PARECER nº:

MPTC/39758/2016

PROCESSO nº:

REP 15/00274787    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de Taió

INTERESSADO:

Joel Sandro Macoppi

ASSUNTO:

Irregularidades na aquisição de conjunto móvel de britagem primária, mediante o Pregão Presencial nº 052/2013

 

 

 

 

Trata-se de representação (fls. 2-206) encaminhada pelo Presidente da Câmara Municipal de Taió, Sr. Joel Sandro Macoppi, por meio do Ofício n. 0112/15, acerca das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou supostas irregularidades no Pregão Presencial n. 052/2013, destinado à aquisição de conjunto móvel de britagem primária para aquele Município.

Após a juntada dos documentos de fls. 207-228v, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações elaborou o relatório de instrução de fls. 229-233v, sugerindo o conhecimento da presente representação e a realização de diligência ao Sr. Hugo Lembeck, Prefeito Municipal de Taió, para que apresentasse os documentos elencados nos itens 3.2.1 a 3.2.5 da conclusão daquele relatório, posicionamento que foi compartilhado por esta Procuradora no parecer de fls. 234-235 e pelo Conselheiro Relator às fls. 236-236v.

Cumprida a diligência à fl. 238, o Prefeito em exercício do Município de Taió apresentou a manifestação e os documentos de fls. 239-830, noticiando, também, irregularidades na contratação decorrente do Convite n. 10/2014 lançado pela Câmara Municipal de Taió.

Na sequência da juntada dos documentos de fls. 832-833, a Área Técnica dessa Corte de Contas formulou o relatório de reinstrução de fls. 834-852, em cuja conclusão sugeriu o desentranhamento dos documentos relativos à alegada irregularidade na contratação realizada pela Câmara Municipal de Taió, noticiada pelo Prefeito em exercício daquele Município, com a constituição de autos próprios para sua apuração, além da realização de audiência dos Srs. Hugo Lembeck (Prefeito Municipal de Taió), Marco Vinicius Pereira de Carvalho (Assessor Jurídico e parecerista do Edital em exame), Carlos Cava (elaborador do Edital em exame), Pedrinho Altoff (Secretário de Transportes, Obras e Serviços Urbanos) e Edésio Fillagrana (responsável pela liquidação da NF n. 159/2013), da seguinte forma:

3.1. Determinar a audiência dos responsáveis abaixo relacionados, nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 202, de 15 de dezembro de 2000, para, no prazo de 30 dias, a contar do recebimento da deliberação, com fulcro no art. 124 do Regimento Interno deste Tribunal (Resolução n. TC-06/2001, alterada pela Resolução n. TC-117/2015), apresentar alegações de defesa acerca das irregularidades apontadas no procedimento do Pregão Presencial nº 52/13, da Prefeitura Municipal de Taió, irregularidades estas, ensejadoras de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000:

3.1.1. Valor previsto para a aquisição de R$745.000,00, sem a devida pesquisa de preços no mercado, contrariando o disposto no inciso III do artigo 3º da Lei Federal nº 10.520/02 e o inciso IV do artigo 43 da Lei Federal n° 8.666/93 (item 2.2.4 do presente Relatório);

3.1.2. Fixação da distância do serviço de assistência técnica no máximo a 200 quilômetros de distância da sede do município, prevista no Termo de Referência, contrariando o disposto no final do § 6º do art. 30 da Lei Federal nº 8.666/93 c/c o inciso I do §1º do art. 3º do mesmo diploma legal e o inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal (item 2.2.5 do presente Relatório);

3.1.3. Ausência da comprovação da visita de inspeção, contrariando o previsto no item 9.1 do Edital e consequentemente o princípio da vinculação ao instrumento convocatório previsto no art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93 (item 2.2.9 do presente Relatório);

3.1.4. Ausência de designação de responsável para recebimento dos equipamentos descritos no objeto do Edital do Pregão, contrariando o caput do artigo 67 c/c o artigo 73, inciso II, §1°, da Lei Federal n° 8.666/93 (item 2.2.11 do presente Relatório);

3.1.5. Liquidação da despesa através da NF nº 159, de 13/06/13, sem a comprovação da entrega do equipamento conforme licitado, contrariando o artigo 73, inciso II, §1°, da Lei Federal n° 8.666/93 e o artigo 63, §1°, da Lei Federal n° 4.320/64 (item 2.2.12 do presente Relatório);

3.1.6. Ausência de comprovação de disponibilização de técnico operacional para execução de treinamento de operação e manutenção preventiva dos equipamentos aos funcionários da prefeitura pelo período mínimo de 15 (quinze) dias com entrega de certificado de pratico operacional de britador ao final do período, descumprindo o previso no Anexo I, do Edital de Licitação (item 2.2.13 do presente Relatório);

3.1.7. Especificações dos equipamentos descritos no Termo de Referência do Edital do Pregão Presencial nº 52/13 da Prefeitura Municipal de Taió, restringiu a participação de outras marcas de licitantes, contrariando o disposto no inciso I do §7° do artigo 15 da Lei Federal nº 8.666/93 c/c o inciso I do §1º do artigo 3º da Lei Federal nº 8.666/93. (item 2.2.15 do presente Relatório); e

3.1.8. Estipulação do prazo de 10 (dez) dias para a entrega, previsto no item 1.2.1 do Edital, afasta competidores, fato que se enquadra nas vedações previstas no inciso I do §1º do artigo 3º da Lei Federal nº 8.666/93 (item 2.2.18 do presente Relatório).

3.2. Rol dos responsáveis:

3.2.1. Sr. Hugo Lembeck – Prefeito Municipal, com endereço profissional na Av. Luiz Bertoli, 44 – Taió/SC, quanto aos itens 3.1.1 a 3.1.8, da conclusão do presente Relatório;

3.2.2. Sr. Marcos Vinícius Pereira de Carvalho – Assessor Jurídico e parecerista do Edital do PP nº 52/13 da PMT com endereço profissional na Av. Luiz Bertoli, 44 – Taió/SC, quanto aos itens 3.1.2, 3.1.7 e 3.1.8, da conclusão do presente Relatório;

3.2.3. Sr. Carlos Cava – nomeado como elaborador do Edital do PP nº 52/13 da PMT, com endereço profissional na Av. Luiz Bertoli, 44 – Taió/SC, quanto aos itens 3.1.2, 3.1.7 e 3.1.8, da conclusão do presente Relatório;

3.2.4. Sr. Pedrinho Altoff – Secretário de Transportes, Obras e Serviços Urbanos com endereço profissional na Av. Luiz Bertoli, 44 – Taió/SC, quanto aos itens 3.1.3, 3.1.4, 3.1.5 e 3.1.6, da conclusão do presente Relatório; e

3.2.5. Sr. Edésio Fillagrana – responsável pela liquidação da NF nº 159, de 13/06/13, quanto ao item 3.1.5 da conclusão do presente Relatório.

Este Órgão Ministerial manifestou-se à fl. 854 por seguir o entendimento da Área Técnica, o que também restou acolhido pelo Relator às fls. 855-856v.

Dessa forma, foi elaborado o termo de formação de autos apartados de fl. 857, seguido da realização da audiência dos responsáveis para apresentação das alegações de defesa acerca das irregularidades que lhes foram imputadas (fls. 866-870), culminando na apresentação de manifestações e documentos às fls. 871-883 (Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho), 886-897 (Sr. Carlos Cava), 900-920 (Sr. Pedrinho Altoff), 923-941 (Sr. Edésio Fillagranna) e 944-1098 (Sr. Hugo Lembeck).

Foram acostados aos autos os documentos de fls. 1101-1108, após o que a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações elaborou relatório de reinstrução (fls. 1109-1125v), concluindo pela manutenção das irregularidades e das responsabilidades – com a consequente aplicação de multas – indicadas no relatório técnico de fls. 834-852, com exceção do Sr. Hugo Lembeck, cuja responsabilidade foi afastada no tocante às restrições mencionadas nos itens 3.1.3, 3.1.4, 3.1.6 e 3.1.7, e do Sr. Pedrinho Altoff, que restou responsabilizado apenas pelas irregularidades descritas nos itens 3.1.5 e 3.1.6, todos da conclusão do relatório técnico de fls. 834-852, transcrito acima neste parecer.

Passo, assim, à análise das irregularidades apontadas pela Área Técnica desse Tribunal, não sem antes apreciar a preliminar de ilegitimidade passiva aventada pelo Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho.

1.     Preliminar de ilegitimidade passiva do Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho

Às fls. 871-883 dos autos, o Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho, assessor jurídico da Prefeitura Municipal de Taió e parecerista no processo licitatório em análise, apresentou manifestação aduzindo, em suma, que no exercício da função de advogado, goza de imunidade material, e que sua opinião em parecer jurídico não apresenta cunho decisório, tendo apenas natureza consultiva e opinativa. Dessa forma, entende pela impossibilidade de aplicação de penalidades ou de sua indicação como responsável no presente processo.

No tocante à alegada imunidade material, deve-se ter em mente que apesar da inegável inviolabilidade conferida aos advogados pelo art. 133 da CRFB/88, essa prerrogativa não é absoluta, não permitindo uma inviolabilidade genericamente permissiva de ilícitos ou a liberalidade na prática de atos danosos a terceiros ou ao erário.

Sobre o tema, Joel de Menezes Niebuhr[1] faz uma interessante análise sobre a possibilidade de os advogados públicos, tanto quanto os outros agentes administrativos, responderem por seus atos. Para ele, os advogados que prestam serviços jurídicos a entidades administrativas, exercem função administrativa, assim como todos os demais agentes administrativos. Nesse contexto, o vocábulo função está diretamente ligado à ideia de dever. Aos advogados, na qualidade de agentes administrativos, atribui-se certa função que corresponde ao dever de realizar atividades jurídicas em prol da coletividade, a fim de atender ao interesse público. Conclui, portanto, que:

Partindo-se desse pressuposto, deduz-se que quem assume o cumprimento de um dever para com a coletividade atrai para si a responsabilidade de fazê-lo. Logo, quem exerce função, assume um dever e, por via direta de consequência, responsabilidades. Num Estado de Direito, todos os cidadãos convivem sob o manto do Direito e, pois, devem agir de conformidade com ele, independentemente do status e da função que desempenham. A noção de Estado de Direito torna imperativo que se reconheça responsabilidade a todos, sem exceção. Todos respondem por seus atos, inclusive os advogados.

No mesmo sentido, Ronny Charles Lopes de Torres[2] afirma que:

Não há dúvidas de que as prerrogativas e competências concedidas pela Constituição à Advocacia do Estado, ao passo que geram grandes poderes, trazem consigo grandes responsabilidades. Basta essa máxima infante para desautorizar qualquer tentativa de suprimir absolutamente a possibilidade de responsabilização do Advogado de Estado ou de qualquer outra autoridade pública ou política. O Estado Democrático de Direito não foi assentado sob as premissas das proteções odiosas às autoridades; pelo contrário, se o Estado de Direito marcou a sujeição do Estado à lei, sua transmudação democrática firmou a submissão do Estado à vontade da sociedade e essa nova face não admite privilégios ilegítimos.

Logo, na qualidade de agentes públicos, os advogados sofrem limitação a essa prerrogativa assegurada constitucionalmente, uma vez que devem observância aos princípios constitucionais da Administração e, como se sabe, no sistema jurídico brasileiro não há exercício de direito de forma absoluta, submetendo-se todos ao princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas. Tanto é verdade, que o próprio Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906/94) estabelece, em seu art. 32, que “o advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa”.

Quanto à alegação do Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho de que não poderia ser responsabilizado em face do caráter opinativo do parecer jurídico nas licitações, filio-me ao entendimento de que a possibilidade de responsabilização dos advogados pareceristas independe de sua natureza jurídica – vinculativo ou opinativo –, estando relacionada, portanto, ao conteúdo e circunstâncias da manifestação.

Com efeito, não cabe responsabilização do parecerista se sua tese for razoável e bem fundamentada, ainda que, ocasionalmente, contrária ao entendimento dos órgãos de controle, tendo em vista ser o Direito uma ciência não exata, ou seja, uma mesma questão é passível de múltiplas interpretações. Mesmo nessa situação, no entanto, o advogado deve expor à autoridade administrativa todos os entendimentos sobre o assunto que lhe foi submetido à análise, de forma a subsidiar o gestor de todas as informações necessárias para o melhor processo decisório.

Não foi o que aconteceu, no entanto, no presente processo. Conforme se extrai do documento acostado à fl. 304 dos autos, o parecer jurídico emitido pelo Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho no processo licitatório n. 52/2013 limitou-se a apenas 1 página, em que, em breves 3 parágrafos, o advogado parecerista entendeu pela regularidade de todos os documentos juntados ao processo até aquele momento e, portanto, pela retidão de todas as exigências ilegais realizadas no edital e seus anexos, conforme será pormenorizadamente analisado nos itens seguintes deste parecer.

No parecer em análise, portanto, não foi tecida qualquer tese minimamente fundamentada acerca dos elementos que compõem o processo licitatório e que poderia justificar o posicionamento do parecerista acerca das irregularidades apontadas por esse Tribunal.

Além disso, em sede de apresentação de alegações de defesa a essa Corte de Contas, o responsável também não promoveu a adequada explicação acerca dos motivos que o levaram a considerar aquele processo licitatório viciado como sendo legal, limitando-se a pugnar pelo afastamento de sua responsabilização.

Como se vê, um processo licitatório de expressivo valor estimado em R$ 745.000,00 foi aprovado pela assessoria jurídica da Unidade Gestora sem a cautela e diligência esperadas, não sendo possível, in casu, o afastamento da responsabilidade do advogado parecerista.

Dessa forma, a preliminar aventada pelo responsável não merece ser acolhida.

2.     Valor previsto para a aquisição do objeto do Pregão Presencial n. 52/2013 da Prefeitura Municipal de Taió

O relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito que apurou irregularidades no Pregão Presencial n. 052/2013 da Prefeitura Municipal de Taió, indicou a ausência de pesquisa de mercado, com a apresentação de 3 orçamentos prévios, que justificassem o valor de R$ 745.000,00 estimado para o objeto a ser licitado.

A obrigação de realização de pesquisa de mercado na fase interna do pregão está prevista no art. 3º, inciso III, da Lei n. 10.520/2002, que assim determina:

Art. 3º A fase preparatória do pregão observará o seguinte: [...]

III - dos autos do procedimento constarão a justificativa das definições referidas no inciso I deste artigo e os indispensáveis elementos técnicos sobre os quais estiverem apoiados, bem como o orçamento, elaborado pelo órgão ou entidade promotora da licitação, dos bens ou serviços a serem licitados (grifei);

[...]

No mesmo sentido, a Lei n. 8.666/1993, aplicável subsidiariamente à modalidade pregão, também menciona, em seu art. 43, inciso IV, a necessidade de compatibilidade das propostas apresentadas pelos licitantes com os preços correntes no mercado, concluindo-se, portanto, pela imprescindibilidade da realização dessa pesquisa de preços.

Em razão dessa irregularidade, foi realizada a audiência do Sr. Hugo Lembeck, Prefeito Municipal de Taió, que, à fl. 945, confirmou que não foi realizada uma pesquisa formal de preços, mas que o valor da licitação foi estimado a partir das notas fiscais de vendas de equipamentos para outras prefeituras e da tabela de preços do BNDES.

As justificativas do responsável, no entanto, não merecem ser acolhidas, tendo em vista que, mesmo que de fato tenha sido realizada a estimativa de preços com base em contratações efetivadas por outras prefeituras, é obrigatório que a pesquisa formal de preços seja juntada ao processo licitatório, o que não foi comprovado no presente caso.

A propósito, o Tribunal de Contas da União, em seu Manual de Licitações e Contratações[3], disserta sobre a matéria nos seguintes termos:

Contratações públicas poderão ser efetivadas somente após estimativa prévia do respectivo valor, que deve obrigatoriamente ser juntada ao processo de contratação e ao ato convocatório divulgado.

Estimativa do valor da contratação é o principal fator para escolha da modalidade de licitação a ser adotada, exceto quanto à concorrência ou ao pregão, que podem ser utilizados independentemente do valor a ser contratado.

Essa estimativa também tem por finalidade, especialmente:

• verificar se existem recursos orçamentários suficientes para o pagamento da despesa com a contratação; e

• servir de parâmetro objetivo para julgamento das ofertas apresentadas. [...]

Preço estimado é um dos parâmetros de que dispõe a Administração para julgar licitações e efetivar contratações. Deve refletir o preço de mercado, levando em consideração todos os fatores que influenciam na formação dos custos. [...]

Deve a estimativa ser elaborada com base nos preços colhidos em empresas do ramo pertinente ao objeto licitado, correntes no mercado onde será realizada a licitação, que pode ser local, regional ou nacional. Sempre que possível, devem ser verificados os preços fixados por órgão oficial competente, sistema de registro de preços ou vigentes em outros órgãos.

Dessa forma, a presente restrição merece ser mantida.

Registre-se, no entanto, que conforme análise realizada pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações às fls. 842-845, não houve sobrepreço na contração realizada. Dessa forma, em que pese não ter sido realizada pesquisa de preços prévia à contratação, dela não adveio prejuízo ao erário.

Logo, cabível a aplicação de multa ao responsável, Sr. Hugo Lembeck, pela ausência da devida pesquisa de preços no mercado – não se constatando, todavia, sobrepreço na contratação – consoante o disposto na conclusão deste parecer.

3.     Distância máxima para a localização da assistência técnica – Termo de Referência – Anexo I do Edital

No parágrafo final do Termo de Referência (fls. 288-291) do Pregão Presencial n. 052/2013, foi exigido que a empresa prestadora de serviços de assistência técnica estivesse localizada a, no máximo, 200 km de distância da sede do Município de Taió.

Conforme apurado pela Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o referido certame, bem como pela Área Técnica desse Tribunal, tal restrição limita a ampla concorrência que deve estar presente nos processos licitatórios, em afronta, portanto, ao princípio da isonomia entre os participantes previsto no art. 3º da Lei 8.666/93 e ao princípio da igualdade insculpido no art. 37, inciso XXI, da CRFB/88.

Nesse sentido, os documentos de fls. 215-227, colacionados pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, demonstram que há uma série de fornecedores que estariam aptos a participar do certame n. 052/2013, mas que restaram excluídos pela mencionada limitação de localização da assistência técnica. Dentre essas empresas, foi indicada a CCM, com sede em Santa Catarina, que inclusive já forneceu o mesmo objeto de conjunto móvel de britagem a diversas prefeituras catarinenses, mas que não poderia participar do certame por sua sede estar a 259,66 km em linha reta e a 356 km de condução da sede do Município de Taió.

Acerca do prejuízo ao caráter competitivo da licitação em razão da fixação de critério geográfico impertinente, Marçal Justen Filho[4] leciona que:

É proibida distinção fundada exclusivamente na sede, domicílio ou naturalidade dos licitantes. A vedação deriva da Constituição, não apenas por força do princípio da isonomia mas por efeito da própria estrutura federativa do Brasil (CF, art. 19, inc. III).

Como decorrência, são vedadas cláusulas vulgarmente encontradas em licitações, por meio das quais se pretende impedir ou onerar empresas estabelecidas em Municípios ou Estados distintos daqueles que promovem a licitação. [...]

Existem hipóteses em que a Administração Pública está legitimada a exigir que o particular execute a prestação contratual em determinado local, sendo indispensável para tanto a existência de um estabelecimento geográfico em determinada região. [...]

Ou seja, admite-se a consagração de critério de localização geográfica do estabelecimento do licitante se tal for indispensável à execução satisfatória do contrato e se a localização geográfica envolver distinções econômicas pertinentes à avaliação da vantajosidade da proposta.

Em todos os casos, será vedada a adoção de exigências de estabelecimento em local determinado como requisito de participação, for força do art. 30, § 6º, da Lei (que determina que “as exigências relativas a instalações... serão atendidas mediante apresentação... da declaração formal de sua disponibilidade... vedadas as exigências de propriedade e de localização prévia”).

Isso significa a necessidade de evidenciar a pertinência não apenas teórica da questão geográfica. É indispensável verificar a solução prática adotada em cada caso concreto. Somente será válido o edital que estabelecer critério de cunho geográfico compatível com o princípio da proporcionalidade. Isso significa a necessidade de evidenciar que a fixação de um critério geográfico determinado era (a) indispensável à satisfação da necessidade objeto da contratação, (b) foi realizada de modo a assegurar a mais ampla participação de potenciais interessados e (c) não infringiu outros princípios constitucionais pertinentes.

Ou seja, não é válida a adoção excessiva ou abusiva de um critério geográfico. Isso se passará quando, a pretexto de assegurar uma prestação vantajosa, introduzem-se restrições desnecessárias ou excessivas.

Em face dessa irregularidade, foram indicados como responsáveis os Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho. Os dois primeiros apresentaram manifestação de igual teor, respectivamente, às fls. 887-889 e 946-949, sustentando, em síntese, que o estabelecimento de distância máxima entre a assistência técnica e o Município visou a garantir a agilidade na prestação dos serviços, o que estaria em harmonia com o interesse público, de forma que inexistiria ato atentatório à competitividade.

Ora, as alegações dos responsáveis não merecem ser acolhidas. É elementar à ideia de licitação o respeito ao princípio da isonomia, do qual decorre a igualdade de condições entre quaisquer interessados em participar do certame, ressalvadas, por óbvio, eventuais restrições expressamente previstas em lei ou devida e inequivocamente justificadas no processo licitatório.

No presente caso, os responsáveis se limitaram a afirmar que o marco restritivo de 200 km asseguraria a agilidade na prestação dos serviços, mas não foram tecidas quaisquer considerações acerca do por que desses 200 km (e não 100 ou 300 km, por exemplo), bem como do fundamento para justificar que uma assistência técnica localizada a uma distância maior não atenderia, necessariamente, aos interesses e agilidade requeridos pela Administração.

Com efeito, essa necessária agilidade que de fato requer a execução de serviços de assistência técnica, poderia ter sido assegurada com alguma exigência relativa ao tempo de retorno e conclusão da manutenção/conserto, o que certamente seria mais eficiente do que a vaga exigência de localização física que, na prática, não garante de fato que os serviços serão prestados em tempo razoável. Dependendo da estrutura de determinada empresa, uma com sede no norte do País pode ser muito mais ágil e eficiente na solução de problemas do que uma empresa localizada no mesmo Município da Unidade Gestora.

Os responsáveis também buscaram afastar sua responsabilização, alegando que essa Corte de Contas estabelece distância máxima na contratação de fornecimento de combustíveis para os veículos do Tribunal. Ocorre que a comparação pretendida pelos responsáveis é absolutamente despropositada, conforme bem resume o já citado doutrinador Marçal Justen Filho[5]:

Há casos em que o particular deverá manter disponível para a Administração um local para a execução da prestação. O exemplo clássico é o fornecimento de combustível. O contrato pode estabelecer que o particular manterá um posto de fornecimento de combustível, ao qual se dirigirão as viaturas da Administração para abastecimento, quando necessário. Nesse caso, a distância geográfica até o posto representa um fator relevante por duas razões, eis que o deslocamento do veículo importa consumo de combustível e de tempo. Logo, quanto mais distante o posto, tanto maior será o combustível e o tempo despedidos. Isso significa que a questão geográfica apresenta relevância sobre o conteúdo da prestação a ser executada, o que exige indispensável consideração.

Seria antijurídico que, numa situação como essa, o edital estabelecesse que o critério de julgamento seria o menor preço por litro de combustível, independentemente da localização do estabelecimento do licitante. Isso produziria resultado totalmente despropositado. Seria imaginável a vitória de um licitante estabelecido a milhares de quilômetros de distância do local em que estivessem sediados os veículos.

Dessa forma, percebe-se que os responsáveis não apresentaram nenhuma justificativa passível de afastar a presente restrição, mantendo-se, portanto, a responsabilização dos Srs. Carlos Cava e Hugo Lembeck.

Quanto ao Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho, assessor jurídico e parecerista no processo licitatório em questão, já foi analisado no item 1 deste parecer que o responsável não apresentou manifestações pontuais acerca do mérito das irregularidades que lhe foram imputadas, limitando-se a tentar afastar sua responsabilização alegando ilegitimidade passiva, o que, como visto, não merece prosperar. Dessa forma, tendo em vista a inequívoca omissão do advogado parecerista em aprovar o processo licitatório mesmo com a grave restrição à competitividade consubstanciada na limitação geográfica debatida neste item, sua responsabilidade também deve ser mantida.

Com tudo isso, deve ser aplicada multa aos Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho em razão da presente restrição, consoante o disposto na conclusão deste parecer.

4.     Visita de inspeção – item 9.1 do Edital

O item 9.1 do Edital do Pregão Presencial n. 052/2013 (fl. 283) previa que, no prazo de 5 dias após declarada a empresa vencedora da licitação, a Prefeitura Municipal de Taió faria visita de inspeção na referida empresa, para a certificação da qualidade, características e prazo de entrega do produto licitado. Dessa forma, se o produto não atendesse às exigências do edital e seus anexos, a empresa vencedora seria desclassificada e o objeto da licitação seria adjudicado à empresa classificada em segundo lugar e assim sucessivamente.

Ocorre que a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o processo licitatório ora em análise apurou que essa visita de inspeção não foi realizada no prazo indicado no edital, mas tão somente por ocasião da instalação do objeto licitado, sendo que, na realidade, da documentação acostada aos autos sequer é possível inferir que essa inspeção foi realizada, ainda que tardiamente.

Os Srs. Pedrinho Altoff e Hugo Lembeck, indicados como responsáveis pela presente restrição, apresentaram manifestação de igual teor respectivamente às fls. 901 e 949, afirmando que não foi realizada a inspeção na fábrica da empresa vencedora da licitação, pois a equipe técnica da Prefeitura já conhecia o equipamento fornecido por aquela empresa, bem como que a exigência de visita de inspeção constante no Edital em análise era desnecessária, porque se o objeto entregue pela empresa vencedora não fosse satisfatório, bastaria à Administração rescindir o contrato firmado e reaver o montante pago na contratação.

Aparentemente, desconhecem os responsáveis o elementar princípio da vinculação ao instrumento convocatório expresso no caput do art. 3º da Lei 8.666/93, segundo o qual tanto os particulares, quanto a Administração, encontram-se obrigados às regras previamente definidas no ato convocatório do certame.

Portanto, se a Unidade Gestora consignou no Edital da licitação que a visita de inspeção seria realizada, foi porque entendeu que essa seria uma garantia à correta execução contratual, de maneira que esse dispositivo deveria ser cumprido. Se essa visita, no entanto, poderia se tornar desnecessária em razão do prévio conhecimento, pela área técnica da Prefeitura, das características e qualidade de determinado produto, o aconselhável seria facultar essa visita por parte da Administração, mas jamais prevê-la no ato convocatório como obrigatória e, posteriormente, deixar de cumpri-la.

Dessa forma, nos termos do proposto pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações no relatório técnico de fls. 1109-1125v, manifesto-me pela expedição de recomendação à Unidade Gestora, para que se abstenha de incluir em seus editais licitatórios cláusulas de que não necessite.

5.     Designação do responsável para o recebimento do objeto

O relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito encaminhado e a Área Técnica desse Tribunal noticiaram defeitos no recebimento provisório e definitivo do objeto licitado, tendo em vista a ausência de ato designando comissão ou pessoa específica para atestar o recebimento da compra realizada, e consequente ausência de termo de recebimento do equipamento, em afronta aos arts. 67 e 73, inciso II e § 1º, da Lei n. 8.666/93, que assim determinam:

Art. 67.  A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição. [...]

Art. 73.  Executado o contrato, o seu objeto será recebido: [...]

II - em se tratando de compras ou de locação de equipamentos:

a) provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação;

b) definitivamente, após a verificação da qualidade e quantidade do material e conseqüente aceitação.

§ 1º Nos casos de aquisição de equipamentos de grande vulto, o recebimento far-se-á mediante termo circunstanciado e, nos demais, mediante recibo.

Novamente, foram indicados como responsáveis pela presente irregularidade os Srs. Pedrinho Altoff e Hugo Lembeck, que apresentaram suas manifestações às fls. 901 e 949-950, respectivamente, alegando que o equipamento licitado foi recebido pelo servidor Edésio Fillagranna, que possuía habilitação técnica para receber tal bem.

Conforme se extrai da nota fiscal acostada à fl. 803, de fato o Sr. Edésio Fillagranna foi o responsável pelo recebimento do material licitado, sendo que os documentos de fls. 963-965 indicam sua qualificação técnica para essa função, e não há qualquer indício nos autos de que tenha ocorrido falhas nesse recebimento que comprometessem os interesses da Administração. No entanto, também é fato que a Unidade Gestora não promoveu a adequada e formal designação desse servidor, em descumprimento ao acima transcrito art. 67 da Lei n. 8.666/93.

Dessa forma, suficiente uma recomendação à Unidade Gestora para que realize termo de designação de responsável para recebimento dos equipamentos em conformidade com as especificações do Edital, nos termos do art. 67 da Lei n. 8.666/93, recebendo-se os materiais na forma disposta no art. 73, inciso II e § 1º da mesma Lei.

6.     Liquidação da despesa por meio da NF n. 159, de 13/06/13

Com base no relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito realizada sobre a licitação em análise, a Área Técnica dessa Corte de Contas indicou a liquidação da despesa por meio da Nota Fiscal n. 159/2013 (fl. 803), sem a comprovação da entrega dos equipamentos conforme licitado, contrariando o art. 73, inciso II e § 1º da Lei n. 8.666/93 e o art. 63, § 1º, da Lei n. 4.320/64.

Com efeito, embora o equipamento licitado seja composto de 8 partes, o recebimento aposto na Nota Fiscal n. 159/2013 pelo Sr. Edédio Fillagranna não teria confirmado que todos foram entregues no mesmo dia, tendo em vista que, conforme relatado (fls. 157-158) pela mencionada CPI, o objeto licitado teria sido entregue em 2 etapas, sendo a primeira em 14/06/2013 (NF n. 159/2013 no valor de R$ 744.000,00) e a segunda em 12/07/2013 (NF n. 177/2013, no valor de R$ 153.034,00), em desacordo ao que previa o Edital n. 052/2013.

Após a audiência dos responsáveis, Srs. Hugo Lembeck, Pedrinho Altoff e Edésio Fillagranna, que alegaram não haver irregularidades na liquidação de despesa realizada, a reinstrução entendeu por manter a presente restrição.

Discordo da Área Técnica, no entanto, diante da ausência de prova acerca da entrega parcelada dos equipamentos. Segundo a CPI, as entregas seriam correspondentes a duas Notas Fiscais (n. 159/2013 e n. 177/2013). Ocorre que apenas se tem notícia da liquidação da primeira, inexistindo registro nos autos acerca do pagamento no valor de R$ 153.034,00 que seria correspondente à segunda Nota Fiscal.

Ainda, não faria sentido exigir do responsável pelo recebimento do material que descrevesse pormenorizadamente cada um dos itens recebidos, tendo em vista que a descrição do produto na nota fiscal remete ao “Conjunto móvel de britagem”, conjunto este que, presume-se, engloba todos os itens que foram solicitados no Edital.

Além disso, a confirmação de recebimento pelo responsável foi realizada mediante um carimbo que informa o seguinte: “Confirmo que o material/serviço constante desde documento foi recebido/prestado e está em conformidade com as especificações nele consagradas”. Ou seja, o “Conjunto móvel de britagem” foi devidamente recebido.

Dessa forma, não vislumbro motivos que sustentem a manutenção da presente restrição, razão pela qual ela deve ser afastada.

7.     Disponibilização do técnico operacional

O Termo de Referência (Anexo I) do Edital n. 052/2013 trouxe a exigência de que a empresa vencedora do certame deveria disponibilizar gratuitamente, pelo período mínimo de 15 dias, técnico operacional para treinar os funcionários da Prefeitura Municipal de Taió acerca da operação e manutenção preventiva dos equipamentos licitados, sendo que, ao final daquele período, deveria haver entrega de certificado prático operacional de britador aos servidores treinados (fl. 290 in fine).

Ocorre que, além de não haver essa obrigação expressa no Contrato n. LC 73/13 (fls. 361-365) firmado entre a Unidade Gestora e a empresa vencedora do certame n. 052/2013, também não foram juntadas provas aos autos acerca do cumprimento dessa obrigação.

Logo, foi realizada a audiência dos Srs. Pedrinho Altoff e Hugo Lembeck acerca da presente restrição, resultando na apresentação, respectivamente, das manifestações de fls. 902 e 950-951, nas quais ambos os responsáveis sustentam de que o referido treinamento aconteceu, remetendo-se, para fins de comprovação, aos documentos que estariam em anexo.

Quanto ao Sr. Pedrinho Altoff, note-se que nenhum dos documentos por ele anexados às suas alegações de defesa, constantes às fls. 903-920, referem-se à presente irregularidade e, por isso, não são hábeis a afastá-la. Já o Sr. Hugo Lembeck menciona expressamente em sua defesa a juntada do Manual Técnico Operacional que demonstraria que no dia 14/06/2013 houve o comparecimento de técnico da empresa vencedora do certame para dar início à montagem do equipamento e para oferecer treinamento aos servidores do Município.

Ocorre que o referido Manual, acostado às fls. 977-1013, não comprova a realização do treinamento, significando, apenas, que houve a entrega de um manual juntamente ao equipamento fornecido. A declaração de fl. 999, por sua vez, também não se presta a comprovar o cumprimento da obrigação prevista no Termo de Referência, porquanto menciona apenas vagamente que aqueles que a firmam foram orientados acerca dos equipamentos entregues pela empresa contratada, não suprindo a exigência de entrega de certificado prático operacional de britador prevista no certame.

Causa estranheza, também, que na parte destinada à assinatura do responsável pela empresa contratada, a declaração de fl. 999 tenha sido assinada pelo Sr. Pedrinho Altoff, que é Secretário de Transportes, Obras e Serviços Urbanos do Município de Taió.

Como se vê, não foram apresentados documentos hábeis a sustentar as alegações dos responsáveis, de maneira que a presente restrição deve ser mantida. Note-se que essa irregularidade implica inclusive em dano ao erário (iliquidável), tendo em vista que ao formular sua proposta de preços, certamente a licitante contemplou os custos de disponibilizar um funcionário por no mínimo 15 dias para realizar o treinamento dos servidores de Taió, de maneira que aquela municipalidade acabou arcando com os custos de um serviço que não foi prestado.

Dessa forma, mantida a presente irregularidade, deve ser aplicada multa aos responsáveis, Srs. Pedrinho Altoff e Hugo Lembeck, consoante o disposto na conclusão deste parecer.

8.     Especificações do objeto no Termo de Referência – Anexo I do Edital

Conforme apurado pela Comissão Parlamentar de Inquérito às fls. 29-39 e confirmado pela Área Técnica na análise de fls. 845-846v, as especificações dos equipamentos descritos no Termo de Referência do Pregão Presencial n. 052/2013 somente podiam ser atendidas por uma única empresa, a Mercantil Catarinense Ltda., que foi, por óbvio, a única participante e consequente vencedora do referido certame.

Embora seja absolutamente salutar e imprescindível que a Administração especifique as características do objeto que pretende comprar, verificou-se no presente caso, além de um excessivo detalhamento, que exclui por completo a possibilidade de participação de outras empresas, a indicação inclusive do número do modelo – referente ao catálogo de produtos da Mercantil Catarinense Ltda. – de alguns dos itens que compõem o conjunto móvel de britagem licitado.

Nesse sentido, vejam-se os apontamentos realizados pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações acerca da demasiada especificidade dos itens descritos pelo Termo de Referência do Edital n. 52/2013 (fls. 1121v-122):

Para cada um dos 8 (oito) equipamentos foram exigidos uma série de especificações constante do Termo de Referência, de fls. 289/291.

Para o alimentar vibratório foram 12 (doze), para o britador primário de mandíbulas 8 (oito), para a peneira vibratória apoiada foram 13 (treze), para as transportadores de correria 9 (nove) e 13 (treze), para o grupo gerador de energia nacional 15 (quinze), para o painel de comando elétrico 11 (onze) e para a carreta rodoviária 16 (dessezeis).

Destacam-se as seguintes especificações de cada item:

a) Do Alimentador vibratório: construído em chapas de aço A36 com no mínimo 3/8" de espessura e com 2 grelhas cambiáveis 1 de 2 %2 e 1 de 11/2 x 1600mm de comprimento, separadora tinos, com capacidade de produção de 40 à 120m' hora;

b) Do britador primário de mandíbulas: construído em chapas de aço A36, com espessura mínima de 2 1/2 com boca de recepção mínima de 0,21 à 0,25m³;

c) Peneira vibratória apoiada: modelo PVA25090, com 2,50 m x 0,90 m, chassis de estrutura metálica construída em vigas "1" e "U" para fixação e apoio da mesma;

d) Transportador de correria: com no mínimo 12,00m de comprimento e 22" de largura, com conjunto de acionamento com redutor, motor elétrico 5cv, 380/660V;

e) Transportador de correia: modelo TC1220, com 12,00m de comp. x 20" de largura, capacidade de produção de 55m' por hora;

f) Grupo gerador de energia nacional: de no mínimo 115kva hibrido, consumo aproximado entre 8 e 10 litros de combustível por hora;

g) Painel de comando elétrico: capacitado para distribuição de energia com chave de partida estrela triangulo (3 rotações) para o motor de 40cv do britador; e

h) Carreta Rodoviária: com capacidade para 22 toneladas documentada, deverá conter no mínimo 08 pés de apoio em viga I no mínimo 6" tipo cavalete com tirantes em x com terminais de regulagem, com regulagem de altura mínima de 200mm para estabilização e suspensão do conjunto em operação.

Destacam-se destes acima, a indicação de modelos na peneira vibratória – modelo PVA25090 e também no transportador de correia – modelo TC1220, modelos não encontrados em outras marcas, apenas no modelo da empresa Mercantil Catarinense Ltda. (grifei)

Ainda, extrai-se do “Quadro 5” elaborado pelo Corpo Técnico dessa Corte de Contas às fls. 845-845v, a absoluta compatibilidade entre essas especificações e aquelas constantes do catálogo da empresa Mercantil Catarinense Ltda., concluindo-se, portanto, pelo inequívoco direcionamento do processo licitatório.

Como se vê, o detalhamento dos objetos realizados pela Unidade Gestora escapa à razoabilidade, configurando-se em verdadeiro limitador da competitividade, em afronta ao disposto no art. 3º, inciso II da Lei n. 10.520/02 e art. 15, § 7º, inciso I da Lei n. 8.666/93 que dispõem, in verbis:

Art. 3º A fase preparatória do pregão observará o seguinte: [...]

II - a definição do objeto deverá ser precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem a competição; [...].

Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão: [...]

§ 7º Nas compras deverão ser observadas, ainda:

I - a especificação completa do bem a ser adquirido sem indicação de marca; (grifei)

A vedação à indicação de marca, no presente caso, foi infringida com a indicação do modelo exato do item licitado, modelo o qual corresponde a uma marca específica, fornecida unicamente pela empresa Mercantil Catarinense Ltda. Note-se que não foi indicado o modelo apenas como referencial do equipamento que estava sendo solicitado, tanto é que não foi adicionada a essa indicação a expressão “ou similar”, “ou equivalente” ou “ou de melhor qualidade”. Da mesma forma, não foram juntadas aos autos da licitação justificativas técnicas que demonstrassem o porquê de somente aquele modelo de determinada marca atender às necessidades da Administração. Logo, as especificações técnicas constantes do Pregão em análise são irregulares, por excessivas e por constarem indicação de marca.

Pela presente restrição, foram indicados como responsáveis os Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho. Os dois primeiros apresentaram manifestações de mesmo teor às fls. 889-890 e 951-952, respectivamente, sustentando, em síntese, que as especificações dos itens licitados não afastaram os competidores e que, se isso tivesse ocorrido, os interessados poderiam ter impugnado o Edital. Ressaltaram a qualidade do material fornecido pela empresa vencedora e a dificuldade de encontrar equipamentos capazes de efetuar britagem de materiais com a dureza característica da região de Taió.

As alegações dos responsáveis de que as especificações dos equipamentos licitados não afastaram competidores, no entanto, se esvaziam pelo fato de que somente uma empresa, a Mercantil Catarinense Ltda. – cujos equipamentos fornecidos tiveram as especificações reproduzidas no edital em análise, inclusive com a indicação de seus respectivos números de modelo – participou da licitação (conforme ata de fl. 336), não tendo ocorrido, portanto, qualquer competição. Essa restrição à competitividade comprometeu, inclusive, o valor dispendido pela Administração nessa compra, tendo em vista que, com a ausência de lances característicos do pregão, o montante da contratação foi apenas R$ 1.000,00 abaixo do valor estimado para a licitação[6] – estimativa, que como visto, também foi defeituosa.

A ausência de impugnação ao edital, por sua vez, não convalida suas irregularidades, circunstância que, portanto, torna-se irrelevante para o controle realizado por essa Corte de Contas.

Por fim, acerca da alegada qualidade dos equipamentos fornecidos pela empresa contratada e consequente dificuldade em encontrar produtos compatíveis com a necessidade da Unidade Gestora, note-se que, se de fato essa situação se confirmasse, caberia à Administração, conforme já pontuado neste parecer, justificar essas peculiaridades. Nesse caso, inclusive, se realmente o equipamento fornecido pela empresa Mercantil Catarinense Ltda. fosse justificadamente o único apto a atender as necessidades da Prefeitura Municipal de Taió, estaríamos diante de caso de inexigibilidade de licitação, não se sustentando, portanto, o Pregão realizado.

Dessa forma, deve ser mantida a irregularidade, bem como a responsabilidade dos Srs. Carlos Cava e Hugo Lembeck.

Quanto ao Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho, advogado que proferiu parecer na licitação em análise, já foi visto neste parecer que, nas alegações de defesa por ele apresentadas (fls. 871-883), não houve expressa manifestação quanto às irregularidades que lhes foram imputadas, limitando-se sua defesa à tentativa de afastar sua responsabilidade sob o argumento de ilegitimidade passiva, o que já foi devidamente afastado no item 1 deste parecer.

Ocorre que, embora ele responda pela emissão de parecer jurídico aprovando licitação claramente defeituosa, deve ser realizada uma ponderação quanto a sua responsabilidade por questões eminentemente técnicas que fogem a sua área de formação, tais como a especificação de materiais e equipamentos não contemplados pelo conhecimento comum, tais como, portanto, o conjunto móvel de britadeira objeto da licitação em exame.

Nesse sentido, Lucas Rocha Furtado[7], atual Subprocurador-Geral do Ministério Público de Contas da União, disserta que:

Não é igualmente correto conferir responsabilidade ao órgão jurídico em razão de falhas técnicas ocorridas nos processos em que atua. Exemplo: se em determinado processo licitatório consta manifestação do órgão técnico que subsidiou a elaboração do projeto básico para a contratação de serviço de informática, e, posteriormente, constata-se que as especificações técnicas resultaram em evidente direcionamento do edital, não se pode atribuir responsabilidade ao advogado, salvo se se tratar de falha ou irregularidade tão evidente que qualquer pessoa que tenha o mínimo conhecimento de informática seria capaz de identificar.

A correta definição do papel do órgão jurídico é aspecto fundamental na definição da sua responsabilidade, especialmente quando se tratar de falhas técnicas nos projetos em que atua, em razão do princípio da segregação das funções. É dever do advogado verificar se constam nos autos os estudos ou as informações técnicas que justificam as especificações do objeto do contrato e as exigências de qualificação técnica e econômico-financeiras constantes do edital da licitação. Não se deve esperar, especialmente em situações que requeiram elevado nível de conhecimento técnico, que os advogados sejam capazes de identificar eventuais falhas técnicas e que sejam capazes de refutá-las em suas manifestações jurídicas.

Dessa forma, a responsabilidade do advogado parecerista de licitações por direcionamento em especificações técnicas alheias a sua área de formação poderia ser afastada.

No presente caso, no entanto, percebe-se que não houve um direcionamento velado, indetectável por pessoa leiga quanto aos objetos licitados. Se, em um primeiro momento, o profundo detalhamento dos itens da britadeira – com a indicação de inúmeras dimensões e potências absolutamente precisas, sem margem, inclusive, para produtos superiores tecnicamente – já deveria despertar, por parte da assessoria jurídica, a dúvida quanto à existência de direcionamento, a indicação de modelo realizada em 2 daqueles itens trazia a certeza que faltava para o parecerista jurídico ao menos questionar os responsáveis pela elaboração do edital acerca das especificações realizadas.

Com tudo isso, e aliado ao fato de o parecer (fl. 304) emitido nos autos licitatórios em análise ter sido absolutamente superficial, sem analisar de fato as questões mínimas esperadas em um parecer jurídico, conforme debatido no item 1 deste parecer, deve ser mantida a responsabilidade do Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho.

Assim sendo, manifesto-me pela manutenção da presente restrição, com a consequente aplicação de multas aos Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho, consoante o disposto na conclusão deste parecer.

9.     Prazo para a entrega do objeto – item 1.2.1 do Edital

A última irregularidade assinalada pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações quanto ao Pregão Presencial n. 052/2013 refere-se ao exíguo prazo de 10 dias para entrega dos equipamentos licitados, estabelecido pelo item 1.2.1 (fl. 276) do mencionado Edital.

Conforme asseverado pela Área Técnica desse Tribunal, esse prazo poderia afastar competidores ou elevar seus preços, além de facilitar que determinados licitantes vencessem a disputa.

Novamente, foi realizada a audiência dos Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho acerca da presente irregularidade. Os Srs. Carlos e Hugo contestaram a restrição respectivamente às fls. 891 e 952-953, informando que os equipamentos licitados eram necessários à conclusão de uma obra em importante via do Município de Taió, justificando-se, portanto, a urgência na entrega dos objetos.

Ocorre que esse diminuto prazo de 10 dias não condiz com a complexidade do objeto licitado, que é composto por 8 partes, cada uma das quais com diversas exigências específicas, que totalizam, conforme apurado pela reinstrução à fl. 1123v, 97 especificidades que deveriam ser pontualmente atendidas.

Não parece razoável, portanto, que uma empresa pudesse fabricar e entregar tal conjunto móvel de britagem rigorosamente de acordo com as detalhadas 97 especificações do Edital, a não ser que ela já tivesse esse equipamento em linha de montagem, o que seria possível para uma única empresa, justamente a vencedora do certame, Mercantil Catarinense Ltda., que, como visto, teve as características de seus produtos reproduzidas no Edital em exame. Percebe-se, portanto, que o prazo de entrega do equipamento licitado também corroborou para o direcionamento verificado na licitação atacada.

Perceba-se, ainda, que mesmo para a empresa Mercantil Catarinense Ltda. a fabricação desses equipamentos não é tão fácil e rápida, porquanto consta no seu site o prazo de 45 dias para entrega desses materiais, conforme documento de fl. 832 acostado aos autos pela Área Técnica desse Tribunal.

Também foi apurado pela reinstrução (fl. 1123v) que em processos licitatórios com o mesmo objeto, o prazo de entrega estabelecido pelas Prefeituras de Ibirubá/RS e Ibirapuitã/RS foi de 60 dias.

Além disso, o “Quadro 2” constante à fl. 1124, e elaborado pela Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, esquematizou alguns prazos de entregas consignados pela própria Prefeitura Municipal de Taió em outras licitações, sendo que, inclusive para uma retroescavadeira, que também é utilizada nas obras do Município, o prazo de entrega estipulado foi de 30 dias, 3 vezes superior, portanto, ao prazo do edital em análise.

Por fim, a alegada urgência mencionada pelos responsáveis, se existente, deveria estar expressamente justificada e fundamentada nos autos licitatórios, o que não ocorreu, in casu, de maneira que sua existência não restou configurada.

Afastados estão, portanto, os argumentos levantados pelos responsáveis. Quanto ao Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho, reprise-se que não houve sua manifestação pontual quanto às irregularidades que lhe foram imputadas, não havendo razões, portanto, para afastar sua responsabilidade, notadamente por tudo que já foi exposto neste parecer.

Logo, a presente irregularidade deve ser mantida, com a consequente aplicação de multas aos Srs. Carlos Cava, Hugo Lembeck e Marco Vinicius Pereira de Carvalho, nos termos do disposto na conclusão deste parecer.

10.   Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

1.        pela PARCIAL PROCEDÊNCIA da presente representação encaminhada pelo Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Taió, Sr. Joel Sandro Macoppi acerca das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou irregularidades no Pregão Presencial n. 052/2013, destinado à aquisição de conjunto móvel de britagem;

2.        pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a” da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, dos atos descritos nos itens 3.2.1 a 3.2.4 e 3.2.6 a 3.2.8, todos da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v;

3.        pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos responsáveis, na forma do art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000 c/c o art. 109, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, diante das irregularidades apontadas na conclusão do relatório de reinstrução, da seguinte maneira:

3.1.  ao Sr. Hugo Lembeck, Prefeito Municipal de Taió, em face das irregularidades descritas nos itens 3.2.1, 3.2.2, 3.2.6, 3.2.7 e 3.2.8 da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v;

3.2.  ao Sr. Marco Vinicius Pereira de Carvalho, Assessor Jurídico e parecerista do Edital em exame, em razão das restrições indicadas nos itens 3.2.2, 3.2.7 e 3.2.8 da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v;

3.3.  ao Sr. Carlos Cava, elaborador do Edital em exame, em face das irregularidades mencionadas nos itens 3.2.2, 3.2.7 e 3.2.8 da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v;

3.4.  ao Sr. Pedrinho Altoff, Secretário de Transportes, Obras e Serviços Urbanos, em razão da inconsistência relacionada no item 3.2.6 da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v;

4.        pelas RECOMENDAÇÕES indicadas nos itens 3.4.1 e 3.4.2 da conclusão do relatório de reinstrução de fls. 1109-1125v.

Florianópolis, 29 de janeiro de 2016.

 

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 



[1] NIEBUHR, Joel de Menezes. Responsabilidade de advogados pela emissão de pareceres jurídicos para a administração pública. Revista da ESMESC, Florianópolis, v. 12, n. 18, 2005, p. 370.

[2] TORRES, Ronny Charles Lopes de. A responsabilidade do parecerista em licitações: elementos de questionamento e o posicionamento do STF. Boletim de Convênios e Parcerias. Nº 46. Fevereiro/2009, p. 7.

[3] Disponível em: http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2057620.PDF. p. 85-86.

[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 2010, p. 84-86.

[5] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. São Paulo: Dialética, 2010, p. 85-86.

[6] O valor estimado que consta no Termo de Referência de fls. 288-291 é R$ 745.000,00, ao passo a contratação foi realizada pelo valor de R$ 744.000,00, conforme contrato acostado às fls. 361-365.

[7] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de licitações e contratos administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 215.