PARECER
nº: |
MPTC/39695/2016 |
PROCESSO
nº: |
REP 15/00277964 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Mafra |
INTERESSADO: |
Siga Mobilidade Urbana Ltda. |
ASSUNTO: |
Irregularidades na Concorrência nº 001/2015
- contratação e outorga de concessão onerosa, à empresa para execução de
serviços de gerenciamento, organização e exploração de estacionamento
rotativo pago. |
Trata-se de Representação, com pedido cautelar,
protocolada pela empresa Siga Mobilidade Urbana Ltda., subscrita por seu
procurador, Sr. Maicon Rodrigo Moreira Zambarda, a respeito de supostas irregularidades no Edital de Concorrência n.
01/2015, promovido pela Prefeitura Municipal de Mafra, que versa sobre a
contratação e outorga de concessão onerosa à empresa para execução de serviços
de gerenciamento, organização e exploração de estacionamento rotativo pago.
A empresa representante apresentou a petição e os
documentos de fls. 2-87.
A Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações apresentou relatório de instrução preliminar (fls. 88-95), em cuja
conclusão sugeriu o conhecimento da representação, a determinação cautelar, à
Sra. Débora Scardanzan, Secretária Municipal de Administração, de sustação
diferida do procedimento licitatório logo após a habilitação dos proponentes
até manifestação ulterior que revogue a medida ex officio ou até deliberação pelo Tribunal Pleno, a sua audiência
para que adote medidas corretivas ou apresente justificativas perante as
restrições elencadas nos itens 3.3.1 e 3.3.2 e as recomendações e determinação
constantes dos itens 3.4 e 3.5, todos da conclusão do relatório de instrução
preliminar em comento.
O Relator, em Decisão Singular (fls. 96-97),
determinou à Sra. Débora Scardanzan, já qualificada, e ao Sr. Diego Ricardo
Krachinski, Presidente da Comissão de Licitação, a sustação do certame logo
após a habilitação dos proponentes e realização do julgamento final das
propostas apresentadas e antes da contratação, até manifestação ulterior que
revogue a medida ou deliberação do Tribunal Pleno, e, na sequência, cumprida a
ordem de sustação, o encaminhamento de cópias das atas das sessões e atos
decisórios produzidos pela Comissão de Licitação ou pela Autoridade
Administrativa, no prazo de 15 dias, bem como das justificativas acerca dos
apontamentos efetuados pela instrução.
Em observância à determinação, a Prefeitura
Municipal de Mafra encaminhou o Ofício n. 063/SMA/2015 (petição de fls. 103-104
e CD de fl. 105), informando sobre a suspensão do edital desde o dia
28/05/2015.
A Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações, então, formulou relatório de reinstrução (fls. 107-109v),
opinando pela revogação da medida cautelar, pela procedência da representação,
em face das irregularidades apontadas nos itens 3.3.1 e 3.3.2, e pela
determinação ao Sr. Roberto Agenor Scholze, Prefeito Municipal de Mafra, para
que promova a anulação do Edital de Concorrência n. 01/2015 e comprove tais
providências no prazo de 30 dias, sob pena de aplicação de multa.
Passo, enfim, à análise das
irregularidades assinaladas pela Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações.
1. Exigência de registro do atestado apenas no CREA e visto antes da
contratação.
Consta nos autos a existência de questionamento a
respeito da seguinte especificação posta no Edital de Concorrência Pública n.
01/2015 (fls. 26-87):
7.2 QUALIFICAÇÃO TÉCNICA
7.2.1.
Registro ou inscrição na entidade profissional competente (CREA) a que estiver vinculada a licitante.
OBS:
Nos casos de em que a proponente for inscrita em outra unidade da União, deverá
apresentar todos os documentos solicitados neste item vistados pelo CREA
(grifei).
A Lei n. 8.666/93 em seu art. 30 regulamenta o que se pode exigir dos
licitantes quanto à qualificação técnica, abaixo:
Art. 30. A documentação relativa à qualificação técnica
limitar-se-á a:
I - registro ou
inscrição na entidade profissional competente;
II - comprovação de aptidão para desempenho de atividade
pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto
da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal
técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem
como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se
responsabilizará pelos trabalhos;
III - comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que
recebeu os documentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as
informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da
licitação;
IV - prova de atendimento de requisitos previstos em lei
especial, quando for o caso.
(grifei)
Como
é de amplo conhecimento, a vinculação do gestor ao princípio da legalidade
contido no caput do art. 37 da
CRFB/88 é um dos pilares que regem toda a atividade pública administrativa.
Sobre o assunto, comenta Hely Lopes Meirelles[1]:
Na Administração Pública não há
liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito
fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer
o que a lei autoriza. A lei, para o particular, significa “pode fazer assim”;
para o administrador significa “deve fazer assim”.
Na
mesma linha de orientação, Celso Antônio Bandeira de Mello[2]
comenta:
Para avaliar corretamente o
principio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o
fato de que ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter
os exercentes do poder em concreto – o administrativo – a um quadro normativo
que embargue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da
norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo
Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as tendências
(inclusive minoritárias) do corpo social -, garantir que a atuação do Executivo
nada mais seja senão a concretização desta vontade geral.
O principio da legalidade contrapõe-se,
portanto, e visceralmente, a quaisquer tendências de exacerbação personalista
dos governantes. Opõe-se a todas as formas de poder autoritário, desde o
absolutista, contra o qual irrompeu, até as manifestações caudilhescas ou
messiânicas típicas dos paises subdesenvolvidos. O principio da legalidade é o
antídoto natural do poder monocrático ou oligárquico, pois te como raiz a ideia
de soberania popular, de exaltação de cidadania. [...]
Assim, o princípio da legalidade é o
da completa submissão da Administração às leis. Esta deve tão-somente
obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os
seus agentes, desde o que ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da Republica,
até o mais modesto dos servidores, só poder ser a de dóceis, reverentes,
obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo,
pois esta é a posição que lhes compete no Direito brasileiro.
Vale
ressaltar ainda que uma das finalidades precípuas do processo licitatório é a
de garantir o princípio constitucional da isonomia e de selecionar a proposta
mais vantajosa de acordo com o interesse público, baseando-se nos princípios
básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade,
da publicidade, da probidade administrativa entre outros, e que a vedação ao
caráter competitivo da licitação está expressamente prevista no art. 3º, § 1º,
inciso I, da Lei de Licitações, conforme se vê:
Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do
princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para
a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será
processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da
legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da
probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do
julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
§ 1º É vedado aos agentes públicos:
I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de
convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o
seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e
estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou
domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou
irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§
5º a 12 deste artigo e no art. 3º da Lei nº
8.248, de 23 de outubro de 1991.
Para fundamentar a explicação sobre o dispositivo legal acima citado,
valho-me das palavras de Marçal Justen Filho[3]:
O ato convocatório tem de estabelecer as regras
necessárias para seleção da proposta mais vantajosa. Se essas exigências serão
ou não rigorosas, isso dependerá do tipo de prestação que o particular deverá
assumir. Respeitadas as exigências necessárias para assegurar a seleção da
proposta mais vantajosa, serão inválidas
todas as cláusulas que, ainda indiretamente, prejudiquem o caráter competitivo
da licitação.
Assegura-se tratamento igualitário aos interessados
que apresentem condições necessárias para contratar com a Administração. A
vitória de um deles dependerá de seus próprios méritos. A regra não exige que o
benefício indevido seja derivado de uma intenção reprovável. Ou seja, não é necessário sequer a intenção
de beneficiar um ou mais competidores. (grifei)
O que não se admite
no processo licitatório é a discriminação arbitrária, produto de preferências
pessoais e subjetivas do ocupante do cargo público. A licitação consiste em
instrumento jurídico para afastar essa arbitrariedade na seleção do
contratante. A isonomia no processo licitatório, portanto, significa o
tratamento uniforme em todas as situações semelhantes, distinguindo-se na
medida em que a lei, e somente a lei, assim o exija.
Desse modo, ao se
especificar a exigência do registro ou inscrição da proponente tão somente no
Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA), restringiu-se a
participação de empresas registradas ou inscritas em outras entidades
profissionais competentes, como o Conselho Regional de Arquitetura (CAU), cujas
atividades e atribuições também abrangem o objeto do certame, conforme art. 2º
da Lei n. 12.378/10.
É importante salientar que
esse Tribunal de Contas tem aplicado multas aos responsáveis cujos editais de
licitação exorbitam exigências legais, e, assim, limitam o caráter competitivo
do certame licitatório. Vejam-se algumas dessas decisões:
Acórdão n.
571/2011 – REP 10/00033039 – Sessão: 15/06/2011
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do
Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões
apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da
Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer do Relatório de Reinstrução DLC, com
abrangência sobre o Edital de Licitação Concorrência n. 264/2009, para
considerar irregular, com fundamento no art. 36, §2º, alínea “a”, da Lei
Complementar n. 202/2000, o ato analisado.
6.2. Aplicar ao Sr. Ronério Heiderscheidt -
Prefeito Municipal de Palhoça, CPF n. 179.763.839-49, com fundamento no art.
70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento
Interno, a multa no valor de R$ 1.500,000 (mil e quinhentos reais), em face da exigência de qualificação
técnica exorbitante, frustrando a competição na licitação, ao exigir
documentos que contrariam o art. 30 c/c os arts. 3º, § 1º, I, da Lei n.
8.666/1993 e 37, caput e XXI, da Constituição Federal (itens 2.1 e 2.2 do
Relatório DLC), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação
deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para
comprovar ao Tribunal o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o quê,
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial,
observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000.
Acórdão
1494/2009 - SLC - 07/00374507 - Sessão 25.11.2009
ACORDAM
os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos
6.2.
Aplicar ao Sr. Sérgio Galizza - ex-Diretor Geral Administrativo do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, CPF n. 375.579.049-15, com fundamento no art. 70,
II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno,
as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a
contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de
Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das
multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da
dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da
Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1.
R$ 1.000,00 (mil reais), em face da exigência de qualificação técnica
exorbitante no item 8.6, II, "a" e "b", do Edital n.
144/2006, frustrando o caráter competitivo da licitação, infringindo o disposto
no art. 3º, § 1º, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 2.1 do Relatório
DLC). (grifei)
De igual modo, não é cabível
o visto dos documentos pelo CREA – subentendida aqui a entidade catarinense –
como exigência de qualificação técnica para proponentes registrados em
entidades profissionais de outros Estados, pois no momento de habilitação o
licitante possui a mera pretensão de contratar. Dessa forma, o art. 30, ao
prescrever o “registro ou inscrição na entidade competente” se refere ao local
de origem da empresa licitante, conforme entendimento de Pedro Jorge Rocha de Oliveira[4], colacionado pela Área
Técnica no Relatório DLC n. 634/2012, referente ao processo ELC 12/00220959:
A Lei Federal nº 8.666/93 (arts. 27 e 30) estabelece que para
habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados a qualificação técnica
com o registro ou inscrição na entidade profissional competente, no caso de
obras é Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea).
A empresa licitante deve ter o registro
no Crea do local da sua origem e, o visto do Crea do local da realização da
obra deve ser exigido apenas para assinatura do contrato. (grifei)
Nesse
sentido, perfectibiliza-se com o disposto nos arts. 58 e 61 da Lei n. 5.194/66, que regula o exercício das profissões de
Engenheiro, Arquiteto e Agrônomo:
Art.58 – Se o profissional, firma ou organização, registrado em
qualquer Conselho Regional, exercer atividade em outra Região, ficará obrigado
a visar, nela, o seu registro. [...]
Art.61 - Quando os serviços forem executados em lugares distantes
da sede da entidade, deverá esta manter, junto a cada um dos serviços, um
profissional devidamente habilitado naquela jurisdição.
Nessa mesma linha, dispõe o
inciso XXI do art. 37 da CRFB/88 sobre a finalidade
do procedimento, que é a máxima ampliação da concorrência e diminuição de
preços.
Ademais, esse Tribunal de
Contas já se manifestou apontando a irregularidade da exigência, vejam-se
algumas decisões:
Decisão n. 2113/2012 – Processo ELC 12/00088406 – Sessão: 23/05/2012
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas
pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual, 1º da Lei
Complementar n. 202/2000 e 6º da Instrução Normativa n. TC-05/2008, decide: [...]
6.1.8. Exigência,
para fins de comprovação da qualificação técnica, de visto do CREA/SC na
Certidão de Pessoa Jurídica das empresas que estejam sediadas em outra unidade
da federação, desrespeitando os arts. 58 da Lei n. 5.194/1966 e 30 da Lei n.
8.666/1993 (item 2.1 do Relatório DLC n. 212/2012). (grifei)
Decisão n. 5529/2012 – Processo ELC 12/00220959 - Sessão: 07/11/2012
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas
pelo Relator e com fulcro nos arts. 59, c/c o art. 113 da Constituição
Estadual, 1º da Lei Complementar n. 202/2000 e 6º da Instrução Normativa n.
TC-05/2008, decide: [...]
6.1.31. Exigência,
para fins de comprovação da qualificação técnica, de visto do CREA/SC, caso a
empresa licitante possua registro em outro estado, desrespeitando os arts. 58
da Lei n. 5.194/1966 e 30 da Lei n.8.666/93. (grifei)
Sobre o tema, também é o entendimento pacificado do Tribunal de Contas
da União. Veja-se:
Acórdão n. 2099/2009 – Processo n. 006.750/2009-1 –
Ata n. 36/2009
Relator: AUGUSTO SHERMAN -
Fiscobras/2009. Projeto de irrigação em Flores de Goiás. Empreendimento já
auditado nos exercícios anteriores. Obra inclusa no Anexo VI da LOA de 2009 em
relação à sua 3ª etapa. Licitação para contratação das obras do vertedouro
complementar. Contratação não formalizada no momento da auditoria.
Irregularidades detectadas no procedimento licitatório. Diligência. Audiência.
Oitiva da empresa contratada. Determinações. 1. Os tributos IRPJ e CSLL não
devem integrar o cálculo do LDI, nem tampouco a planilha de custo direto, por
se constituírem em tributos de natureza direta e personalística, que oneram
pessoalmente o contratado, não devendo ser repassado à contratante. 2. Os itens
administração local, instalação de canteiro e acampamento e mobilização e
desmobilização, por se tratarem de custos diretos, devem ser inseridos na
planilha orçamentária, e não no BDI. 3. É
vedada a exigência de visto do Crea do estado do órgão licitante para as
empresas licitantes de outro estado. 4. É vedada a exigência, como
requisito de aceitação de atestado de capacitação técnico-profissional, de que
os profissionais constantes do atestado possuam vínculo empregatício com a
licitante na data da licitação. (grifei)
O responsável, em suas
justificativas, afirmou que reconhecerá também como órgão competente o Conselho
de Arquitetura e Urbanismo (CAU).
Todavia, até o presente
momento não foi encaminhado a essa Corte de Contas o Edital de Concorrência com
as devidas retificações, além de não ter sido possível vislumbrar sua confecção
através de consulta ao sítio eletrônico da Prefeitura Municipal de Mafra, o que
impede o saneamento da restrição.
Portanto, ao exigir como
qualificação técnica o registro ou inscrição da proponente no Conselho Regional
de Engenharia e Agronomia (CREA) e, nos casos de registro em outras unidades da
federação, o visto por parte do CREA/SC, restou prejudicada a ampla
participação de empresas interessadas no certame, em desrespeito ao princípio
da competitividade, basilar ao processo licitatório, motivo pelo qual sugiro a
manutenção de referida restrição.
2. Exigência de atestados de
capacidade técnica emitidos somente por pessoa jurídica de direito público.
Ainda sobre a questão da
presença de qualificação técnica no edital, no item 7.2.2 do Edital de
Concorrência Pública n. 01/2015 foi exigida a comprovação de capacidade técnica
por meio de certidões ou atestados emitidos somente por pessoas jurídicas de
direito público.
Acerca
das condições de habilitação técnica, a Lei n. 8.666/93 dispõe:
Art. 30. A
documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a: [...]
II - comprovação de aptidão para desempenho de
atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com
o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do
pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da
licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica
que se responsabilizará pelos trabalhos; [...]
§ 1º A comprovação de aptidão referida no inciso II
do "caput" deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e
serviços, será feita por atestados
fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado,
devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as
exigências a:
I - capacitação técnico-profissional: comprovação
do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega
da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido
pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por
execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas
exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto
da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos.
(grifei)
Sobre o tema, Marçal Justen Filho destinou as seguintes palavras em sua
obra Comentários à Lei de Licitações e Contratos Adminitrativos[5]:
Uma das questões reside em que a lei refere-se a
atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado. A
regra destinou-se a afastar a praxe anterior, consistente em autorizar apenas
atestados fornecidos pela própria Administração Pública.
Ou seja, podem participar do certame as proponentes que possuam
atestados de capacidade técnica emitidos tanto por pessoas jurídicas de direito
público, como também de direito privado.
Assim, muito embora a presença da conjunção alternativa “ou” no texto
normativo, a discricionariedade por parte do gestor seria admitida apenas em
casos excepcionais, conforme a natureza predominantemente pública do objeto a
ser contratado.
No presente caso, todavia, verifica-se que o gerenciamento, organização
e exploração de estacionamento rotativo pago e a implantação, operação e
manutenção de equipamentos eletrônicos expedidores de tíquetes são atividades
que também podem ser executadas no âmbito da iniciativa privada, como no caso
de estacionamento privativo em shopping centers e supermercados. Esse,
inclusive, já foi o entendimento manifestado pelo Tribunal de Contas do Estado
de Minas Gerais[6]:
Há
clara restrição à competitividade na exigência contida no item 9.2.3.1 do
edital, quanto à previsão de comprovação de prestação do serviço à empresa
jurídica de direito público, já que não há justifi cativa legal que fundamente
a exclusão dos atestados emitidos por empresas jurídicas de direito privado. É
de se ressaltar que esta Corte já se manifestou neste sentido ao apreciar a
Denúncia apresentada em face da Prefeitura Municipal [...] [omissis],
distribuída sob o nº 796.103, em que prevaleceu o voto do Conselheiro Relator
Conselheiro Eduardo Carone Costa, que assim se manifestou: ‘constato, em
análise perfunctória dos autos, impropriedades nas cláusulas que não contemplam
a possibilidade de pessoas jurídicas de direito privado fornecerem atestados
com o objetivo de comprovar a quali cação técnica dos licitantes, o que, por
si só, fere o princípio da competitividade, corolário ao princípio da
isonomia.’ 38 Assim, entendo que é irregular a restrição contida na cláusula
9232 em relação aos atestados emitidos por pessoas jurídicas de direito
privado, que se constitui em afronta à previsão contida no art. 30, § 1º, inc.
I da Lei nº 8.666/93.
Ao afrontar tais ditames, a cláusula sob análise impede a participação
de empresas que possuam a capacidade técnica exigida pelo Edital, mas
comprovada por meio de certidões ou atestados emitidos por pessoa jurídica de
direito privado, representando restrições ilegítimas ao caráter competitivo do
certame, desprovidas de motivação ou de razoabilidade, resultando na vedação
disposta no art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei n. 8.666/93.
Em resposta, o responsável comunicou que foi acolhido o recurso no
sentido de alterar o dispositivo citado e que, após elaboração de novo edital,
o mesmo seria remetido a essa Corte de Contas para análise.
Entretanto, do mesmo modo como
relatado anteriormente, até o presente momento não foi remetido o edital com as
devidas retificações, o que aponta para a manutenção da irregularidade.
Ante o exposto, o Ministério
Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II
da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela REVOGAÇÃO da medida cautelar concedida por meio da Decisão Singular
n. GAC/HJN – 022/2015;
2.
pela IRREGULARIDADE do Edital de Concorrência n. 01/2015, na
forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000,
diante das seguintes restrições:
2.1 Exigência
de registro ou inscrição na entidade profissional competente (CREA) a que
estiver vinculada a licitante, bem como a obrigatoriedade de visto junto ao
CREA-SC para as empresas registradas em CREA de outras unidades da federação,
em desrespeito ao disposto no art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei n. 8.666/93;
2.2 Exigência de atestados de
capacidade técnica emitidos somente por pessoa jurídica de direito público, bem
como comprovação de experiência idêntica ao objeto a ser licitado, em afronta
ao disposto nos arts. 3º, § 1º, inciso I, e 30, § 1º, da Lei n. 8.666/93;
3. pela DETERMINAÇÃO para que o Sr. Roberto Agenor Scholze, Prefeito
Municipal de Mafra, promova a anulação do Edital de Concorrência n. 01/2015,
com fundamento no art. 49, caput da
Lei n. 8.666/93, sob pena de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, devendo comprovar tais providências a essa
Corte de Contas no prazo de 30 dias, a partir do recebimento da deliberação.
Florianópolis, 12 de janeiro de 2016.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora
[1]
Cf. Direito Administrativo Brasileiro,
20ª ed., cit., p. 82 e 83.
[2] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20. ed., cit., p. 89.
[3] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos
administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005.
[4] OLIVEIRA, Pedro Jorge Rocha de. Obras
Públicas: tirando suas dúvidas. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 224
[5] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos
administrativos. 12. Ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 420.
[6] TCE/MG, Processo n. 796.706,
Primeira Câmara, rel. Con. Wanderley Avila, sessão de 27/03/2012.