PARECER
nº: |
MPTC/47010/2016 |
PROCESSO
nº: |
REP 15/00593610 |
ORIGEM: |
Prefeitura Municipal de Mondaí |
INTERESSADO: |
Mariana Pagnan da Silva |
ASSUNTO: |
Irregularidades concernentes à contratação
de advogados. |
Trata-se
de representação encaminhada pela Promotoria de Justiça da Comarca de Mondaí –
SC, da qual se extrai a ocorrência de supostas irregularidades com relação às
contratações de serviços de assessoria jurídica pela Prefeitura Municipal de
Mondaí no período entre 2009 e 2014, oriundas dos processos licitatórios Cartas
Convites ns. 24/2009, 36/2010, 41/2011 e 13/2013, e Tomada de Preços n.
005/2014.
A
presente representação originou-se do envio do Ofício n. 0382/2015/PJ/MON (fls.
3-4), remetido a esse Tribunal de Contas pela Sra. Mariana Pagnan da Silva,
Promotora de Justiça da Comarca de Mondaí, por meio do qual encaminhou cópia
integral do Inquérito Civil n. 06.2012.00005861-7 (CD anexo à fl. 4). A
Diretora da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações entendeu como
necessária a autuação da manifestação ministerial como representação do
Ministério Público (fl. 2), com seu posterior encaminhamento àquela Diretoria
Técnica para análise.
A
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou o Relatório de
Instrução Preliminar n. DLC-683/2015 (fls. 5-17v), opinando pelo conhecimento
da Representação e pela determinação de audiência do Sr. Lenoir da Rocha,
Prefeito Municipal de Mondaí, para que se manifestasse acerca das imputações
que lhe foram feitas nos itens 3.2.1 a 3.2.6 da conclusão do relatório, bem
como para que a Unidade Gestora apresentasse comprovação dos serviços prestados
pela empresa Wandscheer & Wilhelms Advogados Associados.
Este
Órgão Ministerial, por meio do Parecer n. MPTC/39839/2016 (fls. 19-20),
acompanhou a conclusão da Área Técnica, tendo, então, o Relator apresentado a
Decisão Singular n. GAC/JCG/2016/008 (fls. 21-22), no sentido de determinar a
adoção das providências sugeridas pela Diretoria de Controle de Licitações e
Contratações no Relatório de Instrução Preliminar.
Devidamente
cientificado por meio do Ofício TCE/DLC n. 1.394/2016 (fl. 24, com aviso de
recebimento à fl. 25), o Prefeito Municipal de Mondaí apresentou justificativas
(fls. 26-34) e juntou documentos (fls. 35-705).
A
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações apresentou, então, o
Relatório de Reinstrução n. DLC-198/2016 (fls. 708-713v), em cuja conclusão
sugeriu ao Relator considerar parcialmente procedente a representação, nos
seguintes termos:
3.1. Considerar
parcialmente procedente a Representação apresentada pelo Ministério Público
Estadual.
3.2. Considerar
irregulares, com fundamento no art. 36, § 2º, “a”, da Lei Complementar nº 202,
de 15 de dezembro de 2000, as contratações de serviços de assessoria jurídica
pelo Município de Mondaí entre os exercícios de 2009 e 2014, realizadas através
dos processos licitatórios Cartas Convites nº. 24/2009, 36/2010, 41/2011,
13/2013 e Tomada de Preços nº. 005/2014.
3.3. Aplicar
multas ao Sr. Lenoir da Rocha, Prefeito Municipal de Mondaí, com fundamento no
art. 70, II, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art.
109, II do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001),
em face do descumprimento de normas legais ou regulamentares abaixo,
fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no
Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o
recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde
logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o
disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:
3.3.1. Burla ao
Concurso Público, violação ao art. 37, inciso II, da Constituição Federal de
1988 – processos licitatórios Cartas Convites nºs. 24/2009, 36/2010, 41/2011 e
13/2013, e Tomada de Preços nº. 005/2014, para prestação de serviços de
assessoria jurídica.
3.3.2. Violação aos
princípios da Administração Pública e da licitação, em afronta ao disposto no
art. 37, inciso XXI da Constituição Federal de 1988, bem como ao disposto no
art. 3º, parágrafo 1º, inciso I, da Lei nº. 8.666/93; entre eles o princípio da
legalidade em face do desatendimento ao disposto no artigo 22, parágrafos 3º e
6º, e no art. 9º, ambos da Lei nº. 8.666/93 – Cartas Convites nºs. 24/2009,
36/2010, 41/2011 e 13/2013, e Tomada de Preços nº. 005/2014, para prestação de
serviços de assessoria jurídica.
3.3.3. Irregularidades
nos processos licitatórios, em virtude da ausência de intimação dos licitantes
acerca do julgamento das propostas, constituindo violação à disposição contida
no art. 109, da Lei nº. 8.666/93 - Cartas Convites nºs. 24/2009, 36/2010,
41/2011 e 13/2013, e Tomada de Preços nº. 005/2014, para prestação de serviços
de assessoria jurídica.
3.3.4. Exigências
restritivas à participação na licitação, violação ao disposto no art. 37,
inciso XXI, da CF/1988 e art. 3º, parágrafo 1º, inciso I, da Lei nº. 8.666/93 –
Tomada de Preços nº. 005/2014.
3.3.5. Violação ao
princípio da vinculação ao instrumento convocatório, em virtude de julgamento
de forma diversa da prevista no Edital, contrariedade ao disposto no artigo 3º,
caput, da Lei nº. 8.666/93 (item 2.11 do presente relatório);
3.4. Determinar à
Prefeitura Municipal de Mondaí que adote medidas necessárias a estruturação do
seu quadro de advogados, de modo a garantir a formação de um corpo técnico
especializado e em quantitativo suficiente para atender às necessidades de
serviços jurídicos da Prefeitura, restringindo a contratação de escritórios de
advocacia para serviços singulares ou que exijam notória especialização ou
situações excepcionais.
3.5. Dar ciência
do Acórdão, ao representante e representado.
Após,
os autos vieram conclusos a este Órgão Ministerial.
Passo,
enfim, à análise das irregularidades assinaladas pela Diretoria de Controle de
Licitações e Contratações e das respectivas justificativas apresentadas pelo
responsável.
1. Burla ao instituto do
Concurso Público no âmbito dos processos licitatórios Cartas Convites ns.
24/2009, 36/2010, 41/2011 e 13/2013, e Tomada de Preços n. 005/2014, para
prestação de serviços de assessoria jurídica, incidindo em afronta ao previsto
no art. 37, inciso II, da CRFB/88.
A
presente irregularidade foi examinada no item 2.3 do Relatório de Instrução
Preliminar n. DLC-683/2015 (fls. 7-8v), tendo concluído a Área Técnica, na
ocasião, que o Sr. Lenoir da Rocha, Prefeito Municipal de Mondaí, teria atuado
de forma inconteste nos procedimentos licitatórios, inclusive subscrevendo
todos os editais referentes aos processos licitatórios apontados.
Instado
a se manifestar, o responsável apresentou justificativas de defesa, em cujas
considerações iniciais frisou (fl. 26) que a presente demanda teria sido fruto
de “perseguição pessoal desencadeada pelo representante do MPSC, (...) Sr.
Fabrício Pinto Weiblen”, a qual teria sido verificada e reconhecida pelo
próprio Ministério Público, o que supostamente teria motivado a transferência
daquele Promotor para outra Comarca.
Em
seguida, buscou (fl. 26) afastar a restrição, alegando que a ocupação do cargo
público de procurador, ao longo de todo o período, teria estado sempre ocupado,
sem exceção, de modo que a denúncia realizada não teria qualquer respaldo.
Aduziu
(fl. 27) que não haveria qualquer demonstração de ilegalidade na
realização/formalização dos processos licitatórios para contratação do serviço
de assessoria jurídica, destacando que não haveria, igualmente, qualquer
vedação ao agente público para a realização de contratação, além de inexistir
dano ao erário ou enriquecimento ilícito. Alegou também que o serviço teria
sido efetivamente prestado e que os respectivos valores se encontravam dentro
do preceituado no mercado de trabalho e pela Ordem dos Advogados do Brasil,
salientando que os preços teriam se configurado até mesmo como “econômicos”
para os cofres públicos.
No
que diz respeito à prestação de serviços, o responsável frisou (fl. 27) que o
denunciante não teria questionado tal fato, de modo que se poderia considerá-lo
como incontroverso, destacando que mesmo em face disso, colacionou provas
documentais, as quais creditou como “completas”, em razão de os comprovantes
serem apresentados de forma mensal.
Instou
(fl. 27) que se considerasse a discricionariedade da administração pública em
suas contratações, assim como a efetividade do objeto contratado e seu
respectivo cumprimento, novamente alegando a ausência de prejuízos ao erário.
Argumentou que em momento algum se teria buscado a burla do certame, mas sim a
contratação de serviço técnico “necessário e confiável”, por meio de
procedimentos licitatórios que teriam atingido sua finalidade. Destacou que “a
contratação de serviço de advogado, tradicionalmente, envolve o aspecto
confiança”.
Adiante,
o responsável buscou (fl. 28) justificar sua conduta fundamentando-se na
alegação de que apenas manteve prática que já era usual, tendo sido adotada por
outras administrações daquela Municipalidade, destacando que as contratações
anteriores teriam se dado por dispensa/inexigibilidade de licitação, enquanto
que aquelas objeto do presente processo teriam sido instrumentalizadas por
procedimentos licitatórios.
Nesse
sentido, justificou (fl. 28) que a contratação da empresa Wandscheer &
Wilhelms Advogados Associados se dera em função de esta ter se sagrado
vencedora dos processos licitatórios ns. 024/2009, 036/2010, 041/2011, 013/2013
e 005/2014, reiterando que não teria havido dispensa, inexigibilidade ou burla
à licitação.
Alegou
(fl. 29), ainda, que caso houvesse ocorrido irregularidade formal, não seria
capaz de anular o procedimento, argumentando que o custo anual de manutenção de
advogado para o Município seria da ordem de R$ 81.551,52 para uma jornada
semanal de 30 horas, enquanto que com a contratação da empresa, o Município
teria passado a contar com dois profissionais de forma contínua em período
integral, remunerados “de acordo com o serviço prestado”.
O
responsável frisou (fl. 29) que o Ministério Público catarinense “busca, a todo
custo, fazer crer que a contratação foi irregular”, porém deixando (fl. 30) de
apresentar o preceito legal que teria sido infringido, uma vez que o Promotor
de Justiça teria supostamente reconhecido que não haveria vedação à realização
de processo licitatório para a contratação realizada, reiterando que o caso se
trataria de “uma perseguição pessoal”. Após, colacionou (fls. 30-31) jurisprudência
do Tribunal de Justiça de Santa Catarina teoricamente favorável à sua tese.
Em
seguida, o responsável discorreu acerca de tese sobre a violação dos arts. 9º a
11 da Lei n. 8.429/92, apresentando cálculos cujo resultado seria o valor de R$
97.862,18, representativo do custo anual com o advogado concursado do
Município. Tendo isto em mente, frisou (fl. 31) que após a contratação da
empresa de advocacia, o Município teria passado a contar com “mais dois
advogados devidamente habilitados para prestar todos os serviços inerentes e
decorrentes da contratação havida”.
Nas
páginas seguintes (fls. 31-33), o responsável elaborou análise pormenorizada
relativa aos arts. 9º a 11 da Lei n. 8.429/92, notadamente quanto ao núcleo das
condutas neles contidas, concluindo que não poderia ser enquadrado em qualquer
das hipóteses previstas naqueles dispositivos.
Ao
final, o responsável concluiu (fl. 34) reafirmando a inexistência de qualquer
ato capaz de configurar irregularidades nas contratações realizadas, assim como
a ausência de vícios ou prejuízos, novamente destacando que o presente processo
seria reflexo de “pura perseguição pessoal”.
Em
que pesem as justificativas apresentadas pelo responsável, entende-se pela
efetiva existência de irregularidade, nos moldes em que originariamente
apontado pela instrução.
Inicialmente, compulsando-se
os autos no intuito de verificar o âmbito de atuação e os serviços prestados
pela empresa contratada pelo Município de Mondaí, extrai-se do Relatório
Circunstanciado de Serviços Prestados (fl. 58) que dentre tais atividades
encontram-se: reunião com chefe do Poder Executivo para discussão e
levantamento de dados a respeito de atualização de leis; elaboração de
pareceres sobre procedimento de desapropriação de imóvel para fins de regularização
de rua; elaboração de estudo técnico para viabilização de projeto de lei
autorizativo de convênio do Município com a “Sociedade Terra Nova”; elaboração
de outros serviços técnico-profissionais de assessoria e consultoria jurídica,
tais como orientação, prevenção e atendimento de questões jurídicas e
administrativas e de ordem geral.
A partir do exame das
atribuições inerentes às funções para as quais foi a empresa contratada,
pode-se concluir que se voltam para a consecução de funções típicas e
permanentes da Administração Pública, de modo que juridicamente correto seria o
preenchimento dos respectivos cargos por meio da realização de concurso
público, nos moldes do que previsto no Prejulgado n. 1911 do Tribunal de Contas
de Santa Catarina:
Prejulgado n. 1911:
[...] 2. De acordo com o ordenamento legal vigente a execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública,
das quais decorram atos administrativos, deve ser efetivada, em regra, por
servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos de provimento efetivo
ou comissionado, estes destinados exclusivamente ao desempenho de funções de
direção, chefia ou assessoramento, conforme as disposições do art. 37, II e
V, da Constituição Federal. [...]
4. Sempre que a demanda de
serviços jurídicos - incluindo a defesa judicial e extrajudicial - for permanente e exigir estrutura de
pessoal especializado com mais de um profissional do Direito, é recomendável a
criação de quadro de cargos efetivos para execução desses serviços, com provimento
mediante concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal), podendo ser
criado cargo em comissão (art. 37, II e V, da Constituição Federal) para chefia
da correspondente unidade da estrutura organizacional (Procuradoria, Departamento Jurídico, Assessoria Jurídica, ou
denominação equivalente) [...] (Reformado em 24.08.2009, mediante a decisão n.
3000/09, exarada no Processo CON-08/00526490. Câmara Municipal de Palmeira.
Rel. Conselheiro Moacir Bertoli. Sessão de 24/08/2009). (grifei)
No mesmo sentido, tem-se o
texto contido no Prejulgado n. 1579 desse Tribunal de Contas:
Prejulgado
n. 1579:
1.
O arcabouço normativo pátrio, com apoio doutrinário e jurisprudencial,
atribui a execução das funções típicas e permanentes da Administração Pública a
servidores de seu quadro de pessoal, ocupantes de cargos efetivos - admitidos
mediante concurso público, nos termos do art. 37, II, da Constituição Federal -
ou por ocupantes de cargos comissionados, de livre nomeação e exoneração.
Contudo, deve-se atentar para o cumprimento do preceito constitucional inscrito
no art. 37, inciso V, da Constituição Federal, segundo o qual os cargos em
comissão são destinados exclusivamente ao desempenho de funções de direção,
chefia e assessoramento, devendo ser criados e extintos por lei local, na
quantidade necessária ao cumprimento das funções institucionais do Órgão,
limitados ao mínimo possível, evitando-se a criação desmesurada e sem critérios
técnicos, obedecendo-se também aos limites de gastos com pessoal previstos pela
Lei Complementar nº 101/00.
2.
Havendo necessidade de diversos
profissionais do Direito para atender aos serviços jurídicos de natureza
ordinária do ente, órgão ou entidade, que inclui a defesa judicial e
extrajudicial e cobrança de dívida ativa, é recomendável a criação de quadro de
cargos efetivos para execução desses serviços, com provimento mediante concurso
público (art. 37 da Constituição Federal), podendo ser criado cargo em comissão
para chefia da correspondente unidade da estrutura organizacional (Procuradoria,
Departamento Jurídico, Assessoria Jurídica, ou denominações equivalentes). Se a
demanda de serviços não exigir tal estrutura, pode ser criado cargo em comissão
de assessor jurídico, de livre nomeação e exoneração.
3.
Para suprir a falta transitória
de titular de cargo, quando não houver cargo de advogado, assessor jurídico ou
equivalente na estrutura administrativa da Prefeitura ou Câmara, ou pela
necessidade de ampliação do quadro de profissionais, e até que haja o devido e
regular provimento, inclusive mediante a criação dos cargos respectivos, a
Prefeitura ou a Câmara, de forma alternativa, podem adotar:
a) contratação de profissional em caráter temporário, nos termos do
inciso IX do art. 37 da Constituição Federal;
b)
contratação de serviços jurídicos por meio de processo licitatório
(arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 1º e 2º da Lei Federal nº 8.666/93),
salvo nos casos de dispensa previstos nos incisos II e IV do art. 24 da Lei
Federal nº 8.666/93, atendidos aos requisitos do art. 26 daquele diploma legal,
cujo contrato deverá especificar direitos e obrigações e responsabilidades do
contratado, a carga horária e horário de expediente, prazo da contratação e o
valor mensal do contrato, observada a compatibilidade com a jornada de trabalho
e o valor de mercado regional.
4.
A contratação de profissional do ramo do Direito por inexigibilidade de
licitação só é admissível para atender a específicos serviços (administrativo
ou judicial) que não possam ser realizados pela assessoria jurídica dada a sua
complexidade e especificidade, caracterizando serviços de natureza singular, e
que o profissional seja reconhecido como portador de notória especialização na
matéria específica do objeto a ser contratado, devidamente justificados, e se
dará nos termos dos arts. 25, II, § 1º combinado com o art. 13, V e § 3º, e 26
da Lei Federal nº 8.666/93, observado o disposto nos arts. 54 e 55 da mesma Lei
e os princípios constitucionais que regem a Administração Pública. Os
serviços jurídicos ordinários da Prefeitura (apreciação de atos, processos,
procedimentos e contratos administrativos, projetos de lei, defesa do município
judicial e extrajudicial, incluindo a cobrança da dívida ativa) e da Câmara
(análise de projetos de lei, das normas regimentais, e de atos administrativos
internos) não constituem serviços singulares ou que exijam notória
especialização que autorize a contratação por inexigibilidade de licitação.
5.
Quando a municipalidade realizar contratação de advogados mediante licitação,
não poderá limitar somente à sociedade de advogados, devendo possibilitar a
contratação do profissional autônomo, sob pena de limitação do universo de
participantes, procedimento vedado pelo art. 3º, § 1º, I, da Lei Federal nº
8.666/93.
6. O contrato a ser firmado com o profissional do Direito deverá estabelecer
valor fixo, não podendo prever percentual sobre as receitas auferidas pelo ente
com as ações administrativas ou judiciais exitosas pelo contratado, salvo se a
Administração firmar contrato de risco puro, onde não haja qualquer dispêndio
de valor com a contratação, sendo a remuneração do contratado exclusivamente
proveniente dos honorários de sucumbência devidos pela parte vencida, nos
montantes determinados pelo Juízo na sentença condenatória (grifei).
Note-se, aqui, que as
determinações e vedações contidas no Prejulgado em tela afastam diretamente os
argumentos e justificativas que foram apresentados pelo responsável.
Em primeiro lugar, porque a
regra geral, conforme disposto no item 1, é que as funções que sejam típicas e
permanentes devem ser atribuídas e desempenhadas pelos servidores efetivos que
componham seu quadro de pessoal, o que pressupõe a prévia aprovação em concurso
público.
Em segundo lugar, no caso de
inexistência de tal quadro, e havendo a necessidade de prestação de serviços
jurídicos de natureza ordinária, o item 2 recomenda que seja criado tal quadro,
também a ser composto e provido por servidores aprovados em concurso público
prévio.
Em terceiro lugar, o
responsável incidiu em erro ao elucubrar a possibilidade de que a situação
seria plenamente regular simplesmente em função de ter havido procedimentos
licitatórios prévios realizados pelo Município. Conforme se extrai do item 3 do
Prejulgado, a contratação de serviços jurídicos por meio de processo
licitatório somente poderia ser adotada na situação excepcional de falta
transitória de advogado, o que não era o caso, uma vez que o Município já
contava com Procurador Municipal devidamente contratado por meio de concurso
público.
Em quarto lugar, o fato de
administrações passadas terem contratado por meio de inexigibilidade de
licitação não pode ser adotada como parâmetro comparativo, na medida em que,
inclusive conforme afirmado pelo próprio responsável, tal se afigura
ilegalidade flagrante. O item 4 do Prejulgado é expresso ao assentar que os
serviços jurídicos ordinários da Prefeitura não constituem serviços singulares
ou de notória especialização que possibilitem a contratação amparada em
inexigibilidade.
Ora, de plano se nota que há
um descompasso entre a situação encontrada e a real forma pela qual o
preenchimento dos cargos deveria ter ocorrido. Tal situação caracteriza
evidente burla ao instituto do concurso público, o que afronta os vitais
princípios constitucionais da proporcionalidade e da moralidade, além dos
seguintes preceitos de nossa Lei Maior:
Art.
37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte: [...].
II
- a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em
concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a
complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e
exoneração; (grifei)
Ademais, não só as
legislações constitucional e municipal restaram inobservadas, mas também as
lições de dois dos maiores doutrinadores pátrios em seus respectivos campos de
conhecimento.
O constitucionalista José
Afonso da Silva[1],
ao tratar do tema da investidura em cargo ou emprego público, ensina que
O princípio
da acessibilidade aos cargos e empregos
públicos visa essencialmente realizar o princípio do mérito que se apura
mediante investidura por concurso público de provas ou de provas
e títulos,
de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma
prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em
lei de livre nomeação e exoneração (art. 37, II). [...]
Independem
de concurso as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração
(art. 37, II). Justifica-se a exceção,
porquanto tais cargos devem ser providos por pessoas de confiança da autoridade
a que são imediatamente subordinadas. Prevê-se,
agora, por força da EC-19/98, que as funções de confiança serão exercidas
exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em
comissão serão preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e
percentuais mínimos previstos em lei (art. 37, V). Ambos se destinam, como vimos, às atribuições de direção, chefia e
assessoramento. O tratamento diferenciado, no entanto, tem sua razão de ser
porque os cargos em comissão, como qualquer outro cargo, têm previsão de
remuneração própria, o que comporta exercício por especialistas e técnicos
alheios aos quadros administrativos; de outro lado, a justificativa para
definir que devam ser exercidos por servidores de carreira está no fato de
serem vinculados à especialidade de cada carreira funcional (Promotor,
Procurador, Defensor Público, Médico, Engenheiro, etc.). As funções de confiança correspondem, em geral, à estrutura
administrativa de entidade de Administração indireta, mas não só; existem onde
há necessidade de pessoal de direção, chefia e assessoramento, de confiança
(e com mais flexibilidade na movimentação do pessoal), mas não há os cargos
correspondentes, então é preciso designar alguém para seu exercício, e, como
elas não dispõem de remuneração própria, decidiu-se que o designado seja
ocupante de cargos. (grifei)
O administrativista Celso
Antônio Bandeira de Mello[2],
ao comentar a respeito da acessibilidade aos cargos e empregos públicos, reafirma
que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 se propôs a
impedir o ingresso de servidores sem concurso público, ressalvadas as exceções
previstas, explicando que
Além dos cargos em comissão, há, também,
determinadas hipóteses excepcionais, expressamente
previstas na Constituição, em que a nomeação
prescinde de concurso, embora não se trate de cargo em comissão. É unicamente o caso dos cargos vitalícios
de Ministros ou Conselheiros de Tribunais de Contas (art. 73, § 2º, c/c art.
84, XV) e de Magistrados dos Tribunais; a saber: os cargos de Ministro do
STF (art. 101); certos cargos nos Tribunais Superiores – STJ (art. 104), TST
(art. 111, § 1º) e STM (art. 123); 1/5 dos cargos de Magistrado de segunda
instância (art. 94); certos cargos de ocupação temporária (um biênio,
reconduzível por mais um) de Ministro do TSE (art. 119) e de Juiz de TREs (art.
120), de membro do Conselho Nacional da Magistratura (art. 103-B da EC 45, de
8.12.2004) e membro do Conselho Nacional do Ministério Público (art. 120-A da
mesma EC). Embora a Constituição não o diga de maneira expressa e literal, há
outras duas ordens de hipóteses de dispensa de concurso – já agora para
empregos – que hão de ser havidas como implicitamente previstas. Uma é o caso
de admissão de pessoa, por contrato (emprego, portanto), por tempo determinado,
para atender a necessidade transitória de excepcional interesse público, a que
alude o art. 37, IX. Entende-se que situações desta natureza não se
compatibilizariam com as inevitáveis delongas de um concurso público. Outra,
finalmente, refere-se às hipóteses em que empresas estatais exploradoras de atividade econômica –
embora também obrigadas, como regra, ao regime de concurso público para
admissão de pessoal – vejam-se na contingência de dispensá-lo perante situações
em que, se não o fizessem, frustrariam a necessidade de uma atuação expedita
inerente ao cumprimento de seus fins e requerida pelas circunstâncias do
momento, ou perderiam a possibilidade de admitir pessoal qualificado que não se
interessaria em disputar concursos, por ser de pronto absorvido pela demanda do
mercado (grifei).
A
partir da leitura de tais excertos doutrinários torna-se claro que as
contratações objeto do presente processo não se enquadram em quaisquer das
exceções legalmente previstas, indo de encontro às alegações do responsável.
O
mesmo entendimento foi adotado pela Área Técnica, que, debruçando-se sobre o
caso, trouxe a seguinte manifestação (fls. 709v-710):
No caso, houve a contratação do escritório
Wandscheer e Wilhelms Advogados Associados por meio dos processos licitatórios
Cartas Convites nº. 24/2009, 36/2010, 41/2011, 13/2013 e Tomada de Preços nº.
005/2014 para prestar serviços de modo permanente e para a execução de
atividades inerentes às suas categorias funcionais, culminando em manifesta
burla ao disposto no art. 37, inciso II, da CF/88, que estabelece a exigência
de concurso público para investidura em cargo ou emprego público.
Compulsando os autos observa-se a partir dos
relatórios de serviços prestados às fls. 58 e ss atividades relacionadas a
licitações, desapropriações, processo legislativo, área de pessoal, bens, que
se caracterizam como serviços rotineiros de uma Prefeitura Municipal deixando
claro a necessidade de concurso público para a prestação desses serviços de
assessoria jurídica permanente.
No caso como há o cargo de advogado no quadro de
pessoal do órgão a terceirização somente poderia ser admitida excepcionalmente,
para atender a situações específicas, devidamente justificadas, de natureza não
continuada, com características singulares e complexas, que não pudessem ser
atendidas por profissionais do próprio quadro do órgão ou entidade. Ainda que o
responsável pudesse alegar que o quadro atual é insuficiente caberia a
adequação do quadro a demanda dos serviços jurídicos, reservando a
terceirização para atender a ações de alta complexidade ou situações
excepcionais de crescimento do número de processos judiciais ou
administrativos.
Dessa forma,
mantém–se a irregularidade.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
2. Violação aos princípios da
Administração Pública e da licitação, em afronta ao disposto no art. 37, inciso
XXI, da CRFB/88, bem como ao disposto nos arts. 3º, § 1º, inciso I, 9º, e 22,
§§ 3º e 6º, todos da Lei n. 8.666/93.
A
presente irregularidade foi examinada nos itens 2.4 e 2.6 do Relatório de
Instrução Preliminar n. DLC-683/2015 (fls. 8v-10v e 11v-12v), tendo concluído a
Área Técnica, na ocasião, que o Sr. Lenoir da Rocha, Prefeito Municipal de
Mondaí, teria praticado contratação violadora dos princípios da moralidade
pública e da impessoalidade, na medida em que um dos sócios da empresa
contratada era seu sobrinho, bem como teria deixado de ampliar os convites
feitos a outros licitantes.
Acerca
da presente irregularidade, o responsável não trouxe quaisquer manifestações
específicas, tendo apenas apresentado os argumentos já relatados e examinados
no item anterior.
Impende
destacar que, além da irregularidade ínsita à contratação efetuada, alheia ao
necessário concurso público prévio, o Município de Mondaí laborou em ofensa à
lei, à impessoalidade e à moralidade ao contratar escritório de advocacia cujo
sócio detinha relação de parentesco com o Prefeito Municipal, afora o fato
suspeito de o mesmo ter sido constituído apenas três meses antes da primeira
contratação. Ainda, restou caracterizada irregularidade quanto aos
procedimentos adotados pela municipalidade, no sentido de que, conforme
evidenciado e reiterado pela Área Técnica (fl. 710), os convites eram sempre
endereçados aos mesmos licitantes, sendo que parte delas sequer tinha sede em
Mondaí e outra delas, absurdamente, sequer exercia a atividade profissional
necessária e requerida.
Acerca
dos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, o
constitucionalista Uadi Lammêgo Bulos[3]
traça os seguintes comentários:
O princípio da impessoalidade, consectário
natural do princípio da finalidade,
impõe que o ato administrativo seja praticado de acordo com os escopos da lei,
precisamente para evitar autopromoções de agentes públicos.
Sua palavra de ordem é: banir
favoritismos,
extravios de conduta, perseguições governamentais, execrando a vetusta hipótese
da ilegalidade e do abuso de poder.
A impessoalidade visa, pois, coibir o
desvio de finalidade de ato comissivo ou omissivo na Administração Pública, impedindo que o administrador pratique
ação ou omissão para beneficiar a si próprio ou a terceiros.
O vetor da
impessoalidade recai, também, sobre a figura do administrado.
Assim, os
atos e provimentos administrativos não são imputados unicamente aos órgãos ou
entidades administrativas em nome dos quais os agentes públicos agem.
Imputam-se, também, aos administrados, que devem ser tratados sem discriminações
nem favoritismos.
Nesse
aspecto, a impessoalidade constitui um desdobramento do pórtico geral da
igualdade
(art. 5º, caput), espraiando sua
força centrípeta sobre outras normas constitucionais, a exemplo daquelas
insculpidas nos arts. 37, II e XXI, e 175 da Carta de 1988.
Pelo princípio da moralidade administrativa,
o administrador público deve exercer sua missão à luz da ética, da
razoabilidade, do respeito ao próximo, da justiça e, sobretudo, da honestidade.
A moralidade administrativa envolve,
além da moral comum, a moral jurídica, isto é, aquela que se
extrai das regras de conduta do interior
da Administração (Maurice
Hauriou, Précis de droit administratif et
de droit public, p. 424).
Note-se que
a face jurídica da moralidade
administrativa não exclui o dever de ser
honesto de todo e qualquer agente público. Isso porque, muito mais que
princípio reitor da atuação dos governos, ela é uma qualidade intrínseca do modo de proceder dos agentes públicos.
Essa qualidade não se presume. Deve ser
provada e comprovada por aqueles que se encontram na vida pública ou resolvem
nela ingressar.
Nesse
sentido: “O agente público não só tem que ser honesto e probo, mas tem que
mostrar que possui tal qualidade. Como a mulher de César” (STF, 2ª T., RE
160.381/SP, v. u., RTJ, 153:1030).
A
moralidade, em seu sentido mais profundo, nada tem a ver com a intenção da prática do ato
administrativo. Um administrador público, por exemplo, pode até contrair
despesas lícitas, previstas, formalmente, nos diplomas normativos. Mas sua
conduta somente estará de acordo com a ordem jurídica se tais despesas acatarem
o sentido moral que a Carta Magna
exige. Gastos com propagandas publicitárias, mordomias, nepotismos, e tantas
outras chagas, por exemplo, malsinam o senso de honestidade, o caráter humano,
o respeito ao próximo, a retidão, a boa-fé, o trabalho prestado com amor, a
ética das instituições.
É que a ideia de moralidade
atrela-se ao princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade entre os meios
e os fins perseguidos pelo administrador. As autoridades públicas,
para concretizar o vetor do art. 37, caput,
da Carta Suprema, devem sopesar as vantagens que usufruem (...) com a realidade
vivida pela maioria dos cidadãos (...).
Quer dizer,
moralidade e imoralidade são figuras antagônicas, mas que podem facilmente ser
percebidas pelo exame da proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir
pela Administração Pública.
O quid caracterizador da moralidade
administrativa, por certo, está na aplicação justa, honesta e razoável da lei. Não basta, apenas, aplica-la
formalmente; é mister que se avalie o fato circundante, porque o cumprimento
imoral de um a norma jurídica equivale ao seu próprio descumprimento. Daí se
dizer que a moral jurídica é
bilateral, imperativa, geral, sendo um corolário da aplicação equânime da lei.
O princípio da moralidade administrativa é
a pauta jurídica mais importante dos Estados constitucionais que elegem a
democracia como corolário fundamental da vida em sociedade.
Se esse
princípio fosse levado às suas últimas consequências, metade do que está
escrito na Constituição de 1988 não precisaria vir nela consignado.
Exemplificando, a prática do nepotismo, em todas as esferas de poder, seria, de
pronto, extirpada, sem maiores esforços políticos, muito menos legislativos.
Nem haveria a necessidade de ser editada a Súmula Vinculante n. 13 do STF, que
proibiu as práticas nepotistas.
Certamente, o princípio da moralidade administrativa é obrigatório. Não contempla mera recomendação ou lembrete. É pauta jurídica de
conduta; possui alvo determinado: os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. (grifei)
Consoante
bem colocado pelo Relatório de Reinstrução apresentado pela Diretoria de
Controle de Licitações e Contratações (fls. 710-710v):
Não há como acolher a defesa pelos motivos
expostos e demonstrados nos autos, notadamente porque sempre constou como
participante das licitações o escritório de advocacia Wandscheer & Wilhelms
Advogados Associados, sendo emitidos os demais convites apenas para escritórios
localizados em outro Municípios, seja para preencher o número mínimo de
participantes e para dar aparência de legalidade aos certames, seja para
facilitar/possibilitar que o escritório referido vencesse todos os processos
licitatórios, já que sempre apresentou a proposta com menor valor, mesmo porque
os demais participantes não estavam em pé igualdade na competição.
Dessa forma,
mantem-se a irregularidade.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
3.
Ausência de intimação dos licitantes acerca do julgamento das propostas,
constituindo violação à disposição contida no art. 109 da Lei n. 8.666/93.
A presente irregularidade foi
examinada no item 2.7 do Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-683/2015
(fls. 12v-13), tendo concluído a Área Técnica, na ocasião, pela ausência de
intimação dos licitantes acerca do julgamento das propostas, importando em
ofensa ao disposto no art. 109 da Lei n. 8.666/93.
O responsável não trouxe
quaisquer justificativas ou argumentos acerca da presente restrição.
Levando-se em consideração
que a verificação inicial da irregularidade partiu do Ministério Público
estadual, tendo sido confirmada pelo relatório de instrução, entende-se não
restarem dúvidas acerca da legitimidade do apontado, assomando-se ao fato de
que assim também é o que se pode concluir a partir dos elementos constantes dos
autos.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
4. Exigências restritivas à
participação na licitação, em violação ao disposto no art. 37, inciso XXI, da
CRFB/1988, e no art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei n. 8.666/93, referente à Tomada
de Preços n. 005/2014.
A presente irregularidade foi
examinada no item 2.8 do Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-683/2015
(fls. 13-14), tendo concluído a Área Técnica, na ocasião, pela existência de
exigências editalícias limitadoras do caráter competitivo da Tomada de Preços
n. 005/2014.
O responsável, acerca desta
irregularidade, não se manifestou de modo específico, limitando-se, como já
referido no item 1.1 deste Parecer, a alegar a total regularidade dos
procedimentos adotados pelo Município.
Observando-se o assunto em nosso ordenamento
jurídico, o art. 37, inciso XXI, da CRFB/88 determina que, ressalvados os casos
especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão
contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de
condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de
pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o
qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
Já o art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei de Licitações
e Contratos Públicos estipula que
Art. 3o A licitação destina-se a garantir a observância do princípio
constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a
administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será
processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da
legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da
probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento
objetivo e dos que lhes são correlatos.
§ 1o É vedado aos agentes públicos:
I - admitir,
prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que
comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive
nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções
em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer
outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do
contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de
1991; (grifei)
Relativamente ao caráter competitivo e ao princípio
da isonomia insculpidos acima, o administrativista Marçal Justen Filho comenta[4]:
No inc. I, arrolam-se os casos em que as condições impostas pelo ato
convocatório distorcem o procedimento licitatório. O ato convocatório, ao
estabelecer tais requisitos, já predetermina o(s) provável(eis) vencedor(es).
O disposto não
significa, porém, vedação a cláusulas restritivas da participação. Não impede a
previsão de exigências rigorosas nem impossibilita exigências que apenas possam
ser cumpridas por específicas pessoas. O que se veda é a adoção de exigência
desnecessária ou inadequada, cuja previsão seja orientada não a selecionar a
proposta mais vantajosa, mas a beneficiar alguns particulares. Se a restrição for necessária para atender ao interesse coletivo,
nenhuma irregularidade existirá em sua previsão. A invalidade não reside na restrição em si mesma, mas na
incompatibilidade dessa restrição com o objeto da licitação. Aliás, essa
interpretação é ratificada pelo previsto no art. 37, inc. XXI, da CF (“... o
qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”). A incompatibilidade
poderá derivar de a restrição ser excessiva ou desproporcionada às necessidades
da Administração. Poderá, também, decorrer da inadequação entre as exigências e
as necessidades da Administração.
O ato convocatório tem de estabelecer as regras necessárias para seleção
da proposta vantajosa. Se essas exigências serão ou não rigorosas, isso
dependerá do tipo de prestação que o particular deverá assumir. Respeitadas as exigências necessárias para
assegurar a seleção da proposta mais vantajosa, serão inválidas todas as
cláusulas que, ainda indiretamente, prejudiquem o caráter “competitivo” da
licitação.
Assegura-se tratamento igualitário aos interessados que apresentem
condições necessárias para contratar com a Administração. A vitória de um deles
dependerá de seus próprios méritos. A regra não exige que o benefício indevido
seja derivado de uma intenção reprovável. Ou seja, não é necessário sequer a intenção
de beneficiar um ou mais competidores. (grifei)
Desse
modo, percebe-se claramente que a exigência editalícia no sentido de que as
empresas participantes deveriam estar situadas dentro de um perímetro máximo de
50 quilômetros do Município de Mondaí não encontra respaldo legal ou
doutrinário a lhe dar legitimidade.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
5. Inobservância do prazo de
publicidade do Edital de Tomada de Preços n. 005/2014, importando ofensa ao
disposto no art. 21, § 2º, inciso II, alínea “b”, da Lei n. 8.666/93.
A presente irregularidade foi
examinada no item 2.10 do Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-683/2015
(fls. 15-15v), tendo concluído a Área Técnica, na ocasião, pela violação do
prazo de publicidade do Edital de Tomada de Preços n. 005/2014, importando
ofensa ao disposto no art. 21, § 2º, inciso II, alínea “b”, da Lei n. 8.666/93.
O responsável, outra vez, não
trouxe quaisquer justificativas ou argumentos acerca da presente restrição.
Levando-se em consideração
que a verificação inicial da irregularidade partiu do Ministério Público
estadual, tendo sido confirmada pelo relatório de instrução, entende-se não
restarem dúvidas acerca da legitimidade do apontado, assomando-se ao fato de
que assim também é o que se pode concluir a partir dos elementos constantes dos
autos.
Esclarece-se, aliás, que a
Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, apesar de confirmar a
presente irregularidade no corpo do Relatório de Reinstrução n. DLC-198/2016
(fl. 711), olvidou sua menção na conclusão de tal relatório técnico, não
havendo razão, assim, para que a restrição seja desconsiderada na decisão do
Tribunal Pleno, como destacado na conclusão deste Parecer.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
6. Julgamento de forma
diversa da prevista no edital, representando violação ao princípio da
vinculação ao instrumento convocatório e contrariedade ao disposto no art. 3º, caput, da Lei n. 8.666/93.
A presente irregularidade foi
examinada no item 2.11 do Relatório de Instrução Preliminar n. DLC-683/2015
(fls. 15v-16), tendo concluído a Área Técnica, na ocasião, pela violação ao
princípio da vinculação ao instrumento convocatório, em virtude do julgamento
das propostas de modo diverso daqueles que fora inicialmente previsto.
O responsável não trouxe
quaisquer justificativas ou argumentos acerca da presente restrição.
Levando-se em consideração
que a verificação inicial da irregularidade partiu do Ministério Público
estadual, tendo sido confirmada pelo relatório de instrução, entende-se não
restarem dúvidas acerca da legitimidade do apontado, assomando-se ao fato de
que assim também é o que se pode concluir a partir dos elementos constantes dos
autos.
Desse
modo, entende-se pela manutenção da irregularidade, com a consequente aplicação
de penalidade de multa ao responsável.
7. Dano ao erário.
Conforme
fora exposto pelo Ministério Público estadual, a contratação realizada sem a
observância do necessário concurso público, além da irregularidade em si, teria
ensejado a configuração de dano ao erário.
Acerca
dessa questão, o responsável apresentou os cálculos, valores e argumentos
referidos e analisados no item 1.1 deste Parecer, por meio dos quais buscou
afastar a imputação de dano ao erário que poderia lhe ser atribuída.
Relativamente
a esse ponto específico, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações
apresentou as seguintes ponderações (fls. 712-712v):
No relatório anterior a área técnica analisou a
questão do suposto dano aos cofres públicos, considerando que “em que pese haja
plausibilidade na comparação entre os valores que seriam desembolsados para um
cargo de advogado ou Procurador do Município e os valores desembolsados para um
escritório de advocacia, esta comparação só se mostra possível se considerada a
viabilidade de pleno atendimento e em iguais condições entre ambos os
prestadores de serviço”.
Este Tribunal de Contas em diversas
ocasiões tem entendido que o dano não pode ser presumido ou aferido por
estimativa ou quando o valor dos serviços possa sofrer variações em razão de
suas características, época, condições de pagamento e local.
Daí decorre
que, apenas quando efetivamente demonstrado o dano ao erário, com sua
precisa quantificação, é que tem lugar a conversão do processo em Tomada de
Contas Especial para imputação do débito.
Poder-se-ia ser admitida como antieconômica a
contratação, com possibilidade de imputação do débito, caso ficasse comprovado
que a Prefeitura dispõe de recursos através de um quadro jurídico constituído e
operante para prestar os serviços, quando a contratação do particular seria um
ônus adicional.
No entanto, no presente caso, não se
pode afirmar que a contratação do escritório Wandscheer & Wilhelms
Advogados Associados resultou concretamente em dano ao erário, primeiro porque
não há informação de que os serviços pagos não foram prestados e em segundo
lugar porque não ficou comprovada a possibilidade de prestação desse serviço
pelo quadro próprio de advogado do Município, que conta apenas com um advogado
efetivo e um cargo de procurador geral de livre nomeação e exoneração não
provido.
Embora tenha
razão o representante quando alega que o valor dos contratos é superior ao que
seria pago a título de remuneração para o cargo de advogado ou de procurador,
não leva em consideração o quantitativo necessário do quadro de advogados para
atuar na representação judicial e extrajudicial, bem como nos feitos administrativos
e atividades de assessoramento do Município, para dispensar a necessidade de
contrato com escritórios privados, bem como o quantitativo de advogados e a
carga horária realizada pelo escritório Wandscheer & Wilhelms Advogados
Associados.
Assim, não há como acolher a alegação do representante de que o Prefeito pagou
mais para dispor dos mesmos serviços que teria se provesse adequadamente os
cargos previstos em lei.
Não obstante
a não configuração do dano, tal circunstância não é justificativa para que a
contratação em desconformidade com o regramento constitucional e a
jurisprudência deste Tribunal se prolongue, devendo ser determinado à
Prefeitura Municipal de Mondaí que adote medidas necessárias a estruturação do
seu quadro de advogados de modo a garantir a formação de um corpo técnico
especializado e em quantitativo suficiente para atender às necessidades de
serviços jurídicos da Prefeitura (grifei).
Trata-se,
como se pode perceber, de raciocínio que se coaduna com todas as questões
fáticas e jurídicas até aqui expostas, razão pela qual este Órgão Ministerial
manifesta-se em consonância com as conclusões expostas.
Imperioso
que se note, sobretudo, que, não obstante a impossibilidade de demonstração
efetiva ou mesmo de quantificação do dano ao erário, há ainda a questão
levantada pela Área Técnica no que diz respeito ao parâmetro a ser adotado a
título de comparação para que se pudesse aventar da hipótese de tal dano.
No
caso concreto, observa-se que o Ministério Público estadual, de fato, desconsiderou
a necessária quantificação da carga de trabalho relativa a ser repartida entre
outros servidores concursados para a prestação dos serviços correspondentes que
fossem demandados. Logo, resta frustrada a possibilidade de quantificação e
eventual imputação de débito.
Desse
modo, entende-se, na esteira do que sugerido pela Área Técnica, pela
determinação à Prefeitura Municipal de Mondaí para que adote medidas no sentido
da adequação de seu quadro de Procuradores/Advogados de modo a garantir a
formação de corpo profissional técnico e especializado apto a atender às
necessidades jurídicas da Municipalidade, atendendo, consequentemente, aos
princípios e ditames legais que regem a matéria.
8. Conclusão.
Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com
amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei
Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1.
pela PROCEDÊNCIA PARCIAL da presente
Representação encaminhada pela Promotoria de Justiça da Comarca de Mondaí – SC;
2.
pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”,
da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, das contratações de serviços de
assessoria jurídica pelo Município de Mondaí no período entre 2009 e 2014,
oriundas dos processos licitatórios Cartas Convites ns. 24/2009, 36/2010,
41/2011 e 13/2013, e Tomada de Preços n. 005/2014;
3.
pela APLICAÇÃO DE MULTAS ao Sr.
Lenoir da Rocha, Prefeito Municipal de Mondaí, com fundamento no art. 70,
inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, c/c o art. 109, inciso II,
da Resolução n. TC-06/2001, diante das restrições debatidas nos itens 1.1 a
1.6, deste parecer, esclarecendo-se
somente que a irregularidade disposta no item 5 deste parecer, apesar de
confirmada no corpo do relatório técnico final (fl. 711), foi olvidada em sua
conclusão, devendo, assim, também ser considerada na decisão do Tribunal Pleno;
4.
pela DETERMINAÇÃO à Prefeitura
Municipal de Mondaí para que adote medidas no sentido da adequação de seu
quadro de Procuradores/Advogados de modo a garantir a formação de corpo
profissional técnico e especializado apto a atender às necessidades jurídicas
da Municipalidade, atendendo, consequentemente, aos princípios e ditames legais
que regem a matéria, notadamente o art. 37, inciso II, da CRFB/88, e os
Prejulgados n. 1911 e n. 1579 desse Tribunal de Contas.
Florianópolis,
15 de dezembro de 2016.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora
[1] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.
São Paulo: Malheiros, 2009, p. 680-681.
[2] MELLO, Celso Antônio
Bandeira de. Curso de Direito
Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 281-282.
[3] BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 984-985.
[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos
administrativos. São Paulo: Dialética, 2010, p. 82-83.