PARECER nº:

MPTC/47131/2017

PROCESSO nº:

RLA 14/00389060    

ORIGEM:

Câmara Municipal de Balneário Camboriú

INTERESSADO:

 

ASSUNTO:

Auditoria in loco, relativa a atos de pessoal, com abrangência ao período de 01/01/2013 a 11/07/2014

 

Trata-se de auditoria in loco realizada na Câmara Municipal de Balneário Camboriú, para a verificação da legalidade dos atos de pessoal relativos a cargos de provimento efetivo e em comissão, cessão de servidores, controle de frequência, vantagens remuneratórias e controle interno, com abrangência entre 01/01/2013 e 11/07/2014.

Às fls. 2-73 fora acostada a documentação pertinente à auditoria em comento, estando as Matrizes de Planejamento, de Achados e de Responsabilização, respectivamente, às fls. 6-11, 70-72 e 73.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal elaborou o relatório técnico de fls. 74-85v, sugerindo, ao final, a realização de audiência do Sr. Nilson Frederico Probst, Presidente da Câmara Municipal de Balneário Camboriú, para que apresentasse justificativas a respeito das seguintes restrições:

5.1. Determinar AUDIÊNCIA do responsável, nos termos do art. 29, § 1º c/c art. 35 da Lei Complementar nº 202/2000, para que apresente justificativas a este Tribunal de Contas, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta, relativamente às irregularidades abaixo especificadas:

5.1.1. Sr. Nilson Frederico Probst, Presidente da Câmara Municipal de Balneário Camboriú de 01/01/2013 até a data da auditoria (07/07/2014), com endereço laboral na Av. das Flores, 675, Bairro dos Estados – Balneário Camboriú/SC – CEP 88339-130, quanto às condutas de:

a) Nomear e manter um número excessivo de servidores comissionados na unidade gestora, superior em 186% (cento e oitenta e seis por cento) ao número de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo, propiciando a burla ao instituto do concurso público e aos princípios da proporcionalidade e da moralidade administrativa, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput, e incisos II e V, da Constituição Federal e também à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (conforme acórdão da ADI 4125/TO – rel. Min. Carmen Lúcia - e decisão monocrática do ArR/RE 365.368 – rel. Min. Ricardo Lewandowski)  (item 2.1 deste relatório), tendo em vista as atribuições vinculadas ao Presidente da Câmara pelo art. 45, inciso III, da Lei Orgânica do Município de Balneário Camboriú e art. 23, inciso III, alínea “a” do Regimento Interno da Câmara Municipal (item 3 deste relatório);

b) Nomear três servidores para o cargo comissionado de Assessor Jurídico com atribuições inerentes às funções permanentes da Câmara Municipal, em desvirtuamento aos pressupostos de direção, chefia ou assessoramento, em desacordo ao art. 37, incisos II e V da Constituição Federal e ao Prejulgado 1911 desta Corte de Contas (item 2.2 deste relatório), tendo em vista as atribuições vinculadas ao Presidente da Câmara pelo art. 45, inciso III, da Lei Orgânica do Município de Balneário Camboriú e art. 23, inciso III, alínea “a” do Regimento Interno da Câmara Municipal (item 3 deste relatório);

c) Manter, no quadro funcional da Câmara Municipal, servidores ocupantes de cargo de provimento em comissão sem as suas atribuições legais, propiciando o desconhecimento das funções perpetradas pelos servidores públicos municipais, em descumprimento ao previsto no art. 37, caput, e incisos I e V da Constituição Federal, e artigos 4º e 5º da Lei n. 1069/1991 (item 2.3 deste relatório), tendo em vista as atribuições vinculadas ao Presidente da Câmara pelo art. 45, inciso III, da Lei Orgânica do Município de Balneário Camboriú e art. 23, inciso III, alínea “a” do Regimento Interno da Câmara Municipal (item 3 deste relatório);

O Relator determinou a realização de audiência à fl. 85v, a qual, devidamente realizada (fl. 89), resultou na apresentação das justificativas e documentos de fls. 90-229 e 231-263.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, então, formulou o relatório conclusivo de fls. 265-280, considerando irregulares as condutas indicadas no acima transcrito item 5.1.1, alíneas “a” e “b”, do relatório de auditoria, com a consequente sugestão de aplicação de multa ao responsável e de expedição de determinações, recomendações e alerta à Unidade Gestora, bem como de determinação à própria Diretoria de Controle de Atos de Pessoal.

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da entidade em questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71, inciso IV, da CRFB/88; arts. 58 e 59, inciso IV, da Constituição Estadual; art. 1º, inciso V, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000; e art. 8° c/c art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).

Passo, assim, à análise das irregularidades levantadas pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal.

1.     Excessivo número de servidores ocupantes de cargos comissionados, superando em 186% o número de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo

A auditoria in loco realizada por essa Corte de Contas na Câmara Municipal de Balneário Camboriú no ano de 2014 constatou que dos 89 servidores então atuantes naquele órgão, apenas 23 ocupavam cargos de provimento efetivo, de maneira que os 66 servidores restantes ocupavam cargos de provimento em comissão, configurando grave burla ao instituto do concurso público, aos vitais princípios constitucionais da proporcionalidade e da moralidade e à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

A propósito, a ementa do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 365.368, relatado pelo Min. Ricardo Lewandowski e julgado em 22/05/2007, dispôs, in verbis:

AGRAVO INTERNO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ATO NORMATIVO MUNICIPAL. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. OFENSA. INCOMPATIBILIDADE ENTRE O NÚMERO DE SERVIDORES EFETIVOS E EM CARGOS EM COMISSÃO. I – Cabe ao Poder Judiciário verificar a regularidade dos atos normativos e de administração do Poder Público em relação às causas, aos motivos e à finalidade que os ensejam. II – Pelo princípio da proporcionalidade, há que ser guardada correlação entre o número de cargos efetivos e em comissão, de maneira que exista estrutura para atuação do Poder Legislativo local. III – Agravo improvido (grifei).

Tal caso é praticamente idêntico à situação analisada neste processo, tendo tratado o Pretório Excelso das anomalias encontradas na Câmara Municipal de Blumenau, onde havia 42 servidores comissionados e apenas 25 efetivos, caracterizando clara afronta aos princípios da proporcionalidade e da moralidade. Frise-se que a referida desproporção é ainda menor do que a encontrada nos presentes autos, destacando-se no corpo da Ação Direta de Inconstitucionalidade em comento que o concurso público é a regra geral, sendo a nomeação para cargo em comissão apenas uma exceção.

Ainda, destaca-se a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.125, da Rel. Min. Cármen Lúcia, julgada em 10/06/2010, com a seguinte ementa:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXPRESSÃO “CARGOS EM COMISSÃO” CONSTANTE DO CAPUT DO ART. 5º, DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º E DO CAPUT DO ART. 6º; DAS TABELAS II E III DO ANEXO II E DAS TABELAS I, II E III DO ANEXO III À LEI N. 1.950/08; E DAS EXPRESSÕES “ATRIBUIÇÕES”, “DENOMINAÇÕES” E “ESPECIFICAÇÕES” DE CARGOS CONTIDAS NO ART. 8º DA LEI N. 1.950/2008. CRIAÇÃO DE MILHARES DE CARGOS EM COMISSÃO. DESCUMPRIMENTO DOS ARTS. 37, INC. II E V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. A legislação brasileira não admite desistência de ação direta de inconstitucionalidade (art. 5º da Lei n. 9.868/99). Princípio da Indisponibilidade. Precedentes. 2. A ausência de aditamento da inicial noticiando as alterações promovidas pelas Leis tocantinenses ns. 2.142/2009 e 2.145/2009 não importa em prejuízo da Ação, pela ausência de comprometimento da essência das normas impugnadas. 3. O número de cargos efetivos (providos e vagos) existentes nos quadros do Poder Executivo tocantinense e o de cargos de provimento em comissão criados pela Lei n. 1.950/2008 evidencia a inobservância do princípio da proporcionalidade. 4. A obrigatoriedade de concurso público, com as exceções constitucionais, é instrumento de efetivação dos princípios da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa, garantidores do acesso aos cargos públicos aos cidadãos. A não submissão ao concurso público fez-se regra no Estado do Tocantins: afronta ao art. 37, inc. II, da Constituição da República. Precedentes. 5. A criação de 28.177 cargos, sendo 79 de natureza especial e 28.098 em comissão, não tem respaldo no princípio da moralidade administrativa, pressuposto de legitimação e validade constitucional dos atos estatais. 6. A criação de cargos em comissão para o exercício de atribuições técnicas e operacionais, que dispensam a confiança pessoal da autoridade pública no servidor nomeado, contraria o art. 37, inc. V, da Constituição da República. Precedentes. 7. A delegação de poderes ao Governador para, mediante decreto, dispor sobre “as competências, as atribuições, as denominações das unidades setoriais e as especificações dos cargos, bem como a organização e reorganização administrativa do Estado”, é inconstitucional porque permite, em última análise, sejam criados novos cargos sem a aprovação de lei. 8. Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do art. 5º, caput, e parágrafo único; art. 6º; das Tabelas II e III do Anexo II e das Tabelas I, II e III do Anexo III; e das expressões “atribuições”, “denominações” e “especificações” de cargos contidas no art. 8º da Lei n. 1.950/2008. 9. Definição do prazo máximo de 12 (doze) meses, contados da data de julgamento da presente ação direta de inconstitucionalidade, para que o Estado faça a substituição de todos os servidores nomeados ou designados para ocupação dos cargos criados na forma da Lei tocantinense n. 1.950 (grifei).

A leitura do inteiro teor deste acórdão é de suma importância na discussão da presente questão, porquanto aprofunda de maneira efetiva a análise da matéria. Não se trata agora de caso idêntico ao presente processo, mas o fundamento das decisões é o mesmo, tendo sido citado como precedente, inclusive, o julgamento do Agravo Regimental acima referido. A Rel. Min. Cármen Lúcia apresentou um denso estudo dos princípios da proporcionalidade e da moralidade, e da relação de ambos com o instituto do concurso público. No ponto que mais interessa ao presente caso, deixa evidente que a comparação entre a quantidade de cargos comissionados e de cargos em provimento efetivo mostra a exacerbação do número daqueles cargos, especialmente se considerando que configuram exceção à regra da acessibilidade via concurso público. Houve, assim, clara desproporção entre o número de ambas as espécies de provimento, sendo digno de nota, ainda, o grande debate entre os Ministros da nobre Corte em tal julgamento, chegando-se ao final a uma decisão unânime.

Como se vê, não há dúvidas acerca da necessária proporcionalidade que deve haver entre o número de servidores efetivos e comissionados nos quadros de pessoal do Poder Público, o que, por ocasião da auditoria in loco realizada na Câmara Municipal de Balneário Camboriú, estava sendo descumprido, tendo em vista que praticamente 75% dos cargos então ocupados naquele órgão eram em comissão.

Nas justificativas de fls. 91-93, o responsável alegou que a Câmara Municipal de Balneário Camboriú celebrou Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta com o Parquet Estadual nos autos do procedimento administrativo SIG n. 09.2013.00004164-1 (fls. 135-147), no qual aquela Casa Legislativa comprometeu-se, dentre outras questões, a limitar o número de seus cargos comissionados a 50% dos cargos efetivos, excetuando-se os cargos comissionados vinculados aos gabinetes dos edis, in verbis:

5. O COMPROMISSÁRIO obriga-se, a partir da presente data, a adequar a disparidade do número de servidores comissionados e efetivos junto a administração do Poder Legislativo Municipal, tomando o precedente do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n. 365.368-7/SC, em que restou firmado o limite máximo de cargos comissionados em 50% dos efetivos, primando assim pela proporcionalidade e moralidade administrativas; excetua-se desta regra os cargos comissionados vinculados aos gabinetes de cada Vereador, cujo limite de contratação ficará adstrito ao montante da verba de gabinete estipulada pela Mesa Diretora para cada membro do Poder Legislativo. (grifei)

Além disso, informou que a composição da Câmara Municipal de Balneário Camboriú compreenderia 24 servidores efetivos e 27 servidores comissionados lotados no setor administrativo - além de 37 servidores comissionados lotados nos gabinetes - o que consistiria em “certa paridade” (fl. 93) entre o número de cargos efetivos e comissionados naquele órgão. Por fim, foi solicitado o prazo de 180 dias para que fosse providenciada uma reforma administrativa na Câmara.

Quase 6 meses após a apresentação das justificativas acima relatadas, o responsável apresentou a manifestação de fls. 231-233 informando sobre a entrada em vigor de diversas leis municipais que teriam adequado a estrutura administrativa da Câmara de Vereadores de Balneário Camboriú ao relatório encaminhado por essa Corte de Contas e ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual.

Da análise da Lei Municipal n. 3736/14 mencionada pelo responsável, extrai-se que cada gabinete parlamentar contará com até 5 servidores comissionados. Dessa forma, considerando a existência de 13 Vereadores em Balneário Camboriú, o número de assessores parlamentares poderá chegar a 65.

Por sua vez, a Lei Municipal n. 3752/14 cria 17 cargos comissionados para a estrutura administrativa da Câmara de Vereadores de Balneário Camboriú.

Ainda, de acordo com o art. 34 da Lei Municipal n. 3652/13, que alterou o Anexo II da Lei Municipal n. 1399/94, o quadro de pessoal efetivo da Unidade Gestora compreende 32 cargos.

Como se vê, mesmo se excluídos os cargos comissionados vinculados aos gabinetes de Vereadores, a Câmara Municipal de Balneário Camboriú não cumpriu o acordado no Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual, tendo em vista que o número de cargos comissionados da área administrativa (17), é superior a 50% do número de cargos efetivos (32). Considerando que o responsável não comprovou o quantitativo de cargos efetivos que estariam efetivamente ocupados, a proporcionalidade entre cargos efetivos e comissionados pode estar ainda mais prejudicada.

De qualquer forma, merece registro a discordância deste Órgão Ministerial com o disposto no Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta celebrado com o Parquet Estadual, no sentido de ressalvar da obrigação de proporcionalidade entre cargos efetivos e comissionados os cargos em comissão vinculados a gabinetes de vereadores. Com efeito, essa concessão não encontra respaldo no entendimento dessa Corte de Contas e tampouco na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consoante se extrai dos excertos já transcritos neste parecer, de maneira que todos os cargos comissionados da Câmara Municipal de Balneário Camboriú - vinculados a gabinetes dos Vereadores ou a áreas administrativas - devem ser contabilizados para fins de apuração da proporcionalidade entre cargos efetivos e em comissão.

Dessa forma, tem-se que o responsável não logrou êxito em afastar a presente irregularidade identificada na auditoria in loco realizada na Câmara Municipal de Balneário Camboriú, devendo ser aplicada multa ao Sr. Nilson Frederico Probst e expedida determinação à Unidade Gestora, para que promova a adequação no quantitativo de cargos efetivos e comissionados, tudo consoante o disposto na conclusão deste parecer.

2.     Servidores ocupantes de cargo comissionado de Assessor Jurídico com atribuições inerentes às funções permanentes da Câmara Municipal, em desvirtuamento aos pressupostos de direção, chefia e assessoramento

Outra irregularidade pontuada pelo Corpo Técnico dessa Corte de Contas na auditoria realizada na Câmara Municipal de Balneário Camboriú foi o fato de os servidores ocupantes de cargos de provimento em comissão de Assessor Jurídico possuírem atribuições que estavam compreendidas entre as funções desempenhadas pelo cargo efetivo de Assessor Jurídico, carecendo, portanto, das características de direção, chefia ou assessoramento inerentes aos cargos comissionados, em afronta ao art. 37, inciso V, da CRFB/88, e caracterizando burla ao instituto do concurso público previsto no inciso II daquele mesmo dispositivo constitucional.

Note-se que o já mencionado Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (fls. 135-147) firmado entre a Unidade Gestora e o Parquet Estadual também abordou a presente irregularidade, tendo consignado o seguinte compromisso, in verbis (fl. 143):

4. O COMPROMISSÁRIO obriga-se, a partir da presente data, a não nomear servidores para o exercício de cargos em comissão para o desempenho de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento superior (grifado originariamente).

A propósito, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal é uníssono no sentido da inconstitucionalidade da criação de cargos em comissão sem caráter de direção, chefia ou assessoramento, consoante se extrai, exemplificativamente, da decisão proferida no Agravo Regimental no RE n. 735.788, de relatoria da Ministra Rosa Weber, julgado em 12/08/2014, que foi assim ementada:

EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LEI MUNICIPAL. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. AUSÊNCIA DE CARÁTER DE ASSESSORAMENTO, CHEFIA OU DIREÇÃO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONFIANÇA ENTRE SERVIDOR NOMEADO E SUPERIOR HIERÁRQUICO. IMPOSSIBILIDADE. SERVIDOR PÚBLICO. FIXAÇÃO DO MONTANTE DA REMUNERAÇÃO. RESERVA LEGAL. PRECEDENTES. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 05.3.2012. Esta Corte entende que é inconstitucional a criação de cargos em comissão que não possuam caráter de assessoramento, chefia ou direção e que não demandem relação de confiança entre o servidor nomeado e o seu superior hierárquico. Precedentes. Na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a fixação do montante da remuneração de servidores públicos exige a adoção de lei formal e específica. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à conformidade entre o que decidido no acórdão recorrido e a jurisprudência desta Corte. Agravo regimental conhecido e não provido (grifei).

Da mesma forma, extrai-se do voto que fundamentou o recente Acórdão n. 0743/2015 dessa Corte de Contas, nos autos do processo REC n. 14/00430981, que a burla ao instituto do concurso público em face da criação de cargos em comissão sem as atribuições de direção, chefia e assessoramento constitui-se em grave infração à norma legal, implicando na imposição de multa ao responsável, a saber:

RECURSO DE REEXAME. CARGOS EM COMISSÃO. INEXISTÊNCIA DE ATRIBUIÇÕES DE DIREÇÃO, CHEFIA OU ASSESORAMENTO. BURLA AO CONCURSO PÚBLICO. GRAVE INFRAÇÃO A NORMA LEGAL. CONHECER. NÃO PROVER.

O art. 37, V, da Constituição Federal estabelece as hipóteses excepcionais dos cargos em comissão, os quais devem conter eminentemente as atribuições de direção, chefia ou assessoramento descritas no diploma legal que os criou.

Caso reste caracterizada, em razão da natureza do cargo, que as atribuições não correspondem à exceção constitucional, tratando-se de funções técnicas, burocráticas ou até mesmo operacionais, típicas de cargos de provimento efetivo, a contratação configura burla ao concurso público, demandando a aplicação de multa ao responsável, por grave infração à norma legal (grifei).

Em suas justificativas, o Presidente da Câmara de Vereadores de Balneário Camboriú alegou (fl. 93) que as atribuições dos Assessores Jurídicos comissionados se diferem daquelas exercidas pelos ocupantes de cargo homônimo, mas de provimento efetivo, pois compreendem, além da análise técnica, a análise política necessária ao assessoramento de Vereadores e Comissões.

Ainda, na manifestação apresentada às fls. 231-233, asseverou que “os cargos comissionados de Assessor Jurídico foram extintos, sendo criada a Procuradoria Geral, órgão de direção, que conta ainda com a Consultoria Jurídica de Plenário, órgão de chefia” (fl. 232).

Da análise das informações prestadas pelo responsável, percebe-se que, além de não ter sido apresentada qualquer informação apta a desconstituir a ocorrência da presente restrição por ocasião da auditoria in loco realizada por essa Corte de Contas, a alteração da nomenclatura dos cargos da Câmara Municipal de Balneário Camboriú também não sanou o problema.

Com efeito, percebe-se que embora o cargo comissionado de Assessor Jurídico tenha sido extinto, foi criado em seu lugar o cargo em comissão de Consultor Jurídico, a quem compete, por força do art. 29, § 1º, da Lei Municipal n. 3.752/14, “apoiar os trabalhos do Procurador Geral, executar as tarefas por ele delegadas e promover o assessoramento jurídico nas reuniões de Plenário e de Comissões”. Demais atribuições desse cargo, indicado como “de chefia”, constam do Anexo II da referida norma.

Ocorre que, na linha do disposto pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal às fls. 275v-276, as competências conferidas ao cargo comissionado de Consultor Jurídico em pouco divergem daquelas relacionadas ao cargo efetivo de Assessor Jurídico, não estando demonstrado, verdadeiramente, o caráter de direção, chefia ou assessoramento desse novo cargo criado pela Câmara Municipal de Balneário Camboriú. Veja-se:

No que tange à extinção dos cargos comissionados de Assessor Jurídico, analisando o conteúdo do art. 29 da Lei Municipal nº 3.752/2014, às fls. 244, se verificou a criação de um cargo comissionado de Consultor Jurídico vinculado à Consultoria Jurídica do Plenário, e no parágrafo 1º, do mesmo artigo, constam as atribuições desse Consultor Jurídico: “compete apoiar os trabalhos do Procurador Geral, executar as tarefas por ele delegadas e promover assessoramento jurídico nas reuniões do Plenário e de comissões”. À Procuradoria Geral da Câmara Municipal está vinculada hierarquicamente a Consultoria Jurídica do Plenário.

Considerando a subordinação da Consultoria Jurídica à Procuradoria Geral, bem como o fato de que as atribuições (competência) do consultor jurídico se equivalem àquelas atribuídas ao Assessor Jurídico, e que inclusive a instrução técnica já havia verificado através de uma análise criteriosa no sentido deque as funções desempenhadas pelo Assessor Jurídico comissionado estão compreendidas dentre aquela atribuídas ao Assessor Jurídico ocupante de cargo de provimento efetivo, resta comprovado que o cargo de provimento em comissão de Consultor Jurídico não possui caráter de direção, chefia ou assessoramento.

O cargo em comissão de Consultor Jurídico (art. 37, II e V, da Constituição Federal) somente poderá ser criado para chefiar a correspondente unidade da estrutura organizacional (Procuradoria, Departamento Jurídico, Assessoria Jurídica, ou denominação equivalente), visto que realiza atribuições inerentes às funções permanentes da Câmara.

Assim, na época da auditoria in loco restou comprovado a existência de servidor ocupante de cargo de provimento em comissão de Assessor Jurídico em desvirtuamento das atribuições específicas de direção, chefia ou assessoramento, em descumprimento ao art. 37, incisos II e V, da Constituição Federal.

Necessário a adoção de providências, inclusive modificação na legislação, em relação ao cargo comissionado de Consultor Jurídico, cujas atribuições legais são típicas de cargo efetivo, requerendo, por isso, que seu provimento se dê mediante prévia aprovação em concurso público.

Dessa forma, a presente restrição merece ser mantida, com a aplicação de multa ao Sr. Nilson Frederico Probst e a expedição de determinação à Câmara Municipal de Balneário Camboriú, tudo consoante o disposto na conclusão deste parecer.

3.     Ausência de atribuições de cargo de provimento efetivo e de cargos em comissão na Câmara Municipal de Balneário Camboriú

A última restrição identificada na auditoria in loco realizada na Câmara Municipal de Balneário Camboriú diz respeito à ausência de normativa que especificasse as atribuições relativas ao cargo efetivo de Auxiliar de Secretaria Permanente e os cargos comissionados de Coordenador de Administração, Coordenador da Câmara Mirim, Diretor de Finanças, Diretor de Gabinete, Diretor de Processamento de Dados e Diretor do Sistema de Qualidade.

À fl. 94, o responsável, Sr. Nilson Frederico Probst, asseverou que apenas os cargos em comissão de Coordenador da Câmara Mirim e Diretor de Processamento de Dados não possuiriam suas atribuições definidas em lei, irregularidade que estaria sendo sanada com o Projeto de Resolução n. 017/2014 daquela Câmara Municipal.

Mais adiante, na nova manifestação acostada aos autos (fls. 231-233), foi informado o advento da Lei Municipal n. 3752/14, que revogou as demais que versavam sobre o quadro de pessoal comissionado da Câmara Municipal de Balneário Camboriú e disciplinou as atribuições de todos os cargos em comissão que compõem a estrutura administrativa daquele órgão, bem como da Lei Municipal n. 3753/14, cujos arts. 7º e 8º criaram as atribuições do cargo efetivo de Auxiliar de Secretaria Permanente.

Com efeito, percebe-se que a Lei Municipal n. 3752/14 realmente disciplina as atribuições de todos os cargos comissionados que institui, e que a Lei Municipal n. 3753/14 estabeleceu as atribuições do único cargo efetivo indicado na presente restrição.

Dessa forma, sendo satisfatórias as justificativas apresentadas pelo responsável, a irregularidade em comento merece ser afastada. Cabível, no entanto, a expedição de recomendação à Unidade Gestora para que se atente à definição das atribuições de cargos efetivos e comissionados que venham a ser criados, tudo conforme o disposto na conclusão deste parecer.

4.     Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:

1. pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, dos atos descritos nos itens 4.2.1 e 4.2.2 da conclusão do relatório técnico de fls. 265-280 (itens 1 e 2 deste parecer);

2. pela APLICAÇÃO DE MULTAS ao responsável, Sr. Nilson Frederico Probst, na forma prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, em razão das irregularidades descritas nos itens 4.2.1 e 4.2.2 da conclusão do relatório técnico de fls. 265-280 (itens 1 e 2 deste parecer);

3. pelas DETERMINAÇÕES, RECOMENDAÇÕES e ALERTA indicados nos itens 4.4.1, 4.4.2, 4.5.1, 4.5.2, 4.6 e 4.7 da conclusão do relatório técnico de fls. 265-280.

Florianópolis, 13 de janeiro de 2017.

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora