PARECER
nº: |
MPTC/37429/2015 |
PROCESSO
nº: |
TCE 08/00759591 |
ORIGEM: |
Secretaria de Estado da Fazenda |
INTERESSADO: |
Associação dos Aposentados e Pensionistas
de Fraiburgo - Asaprev |
ASSUNTO: |
Tomada de Contas Especial relativa ao
empenho nº 2642, de 31/12/2003, item 334041, P/A 4769, FR 00, no valor de R$
150.000,00, tendo como credora a Associação dos Aposentados e Pensionistas da
Previdência Social da Grande Florianópolis - Florianópolis. |
Trata-se de
Tomada de Contas Especial instaurada na Secretaria de Estado da Fazenda, em
atendimento ao item 6.1 da Decisão n. 3.342/2007 exarada pelo Tribunal Pleno quando
do julgamento do processo SPC n. 06/00313522 (fls. 49-50, em apenso), diante do
repasse realizado pelo Estado de Santa Catarina, por intermédio da Secretaria
de Estado da Fazenda (SEF), à Associação dos Aposentados e Pensionistas da
Previdência Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), representada, à época,
por seu ex-Presidente, Sr. Marcos Wandresen, por conta do Convênio n.
15.549/2003-7 (fl. 162), que teve por objeto a implementação do projeto
denominado "Cartão Melhor Idade", vazada a referida Decisão nos
seguintes termos:
O
TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas pelo
Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei
Complementar n. 202/2000, decide:
6.1. Determinar ao Sr. Sérgio Rodrigues Alves -
Secretário de Estado da Fazenda, a adoção de providências visando à instauração
de tomada de contas especial, nos termos do art. 10, §1°, da Lei
Complementar n. 202/2000, com a estrita observância do disposto no art. 12 da
Instrução Normativa n. 03/2007, em virtude da não-prestação de contas de
recursos repassados à Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social - ASAPREV, de Florianópolis, pertinente à Nota de Subempenho n. 2642,
31/12/2003, pago em 03/02/2004, P/A 4769, item 33404100, fonte 00, no valor de
R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), para apuração dos fatos,
identificação dos responsáveis e quantificação do dano, sob pena de responsabilidade
solidária.
6.1.1. Fixar o prazo de 30 (trinta) dias, a contar
da comunicação desta deliberação, para que a Secretaria de Estado da Fazenda
comunique a este Tribunal as providências administrativas adotadas com vistas
ao cumprimento do art. 4º da Instrução Normativa n. TC-03/2007.
6.1.2. A fase interna da tomada de contas especial deverá ser
concluída no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data de
sua instauração, conforme dispõe o art. 11 da referida Instrução Normativa.
6.1.3. Determinar à Secretaria de Estado da Fazenda, com fulcro no
art. 13 da citada Instrução Normativa, o encaminhamento a este Tribunal da
Tomada de Contas Especial, tão logo concluída.
6.2. Declarar a Associação dos Aposentados e Pensionistas da
Previdência Social - ASAPREV, de Florianópolis, e o Sr. Marcos Wandresen
impedidos de receberem novos recursos do Erário, até a regularização do
presente processo, consoante dispõe o art. 5º, "c", da Lei Estadual
n. 5.861/81.
6.3. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que
a fundamentam, bem como do Relatório de Instrução DCE/Insp.1/Div.3 n.
310/2007:
6.3.1. à Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social - ASAPREV, de Florianópolis, e ao Sr. Marcos Wandresen -
Presidente daquela entidade em 2003 e 2004;
6.3.2. ao Sr. Sérgio Rodrigues Alves - Secretário
de Estado da Fazenda e ao responsável pelo controle Interno daquela Secretaria,
com remessa de cópia da Instrução Normativa n. TC-03/2007.
Conforme a Informação DCE n.
060/2011, proferida nos autos do processo SPC n. 06/00313522 (fls. 124-125, em
apenso), por conta de um “desencontro de informações” a Secretaria Geral desse
Tribunal de Contas desconsiderou os documentos encaminhados pela Secretaria de
Estado da Fazenda e encaminhou os autos para que a Diretoria de Controle da
Administração Estadual procedesse à reinstrução. Desse encaminhamento
originou-se o presente processo TCE n. 08/00759591, ao qual a Informação
referida acima sugeriu que se apensasse o processo SPC n. 06/00313522, para que
tramitassem juntos até a conclusão.
O Despacho GC-WRW n. 49/2011
determinou, então, o encaminhamento dos autos SPC n. 06/00313522 à SEG/DIPO
para que procedesse ao seu apensamento ao processo TCE n. 08/00759591, em
virtude da conexão de matérias.
O Relatório de Instrução
DCE/Insp.1/Div.3 n. 538/2013 (fls. 429-439v) sugeriu definir a responsabilidade
solidária e determinar a citação do Sr. Marcos Wandresen, Presidente da
Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da Grande
Florianópolis (ASAPREV), do Sr. Gilmar Knaesel, ex-Secretário de Estado de
Turismo, Cultura e Esporte, do Sr. Max Roberto Bornholdt, ex-Secretário de
Estado da Fazenda, e do Sr. Lindolfo Weber, então Diretor-Geral da Secretaria
de Estado da Fazenda e ordenador primário do repasse, em razão das
irregularidades expostas nos itens 3.2.1.1, 3.2.2.2, 3.3.1 e 3.4.1, constantes
de sua conclusão.
Este Órgão Ministerial
proferiu o Parecer MPTC n. 25752/2014 (fls. 440-441) acompanhando o
entendimento exarado pela Diretoria Técnica.
O Conselheiro Relator, por
meio da Decisão GAC/AMF n. 139/2014 (fls. 442-445), definiu a responsabilidade
solidária do Sr. Marcos Wandresen, da Associação dos Aposentados e Pensionistas
da Previdência Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), da SULCARD
Administradora de Cartões SUC Ltda. e seus respectivos sócios-gerentes, e da
INTERTRAINER Desenvolvimento Empresarial S/C Ltda. e de seus respectivos
sócios-gerentes, determinando a citação dos responsáveis pela ausência de
comprovação da realização do objeto e do efetivo fornecimento dos materiais ou
prestação dos serviços, em face da descrição insuficiente de notas fiscais
apresentadas e ausência de outros elementos de suporte, em contrariedade aos
arts. 49, 52, incisos II e III, e art. 60, incisos II e III, da então vigente
Resolução n. TC-16/94.
O Conselheiro Relator também
definiu, na mesma Decisão, a responsabilidade solidária e determinou a citação
do Sr. Marcos Wandresen, da ASAPREV, do Sr. Gilmar Knaesel, do Sr. Max Roberto
Bornholdt e do Sr. Lindolfo Weber em face de burla ao processo licitatório, em
contrariedade à Lei n. 8.666/93; a responsabilidade individual e citação do Sr.
Marcos Wandresen pela apresentação de prestação de contas fora do prazo
estabelecido no art. 8º da Lei Estadual n. 5.867/81; e a responsabilidade
individual e citação do Sr. Gilmar Knaesel, por extrapolar a competência da
então Secretaria da Organização do Lazer (SOL), em contrariedade aos arts. 5º,
6º e 7º da Lei Estadual n. 11.436/00, art. 2º da Lei Estadual n. 8.072/90 e
art. 52 da Lei Complementar Estadual n. 243/2003.
O responsável Sr. Max Roberto
Bornholdt apresentou alegações de defesa às fls. 450-465.
As responsáveis INTERTRAINER
Desenvolvimento Empresarial Ltda. e a SUL CARD Administradora de Cartões S.A.
apresentaram alegações de defesa às fls. 503-519, com juntada de documentos de
fls. 520-1.070.
O responsável Sr. Lindolfo
Weber apresentou alegações de defesa às fls. 1.074-1.080.
A responsável Associação dos
Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da Grande Florianópolis
(ASAPREV) apresentou justificativas às fls. 1.083-1.098, com a juntada dos
documentos de fls. 1.099-1.193.
O responsável Sr. Marcos
Wandresen apresentou alegações de defesa às fls. 1.209-1.228.
Por sua vez, o responsável
Sr. Gilmar Knaesel, apesar de ter apresentado pedido de prorrogação de prazo
para atendimento à citação, o qual foi deferido (fl. 1.072), deixou transcorrer
in albis o prazo para apresentação de
suas alegações de defesa, não atendendo ao Ofício n. 16.652/2014 (fl. 476), consoante
a informação de fl. 1.236.
A
Diretoria de Controle da Administração Estadual, então, apresentou o Relatório
de Instrução DCE/Insp.1/Div.3 n. 508/2015 (fls. 1.237-1.255v), opinando, em
seus itens 3.1 e 3.2, pela irregularidade das contas referentes ao repasse
efetuado pelo Estado de Santa Catarina, por intermédio da Secretaria de Estado
da Fazenda, à Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social
da Grande Florianópolis (ASAPREV) sob análise nestes autos, com imputação de
débito, na forma do art. 18, inciso III, alíneas “a”, “b” e “c” c/c o art. 21, caput da Lei Complementar Estadual n.
202/2000, e pela condenação solidária, sem prejuízo da multa prevista no art.
68 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, dos responsáveis Sr. Marcos
Wandresen, Sr. Gilmar Knaesel, Sr. Max Roberto Bornholdt, Sr. Lindolfo Weber e
da pessoa jurídica Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), por irregularidades que ensejam a
imputação de débito no valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais).
A
Unidade Técnica apontou a responsabilidade do Sr.
Marcos Wandresen e da Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social da Grande Florianópolis (ASAPREV) em razão da transferência irregular por parte da ASAPREV,
da execução do objeto do Convênio n. 15.549/2003-7, firmado com a Secretaria de
Estado da Fazenda, tendo atuado como mera repassadora de recursos à
empresa privada em desacordo com os
termos estabelecidos no citado Convênio e com o Decreto Estadual n. 307/2003,
em especial com os seus arts. 6º, §2º e 8º, inciso XV, ensejando a rescisão do
convênio (art. 20, inciso I do Decreto em comento) e a instauração de tomada de
contas especial com vistas à quantificação do dano, definição dos responsáveis
e restituição do erário (art. 21 do mesmo Decreto), conforme o item 3.2.1.1 da
conclusão do relatório técnico em questão.
A
DCE entendeu, ainda, pela responsabilidade
do Sr. Marcos Wandresen, da Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), do Sr. Gilmar Knaesel, do Sr. Max
Roberto Bornholdt, e do Sr. Lindolfo Weber, em razão de burla ao processo
licitatório, contrariando a Lei n. 8.666/93, além dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade,
publicidade e probidade administrativa contidos no art. 37, caput
e inciso XXI da CRFB/88, conforme o item 3.2.2.1 da parte final do relatório em
comento.
A
Diretoria Técnica opinou também pela aplicação de multa ao Sr. Marcos Wandresen
em face da apresentação da prestação de contas fora do prazo estabelecido no
art. 8º da Lei Estadual n. 5.867/81 (item 3.3.1 da conclusão do relatório
técnico) e pela aplicação de multa ao Sr. Gilmar Knaesel por extrapolar a
competência da então Secretaria da Organização do Lazer, em contrariedade aos arts. 5º ao 7º da Lei
Estadual n. 11.436/00, art. 2º da Lei Estadual n. 8.072/90, art. 52 da Lei
Complementar Estadual n. 243/03 (item 3.4.1 da parte final do relatório técnico).
Finalmente,
a Unidade Técnica entendeu por declarar o Sr. Marcos Wandresen e a ASAPREV
impedidos de recebimento de novos recursos do erário até a regularização do
presente processo e pela determinação do arquivamento do processo SPC n.
06/00313522 (apensado aos presentes autos), com fundamento no art. 46, inciso IV da
Resolução n. 09/2002 (itens 3.5 e 3.6 da conclusão do relatório técnico
em questão).
A
ASPREV juntou nova documentação às fls. 1259-1274.
A fiscalização contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está
inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos
constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso II da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, arts. 58 e 59, inciso
II da Constituição Estadual, art. 1º, incisos III e XI, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000, e art. 8° c/c art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).
Após análise de toda a
documentação acostada aos autos e consoante as informações do relatório técnico
de fls. 1.237-1.255v, verifico que, de fato, remanescem as irregularidades
objeto da presente Tomada de Contas Especial, diante da ausência de elementos
hábeis a elidi-las. Assim, restam caracterizadas as irregularidades
identificadas pela Unidade Técnica, as quais ensejam imputação de débito e
aplicação de multas aos responsáveis, consoante os comandos da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000.
Vejamos.
1. Real autoria
do projeto e burla ao processo licitatório.
Consoante se extrai dos
autos, as Cláusulas Segunda e Terceira do Convênio n. 15.549/2003-7 (fls.
158-161) assinado pelos Srs. Max Roberto Bornholdt (então Secretário de Estado
da Fazenda) e Marcos Wandresen (ex-Presidente da ASAPREV), o Estado de Santa
Catarina, por meio da Secretaria de Estado da Fazenda, destinou à ASAPREV o
valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) para implementação do projeto
“Cartão Melhor Idade”. Tal repasse deu-se por meio da Nota de Empenho Global n.
1966/000 de 2003 (fl. 100). O processo presente originou-se da não comprovação
da aplicação dos recursos referentes à Nota de Subempenho n. 2642/000 de 2003
(fl. 163), emitida em face do Termo Aditivo ao Convênio referido acima, cujo
montante era de R$ 150.000 (cento e cinquenta mil reais), referentes à segunda
parcela do valor total.
Conforme remontado pelo
Relatório DCE n. 508/2015, a ASAPREV apresentou plano de trabalho à SEF,
visando à formalização do Convênio e o empenhamento e repasse de recursos para
o projeto, cujo objeto seria a emissão de cartão de fidelidade a ser emitido
exclusivamente para pessoas acima de 50 anos de idade usufruírem de benefícios
junto aos estabelecimentos conveniados. O programa deveria ser administrado
pela Fundação Nova Vida e coordenado pela Secretaria de Estado da Organização
do Lazer (SOL), com a fiscalização do Estado, de acordo com o previsto na
Cláusula Quarta do Convênio (fl. 159). A ASAPREV contratou a empresa SULCARD
Administradora de Cartões para a emissão dos cartões e formação de rede
conveniada de estabelecimentos, transferindo a ela, como forma de pagamento,
parte dos valores recebidos pelo Convênio.
Posteriormente ao Convênio n.
15.549/2003-7 (fls. 158-161), foi firmado o Convênio SOL n. 931/034 (fls.
246-248), no qual a Secretaria de Estado da Organização do Lazer (SOL), representada
pelo então Secretário Gilmar Knaesel, e a ASAPREV, por seu então presidente
Marcos Wandresen, firmaram parceria objetivando a implementação do Programa
“Cartão Melhor Idade” no Estado de Santa Catarina. Interessante que se atente
para o teor da Cláusula Quarta do referido Convênio, que assim prescreve:
CLAUSULA
QUARTA – Das obrigações da SOL
1.
Realizar
as ações e parcerias necessárias com a ASAPREV para implementação do programa
“Cartão Melhor Idade”;
2.
Divulgar
o Programa nos meios de comunicações;
3.
Incentivar
o uso dos benefícios através de campanhas promocionais específicas;
4.
Apoiar
o Programa através das estruturas das gerências regionais.
5.
Firmar
Convênios com Prefeituras e instituições Públicas ou Privadas, visando a
ampliação e ordenamento dos benefícios aos usuários do programa.
6.
Apoiar
projetos e eventos complementares.
7.
Promover
eventos e campanhas para os usuários do programa.
Nessa linha, seguindo o
raciocínio aventado a partir dos fatos e documentos juntados aos autos,
chega-se à conclusão de que a execução do referido objeto caberia à SOL em
parceria com a SEF, as quais, caso entendessem pela contratação de empresas
privadas para a consecução do objeto, deveriam dar vazão a procedimento
licitatório na modalidade apropriada, em atendimento ao art. 37, inciso XXI, da
CRFB/88. Outro não é o entendimento da Unidade Técnica (fls. 1.241-1.241v), a
qual aqui se colaciona a título de conclusão:
Outro ponto de extrema importância,
que reforça a necessidade de realização de certame licitatório para a definição
de quem prestaria os serviços de administração do programa de descontos, é o
fato de a empresa ser remunerada com parte da mensalidade paga por cada cartão
emitido. Conforme se verifica na resposta da empresa Sulcard Administradora de
Cartões S/A, fl. 342/343; cada cartão pagava uma mensalidade de R$ 1,00, sendo
que destes R$ 0,05 era retido pela Celesc, R$ 0,40 era repassado para pagamento
do sistema PBM – Pharmacy Benefite
Management, enquanto o restante, R$ 0,55 era retido para a administradora.
Segundo, ainda, informações da Sulcard, fl. 341, o número de cartões ativos
chegou a 22.000. Assim, chega-se ao total de R$ 12.100,00 repassados à
administradora mensalmente. Importante destacar que tanto a Celesc quanto a PBM
– Pharmacy Benefite Management não aparecem no convênio, nem mesmo como
intervenientes.
Diante de
tais constatações, verifica-se que a participação da ASAPREV se limitou à mera
repassadora dos recursos, atendendo solicitação da Secretaria da Organização do
Lazer, visando somente a burla ao processo licitatório, obrigação legal a qual
o Governo do Estado estaria sujeito, conforme determina o art. 37, XXI da
Constituição Federal e a Lei Federal nº 8.666/93, além dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
igualdade, publicidade e probidade administrativa.
Desta
forma, tendo em vista que a real autoria do projeto era da Secretaria da
Organização do Lazer, conforme se observa no documento de fl. 102, a responsabilidade pelo repasse também
foi atribuída ao seu então Secretário, Sr. Gilmar Knaesel, ao Secretário de
Estado da Fazenda, à época, Sr. Max Roberto Bornholdt (fls. 158-161) e ao
ordenador primário Lindolfo Weber (fl. 29), solidariamente com o Sr. Marcos
Wandresen, Presidente da ASAPREV e da ASAPREV. Estes últimos, por terem
contribuido ativamente para que a ilegalidade fosse perpetrada, com a
proposição do projeto. (grifei)
Desse modo, resta claro que a
ASAPREV figurou como “atravessadora” dos recursos, repassando-os às empresas
contratadas, as quais deveriam ter sido submetidas a procedimento licitatório
prévio para que somente então pudessem estabelecer liame jurídico com o Estado,
dele recebendo os recursos públicos mediante a contraprestação na forma de
serviços a serem prestados em prol do referido programa.
O art. 37, inciso XXI da
CRFB/88 é expresso ao dispor que
XXI - ressalvados
os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações
serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure
igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam
obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos
da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e
econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações (grifei).
Em vista desse trecho inicial
do inciso em destaque, traz-se o ensinamento de Marçal Justen Filho em obra
específica sobre licitações e contratos administrativos[1]:
A
Constituição acolheu a presunção (absoluta) de que prévia licitação produz a
melhor contratação – entendida como aquela que assegura a maior vantagem
possível à Administração Pública, com observância do princípio da
isonomia. Mas a própria Constituição se encarregou de limitar tal presunção
absoluta, facultando contratação direta nos casos previstos por lei. [...]
Como
é usual se afirmar, a “supremacia do interesse público” fundamenta a exigência,
com regra geral, de licitação prévia para contratações da Administração Pública
– o que significa, em outras palavras, que a
licitação é um pressuposto do desempenho satisfatório pelo Estado das funções
administrativas a ele atribuídas. No entanto, existem hipóteses em que a
licitação forma seria impossível ou frustraria a realização adequada das
funções estatais. O procedimento licitatório normal conduziria ao
sacrifício dos fins buscados pelo Estado e não asseguraria a contratação mais
vantajosa. Por isso, autoriza-se a
Administração a adotar um outro procedimento, em que formalidades são
suprimidas ou substituídas por outras. Essa flexibilidade não foi adornada de
discricionariedade. O próprio legislador determinou as hipóteses em que se
aplicam os procedimentos licitatórios simplificados. Por igual, definiu
os casos de não incidência do regime formal de licitação. A contratação direta
não significa que são inaplicáveis os princípios básicos que orientam a atuação
administrativa. Nem se caracteriza uma livre atuação administrativa. O administrador está obrigado a seguir
um procedimento administrativo determinado, destinado a assegurar (ainda nesses
casos) a prevalência dos princípios jurídicos fundamentais. Permanece o
dever de realizar a melhor contratação possível, dando tratamento igualitário a
todos os possíveis contratantes.
Portanto,
a contratação direta não significa eliminação de dois postulados consagrados a
propósito da licitação. O primeiro é a existência de um procedimento
administrativo. O segundo é a vinculação estatal à realização de suas funções
(grifei).
Incumbe salientar que tais
modalidades de contratação direta se dão por meio da dispensa e da
inexigibilidade de licitação, previstas, respectivamente, nos arts. 24 e 25 da
Lei n. 8.666/93. Do exame acurado de tais dispositivos, percebe-se que nenhum
deles abarca o caso ora sob debate.
Assim, conclui-se pela
responsabilização dos envolvidos nos fatos narrados, na medida em que seus atos
contribuíram para a patente violação de dispositivo constitucional e princípios
oriundos dele: o Sr. Max Roberto Bornholdt, como signatário do Convênio n.
15.549/2003-7; o Sr. Lindolfo Weber, como ordenador primário da despesa; o Sr.
Marcos Wandresen, na qualidade de ex-Presidente da ASAPREV e signatário dos
Convênios n. 15.549/2003-7 e n. 931/034; a própria ASAPREV, como pessoa
jurídica; e o Sr. Gilmar Knaesel, na qualidade de então Secretário da SOL e signatário
do Convênio n. 931/034.
Em suas alegações de defesa
(fls. 450-465) o Sr. Max Roberto Bornholdt alega sua ilegitimidade passiva
argumentando que a Secretaria de Estado da Fazenda possui diversas subdivisões,
havendo delegação de atribuições, sendo que a emissão de notas de empenho,
classificação das despesas, registro e controle dos documentos de ordem
financeira ligados à Secretaria seriam atribuição específica da Gerência de
Administração, Finanças e Contabilidade.
Em relação à burla ao
processo licitatório, alega que a responsabilidade pela análise da legalidade
de convênios firmados pela Secretaria do Estado da Fazenda seria da Consultoria
Jurídica (COJUR) e que não assinou documento algum. Afirma, ainda, que a
responsabilidade por eventual burla à licitação seria da Secretaria de Estado
da Organização do Lazer, sendo que os documentos juntados aos autos demonstram
que a Secretaria de Estado da Fazenda teria realizado todos os procedimentos de
fiscalização, excluindo assim sua responsabilização solidária.
Já o Sr. Lindolfo Weber, em
sua resposta (fls. 1.074-1.080), alegou preliminarmente que sua defesa se
remeteria à Decisão Singular GAC/AMF n. 139/2014 e não ao Relatório de
Instrução DCE n. 538/2013 (fls. 1.074-1.076) e que teria ocorrido a prescrição
da pretensão punitiva (fl. 1.076), uma vez que os fatos teriam ocorrido há mais
de dez anos.
No mérito, alegou que não era
o responsável pelos pagamentos questionados (fl. 1.077-1.078), na medida em que
a assinatura na Nota de Empenho teria tido como base o Convênio firmado, que
não previa a participação da SOL na gestão ou coordenação. Por fim, alegou que
não se comprovaram prejuízos ao erário.
Por sua vez, o Sr. Marcos
Wandresen, ao defender-se (fls. 1.209-1.228), arguiu, em sede de preliminares,
a nulidade absoluta do presente processo, alegando (fl. 1.212) que a presente
Tomada de Contas Especial teria ocorrido de forma contrária à lei, tendo sido
instaurada sem o esgotamento prévio do contraditório e da ampla defesa. Ainda
em preliminares, alegou a prescrição intercorrente (fl. 1.213), com fulcro no
art. 24-A da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, bem como a prescrição
quinquenal (fl. 1.214), aduzindo que os fatos teriam tido lugar em fevereiro de
2004 e a citação somente teria ocorrido em fevereiro de 2015.
Quanto ao mérito, afirmou que
a Secretaria de Estado da Fazenda possuiria gerência sobre a administração e
manutenção do objeto proposto (fl. 1.219), que teria havido parceria entre a
Secretaria do Estado da Fazenda, a Secretaria de Organização do Lazer (SOL) e a
ASAPREV (fls. 1.219-1.220), pertencendo a estas Secretarias a avaliação quanto
à necessidade de instauração de procedimentos licitatórios.
Ademais, declarou desconhecer
a forma de remuneração dos emissores do cartão (fl. 1.220), que em nenhum
momento teria contribuído para a burla de procedimento licitatório (fl. 1.220),
que o Termo de Convênio firmado teria seguido o permissivo legal que autoriza a
descentralização política/administrativa (fl. 1.222), que a responsabilidade
pela correta aplicação dos recursos seria da Secretaria de Estado da Fazenda
(fl. 1.224) e que a ASAPREV teria sido mera receptora do valor questionado nos
autos (fl. 1.224).
Por seu turno, em sua defesa
(fls. 1.083-1.098), a responsável ASAPREV também arguiu preliminarmente a
nulidade absoluta do processo (fl. 1.085), a prescrição intercorrente (fl.
1.085) e a prescrição quinquenal (fl. 1.087), bem como protestou por sua
ilegitimidade passiva e pela exclusão de sua responsabilidade solidária (fls.
1.087-1.088). Quanto ao mérito respectivo à burla do procedimento licitatório,
empreendeu as mesmas alegações constantes da defesa de seu ex-Presidente, Sr.
Marcos Wandresen.
Cumpre reiterar que o
responsável Sr. Gilmar Knaesel não apresentou alegações de defesa no prazo hábil,
incidindo na hipótese de revelia prevista no art. 15, § 2º da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000.
Note-se que os argumentos
levantados por todos os responsáveis no sentido de eximirem-se de suas
respectivas responsabilidades não merecem prosperar, uma vez que presentes
todos os fundamentos fáticos e jurídicos a caracterizarem suas ações/omissões
nas qualidades e funções dos cargos que então exerciam, ainda que se possa
imputá-las, em determinados casos, meramente a título de culpa in eligendo e culpa in vigilando.
No caso dos responsáveis Srs.
Max Roberto Bornholdt e Gilmar Knaesel, suas respectivas responsabilidades
restam patentes, tanto da análise dos autos como tendo em vista o que esta
Procuradora já defendeu em outras oportunidades, a exemplo dos pareceres nos
processos TCE n. 11/00363600 e PCR n. 10/00748470, fundados na Lei Complementar
Estadual n. 381/2007, cujo texto dispõe sobre o modelo de gestão e a estrutura
organizacional da Administração Pública Estadual, destacando em seu art. 7º as atribuições
dos cargos de Secretário de Estado, ao passo que seus arts. 24 e 25 definem a
responsabilidade do gestor pela supervisão na área de sua respectiva
competência, o que é bastante elementar, aliás:
Art.
24. Os Secretários de Estado são
responsáveis perante o Governador do Estado, pela supervisão dos serviços dos
órgãos da Administração Direta e das entidades da Administração Indireta
enquadrados em sua área de competência.
Parágrafo
único. A supervisão a cargo dos Secretários de Estado é exercida por meio de
orientação, coordenação, controle e avaliação das atividades dos órgãos
subordinados ou vinculados e das entidades vinculadas ou supervisionadas.
Art.
25. A supervisão a cargo dos Secretários de Estado, com o apoio dos órgãos que
compõem as estruturas de suas Secretarias, tem por objetivos, na área de sua
respectiva competência:
I
- assegurar a observância das normas
constitucionais e infraconstitucionais;
II
- promover a execução dos programas, projetos e ações de Governo de forma
descentralizada, desconcentrada e intersetorializada;
III
- coordenar as atividades das
entidades vinculadas ou supervisionadas e harmonizar a sua atuação com a dos
demais órgãos e entidades;
IV
- avaliar o desempenho das entidades vinculadas ou supervisionadas;
V
- fiscalizar a aplicação e a
utilização de recursos orçamentários e financeiros, valores e bens públicos;
VI
- acompanhar os custos globais dos
programas, projetos e ações setoriais de Governo;
VII
- encaminhar aos setores próprios da
Secretaria de Estado da Fazenda os elementos necessários à prestação de contas
do exercício financeiro; e
VIII
- enviar ao Tribunal de Contas do Estado, sem prejuízo da fiscalização deste,
informes relativos à administração financeira, patrimonial e de recursos
humanos das entidades vinculadas ou supervisionadas. (grifei)
Assim, os Secretários de
Estado possuem o dever legal de supervisionar e fiscalizar os serviços
executados nos órgãos de sua competência, devendo para tanto ser
responsabilizados no caso de irregularidades, como as observadas no presente
processo.
Deve-se recordar, ainda, que
cabe também aos gestores a responsabilização em face das chamadas culpa in eligendo e culpa in vigilando, significando esta a ausência de fiscalização das
atividades de seus subordinados, ou dos bens e valores sujeitos a esses
agentes, ao passo que aquela representa a responsabilidade atribuída a quem deu
causa à má escolha de seu representante ou preposto.
Na condição de Secretários de
Estado, os então gestores enquadravam-se exatamente no conceito de responsáveis
“por dinheiros, bens e valores da administração direta e indireta”, consoante
inclusive a seguinte norma da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno dessa
Corte de Contas):
Art.
133. Em todas as etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de
atos sujeitos a registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada
aos responsáveis ou interessados ampla defesa.
§
1º Para efeito do disposto no caput, considera-se:
a)
responsável aquele que figure no
processo em razão da utilização, arrecadação, guarda, gerenciamento ou
administração de dinheiro, bens, e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou
o Município respondam, ou que, em nome destes assuma obrigações de natureza
pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou outra irregularidade de
que resulte prejuízo ao erário; (grifei)
No caso do responsável
Lindolfo Weber, sua responsabilidade decorre do documento Doc. n. 2642/000 de
31/12/2003 (fl. 29), do qual consta como Ordenador Primário de R$ 150.000,00 (cento
e cinquenta mil reais), valor referente ao Subempenho da Nota de Empenho Global
n. 1966/000 de 2003 (fl. 100).
Veja-se que, acerca da
responsabilidade do ordenador de despesa, o Conselheiro do Tribunal de Contas
do Estado do Rio Grande do Sul, Helio Saul Mileski[2],
ensina que
A figura do Ordenador de Despesa
surgiu com a implantação do sistema de Fiscalização Financeira e Orçamentária
realizada pela Constituição de 1967, com as definições introduzidas pela
Reforma Administrativa, nos termos do regramento efetuado pelo Decreto-lei nº
200, de 25 de fevereiro de 1967.
Rompendo com o sistema de controle
prévio adotado pela Constituição de 1946, cuja concepção de controle estava
regulada pelo antigo Código de Contabilidade da União (Decreto Legislativo nº
4.536, de 28 de janeiro de 1922), a Constituição de 1967, com as alterações
efetuadas pela Emenda Constitucional nº 1, de 17.10.1969, na esteira das novas
normas gerais de direito financeiro estatuídas para elaboração e controle dos
orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito
Federal, editadas pela Lei Federal nº 4.320, de 17.03.1964, implantou o Sistema
de Fiscalização Financeira e Orçamentária, assentado na dualidade de controle -
controle externo e interno -, cuja sistemática de atuação passou a independer
do tempo (prévio, concomitante ou a posteriori), com execução via procedimento
de auditoria e julgamento das contas dos Administradores Públicos.
Consoante essa nova sistemática
constitucional, o julgamento das contas dos Administradores passou a ser
realizado em duas órbitas:
a) os Chefes de Poder Executivo - o
Presidente da República, os Governadores de Estados e os Prefeitos Municipais -
possuem o que se pode chamar de foro privilegiado, uma vez que as suas contas
anuais não são julgadas pelo Tribunal de Contas, mas sim apreciadas por ele,
mediante parecer prévio, com o julgamento cabendo ao Poder Legislativo
respectivo. Portanto, as contas prestadas anualmente pelos Chefes de Poder
Executivo sofrem apreciação técnico-jurídica do Tribunal de Contas e avaliação
política com julgamento do Poder Legislativo;
b)
quanto ao julgamento sobre a regularidade das contas dos administradores e
demais responsáveis (art. 70, § 4º, da CF/67), este fica adstrito à competência
de julgamento do Tribunal de Contas, em jurisdição própria e privativa, que
será baseado em levantamentos contábeis, certificados de auditoria e
pronunciamento das autoridades administrativas, sem prejuízo das inspeções
realizadas pelo próprio Tribunal de Contas.
Como conseqüência
desse sistema de apreciação e julgamento de contas, tornou-se necessária a
criação de um instrumento legal que viabilizasse a sua concretização. Este
instrumento legal é o processo, que deve ser organizado por um conjunto de
atos, no sentido de possibilitar a verificação de regularidade da ação
administrativa, quanto à boa à má gerência dos recursos financeiros e
administração dos bens públicos.
Nesse aspecto, a Lei Federal nº 4.320/64, no seu art. 84,
previu o processo chamado Tomada de Contas, ao dispor que "ressalvada a
competência do Tribunal de Contas, a tomada de contas dos agentes responsáveis
por bens ou dinheiros públicos será realizada ou superintendida pelos serviços
de contabilidade", mas
sem proceder à regulamentação dos procedimentos processuais necessários a sua
aplicação.
Foi o
Decreto-lei nº 200/67 que estruturou legalmente o processo de tomada de contas,
determinando os documentos que o integram, o prazo de instauração e quem se
submete ao procedimento processual - "todo ordenador de despesa ficará
sujeito a tomada de contas realizada pelo órgão de contabilidade e verificada
pelo órgão de auditoria interna, antes de ser encaminhada ao Tribunal de
Contas" (art. 81).
A par
de estruturar os procedimentos do processo de tomada de contas (arts. 81 a 93),
o Decreto-lei nº 200/67 também conceituou quem detém a condição de ordenador de
despesa, posicionando este como o interessado no processo de julgamento das
contas a ser realizado pelo Tribunal de Contas, nos termos do disposto no seu art.
80:
"Art.
80. Os órgãos de contabilidade
inscreverão como responsável todo o ordenador de despesa, o qual só poderá ser
exonerado de sua responsabilidade após julgadas regulares suas contas pelo
Tribunal de Contas.
§ 1º Ordenador de despesa é toda e qualquer
autoridade de cujos atos resultarem emissão de empenho, autorização de
pagamento, suprimento ou dispêndio de recursos da União ou pela qual esta
responda.
§ 2º O
ordenador de despesa, salvo conivência, não é responsável por prejuízos
causados à Fazenda Nacional decorrentes de atos praticados por agente
subordinado que exorbitar das ordens recebidas.
§ 3º As
despesas feitas por meio de suprimentos, desde que não impugnadas pelo
ordenador, serão escrituradas e incluídas na sua tomada de contas, na forma prescrita;
quando impugnadas, deverá o ordenador determinar imediatas providências
administrativas para a apuração das responsabilidades e imposição das
penalidades cabíveis, sem prejuízo do julgamento da regularidade das contas
pelo Tribunal de Contas."
Conforme a conceituação legal supratranscrita - § 1o -,
ordenador de despesa é necessariamente uma autoridade administrativa, de cujos
atos resultem emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou
dispêndio de recursos financeiros. Assim, a função de
ordenador de despesa está intimamente ligada à atividade administrativa de
execução orçamentária da despesa, envolvendo responsabilidade gerencial de
recursos públicos.
Nessa circunstância, para identificação do ordenador de
despesa é importante que este só possa assim ser considerado quando investido
de autoridade administrativa, via de conseqüência, não podendo ser reconhecido
na pessoa do agente subordinado. Por isso, o simples
assinador de empenho, o servidor que realiza a liquidação da despesa ou o seu
pagamento, em princípio, não pode ser identificado como o ordenador de despesa.
Ordenador de despesa é a autoridade
administrativa, o responsável-mor, com poderes e competência para determinar ou
não a realização da despesa, de cujo ato gerencial surge a obrigação de
justificar o bom e o regular uso dos dinheiros públicos.
Dessa
forma, Ordenador de Despesa é o agente público com autoridade administrativa
para gerir os dinheiros e bens públicos, de cujos atos resulta o dever de
prestar contas, submetendo-se, por isso, ao processo de tomada de contas, para
fins de julgamento perante o Tribunal de Contas (grifei).
Ora, foi na qualidade de
então Diretor-Geral da Secretaria de Estado da Fazenda que o responsável
Lindolfo Weber assinou a referida Nota de Subempenho. Tal cargo, há que se
dizer, enquadra-se perfeitamente no requisito de “autoridade administrativa”
exarado no trecho acima colacionado, de modo que configurada a responsabilidade
em comento.
Acerca das alegações de
nulidade, cumpre esclarecer que o presente processo de Tomada de Contas
Especial originou-se de Decisão exarada nos autos SPC n. 06/00313522, seguindo
todos os regulares trâmites previstos na legislação vigente, de modo que
descabida a referida arguição. Ao longo do desenrolar processual foram
ofertados aos ora responsáveis todos os mecanismos e instrumentos que compõem o
contraditório e ampla defesa, inclusive as próprias alegações de defesa sobre
as quais se debruça o presente parecer.
Conforme a lição do mestre
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes[3],
No
processo submetido à jurisdição dos Tribunais de Contas, após a determinação da
citação ou audiência, chega o momento da resposta do réu, gênero maior, onde se
insere o exercício do direito de ampla defesa, do contraditório e da revelia.
Assim,
como no processo judiciário, ao ser citado ou chamado em audiência, o agente
pode assumir uma das seguintes atitudes:
a
– responder à citação:
a.1) reconhecendo a procedência do que
lhe é requerido;
a.2) apresentado defesa, que poderá ser:
a.2.1) contra o processo ou
a.2.2) contra o mérito
b
– deixar o processo correr ao acaso, não respondendo à citação.
Nos
processos de julgamento de contas, notadamente nos de tomada de contas
especial, quando o citado reconhece a procedência dos fatos articulados na
citação, pode, desde logo, efetuar o pagamento do débito que lhe é imputado,
obtendo, ipso facto, direito à quitação.
Tendo por norte o excerto
acima, resta comprovado que o presente processo, desde sua gênese como
Solicitação de Prestação de Contas até a presente Tomada de Contas Especial,
atendeu os requisitos para o regular andamento processual, bem como os
princípios que regem a jurisdição do controle, que, no entendimento do
professor Jacoby[4],
seriam legalidade, segurança jurídica, juiz natural (subdividido em
distribuição aleatória de processos, designação do relator e impedimento e
suspeição), devido processo legal (subdividido em encaminhamento de
documentos), contraditório e ampla defesa (garantias da informação,
manifestação e consideração das razões).
No que tange às alegações
almejando a prescrição, também não as socorre a legislação, tanto
constitucional como infraconstitucional. A CRFB/88 prescreve, em seu art. 37, §
5º, que
§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição
para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de
ressarcimento. (grifei)
Assim também o art. 3º,
inciso I, da Resolução n. TC-100/2014:
Art.
3º A aplicação do art. 24-A da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000 será afastada nas seguintes
hipóteses:
I
– incidência do art. 37, § 5º, da
Constituição Federal nos processos em que for caracterizado dano ao erário,
conforme dispõem os arts. 15, § 3º, 18, inciso III e § 2º, e 32 da Lei
Complementar (estadual) n. 202/2000. (grifei)
Do mesmo modo, respeitada
doutrina da seara de contas públicas reafirma a questão da imprescritibilidade
quando se fala em ressarcimento dos cofres públicos. Nesse sentido, o já
mencionado professor Jacoby[5]
ensina que a previsão do art. 37, § 5º
[...]
fixou indelevelmente dois comandos: o primeiro, pertinente aos ilícitos
praticados por qualquer agente que cause prejuízo ao erário, os quais terão
obrigatoriamente prazos de prescrição, sendo entendido como tal os prazos de
prescrição penal e administrativa; o segundo, pertinente ao direito da
Administração Pública de ver recomposto o prejuízo causado ao erário, o qual
não terá prazo prescricional se o dano decorre de ato ilícito, porque foi
expressamente ressalvado da regra geral de prescrição pela Constituição
Federal.
Por
isso, esta regra geral, prevista no Código Civil Brasileiro, não subsiste
quando a Administração estiver buscando ressarcir o erário de prejuízo
decorrente de ato ilícito.
Mais adiante em sua obra, o
autor comenta[6]
ainda sobre a prescrição antes do julgamento e a prescrição intercorrente,
analisando que
Ocorrida
a irregularidade em matéria de contas públicas, nasce para a sociedade,
personalizada no Estado, por intermédio do Tribunal de Contas, a pretensão de
punir os responsáveis.
Essa
pretensão é consumida pela ação do tempo, observadas as normais causas de
interrupção e de prescrição. Exaurindo-se o lapso temporal, sem que a
Administração Pública procure apurar o fato de que tinha ciência, ocorre a
chamada prescrição da pretensão punitiva da Administração, em conformidade com
a tradicional teoria do direito penal. Reconhecendo a prescrição, é possível
pugnar pela responsabilização de que a esta deu causa.
[...]
Denomina-se
intercorrente a prescrição que se
consuma pela superveniência do curso do lapso temporal, após a interrupção ou
suspensão do processo. Pode efetivamente ocorrer que, diante de uma
irregularidade, a Administração Pública inicie a apuração, mas, posteriormente,
abandone de tal modo a apuração, revelando tal descaso com o já manifestado
interesse de punir, que decorra integralmente novo lapso prescricional.
O que se pode extrair dos
pontos elencados acima é que a prescrição somente tem lugar quando não presente
a ressalva do art. 37, § 5º, da CRFB/88.
Ora, forçoso é reconhecer
que, se há irregularidade na aplicação dos recursos com imputação de débito aos
responsáveis, deduz-se que houve o dano ao erário, o que impossibilita que se
discuta da prescritibilidade dos fatos observados.
Portanto, considerando que os
argumentos oferecidos não foram capazes de elidir os fatos imputados,
entende-se pela manutenção das restrições impostas aos responsáveis, conforme
será disposto no item 5 e na conclusão deste parecer, oportunidade na qual será
adequada a consequência do apontamento – imputação de débito ou aplicação de
multas – ao entendimento definido pelo Conselheiro Relator na Decisão Singular
de fls. 442-445, o qual, não obstante inúmeros posicionamentos divergentes que
multiplicam decisões antagônicas no âmbito dessa Corte de Contas, restringiu a
citação no aspecto ora analisado sob pena somente de multa. Em outras
palavras, diante da aludida Decisão Singular, entendo que a presente restrição
viabiliza apenas a aplicação de multas aos responsáveis.
2. Competência
para executar políticas de assistência ao idoso.
A Lei Estadual n.
11.436/2000, ao dispor sobre a Política Estadual do Idoso, previu em seus arts.
5º e 6º o seguinte:
Art. 5º Competirá ao órgão estadual responsável
pela Assistência Social a coordenação geral da Política Estadual do Idoso,
com a participação dos Conselhos Estadual e Municipais do Idoso.
Art. 6º
Competirá ao Estado por intermédio do
órgão responsável pela Assistência Social:
I -
coordenar as ações relativas à Política Estadual do Idoso;
II -
participar na formulação, acompanhamento e avaliação da Política Estadual do
Idoso;
III -
promover a articulação com as Secretarias Estaduais e Órgãos Federais
responsáveis pelas políticas de Saúde, Previdência Social, Assistência Social,
Trabalho, Habitação, Justiça, Cultura, Educação, Esporte, Lazer, Urbanismo,
Agricultura, Segurança Pública, Ciência e Tecnologia visando a implementação da
Política Estadual do Idoso;
IV - apoiar
o Conselho Estadual do Idoso na elaboração do diagnóstico da realidade do idoso
no Estado, visando subsidiar a elaboração do plano de ação;
V - prestar
assessoramento técnico às entidades, prefeituras municipais e organizações de
atendimento ao idoso no Estado de acordo com as diretrizes definidas pelo
Conselho Estadual do Idoso;
VI -
formular política para a qualificação sistemática e continuada de recursos
humanos na área do idoso;
VII
- garantir o assessoramento técnico ao Conselho Estadual do Idoso bem como a
órgãos estaduais e entidades não governamentais, no sentido de tornar efetivos
os princípios, as diretrizes e os direitos estabelecidos na Lei federal nº
8.842, de 04 de janeiro de 1994, regulamentada pelo Decreto federal nº
1948, de 03 de julho de 1996, e nesta Lei estadual;
VIII -
prestar apoio técnico e financeiro às iniciativas comunitárias de estudo e
pesquisas na área do idoso;
IX
- coordenar e manter atualizado o sistema de cadastro de entidades e
organizações de atendimento ao idoso no Estado. (grifei)
Percebe-se que não há
remissões ou referências à SOL, bem como na legislação que traz as competências
desta (art. 52 da Lei Complementar Estadual n. 243/2003) não se encontra a
elaboração ou manutenção de políticas voltadas aos cidadãos idosos:
Art. 52. À Secretaria de Estado
da Organização do Lazer compete:
I - desenvolver as atividades
relacionadas com:
a) turismo;
b) cultura;
c) desporto;
d) lazer;
II - a elaboração da política
do turismo, visando ao seu desenvolvimento;
III - a promoção e divulgação
das potencialidades turísticas do Estado, em cooperação com os Municípios;
IV - o estímulo às atividades
de cultura, desporto e turismo nos âmbitos municipais, regionais, estadual,
nacional e internacional, especialmente com os países signatários do Tratado de
Assunção (MERCOSUL);
V - o intercâmbio com entidades
ligadas ao turismo, inclusive organismos internacionais;
VI - o desenvolvimento de
política de integração do desporto através da criação de espaços esportivos
comuns e arenas de multiuso, bem como ampliação dos existentes, em parceria com
os municípios.
VII - a compatibilização das
diretrizes estaduais com a política nacional de desenvolvimento do turismo;
VIII - a divulgação do
potencial turístico de Santa Catarina;
IX - a implantação de ações,
programas e projetos de apoio ao desenvolvimento de atletas infanto-juvenis de
alto rendimento; e
X - planejar estrategicamente,
implantar, coordenar e avaliar a política estadual das atividades de lazer.
Desse modo, ao envolver-se
com a execução de Convênio que tinha por objeto a prestação de serviços
voltados ao idoso, a SOL excedeu sua linha de competências, nos termos do item
2.1.2 do Relatório DCE n. 508/2015 (fls. 1.244-1.245), incidindo esta
responsabilidade pela irregularidade presente sobre o seu Secretário à época,
Sr. Gilmar Knaesel.
Cabe salientar que, pelo
informado no documento ME n. 41/2003 (fl. 102), o Programa denominado “Cartão
Melhor Idade” tinha por objetivo “a inclusão social do cidadão a partir dos 50
anos residentes no Estado de Santa Catarina”. Portanto, a violação em comento é
também pela extrapolação de
competências ao abranger programa voltado ao idoso, uma vez que se nota que o
programa não é exclusivamente
direcionado a eles, mas sim de pessoas acima dos cinquenta anos, o que
obviamente abrange igualmente a população idosa.
A título de esclarecimento, a
Lei Federal n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) define que o idoso é aquela
pessoa “com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos”. Do mesmo modo, o
art. 2º da Lei Estadual n. 11.436/2000 dispõe que “Considera-se idoso, para os
efeitos desta Lei, a pessoa com sessenta anos de idade ou mais”.
Conforme já expendido acima,
o referido responsável manteve-se inerte quando de sua citação, deixando escoar
seu prazo de defesa. Frise-se, por fim, que a conduta levada a termo
possibilitou a referida burla à prescrição constitucional da necessidade de
licitação para contratações do poder público.
Portanto, tendo em vista o
respeito aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa
demonstrados a partir da regularidade da citação do responsável, e considerando
a falta de manifestação do mesmo, a presente restrição merece ser mantida, com
a consequente aplicação de multa ao Sr. Gilmar Knaesel, então Secretário de
Estado da Organização do Lazer, conforme disposto no Relatório DCE n. 538/2013
e na Decisão Singular GAC/AMF n. 139/2014, os quais neste ponto se encontram em
consonância.
3. Ausência de
comprovação do efetivo fornecimento dos materiais ou prestação dos serviços, em
face da descrição insuficiente das notas fiscais apresentadas e da ausência de
outros elementos de suporte.
As defendentes Intertrainer
Desenvolvimento Empresarial Ltda. e a Sul Card Administradora de Cartões S.A.,
em defesa conjunta (fls. 503-519) alegam que
Em
razão do tempo decorrido entre os fatos e a solicitação de informações, não se
pode aferir quantos folders, take one (disposer para fichas de adesão) e outros
materiais de propaganda foram confeccionados, mas considerando que o número a ser atingido pelo projeto de
50.000 cartões, e de 5.000 estabelecimentos, é fato notório que foi um número
bastante elevado.
Além
disso, a Defendente cadastrou médicos, dentistas e as farmácias que utilizaram
o sistema PBM – Pharmacy Benefite
Management, de propriedade da PREV SAÚDE em todo o estado de Santa
Catarina, salões de beleza, academias, cursos de informática, hotéis e óticas.
Para
divulgação do “Cartão de Melhor Idade” nas diversas Secretarias Regionais de
Santa Catarina, as Defendentes promoveram palestras com associações de
aposentados, clube de idosos, cafés e chás da tarde, que ultrapassaram uma
centena de eventos, cujos custos sempre foram de responsabilidade das
Defendentes.
[...]
Assim,
foram confeccionados os previstos 50.000 (cinquenta mil) cartões, que ficaram a
disposição sem os embosses (dados pessoais dos usuários), para serem embossados
e entregues imediatamente após a solicitação.
As
Defendentes encontraram em seus arquivos 14 (quatorze) caixas de arquivo morto
com fichas de cadastro de usuários preenchidas à mão, e que estão à disposição
desse órgão fiscalizador.
As
Defendentes aguardam orientação de como e onde depositar tais documentos, posto
que o volume é bastante elevado e as Defendentes estão com dúvidas de como
apresentar tais documentos sem que cause mais transtornos e delongas para o
processo.
[...]
Somente
em descontos pelo uso do PBM – Pharmacy Benefite Management, foi atingido o
valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), em benefícios dos usuários do
cartão, cujos relatórios não foram
possíveis de se recuperar em razão do lapso de tempo entre a citação e a
ocorrência dos fatos.
Foram
recuperados somente os relatórios referentes a utilização dos meses de
agosto/2004 e setembro/2004 que foram juntados aos autos em
meio digital (fls. 347)
[...]
Entre
os anos de 2004 e 2007 o número de cartões ativos chegava a casa de 22.000
(vinte e dois mil).
[...]
Logo,
o projeto estava viável do ponto de vista econômico, e as Defendentes faziam a
gestão de todos os cartões de benefício e cadastros de credenciados e usuários
do cartão.
O
projeto tinha boa aceitação, até que no final do ano de 2007 a servidora
SABRINA DE SOUZA foi afastada da função de coordenadora junto a SOL, e com isso
o programa perdeu fôlego.
A
Defendente também fez parceria com a UNIVERSIDADE UNISUL e Município de
Imbituba/SC, e conseguiu implantar em Imbituba o CURSO DE EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA PARA A TERCEIRA IDADE, que atendeu uma série de alunos, cujo
montante exato não se tem lembrança, dando continuidade ao projeto iniciado.
Com
o encerramento do convenio com a CELESC no final de 2007, a manutenção dos
cartões restou inviável financeiramente, eis que o custo cobrado era bastante
baixo e dependia de uma forma eficaz de arrecadação, no caso a conta de energia
elétrica.
A
Defendente ainda manteve os benefícios dos cartões por mais 4 (quatro) meses
após o encerramento do convenio com a CELESC, sem qualquer possibilidade de
cobrança de tais valores.
Ao
final do projeto, foi inserida uma nota no jornal de circulação estadual,
comunicando o fim do convênio e informando a manutenção dos benefícios pelo
prazo acima descrito.
Assim,
o projeto encabeçado pela ASAPREV que beneficiou pessoas em todo o estado de
Santa Catarina, e que precisava dos serviços específicos prestados pelas
Defendentes foi encerrado.
[...]
Urge lembrar
que o presente procedimento administrativo citou as Defendentes após os cinco
anos da ocorrência dos fatos, e portanto, os documentos contábeis referentes as
operações acima não estão mais em poder das Defendentes e não há
obrigatoriedade para estarem.
Os programas
de computador que foram utilizados foram perdidos e com eles informações
importantes sobre o uso dos cartões também se foram, porém em busca por
documentos físicos foram encontradas caixas no setor de arquivo morto das
Defendentes
(grifei).
Informam que anexam documentos
listados (fl. 513) como provas, quais sejam: anexo Contrato de Integração ao
Projeto Melhor Idade e de Concessão de Descontos; fotocópia de livro preto para
Críticas e Sugestões – Cartão Melhor Idade; folders e material publicitário
para divulgação do projeto; relação de grupos de idosos que foram visitados
e/ou contatados para oferecimento do cartão e benefícios; relação de contatos
de assistentes sociais e respectivas Secretarias Regionais de Estado que foram
contatadas e que de alguma forma atuaram no projeto. Ao final, reiteram as 14
caixas de arquivo morto à disposição do Tribunal de Contas.
Aventam, por fim, a título de
prejudicial do mérito, a ocorrência de prescrição intercorrente e da prescrição
geral (fls. 515-517).
Em sua defesa (fls. 1.083-1.098),
a responsável ASAPREV atribui a responsabilidade pela comprovação em tela à SEF
ou à SOL, pois teriam sido estes Órgãos, com seus respectivos Secretários, os
gestores dos recursos (fls. 1.093-1.094). Afirma também não ter obrigação de
guardar prova de fatos ocorridos há mais de 5 anos (fl. 1.095).
Aduz que, caso a documentação
juntada em anexo não seja acatada, a detalhada aplicação dos recursos deverá
ser exigida da SOL e da Intertreiner/SULCARD (fl. 1.096).
O responsável Sr. Marcos
Wandresen, ao defender-se (fls. 1.209-1.228), também atribui a má aplicação dos
recursos alternativamente à SEF ou à SOL, colocando a ASAPREV como mera
receptora do valor referente ao objeto do Convênio (fl. 1.224).
Acerca deste tópico, a
Unidade Técnica, em seu relatório n. 508/2015 (especificamente às fls.
1.245-1.247), entendeu pela imputação de débito ao responsável Marcos Wandresen
e à ASAPREV, baseando-se na insuficiência da documentação apta a comprovar a
realização do objeto do programa, em contrariedade aos arts. 49, 52 e 60 da
Resolução n. TC-16/94, cujas disposições encontravam-se em vigor à época dos
fatos, acrescentando, ainda, a responsabilização dos Srs. Gilmar Knaesel, Max
Roberto Bornholdt e Lindolfo Weber, mesmo considerando que tais gestores não
foram citados sob a imputação de débito ora debatida, consoante o que já se
registrou ao final do item 1 e será aprofundado no item 5, ambos deste parecer.
A impossibilidade de liquidez
da despesa resta devidamente configurada ao teor da descrição contida nas notas
ficais 092 e 093 dos autos (replicada à fl. 1245 do relatório técnico), que
traz um relato por demais genérico do serviço prestado, como “serviços de
administração e implantação da rede de estabelecimentos do Projeto Melhor
Idade, treinamento de pessoal, formação de banco de dados e atividades
complementares”, ao custo de R$ 49.435,00.
Ora, que atividades foram
essas? Quem foram as pessoas treinadas? Quantas foram necessárias para treinar,
formar banco de dados, administrar e implementar a tal rede de estabelecimentos?
Que atividades complementares seriam essas? Quais foram os custos em materiais
e serviços para desenvolver essas atividades? Sem essas informações não se pode
aferir minimamente se o valor repassado corresponderia ao serviço prestado.
O mesmo raciocínio se aplica
ao dispêndio de R$ 100.000,00 para o desenvolvimento de software para a
implantação do projeto.
As informações trazidas pelos
responsáveis, como se verá, não têm o condão de justificar o valor repassado,
pois não comprova a a sua aplicação integral no objeto conveniado.
Por outro lado, no que tange
à responsabilidade da Intertrainer Desenvolvimento Empresarial Ltda. e da Sul
Card Administradora de Cartões S.A., o relatório técnico, estranhamente,
eximiu-as da imputação referente à não comprovação da efetiva prestação dos
serviços, argumentando (fl. 1.246v) que
Foram encaminhados, por estas empresas, diversos documentos, tais como
fichas de cadastro dos usuários, contratos de integração ao projeto e de
concessão de descontos, além de produtos de mídia e informes publicitários
(fls. 520-1070), os quais a princípio
demonstram a execução da avença firmada entre as referidas empresas e a
ASAPREV. As empresas, inclusive, demonstram interesse em apresentar outros
comprovantes constantes de um arquivo morto, constituído de 14 caixas (fls.
518).
Ressalte-se que, diante da documentação apresentada pelas empresas,
inexistem nos autos indícios de que os serviços não tenham sido por elas
prestados, cabendo, portanto, sugestão ao Exmo. Relator para que considere o
afastamento das suas responsabilidades.
Contudo,
ressalte-se que o fato das empresas terem demonstrado a execução dos serviços
não afasta a ocorrência de dano ao erário estadual, pois o repasse em questão
foi realizado à entidade com caráter de assistência social mediante convênio
que tem fundamento, entre outros dispositivos legais, no Decreto Estadual nº
307/2003, que disciplina a celebração de convênios ou instrumentos congêneres,
de natureza financeira, pelos órgãos ou entidades da administração pública
estadual direta ou indireta, que tenham como objeto a execução descentralizada
de programas de governo e ações.
Este Órgão Ministerial
diverge do entendimento propugnado pela Área Técnica desse Tribunal de Contas.
Em que pese o volume considerável de documentos juntados às fls. 520-1.070,
entende-se que não restaram cumpridos os mesmos dispositivos aos quais o
relatório técnico fez alusão anteriormente, uma vez que as próprias empresas, em sua defesa, confessam em diversas ocasiões
que não dispõem de volume considerável de documentos e informações. Admitem que somente dispõem de
relatórios referentes aos meses de agosto e setembro de 2004 e aduzem que
diversos documentos e informações contidas em programas de computador foram
perdidos ao longo dos anos.
Nesse sentido, o art. 52,
incisos II e III, da Resolução n. TC-16/94, a qual se encontrava vigente à
época em que se deram os fatos, é expressa ao determinar que
Art.
52. A autoridade administrativa
considerará como não prestadas as contas, entre outras situações
possíveis, quando: [...]
II
– com documentação incompleta;
III
– a documentação apresentada não oferecer condições à comprovação da boa e
regular aplicação dos dinheiros públicos (grifei).
Note-se que a Unidade Técnica
entende que os documentos e informações em questão, aptos a afastarem a
irregularidade, “a princípio demonstram a execução da avença firmada entre as
referidas empresas e a ASAPREV”. Ora, tal entendimento não deve prosperar, pois
ilide a imputação feita com base em mera conjectura, talvez impressionada com o
volume de dados apresentados e a oferta de outras “14 caixas” de documentos do
arquivo morto.
Tanto é assim que o próprio
relatório técnico, apenas alguns parágrafos antes, fazia a seguinte assertiva
(fl. 1.245v):
Ressalta-se
que em nenhum momento foram anexados aos autos quaisquer documentos aptos a
comprovar a realização do objeto proposto na sua integralidade, como lista de
frequência em cursos de treinamento, listagem com a identificação dos usuários
dos cartões emitidos, contratos de adesão dos estabelecimentos comerciais
cadastrados, dentre outros elementos que demonstrem a efetiva realização do
projeto “Cartão Melhor Idade”.
A ressalva, contida no
parágrafo retro colacionado, levada a efeito pela Unidade Técnica se deve ao
conteúdo dos arts. 6º, § 2º e art. 8º, inciso XV do Decreto Estadual n.
307/2003, os quais prescrevem, respectivamente, que é vedado firmar convênios
com organizações de direito privado com fins lucrativos (o que se observou no
processo em epígrafe) e que o convênio conterá de modo expresso e obrigatório,
cláusula que estabeleça a proibição de que o convenente repasse recursos
financeiros recebidos a outras entidades de direito público ou privado (o que
se observou também neste processo).
A burla aos artigos em
comento se deu no momento em que a ASAPREV efetuou repasses dos recursos
recebidos às empresas Intertrainer Desenvolvimento Empresarial Ltda. e SULCARD
Administradora de Cartões S.A., de modo que se torna imperiosa a devolução aos
cofres públicos dos valores referidos.
Assim, as presentes
restrições devem ser mantidas, com a
consequente imputação de débito aos responsáveis relacionados na parte final
deste parecer, tendo em vista que, não obstante a apresentação de documentação
voltada a comprovar a aplicação dos recursos, verificou-se sua incompletude,
assim como restou assente a ilegalidade dos repasses efetuados.
4. Apresentação
de prestação de contas fora do prazo
A responsável ASAPREV, em sua
defesa (fls. 1.083-1.098), afirmou que “nunca houve apresentação da prestação
de contas fora do prazo, contrariando o art. 8º da Lei Estadual n. 5.867/81”.
Argumentou (fl. 1.097) que o § 1º do dispositivo enfocado permitiria a
prorrogação do prazo em até 180 dias, desde que não excedesse o dia 31/12, sendo
que o repasse teria sido feito em 03 de fevereiro de 2004, tendo até 03 de
setembro (considerando os 180 dias de prorrogação), e que a prestação teria
sido entregue no dia 27 de agosto do mesmo ano.
O responsável Marcos
Wandresen reitera os mesmos argumentos, e ao final adiciona o seguinte (fl.
1.226):
Corrobora
o fato da prestação ter sido apresentada em tempo hábil, o fato deste
peticionante ser o Presidente à época da ASAPREV, e ter findado seu mandato em
12/04/2004, data na qual foi empossada a nova diretoria, conforme registro n.
188295, fls. 13, livro B-413 em 19/04/2004, perante o Registro Civil Títulos e
Doc. Pessoas Jurídicas Iolé Luiz Faria.
Contudo, entende este Órgão
Ministerial não assistir razão aos responsáveis ora defendentes, pois, da
leitura atenta do dispositivo no qual se ampararam, depreende-se que a
prorrogação do prazo pode se dar em situação excepcional e, cumulativamente, a
prudente juízo do titular da repartição responsável. Veja-se a íntegra do
dispositivo legal:
Art.
8º As instituições contempladas com subvenções são obrigadas a apresentar à
Secretaria da Fazenda, através da repartição a que pertencer o crédito, a
correspondente prestação de contas, no prazo de 60 (sessenta) dias contados do
recebimento, mas nunca excedendo ao último dia do exercício.
§
1º Excepcionalmente, e a prudente juízo do titular da repartição que houver
liberado a subvenção, o prazo fixado neste artigo poderá ser prorrogado por
período a 180 (cento e oitenta) dias, não excedentes este último a 31 de dezembro
do exercício correspondente.
§
2º A autoridade que conceder a prorrogação do prazo para prestação de contas
dará imediato conhecimento à Secretaria da Fazenda.
Ademais, tenha-se em vista os
argumentos expendidos pela Unidade Técnica ao abordar o assunto:
No presente caso, não
há autorização expressa para a prorrogação do prazo inicialmente concedido à
entidade, motivo pelo qual sua justificativa não pode ser aceita. Ademais, se o
procedimento adotado com relação à primeira parcela foi aprovado é porque não
resultou em atraso na prestação de contas.
Destaca-se
que a prestação de contas deve ser encaminhada ao órgão que liberou os recursos
e que o atraso restou caracterizado, devendo, portanto, ser aplicada penalidade
ao responsável.
Logo, a manifestação dos
responsáveis não logra êxito em afastar o atraso que lhes é imputado, razão
pela qual a presente restrição deve ser mantida, com a consequente aplicação de
multa ao responsável, Sr. Marcos Wandresen, já que somente o ex-Presidente da
ASAPREV – e não a pessoa jurídica – fora citado para responder à presente
irregularidade.
5.
Solidariedade dos Srs. Gilmar Knaesel, Max Roberto Bornholdt e Lindolfo Weber.
O responsável Max Roberto
Bornholdt, em sua defesa (fls. 450-465), além da já comentada alegação de ilegitimidade
passiva, combateu a aplicação da responsabilização solidária (fls. 461-462),
colacionando o disposto no art. 67 do Decreto Estadual n. 127/2011, bem como o
art. 3º, §§ 1º e 2º, e aduzindo que todos os órgãos da Secretaria de Estado da
Fazenda responsáveis pela fiscalização teriam exercido seu trabalho, nos termos
do Regimento Interno, e que a Tomada de Contas Especial teria sido instaurada
em 08/01/2008, por determinação do Tribunal de Contas, razão pela qual não
haveria que se falar em responsabilidade solidária da autoridade do órgão
concedente, pois qualquer irregularidade eventualmente apurada deveria ser
reparada pela entidade convenente.
O responsável Lindolfo Weber
defendeu-se (fls. 1.074-1.080) alegando que a Nota de Empenho objeto da presente
Tomada de Contas Especial teria sido assinada visando a dar condições à ASAPREV
de executar o objeto do convênio, dele não constando a previsão de participação
da SOL (fl. 1.078). Afirmou também (fl. 1.078) que não era de seu conhecimento
que o programa seria da SOL ou que esta viria a geri-lo ou coordená-lo, a ponto
de demandar procedimento licitatório, e que (fl. 1.079) o Convênio firmado
entre a SOL e a ASAPREV não teria sido levado ao conhecimento da Secretaria de
Estado da Fazenda na época, somente tendo tomado conhecimento por meio dos
presentes autos. Por fim, argumenta (fl. 1.079) que não foram comprovados
prejuízos ao erário.
Conforme já expendido
outrora, o responsável Gilmar Knaesel quedou-se inerte, submetendo-se ao
alcance da norma contida no art. 15 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000
(“o responsável que não acudir à citação será considerado revel, para todos os
efeitos, dando-se prosseguimento ao processo”).
Cabe, em primeiro lugar,
reforçar a qualidade e natureza dos cargos ocupados pelos responsáveis
apontados quando da ocorrência dos fatos que lhes são imputados: o Sr. Max
Roberto Bornholdt ocupava o cargo de Secretário da Fazenda (SEF), o Sr.
Lindolfo Weber ocupava o cargo de Diretor-Geral da Secretaria de Estado da
Fazenda (SEF) e o Sr. Gilmar Knaesel ocupava o cargo de Secretário de Estado da
Organização do Lazer.
Sob esta ótica, examine-se a
explanação do administrativista Celso Antônio Bandeira de Mello sobre a
classificação dos agentes públicos[7]:
Agentes políticos são os titulares dos cargos
estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes os que integram
o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se
constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes políticos apenas o Presidente da República, os
Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes de Executivo, isto é, Ministros e
Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados
federais e estaduais e os Vereadores.
O
vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política. Exercem um munus
público. Vale dizer, o que os qualifica para o exercício das correspondentes
funções não é a habilitação profissional, a aptidão técnica, mas a qualidade de
cidadãos, membros da civitas e, por
isto, candidatos possíveis à condução dos destinos da Sociedade (grifei).
Tem-se como agentes políticos
não somente os Chefes do Executivo nas três esferas federativas, como se
poderia supor num primeiro momento, mas também aqueles agentes que atuam em
nível de subordinação direta àqueles, tais quais os Ministros e Secretários de
Estado.
Ainda neste sentido, o mesmo
autor, ao debater a questão da responsabilidade do Estado e quais os sujeitos
cuja atuação pode comprometer o Estado, ensina[8]:
Quem
são as pessoas suscetíveis de serem consideradas agentes públicos, cujos
comportamentos, portanto, ensejam engajamento da responsabilidade do Estado? São todas aquelas que – em qualquer
nível de escalão – tomam decisões ou realizam atividades da alçada do Estado,
prepostas que estão ao desempenho de um mister público (jurídico ou material),
isto é, havido pelo Estado como pertinente a si próprio.
Nesta
qualidade ingressam desde as mais altas autoridades até os mais modestos
trabalhadores que atuam pelo aparelho estatal.
[...]
Indicadas
as pessoas cuja conduta compromete a responsabilidade do Estado, cumpre verificar quando esta condição subjetiva tem o relevo necessário para
desencadear tal comprometimento. Sendo certo que a pessoa também atua
em situação totalmente alheia à qualidade de agente, importa fixar o que se
reputará necessário para configurar atuação (ou omissão indevida) imputável à
qualidade jurídica de “agente do Estado” (grifei).
Da leitura atenta das lições
expostas conclui-se que os três responsáveis enquadram-se no perfil em comento,
vez que então ocupantes de cargos nos quais “tomam decisões ou realizam
atividades da alçada do Estado, prepostas que estão ao desempenho de um mister
público (jurídico ou material)”, quais sejam, as Secretarias (SEF e SOL) e a
Diretoria-Geral da SEF.
Além da orientação
doutrinária, o próprio arcabouço legislativo em vigor traz dispositivos cujo
conteúdo abarcam a presente situação em que se encontram os responsáveis. O
art. 1º, incisos III e X, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 determina
que
Art.
1º Ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, órgão de controle
externo, compete, nos termos da Constituição do Estado e na forma estabelecida
nesta Lei:
[...]
III
— julgar as contas dos
administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores da
administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades
instituídas e mantidas pelo Poder Público do Estado e do Município, e as contas
daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que
resulte prejuízo ao erário;
[...]
X
— fiscalizar a aplicação de quaisquer
recursos repassados pelo Estado ou Município a pessoas jurídicas de
direito público ou privado, mediante
convênio, acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento congênere, bem
como a aplicação das subvenções por eles concedidas a qualquer entidade de
direito privado; (grifei)
Já o art. 133, § 2º, alínea
“a” da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno do Tribunal de Contas de
Santa Catarina) traz a definição de responsável. Veja-se:
Art.
133. Em todas as etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de
atos sujeitos a registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada
aos responsáveis ou interessados ampla defesa.
§
1º Para efeito do disposto no caput, considera-se:
a)
responsável aquele que figure no
processo em razão da utilização, arrecadação, guarda, gerenciamento ou
administração de dinheiro, bens, e valores públicos, ou pelos quais o Estado ou
o Município respondam, ou que, em nome destes assuma obrigações de natureza
pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou outra irregularidade de
que resulte prejuízo ao erário (grifei);
Neste mesmo sentido é o
entendimento da Unidade Técnica, que ao exarar seu Relatório de Instrução n.
508/2015, traçou o seguinte panorama (fl. 1.249v-1.250):
Cabe afirmar que a conduta dos
responsáveis concorreu para a ocorrência do dano, pois o exercentes
de um múnus público devem desenvolver seu mister em consonância com as
normas vigentes, pois aqueles que atuam na contratação, na formulação, no
planejamento, na coordenação e na execução de políticas públicas devem fazê-lo
dentro dos princípios que norteiam todo o serviço público.
Caberia ainda aos ex-Gestores
capacitarem seus servidores para que falhas não viessem a incorrer em
descumprimento de norma legal ou regulamentar, além de que, deveriam ser
formalizados fluxogramas e rotinas para que cada setor ou servidor assumisse
suas responsabilidades na tramitação processual, de modo a não descumprir
requisitos legais imprescindíveis.
Ademais, o Ordenador de Despesa e gestor da
coisa pública deveria exigir que seus subordinados estivessem atentos e
vigilantes a todos os procedimentos legais e normativas afetos a gestão dos
recursos públicos
Desta forma, os responsáveis não podem se desvincular de suas atribuições, dado ao fato de deterem o
poder de hierarquia, supervisão e controle, dentre outras atribuições previstas
no art. 7º da Lei Complementar Estadual nº 381/2007.
A inobservância de um dever de cuidado objetivo imposto pelas normas legais
ou regulamentares a todas as pessoas de razoável diligência, torna a conduta
sua culposa, pois deveria ser de tal modo a não causar inobservância às normas,
que redundassem em dano aos cofres públicos.
Todos aqueles que concorrem para o cometimento do dano ao erário podem
ser responsabilizados solidariamente, independentemente da existência de dolo
ou má-fé, bastando a presença do elemento culpa, além do nexo de causalidade
entre a ação omissiva-comissiva e o dano constatado, o que se verifica nestes
autos.
O Gestor Público responsável pela aprovação/homologação do termo de
concessão de repasse de recurso, quando da análise dos requisitos
legais, confirma a validade dos atos praticados até aquele momento e, ao
anuir o procedimento de concessão torna-se responsável, visto que caberia
a ele arguir ou não qualquer falha na condução do processo ou então determinar
que isso fosse realizado com o devido rigor.
Diante do exposto, resta
concluir que os responsáveis aqui mencionados infringiram a legislação em
vigor, ferindo suas diretrizes e prerrogativas inerentes aos cargos ocupados,
colaborando para que se chegasse ao resultado que culminou em danos ao erário,
não logrando sucesso em demonstrar o contrário.
Desta maneira, deveriam os
responsáveis Max Roberto Bornholdt, Lindolfo Weber e Gilmar Knaesel responder
solidariamente com os responsáveis Marcos Wandresen e ASAPREV pelas
irregularidades constantes dos autos, passíveis de imputação de débito e
aplicação de multas, conforme já restou destacado, a propósito, também no item
1 deste parecer.
Entretanto, como igualmente
já frisado ao final do item 1 deste parecer, apesar de esta Procuradora
apresentar o referido entendimento, concordando, assim, com o posicionamento da
Diretoria de Controle da Administração Estadual no sentido de responsabilizar
também os Secretários de Estado de maneira solidária em situações como a
presente – irretocável, neste aspecto, a argumentação de fls. 1.248-1.252 –, a
Decisão Singular GAC/AMF n. 139/2014 inviabiliza a responsabilização solidária
em comento.
Aliás, nos casos em que a
Área Técnica deixa de imputar a responsabilidade solidária do Secretário de
Estado pelo débito assinalado na verdadeira enxurrada de processos de Tomada de
Contas Especial de recursos repassados a particulares, notadamente no âmbito
dos Fundos que compõem o SEITEC (FUNCULTURAL, FUNDESPORTE e FUNTURISMO),
recomenda-se ao final das manifestações ministeriais desta Procuradora a uniformização
de entendimentos da Diretoria Técnica, no sentido de que não se multipliquem
decisões antagônicas nesse Tribunal de Contas.
Todavia, repita-se que na
Decisão Singular de fls. 442-445, foram delineadas as responsabilizações que se
entendeu como corretas, sobre as quais fora procedida a citação dos
responsáveis, não cabendo, assim, imputar o débito ora debatido a quem não
definido como responsável pelo Conselheiro Relator, tendo em vista que os Srs.
Max Roberto Bornholdt, Gilmar Knaesel e Lindolfo Weber não foram citados para
responder às irregularidades sob pena de débito – tão somente sob pena de multa
–, concordando-se ou não com referido posicionamento.
6. Da
responsabilidade da pessoa jurídica
A ASAPREV ofereceu suas
alegações de defesa (fls. 1.083-1.098) nos autos representada pelo seu
Presidente, o Sr. João Alfredo Campos.
Reivindicou a exclusão da
responsabilidade solidária e sua ilegitimidade passiva (fl. 1.087),
argumentando que nunca teria havido litigância de má-fé por sua parte, e que a
parceria oriunda do Convênio teria sido em malam
partem, em vista da situação processual daí formada.
Afirmou que não há nem nunca
houve nexo de causalidade entre a sua conduta e o dano ao erário (fl. 1.088),
já que efetuou o repasse do dinheiro apoiada na boa-fé, e que a aplicação dos
recursos coube à gestora do dinheiro, a SOL.
Ademais, laborou um parágrafo
acerca da admissibilidade de aplicação de jurisprudência da Corte, nos
seguintes termos (fl. 1.088):
Por
fim, neste ponto insta salientar que a responsabilidade solidária das pessoas
jurídicas foi uma novação no processo, com base no incidente de jurisprudência
suscitado pelo MP junto TCU nos termos do art. 91, caput, do Regimento Interno, cujo acórdão n. 2763/2011 foi
proferida na sessão plenária do dia 19/10/2011, pelos Ministros do TCU, no
sentido de incluir a responsabilidade solidária entre a pessoa jurídica e seus
administradores por danos ao erário. Portanto, o julgado é muito posterior ao
fato gerador debatido nestes autos, consistente no empenho n. 2642, de
31/12/2003 ou do repasse da verba à ASAPREV, ocorrido no dia 03/02/2004!
Ademais,
a solidariedade não se presume, pois decorre da lei ou da vontade das partes,
nos termos do art. 265 do CC. Para decorrer de lei, necessária previsão
expressa, o que inexiste na legislação aplicável ao caso concreto; e, para
decorrer da vontade das partes, que constasse no termo de convênio, o que
igualmente não ocorreu!
Contudo, entende este Órgão
Ministerial não assistir razão à responsável no presente tópico. Conforme
observado nos autos, a ASAPREV teve participação ativa na burla ao procedimento
licitatório, atuando como repassadora dos recursos públicos levantados junto à
Secretaria de Estado da Fazenda às empresas privadas arroladas no histórico do
processo. A legislação vigente à época corrobora isto, conforme se verá
adiante.
O Código Civil Brasileiro
traz, em seu Livro I, Título II (“Das Pessoas Jurídicas”) e no Livro III,
Título III (“Dos Atos Ilícitos”), as seguintes disposições:
Art. 47. Obrigam
a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de
seus poderes definidos no ato constitutivo. [...]
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (grifei)
Já o art. 18 da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000 determina que:
Art.
18. As contas serão julgadas:
I
— regulares, quando expressarem, de forma clara e objetiva, a exatidão dos
demonstrativos contábeis, a legalidade, a legitimidade e a economicidade dos
atos de gestão do responsável;
II
— regulares com ressalva, quando evidenciarem impropriedade ou qualquer outra
falta de natureza formal de que não resulte dano ao erário; e
III
— irregulares, quando comprovada
qualquer das seguintes ocorrências:
a)
omissão no dever de prestar contas;
b)
prática de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração à norma
legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária,
operacional ou patrimonial;
c)
dano ao erário decorrente de ato de
gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e
d)
desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos.
§
1º O Tribunal poderá julgar irregulares as contas no caso de reincidência no
descumprimento de determinação de que tenha ciência o responsável, feita em
processo de prestação ou tomada de contas.
§
2º Nas hipóteses do inciso III,
alíneas c e d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as contas,
fixará a responsabilidade solidária:
a)
do agente público que praticou o ato irregular e
b)
do terceiro que, como contratante ou
parte interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido
para a ocorrência do dano apurado.
§
3º Verificada a ocorrência prevista no parágrafo anterior deste artigo, o
Tribunal providenciará a imediata remessa de cópia da documentação pertinente
ao Ministério Público Estadual, para ajuizamento das ações civis e penais
cabíveis (grifei).
Ademais, quanto ao argumento
aventado no sentido de que o entendimento jurisprudencial não poderia ser
aplicado por ser posterior à época dos fatos imputados, entende este Órgão não
assistir razão ao argumento, eis que a jurisprudência nada mais é do que o
conjunto de reiteradas decisões orientadas num mesmo sentido acerca de uma
mesma matéria, de modo que traduz a evolução de métodos interpretativos da
legislação, ao passo que sua aplicação a fatos anteriores não gera qualquer
prejuízo à legalidade ou uma possível “anterioridade”, ou como se queira
chamá-la.
Outro não é o posicionamento
sustentado pela Unidade Técnica, ao debruçar-se sobre o arcabouço fático (fl.
1.252v):
Nessa senda, a
responsabilidade da pessoa jurídica é cristalina, na medida em que firmam
convênio ou outro instrumento congênere com o Poder Público e recebem recursos
do estado, promovendo-se com os benefícios da sua aplicação e da realização dos
eventos, sendo os seus representantes legais também os gestores dos recursos.
Por seu turno, a responsabilidade dos seus representantes resulta da má gestão
e da atuação desconforme com a lei ou, ainda, com as finalidades da própria
entidade.
Cumpre salientar que,
no caso concreto que ora se analisa, é a pessoa jurídica que figura como
convenente/contratante (apesar de ilegalmente ausente o termo de ajuste),
obrigando-se a comprovar o pactuado com a Administração Pública para a
consecução do objeto. Ademais,
verifica-se que as notas fiscais juntadas aos autos não estão em nome da pessoa
física, representante da entidade, mas, sim, em nome da pessoa jurídica,
beneficiária e proponente do projeto.
Destarte,
caracterizada a má e irregular gestão dos recursos públicos, por desobediência
aos preceitos legais e com prejuízo ao erário; considerando que significativa parcela da doutrina já vinha trilhando o
caminho da possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica, juntamente
com seu(s) administrador(es), bem como, da constatação de que foram dirimidas e
pacificadas as divergências jurisprudenciais em sede do Tribunal de Contas da
União, entende esta instrução que incumbe à entidade, pessoa jurídica
proponente, solidariamente com o seu representante legal à época, o ônus da
devolução dos valores correspondentes, a fim de restabelecer a equação
econômico-financeira constituída no ajuste (grifei).
Portanto, este Ministério
Público de Contas entende que não merece acolhida os argumentos e razões
expostos pela responsável ASAPREV, opinando, assim, pela manutenção de sua
responsabilidade solidária junto ao seu então presidente, Sr. Marcos Wandresen,
no que tange aos fatos imputados nos autos, acrescentando-se que a
responsabilização das demais pessoas jurídicas – Intertrainer Desenvolvimento
Empresarial Ltda. e Sul Card Administradora de Cartões S.A. – já fora esgotada
na Decisão Singular de fls. 442-445, sendo também destacada no item 3 deste
parecer.
7. Conclusão.
Ante o exposto, o Ministério
Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II
da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela IRREGULARIDADE das contas em análise nestes autos, na forma do art.
18, inciso III, alíneas “a”, “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em razão do
repasse realizado pelo Estado de Santa Catarina, por meio da Secretaria de
Estado da Fazenda à Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência
Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), por conta do Convênio n.
15.549/2003-7, referente à Nota de Empenho n. 2642/2003 no valor de R$
150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) para a execução do projeto “Cartão Melhor
Idade”;
2. pela IMPUTAÇÃO SOLIDÁRIA DE DÉBITO aos responsáveis, Sr. Marcos Wandresen, ex-presidente da
Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da Grande
Florianópolis (ASAPREV); e as pessoas jurídicas Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da
Grande Florianópolis (ASAPREV), Intertrainer
Desenvolvimento Empresarial Ltda. e Sul
Card Administradora de Cartões S.A., na forma do art. 18, inciso III,
alíneas “a”, “b” e “c”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, no montante
de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), devidamente atualizado,
acrescido dos juros legais e sem prejuízo da multa proporcional ao dano ao
erário, diante da irregularidade
delineada no item 1.1.2 da Decisão Singular GAC/AMF n. 139/2014 (fls. 442-445)
3. pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos responsáveis, na forma do art. 70, inciso
II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em face das restrições apontadas
nos itens 3.2.2.1., 3.3.1. e 3.4.1. da conclusão do Relatório de Reinstrução
DCE n. 508/2015, da seguinte maneira:
3.1. de responsabilidade do Sr. Marcos Wandresen, ex-Presidente da
Associação dos Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da Grande
Florianópolis (ASAPREV), em face das irregularidades descritas nos itens
3.2.2.1. e 3.3.1. da conclusão do Relatório de Reinstrução DCE n. 508/2015;
3.2. de responsabilidade do Sr. Gilmar Knaesel – ex-Secretário de
Estado da Organização do Lazer, em face da irregularidade descrita nos itens
3.2.2.1. e 3.4.1. da conclusão do Relatório de Reinstrução DCE n. 508/2015;
3.3. de responsabilidade da Associação dos Aposentados e Pensionistas
da Previdência Social da Grande Florianópolis (ASAPREV), em face da
irregularidade descrita nos item 3.2.2.1. da conclusão do Relatório de
Reinstrução DCE n. 508/2015;
3.4. de responsabilidade do Sr. Max Roberto Bornholdt,
ex-Secretário de Estado da Fazenda, em face da irregularidade descrita no item
3.2.2.1. da conclusão do Relatório de Reinstrução DCE n. 508/2015;
3.5. de responsabilidade do Sr. Lindolfo Weber, então Diretor-Geral da Secretaria de Estado da Fazenda, em face da
irregularidade descrita no item 3.2.2.1. da conclusão do Relatório de
Reinstrução DCE n. 508/2015;
4. pela DECLARAÇÃO do Sr. Marcos
Wandresen e a Associação dos
Aposentados e Pensionistas da Previdência Social da Grande Florianópolis
(ASAPREV), como impedidos de receberem novos recursos do erário, conforme
item 3.5 da conclusão do Relatório de Reinstrução DCE n. 508/2015;
5. pela DETERMINAÇÃO do arquivamento do Processo SPC n. 06/00313522, com
fundamento no art. 46, inciso IV da Resolução n. TC-09/2002;
6. pela REMESSA DE INFORMAÇÕES contidas nestes autos ao Ministério Público
do Estado de Santa Catarina, em cumprimento ao disposto no art. 18, § 3º da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, para ciência dos fatos descritos nestes
autos e adoção das providências cabíveis.
Florianópolis,
25 de setembro de 2015.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora
[1] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos. São Paulo: Editora Dialética, 2010, p. 295.
[2] MILESKI, Helio Saul. O ordenador de despesa e a lei de
responsabilidade fiscal – conceituação e repercussões jurídico-legais. Disponível
em: <http://www.amdjus.com.br/doutrina/administrativo/168.htm>.
Acesso em 30/06/2015 às 16h43.
[3] FERNANDES, J. U. Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição
e competência. Belo Horizonte: Editora Forum, 2008, p. 575.
[4] FERNANDES, J. U. Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. Belo Horizonte: Editora Forum, 2008, p. 576-596.
[5] FERNANDES, J. U. Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição
e competência. Belo Horizonte: Editora Forum, 2008, p. 237.
[6] Idem, p. 639-640.
[7] MELLO, Celso Antônio
Bandeira de. Curso de Direito
Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 247-248.
[8] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 1008-1009.