PARECER nº:

MPTC/45881/2016

PROCESSO nº:

REP 16/00219443    

ORIGEM:

Câmara Municipal de Gravatal

INTERESSADO:

Wilson Rogério Wan-Dall

ASSUNTO:

Comunicação à Ouvidoria n. 1068/2015 - Irregularidades no que concerne à assinatura de cheques da Casa Legislativa.

 

 

 

Trata-se de representação oferecida pelo Conselheiro Supervisor da Ouvidoria (fls. 2-2v) em função das informações contidas em comunicação formulada à Ouvidoria do Tribunal de Contas de Santa Catarina, reportando a ocorrência de supostas irregularidades na Câmara Municipal de Gravatal, dentre as quais a relacionada à assinatura de cheques pela Presidente da Casa em conjunto com a Secretária Legislativa do Órgão, ocupante de cargo em comissão.

A comunicação restou direcionada à Diretoria de Controle dos Municípios, a qual, na Informação n. 76/2016 (fls. 3-3v), esclareceu que parte das restrições relatadas estaria sendo tratada pelas Informações DMU n. 105/2015 e n. 52/2016 e que, com relação à suposta irregularidade na assinatura dos cheques do Legislativo Municipal, haveria ofensa às disposições do Prejulgado n. 0724 dessa Corte de Contas, razão pela qual sugeriu a conversão do conteúdo da comunicação em representação.

Procedida a autuação, a Área Técnica emitiu o Relatório de Instrução Preliminar n. DMU-1545/2016 (fls. 7-9v) e, com base nos documentos de fls. 4-6, sugeriu que se determinasse a audiência da Sra. Rosinéia Fermino, Presidente da Câmara Municipal de Gravatal nos exercícios de 2015 e 2016, a fim de prestar esclarecimentos a respeito da seguinte restrição:

3.1.1.1 - designação, por meio das portarias ns. 005/2015 e 006/2015, da servidora Jucinéia Onofre de Assunção, matrícula nº 115, ocupante de cargo em comissão de Secretária Legislativa, para o exercício de funções financeiras da Câmara Municipal de Gravatal, eminentemente necessárias às atividades permanentes da administração, e, por isso, devem ser exercidas por servidores efetivos admitidos pela via do concurso público, em afronta ao disposto no artigo 37, V, da Constituição Federal e 21, IV, da Constituição do Estado de Santa Catarina (item 2.1).

O Relator, por outro lado, entendeu que a situação dos autos é totalmente distinta da discutida na consulta que deu origem ao Prejulgado n. 0724 e, por isso, deixou de determinar a audiência da responsável e encaminhou o processo a este Ministério Público de Contas (fls. 10-11).

Passo, então, à análise da irregularidade assinalada pela Diretoria de Controle dos Municípios.

O Relatório de Instrução Preliminar n. DMU-1545/2016 entendeu que haveria possível restrição na assinatura de cheques pela Presidente da Câmara em conjunto com servidora ocupante de cargo em comissão, por afrontar o disposto no art. 37, inciso V, da CRFB/88, e no art. 21, inciso IV, da Constituição do Estado de Santa Catarina.

Afirma a Área Técnica que a Portaria n. 12/2015 (fl. 6) demonstra que a Sra. Jucinéia Onofre de Assunção foi nomeada para exercer o cargo de Secretária Legislativa, do quadro comissionado de pessoal do Legislativo Municipal, e que pelas Portarias n. 05 e n. 06/2015 (fls. 4-5) foi designada pela Presidente da Câmara Municipal de Gravatal, Sra. Rosinéia Fermino, para assinar cheques e realizar transações bancárias referentes à conta corrente n. 45.465-6, mantida pela Câmara Municipal de Gravatal na agência n. 2089-3 do Banco do Brasil.

Entretanto, alega a DMU (fls. 8-9) que a situação seria irregular porquanto a CRFB/88 – e a Constituição Estadual – determina que os cargos em comissão se destinam apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento e devem ser preenchidos, preferencialmente, por servidores de carreira, conforme também decidido por essa Corte de Contas em diversas oportunidades, a exemplo do Prejulgado n. 1501.

Afirma a Área Técnica, portanto, que as demais atividades – contínuas e permanentes da Administração Pública – devem ser desenvolvidas por servidores ocupantes de cargos efetivos, após aprovação em concurso público. Por essas razões, a instrução defende que a responsabilidade por funções de finanças da Câmara não pode ser atribuída a servidor ocupante de cargo em comissão (fls. 7v-9).

Ressalta-se que embora na Informação n. 76/2016 (fl. 3v) a Diretoria de Controle dos Municípios tenha fundamentado a irregularidade da situação no Prejulgado n. 0724, na nova manifestação da DMU, pelo relatório técnico de fls. 7-9v, não há qualquer menção a este Prejulgado.

O Relator, no despacho de fls. 10-11, defendeu a não aplicação do Prejulgado n. 0724 ao caso em exame, por considerar tratar-se de situação diversa da dos autos. Eis o conteúdo do referido Prejulgado:

O presidente da Câmara de Vereadores detém a condição de ordenador de despesa, cabendo-lhe as atribuições de autorizar as despesas do Legislativo e assinar cheques e ordens de pagamento, juntamente com o tesoureiro.

Para o Relator, ao se analisar o parecer da COG que deu origem ao Prejulgado acima transcrito, percebe-se facilmente que o comando editado pela Corte de Contas apenas deixou clara a possibilidade de o Presidente da Câmara Municipal autorizar despesas do Legislativo em conjunto com outro membro desse Poder, no caso, o ocupante do cargo de Tesoureiro da Mesa Diretora.

Esclarece, então, que não é vedado ao Presidente da Câmara delegar atribuições referentes à função do ordenador de despesa a determinando servidor e que não há, tampouco, qualquer impeditivo no sentido de que tal delegação seja feita a servidor comissionado.

Conforme bem exposto pelo Relator, na Consulta n.  TC6487501/91, que deu origem ao Prejulgado n. 0724, o Presidente da Câmara Municipal de Urubici solicitou orientação para definir quem deveria assinar cheques e determinar as despesas do Órgão, tendo em vista que existia um cargo de tesoureiro na Mesa Diretora. Naquela ocasião, pelo Parecer n. COG-386/99, a Consultoria Geral esclareceu que ao Presidente da Câmara compete a atribuição de autorizar despesas, podendo ser auxiliado pelo tesoureiro.

Assim, a situação difere da hipótese dos autos, pois o questionamento se referia especificamente à responsabilidade pela ordenação da despesa e assinatura de cheques na Câmara Municipal, em havendo um cargo de Tesoureiro na Mesa Diretora. O comando do Prejulgado não veda, portanto, que tais atribuições sejam exercidas por outros cargos.

Além disso, quanto aos argumentos apresentados pela DMU no relatório técnico de fls. 7-9v, entendo que não há irregularidade no desempenho de funções de finanças da Câmara Municipal por servidor ocupante de cargo em comissão, já que algumas atividades de natureza permanente da administração podem ser exercidas por servidores comissionados.

De fato, os dispositivos constitucionais reservam a criação de cargos em comissão para o exercício de atividades de chefia, direção e assessoramento, porém, diferente do afirmado pela Área Técnica, em nenhum momento a Lei Maior veda que os servidores ocupantes de cargo em comissão exerçam atividades contínuas e permanentes da Administração Pública.

Nesse sentido, o Prejulgado n. 1579 dessa Corte de Contas esclarece que a execução das funções típicas e permanentes do Estado devem se dar, em regra, por meio de servidores do quadro de pessoal da Unidade, ocupantes de cargos de provimento efetivo ou comissionado, este último destinado apenas às funções de direção, chefia e assessoramento. Veja-se:

1. O arcabouço normativo pátrio, com apoio doutrinário e jurisprudencial, atribui à execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública a servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos efetivos - admitidos mediante concurso público, nos termos do art. 37, II, da Constituição Federal - ou por ocupantes de cargos comissionados, de livre nomeação e exoneração. Contudo, deve-se atentar para o cumprimento do preceito constitucional inscrito no art. 37, inciso V, da Constituição Federal, segundo o qual os cargos em comissão são destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção, chefia e assessoramento, devendo ser criados e extintos por lei local, na quantidade necessária ao cumprimento das funções institucionais do Órgão, limitados ao mínimo possível, evitando-se a criação desmesurada e sem critérios técnicos, obedecendo-se também aos limites de gastos com pessoal previstos pela Lei Complementar nº. 101/00. (grifei)

Assim, resta claro que as funções típicas e permanentes da Administração Pública podem ser executadas por ocupantes de cargos comissionados, desde que relacionadas a funções de direção, chefia e assessoramento.

Nesse sentido, conforme ensina Hely Lopes Meirelles[1] – citado pela própria DMU – ao Presidente da Câmara de Vereadores cabe a responsabilidade pela contabilidade do Poder Legislativo, com a assessoria do tesoureiro e do secretário:

Todos os serviços administrativos da Câmara são chefiados pelo presidente, embora possam ser dirigidos por encarregados de seções ou departamentos, conforme exijam as circunstâncias. O que pretendemos assinalar é que o presidente da Câmara atua, em relação aos servidores e aos serviços da Edilidade, como a mais alta autoridade hierárquica, a que todos devem obediência e subordinação. Nessa qualidade, não obstante os serviços e os servidores estejam diretamente vinculados à secretaria ou à tesouraria, compete ao presidente exercer a administração superior desses órgãos da Câmara, expedindo os atos administrativos pertinentes e consubstanciados em portarias, instruções, ordens de serviço e outros de natureza executiva.

A administração financeira, a contabilidade e a elaboração e execução do orçamento da Câmara, que irá integrar o do Município, são de responsabilidade do presidente, assessorado pelo tesoureiro e pelo secretário, com membros da Mesa (grifei).

Desta forma, a prerrogativa de a Sra. Jucinéia Onofre de Assunção, na qualidade de Secretária Legislativa, realizar o controle e execução da movimentação financeira da conta bancária da Câmara, por expressa delegação da Presidente do Legislativo Municipal, caracteriza-se efetivamente como função de assessoramento, cuja relevância e especialidade permitem o seu provimento na forma comissionada.

Assim, tendo em vista que as atividades exercidas pela Sra. Jucinéia Onofre de Assunção por força das Portarias n. 05 e n. 06/2015 (fls. 4-5) são plenamente compatíveis com a finalidade de assistência e assessoramento, prevista para o provimento de cargos em comissão, entendo que não há qualquer irregularidade nas informações contidas na Comunicação n. 1068/2016, formulada à Ouvidoria dessa Corte de Contas.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se pela IMPROCEDÊNCIA da presente representação oferecida pelo Conselheiro Supervisor da Ouvidoria em função das informações contidas na Comunicação n. 1068/2016, formulada em 20/11/2015 à Ouvidoria desse Tribunal de Contas, reportando a ocorrência de suposta irregularidade na assinatura de cheques pela Presidente da Câmara de Municipal de Gravatal em conjunto com a Secretária Legislativa da Casa, ocupante de cargo em comissão.

Florianópolis, 4 de novembro de 2016.

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora

 



[1] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Ed. Malheiros, 1998, p. 482.