de faltas justificadas, em desacordo com o estabelecido nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011.

3.1.2. Cancelar a responsabilização relativa aos débitos imputados aos responsáveis, constantes dos itens 6.1.1, 6.1.2 e 6.1.3 da Deliberação Recorrida.

3.1.3. Ratificar os demais termos da Deliberação Recorrida.

O recurso interposto está previsto no art. 77 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, sendo adequado o seu manejo contra decisão em processo de prestação e tomada de contas, sendo as partes legítimas para a sua interposição, uma vez que foram apontadas como responsáveis pelas irregularidades.

O Acórdão atacado foi publicado na imprensa oficial em 27/09/2013 e a peça recursal teve o protocolo procedido nessa Corte de Contas em 24/10/2013, o que caracteriza a tempestividade do recurso em comento.

Logo, encontram-se presentes todos os requisitos de admissibilidade do presente recurso.

Passa-se, na sequência, à análise dos itens impugnados do Acórdão recorrido e alegações dos Recorrentes.

1.     Da imputação de débito pelo pagamento de gratificação de produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul que possuíam mais de 03 (três) dias de faltas justificadas, em desacordo com o estabelecido nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011

O item 6.1 do Acórdão recorrido julgou irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, III, "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, as contas pertinentes à Tomada de Contas Especial efetuada e condenou os Responsáveis ao pagamento de débitos, na medida de suas responsabilidades, em razão do pagamento de gratificação de produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul que possuíam mais de 03 (três) dias de faltas justificadas, em desacordo com o estabelecido nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011.

Os recorrentes alegaram que a interpretação conferida por eles aos Acordos Coletivos referidos não trouxe nenhum prejuízo aos cofres da CIDASC. Para tanto, amparam-se nos argumentos abaixo:

 Tal conclusão é decorrência insofismável da aplicação da fórmula contida na Cláusula 7ª dos Acordos Coletivos de Trabalho firmados entre a Companhia e o Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Armazenador do Estado de Santa Catarina – SINTRACASC.

Segundo mencionada fórmula, o valor da gratificação de produtividade é alcançado multiplicando-se as toneladas excedentes as 100 mil toneladas/mês, a tarifa (valor fixo) e a base de produtividade (valor fixo). O resultado decorrente dessa operação é, então, dividido entre os funcionários do Terminal. Confira:

GP = TE x T x BP : nº empregados

Dessa forma, o produto da multiplicação de três elementos era dividido por uma quantidade determinada de funcionários, sendo certo que a celeuma reside justamente no denominador da divisão. Com efeito, o entendimento é que o denominador deveria ser menor do que aquele aplicado pela CIDASC, uma vez que, supostamente, estariam sendo contemplados funcionários que não deveriam compor a matemática indicada.

No entanto, se a CIDASC dividia o produto da multiplicação entre mais ou menos funcionários, inquestionável que esse montante não sofria qualquer alteração, de onde decorre que o suposto equívoco no pagamento a funcionários que não deveriam ser contemplados em nada alterou o valor devido pela empresa a título de gratificação de produtividade.

A discussão cinge-se à possibilidade de imputação de débito aos recorrentes em razão de serem as condutas causadoras ou não de dano do erário, uma vez que os próprios recorrentes assumem que o comportamento a eles imputado realmente ocorreu, em violação às determinações contidas nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011. Nesse sentido, os Recorrentes em seu recurso afirmam (fl.07) que

Eventual pagamento da gratificação a funcionários que não deveriam ser contemplados com a verba acarretou prejuízo apenas e tão somente àqueles empregados lotados no Terminal Graneleiro que deveriam receber uma quantia maior, mas receberam montante menor pois a divisão operou-se com maior número de pessoas no denominador.

Não houve, no entanto, qualquer questionamento por parte dos colaboradores da Cidasc que trabalhavam no Terminal Graneleiro em relação a interpretação dada à Cláusula Sétima do Acordo Coletivo. Antes, era um consenso daquele grupo de empregados que a interpretação mais correta era justamente aquela no sentido de que os funcionários em gozo de férias, licença especial e faltas justificadas teriam direito à percepção do mencionado benefício.

[...]

Reitere-se que se algum prejudicado existe no atual contexto dos fatos são apenas e tão somente aqueles funcionários cuja gratificação foi paga em valor inferior em razão da existência de mais pessoas para se operar a divisão.

Nesta senda, afigurar-se-ia justo e jurídico que os funcionários que receberam a mais sejam compelidos a restituir a quantia excedente aos funcionários que receberam a menos, de forma que a hipótese de pagamento da quantia apontada por essa Egrégia Corte de Contas pelos ex-dirigentes da Companhia revela-se teratológica, ferindo os princípios basilares da Justiça.

No que tange a essa discussão, o Parecer DRR 277/2015 acata a tese argumentativa dos Recorrentes e conclui (fl. 98) no sentido de que

Assim, não restou caracterizado qualquer prejuízo ao erário, se este ocorreu foi em relação aos empregados que perceberam gratificação inferior àquela que lhes era devida, e isto não cabe ser apurado por esta Corte de Contas.

Acerca desse assunto, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, em obra específica[1], ensina que

O dano ao erário como causa para instauração de TCE é hipótese mais comum e de maior relevância para os trabalhos dos Tribunais de Contas.

Na apreciação desse tipo de processo é que as cortes de contas revelam a grandeza e significação de sua própria existência, exercitando na esfera administrativa o significado da Justiça. Também é aqui que o Ministério Público que atua junto aos Tribunais de Contas deve ser fazer mais atuante, porque representará o interesse da sociedade no resguardo das verbas públicas.

Aproveitando as considerações expendidas anteriormente, deve-se iniciar o exame do tema proposto, firmando-se as seguintes premissas:

a)       o dano deve ter significado econômico para justificar a instauração da TCE;

b)       a competência dos Tribunais de Contas só se estabelece quando, subjacente ao dano, houver uma conduta de um agente jurisdicionado a essa corte especializada, mesmo que tal conduta decorra de ato culposo, em qualquer de suas modalidades: negligência, imprudência ou imperícia (grifei).

Acerca dessa questão, a Lei Complementar Estadual nº 202/2000 estabelece, em seu art. 15, § 3º, incisos I a III o que se considera débito. Veja-se:

Art. 15. Verificada irregularidade nas contas, o Relator ou o Tribunal:

[...]

§ 3º Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo, considera-se débito o valor apurado em processo de prestação ou tomada de contas decorrente de:

I – dano ao erário proveniente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado;

II – desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos; e

III – renúncia ilegal de receita (grifei).

Veja-se, ainda, o teor do item 3 do Prejulgado 0817 do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina:

Onde haja fundado indício de prática de atos visando obtenção de vantagem indevida, com participação do particular beneficiado, o pagamento de despesas realizadas sujeita-se à demonstração de inexistência de dano ao erário, porque incabível à Administração suportar os prejuízos, ante a indisponibilidade do interesse público. Quando comprovada prática de atos ilegais visando obtenção de vantagem indevida, os pagamentos devem ser suspensos pela Administração. Ao particular que se considerar prejudicado pela ausência de pagamento do montante que alega devido, estão disponíveis os mecanismos judiciais para obter indenização (grifei).

 

Portanto, em que pese a efetivação de despesa contrariamente ao previsto nos Acordos Coletivos e alheia à autorização ou manifestação do Conselho de Política Financeira do Estado de Santa Catarina (CPF), percebe-se que não houve, efetivamente, dano ao erário. O prejuízo se limitou aos interesses individuais e pessoais dos demais empregados, que tiveram seu montante individual reduzido em face do pagamento aos funcionários que não faziam jus. Dessa forma, torna-se de fato descabida a imputação de débito aos recorrentes.

2.     Da irregularidade do pagamento de gratificação de produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul que possuíam mais de 03 (três) dias de faltas justificadas, em desacordo com o estabelecido nos Acordos Coletivos de Trabalho ns. 2009/2010 e 2010/2011

Acerca da irregularidade do das despesas com o pagamento de gratificações de empregados que não se enquadravam nos requisitos, os recorrentes alegam que:

Um dos pilares de sustentação da decisão condenatória objurgada é a assertiva segundo a qual “o adicional teria sido pago a todos os servidores do Terminal Graneleiro”. Tal afirmação, no entanto, não se coaduna com a realidade dos fatos. Os documentos anexos ao presente recurso atestam que diversos funcionários lotados no Terminal Graneleiro não receberam a gratificação, por estarem afastados de suas atividades profissionais.

Entretanto, aqueles empregados cuja ausência ao trabalho não pode ser caracterizada com FALTA para efeitos legais foram beneficiados com a gratificação. Com efeito, qualquer entendimento em sentido diverso seria facilmente afastado, de forma que os dirigentes  da Cidasc não tinham outra alternativa senão o cumprimento da legislação trabalhista que rege a matéria.

Contudo, apesar do referido dano ter-se cingido ao aspecto formal, reitere-se que ainda assim, mesmo em face da ausência de prejuízos aos cofres públicos, foi praticada irregularidade quanto às concessões de Gratificações de Produtividade aos empregados do Terminal Graneleiro de São Francisco do Sul, uma vez que beneficiados empregados que contavam mais de três dias de falta ao serviço. Afasta-se o dano sob os aspectos financeiros e econômicos, porém persiste a vulneração quanto ao caráter jurídico das condutas empreendidas.

O requisito relativo às faltas em não mais que três dias/mês estabeleceu foi estabelecido na Cláusula Sétima dos Acordos Coletivos de Trabalho de 2009/2010 e 2010/2011, então chancelados pelo Conselho de Política Financeira do Estado. O posterior Termo de Esclarecimento, que, segundo os Recorrentes, teria trazido conteúdo ampliativo e permissivo aos Acordos mencionados, não foi, contudo, submetido ao crivo do mesmo Conselho de Política Financeira.

Logo, não merecem prosperar as alegações de que houve o correto pagamento da gratificação por produtividade sob o pálio das normas constantes na Consolidação das Leis do Trabalho e de que o Termo de Esclarecimento teria sanado eventuais desrespeitos às regras anteriormente previstas nos acordos.

 Portanto, considerando que restou comprovada a irregularidade, mas que, todavia, não houve prejuízo ao erário, manifesto-me pela modificação do julgamento proferido nos autos do processo TCE n. 11/00649503, para afastar a imputação de débito. 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar n. 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO do recurso interposto, para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL, consoante a proposição dada pelo Parecer n. 277/2015 Diretoria de Recursos e Reexames.

Florianópolis, 26 de agosto de 2015.

 

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 

 



[1] FERNANDES, J. U. Jacoby. Tomada de contas especial: processo e procedimento na Administração Pública e nos Tribunais de Contas. 4 ed., ver., atual. e amp. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 157-158.