PARECER  nº:

MPTC/39711/2016

PROCESSO nº:

REC 15/00382407    

ORIGEM     :

Prefeitura de Florianópolis

INTERESSADO:

Dário Elias Berger

ASSUNTO    :

Recurso de Reexame da decisão exarada no processo nº LCC 09/00345896.

 

1 – RELATÓRIO

Cuida-se de Recurso de Reexame interposto pelo Sr. Dário Elias Berger em face do Acórdão nº 259/2015,[1] em que se decidiu pela condenação do recorrente no pagamento de multas, em virtude de irregularidades no Edital de Concorrência nº 244/2009 e na execução do Contrato nº 875/2009, relativos à construção de elevado no trevo da Via Expressa Sul com a Rodovia SC-405 e a Rodovia Diomício Freitas.

Auditores da Diretoria de Recursos e Reexames – DRR sugeriram o conhecimento do recurso, para dar-lhe total provimento, com o cancelamento das multas aplicadas (fls. 18/22).

 

2 – ADMISSIBILIDADE

O recurso é singular, tempestivo[2] e foi manejado por responsável legitimado para tanto.

Deste modo, encontram-se preenchidos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, razão pela qual o recurso merece ser conhecido.

 

3 – PRELIMINARMENTE

O recorrente sustenta, em caráter preliminar, sua ilegitimidade passiva para figurar como responsável pelas irregularidades constatadas no processo nº LCC-09/00345896.

Argumenta não ter participado dos atos relativos ao procedimento licitatório e à contratação da empresa vencedora; inexistindo, por conseguinte, nexo de causalidade entre a sua atuação como gestor máximo do Executivo Municipal e as condutas sancionadas. 

Auditores da DRR recomendaram o acolhimento da preliminar suscitada, em função dos argumentos expendidos nas razões recursais.

O recorrente invocou a Lei Complementar Municipal nº 348/2009,[3] vigente à época da confecção do Edital de Licitação nº 244/2009 e do Contrato nº 875/2009, a qual dispunha expressamente acerca da competência dos Secretários Municipais para assinar contratos dentro de sua esfera de competência:

 

Art. 20. No exercício de suas atribuições cabe aos Secretários Municipais e Regionais:

[...]

III - ordenar, fiscalizar e impugnar despesas públicas;

IV - assinar contratos, convênios, acordos e outros atos administrativos bilaterais ou multilaterais dentro de sua competência e quando não for legalmente exigida a assinatura do Prefeito Municipal;

 

Analisando o Edital de Licitação nº 244/2009 e o Contrato nº 875/2009,[4] constata-se que o recorrente efetivamente não participou como signatário dos referidos documentos.

Em que pese o prefeito, na condição de gestor municipal máximo e ordenador primário de despesas, seja responsável pela supervisão dos atos praticados pelos secretários municipais, os quais se encontram diretamente subordinados à sua autoridade, não se mostra pertinente responsabilizá-lo de modo automático e irrestrito por toda irregularidade eventualmente praticada nas pastas das secretarias municipais.

Neste sentido, a averiguação da responsabilidade solidária deve levar em conta as peculiaridades do caso concreto em análise, considerando as competências legalmente estabelecidas e os atos administrativos efetivamente praticados, conforme o disposto no art. 83 da Lei Orgânica do Município de Florianópolis:

 

Art. 83. São solidariamente responsáveis com o Prefeito os auxiliares diretos pelos atos que, em conjunto, assinarem, ordenarem ou praticarem.

 

No caso, as irregularidades imputadas ao recorrente decorreram todas do edital de licitação e da execução do respectivo contrato em análise, instrumentos estes que, como visto, foram firmados apenas pelos secretários municipais de administração e de obras, dentro de sua esfera de competência, oriunda de delegação legal expressa.

De outro lado, não se vislumbra a existência de elementos que indiquem atuação direta do recorrente nas irregularidades apontadas, as quais tratam de falhas eminentemente técnicas.

Observo que o Tribunal de Contas já teve oportunidade de se manifestar sobre questão análoga, ocasião em que se decidiu somente pela responsabilização da secretaria municipal (DEN-08/00439171).

Por oportuno, colaciono o seguinte excerto do parecer elaborado por auditores da Diretoria de Controle de Licitações e Contrações no processo referido, o qual serviu de embasamento para o julgamento de ilegitimidade do prefeito naquele caso:[5]

 

2.1. PRELIMINAR 2.1.1. DA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM

O responsável, em sua defesa (fls. 44/63), sustentou, em síntese, que o pressuposto da responsabilização é a existência de nexo causal, ou seja, de liame fático entre o ato ou a omissão do denunciado e os danos consequentes.

Asseverou que a realização do procedimento licitatório não teve sua participação, porquanto foi promovido pela Secretaria de Municipal da Saúde, gestora do Fundo Municipal de Saúde, em conjunto com a Secretaria Municipal de Administração.

Prosseguindo nos seus argumentos, destacou que a Lei Complementar Municipal n. 2.615/05 procedeu à delegação das atividades administrativas dentro do Poder Executivo, inclusive das atividades de realização das licitações, estas delegadas ao Secretário Municipal da Administração, conforme disposto nos seus artigos 13 e 18.

Asseverou, assim, que as atribuições relativas à licitação não competiam, em absoluto, ao denunciado, tendo em linha de conta que devidamente delegadas, o que impossibilita sua responsabilização.

Levantou, por fim, o entendimento desta Corte de Contas acerca da aferição da responsabilidade do ordenador de despesas em razão da existência de ato de delegação, esposado no Prejulgado n. 1.533.

2.1.2. ANÁLISE DAS JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELO RESPONSÁVEL

Com razão o responsável.

Compulsando os autos, notadamente os documentos acostados às fls. 69/166, infere-se, efetivamente, a inexistência de qualquer ato praticado pelo responsável, seja na fase interna, seja na fase externa do certame, que possa ensejar a imputação de responsabilidade pela suposta irregularidade apontada pelo Relatório de Instrução n. DLC/INSP2/DIV4/050/2009.

Verifica-se que, nos procedimentos licitatórios descritos pela instrução, houve por parte da Secretaria Municipal da Saúde o encaminhamento de solicitação, assinada pela Secretaria da Saúde, Sr. Maria Madalena Domingos Nunes, ao setor de licitações e contratos da Secretaria Municipal da Administração, objetivando a elaboração de processo licitatório para aquisição de medicamentos (fl. 138).

O setor de licitações e contratações elaborou os instrumentos convocatórios e promoveu a publicação dos avisos de licitação, dois assinados pela Secretaria Municipal da Saúde (fls. 95 e 119) e o outro pela Presidente da Comissão de Licitação (fl. 149).

O recebimento, abertura e julgamento das propostas foram realizados pela Comissão Permanente de Licitação do Setor de Licitações e Contratações da Secretaria Municipal da Administração (fls. 85, 108, 131 e 161), cujos resultados restaram homologados pela Secretaria Municipal da Saúde (fls. 86, 109, 132 e 162), que, também, celebrou os contratos (fls. 89, 113 e 136).

Vislumbra-se, assim, que os atos praticados na tramitação dos processos licitatórios foram promovidos pelo Setor de Licitações e Contratos da Secretaria Municipal da Administração e pela Secretária Municipal da Saúde, não passando, portanto, pela chancela do Prefeito do Município, ora responsável.

Ademais, como bem salientou o responsável, com o advento da Lei Complementar n. 2.615, de 01 de março de 2005, que dispõe sobre a estrutura administrativa e organizacional do Poder Executivo Municipal de Imbituba, a competência referente ao processamento dos certames licitatórios foi atribuída à Secretaria de Municipal da Administração e, in casu, à Secretaria Municipal da Saúde. Assim sendo, os processos licitatórios e as contratações são promovidos conjuntamente pela Secretaria da Administração e pela Secretaria solicitante, tanto que a solicitação de aquisição e a assinatura dos contratos foram efetuadas pela Secretaria Municipal da Saúde.

Vislumbra-se, pelo exposto, a existência de delegação legal das funções por parte do Prefeito Municipal aos demais órgãos da estrutura administrativa municipal através da Lei Complementar n. 2.615, de 01 de março de 2005.

Cabe salientar, a desnecessidade do ato de delegação estar assinado pelo delegando e pelo delegado, bem como a indicação nominal dos agentes. Conforme exposto na Lei Complementar acima mencionada, restam delegadas as funções discriminadas aos órgãos por esta indicada. Tal situação é admitida no âmbito do estado, porquanto a responsabilidade das contratações realizadas pelos Secretários de Estado não é imputada ao Governador apesar da inexistência de ato formal de delegação, salvo verificada sua participação. Mesmo entendimento, por questão de lógica jurídica, deve ser aplicado aos municípios.

Nesse sentido, o Prejulgado 1.533, in fine, desta Corte de Contas, in verbis:

 [...]

Em casos de existência de ato de delegação regular, serão partes nos processos de prestação e de tomada de contas, de auditoria e outros de competência desta Corte, somente os ordenadores de despesa delegados.

Serão solidariamente responsáveis, e com isso também partes jurisdicionadas nos mesmos expedientes, os agentes delegantes, nos casos de delegação com reserva de poderes ou de comprovada participação na realização de atos dos quais provenham conseqüências antijurídicas ou mesmo em razão de culpa pela má escolha da autoridade delegada. (grifou-se)

Por fim, ressalta-se que a responsabilidade acerca das irregularidades cometidas no processo licitatório, na celebração e execução do contrato deve ser imputada à autoridade que homologou o resultado do certame e ao gestor do contrato, ou seja, à ex-Secretária da Saúde do Município de Imbituba, Sra. Maria Madalena Domingos Nunes.

Dessa forma, sugere-se a exclusão do Sr. José Roberto Martins, Prefeito do Município de Imbituba, do pólo passivo do presente feito, e a inclusão da Sra. Maria Madalena Domingos Nunes, ex-Secretária da Saúde do Município de Imbituba, procedendo-se à devida audiência. (Grifos meus)

 

Destarte, considerando a ausência de elementos capazes de configurar a responsabilização do recorrente, mostra-se correta a tese da ilegitimidade passiva.

Caso a preliminar seja afastada, desde já manifesto aquiescência às razões tecidas por auditores da Diretoria de Recursos e Reexames quanto ao mérito das multas aplicadas, em função do caráter eminentemente técnico das irregularidades tratadas, as quais, repita-se, não contaram com a participação do recorrente.

 

4 - CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar n° 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO do RECURSO de REEXAME, em virtude do preenchimento dos requisitos de admissibilidade previstos no art. 80 da Lei Complementar n° 202/2000, para DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos deste parecer.

Florianópolis, 8 de março de 2016.

 

Aderson Flores

Procurador



[1] Acórdão exarado pelo Tribunal Pleno na sessão ordinária realizada em 13-3-2015, por ocasião do julgamento do processo nº LCC-09/00345896.

[2] Fl. 2.

[3] Dispõe sobre o modelo de gestão e a estrutura organizacional da administração pública municipal de Florianópolis.

[4] Fls. 51/67 e 221/224 do processo n° LCC-09/00345896, respectivamente.

[5] Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. Processo n° DEN-08/00439171. Relator: Conselheiro César Filomeno Fontes. Parecer n° DLC-20/2010. Data: 26-3-2010. Disponível em: <http://consulta.tce.sc.gov.br/RelatoriosDecisao/RelatorioTecnico/3301078.PDF>. Acesso em: 19-1-2016.