Parecer nº: |
GPDRR/060/2016 |
Processo nº: |
REP
14/00336888 |
Origem: |
Ministério
Público de Santa Catarina |
Assunto: |
Pagamento de remuneração acima do
teto constitucional aos Promotores e Procuradores de Justiça |
Trata-se de
representação noticiando a ocorrência de pagamentos remuneratórios de
Promotores e Procuradores de Justiça supostamente realizados acima do teto
constitucional.
Após o exame da
documentação acostada ao feito, a diretoria elaborou o relatório técnico nº
5016/2015, mediante o qual concluiu por:
3.1 Não conhecer da Representação formulada
pelo Sr. Jailson Lima da Silva, Deputado Estadual, nos termos dos arts. 100,
101 e 102, do Regimento Interno desta Casa (Resolução n° TC-06/2001), com nova
redação dada pelo art. 5º, da Resolução n° TC- 05/2005 c/c artigos 65, § 1º e
66 da Lei Complementar n. 202/2000, visto que não foram encontrados na peça de Representação indícios de prova que
atestassem a percepção de remuneração acima do teto constitucional pelos
Promotores e Procuradores do Ministério Público de Santa Catarina no
período de setembro de 2012 a dezembro de 2013;
3.2 Dar ciência ao
Representante, ao Ministério Público de Santa Catarina - Procuradoria-Geral de
Justiça e ao Conselho Nacional do Ministério Público;
Vieram os autos ao
Ministério Público de Contas para manifestação.
Deve-se considerar
que a representação destaca eventual “burla” ao teto remuneratório
constitucional encobertada pelo sistema das chamadas “verbas indenizatórias”,
que, sob esta denominação, poderiam se tratar na verdade de pagamentos
habituais de remuneração, sem previsão legal.
A representação
contudo não imputa ilícitos claramente, limitando-se a disseminar suspeição
genérica sobre os vencimentos percebidos por membros do Ministério Público do
Estado de Santa Catarina.
Os contracheques
acostados aos autos relacionam-se aos meses de agosto de 2012 a novembro de
2013, abrangendo um período maior que 12 meses, possibilitando averiguar, com
razoável segurança, a eventual habitualidade dos pagamentos indenizatórios.
O caráter
indenizatório das verbas genericamente questionadas sob o pálio de possível
“burla” ao teto remuneratório, deve ser aferido com base mas leis e
regulamentos aplicáveis.
O representante
atentou para o caso de promotor[1]
que, de outubro de 2012 a setembro de 2013, teria recebido a título de
subsídios R$ 175.227,01 e a título de verbas indenizatórias R$ 310.800,95[2].
Em setembro de 2012,
houve pagamento de indenização de férias
no valor de R$ 21.705,86[3].
Em outubro, o
pagamento de exercício findo vale
alimentação, de R$ 29.347,02. Em novembro esta verba se repetiu, só que no
valor de R$ 29.472,41[4].
Em dezembro, além da
costumeira gratificação natalina, ocorreu novamente o pagamento de indenização de férias, no montante de R$
28.941,15 (21.705,86+7.235,29)[5].
Em fevereiro de 2013, repetiu-se o pagamento da verba, no valor de R$ 22.791,16[6].
Em março, houve o
pagamento de exercício findo auxílio
moradia, de R$ 22.285,49[7].
Em abril, novamente a
indenização de férias, no valor de R$
22.791,16[8]
e, em junho, outra parcela do exercício
findo auxílio moradia, no montante de R$ 6.257,86[9].
Em agosto, torna-se a
ver a indenização de férias, de R$
30.388,21 (22.791,16+7.597,05)[10].
A licença prêmio foi
paga como indenização em julho e setembro de 2013, cada uma no valor de R$
22.791,16[11].
Em outubro, incide
pela 4ª vez em um ano a indenização de
férias, no valor de R$ 21.651,60[12].
Em novembro, pela 5º vez, houve o pagamento desta, agora no valor de R$
21.651,60[13].
Nota-se, ainda, que
as indenizações de exercício findo auxílio
moradia (março de 2013, no valor de R$ 22.285,49, e junho de 2013, no valor
de R$ 6.257,86)[14]
ocorreram simultaneamente aos pagamentos mensais do auxílio moradia. Igualmente
deu-se com as elevadas indenizações do vale alimentação (outubro de 2012, no
montante de R$ 29.347,02, e novembro de 2012, no montante de R$ 29.472,41)[15],
que foram pagas quando mensalmente já vinham sendo, de modo a não se verificar
de plano a que meses se referiram.
Às fls. 162 a 178,
verificam-se as verbas recebidas por outro promotor[16].
A indenização de férias ocorreu no mínimo
duas vezes no ano de 2012, em setembro (R$ 21.705,86) e dezembro (R$
21.705,86+7.235,29), e no mínimo cinco vezes em 2013, em fevereiro (R$
22.791,16+7.597,00), em abril (R$ 22.791,16+7.597,05), em agosto (R$
22.791,16+7.597,05), em outubro (R$ 91.164,63) e em novembro (R$ 91.164,65),
considerando que os contracheques são de agosto de 2012 a novembro de 2013; a
verba intitulada exercício findo vale
alimentação veio em outubro (R$ 29.347,02) e em novembro de 2012 (R$
29.472,41); a denominada dif ou exercício
findo auxílio moradia veio em março de 2013 (R$ 22.285,49+3.848,57) e em
junho de 2013 (R$ 6.257,86+ 2.330,70); a licença prêmio foi paga como
indenização em julho e setembro de 2013, cada uma no valor de R$ 22.791,16.
Às fls. 4261 a 4277,
registram-se as verbas recebidas por mais um promotor[17].
A indenização de férias ocorreu no mínimo
duas vezes no ano de 2012, em setembro e dezembro (duas parcelas de R$
19.588,33+6.529,44), e no mínimo cinco vezes em 2013, em fevereiro (R$
20.567,75+6.855,92), em abril (R$ 20.567,75+6.855,92) e em agosto (R$
20.567,75+6.855,92), em outubro (R$ 82.956,59) e em novembro (R$ 82.956,59); a
verba intitulada exercício findo vale
alimentação veio em outubro (R$ 29.347,02) e em novembro de 2012 (R$
29.472,41); a denominada dif ou exercício
findo auxílio moradia veio em março de 2013 (R$ 20.111,38+3.473,11) e em
junho de 2013 (R$ 5.647,44+ 2.103,37); a licença prêmio foi paga como
indenização em julho e setembro de 2013, cada uma no valor de R$ 20.567,75.
Nota-se, nos exemplos
citados, que os promotores receberam as mesmas verbas nos mesmos períodos.
O mencionado exemplo,
contudo, desconsidera que referidos membros do MPSC estão na carreira há muitos
anos:
Matrícula |
Nome |
Cargo
Efetivo |
Lotação |
Nomeação
Portaria |
Anos de carreira |
3160793 |
Affonso
Ghizzo Neto |
Promotor
de Justiça |
Especial
- 4º Promotor de Justiça Especial da comarca da Capital - Comarca da Capital |
00067/1998 |
18 |
3051404 |
Andrey
Cunha Amorim |
Promotor
de Justiça |
37ª PJ
da Comarca da Capital - Comarca da Capital |
00091/1996 |
20 |
3210308 |
Luis
Felipe de Oliveira Czesnat |
Promotor
de Justiça |
02ª PJ
da Comarca de Balneário Piçarras - Comarca de Balneário Piçarras |
00144/2003 |
13 |
Não vislumbro,
portanto, de plano, aparente incongruência entre as verbas percebidas e o tempo
de carreira.
Sabidamente o
pagamento de tais verbas passou a ser procedido administrativamente no âmbito
de órgãos como o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o próprio Tribunal de
Contas e o Ministério Público Estadual nos últimos dez anos.
Anteriormente a
conversão em pecúnia de tais direitos acabava acontecendo apenas em sede
judicial, depois de longos e tormentosos processos em que o Estado,
invariavelmente saía condenado, depois do dispêndio de volumosos recursos,
tendo que arcar com pesadas condenações, enxertadas quase sempre com juros
moratórios reais embutidos na chamada taxa SELIC.
A discussão,
portanto, sobre a decisão administrativa de indenizar no âmbito administrativo
ou judicial é matéria que conta com histórico um pouco mais complexo do que
deixa transparecer o ilustre representante, membro do Poder Legislativo no
passado.
É verdade que
remunerações que já são muito avantajadas quando comparadas com a de muitos
outros profissionais, notadamente em um país cuja remuneração per capita[18]
nos anos suscitados pela representação girava em torno de R$ 2.000,00, ainda
mais quando majoradas com verbas indenizatórias retroativas geram comoção pela
aparência de que são indevidas, ou exageradas.
A divulgação de
informações como estas, relacionadas ao pagamento de verbas indenizatórias
relativas a diversos anos anteriores (exercício findo), não torna ilícitos
referidos pagamentos, contudo.
Com o transcurso da
carreira vão se acumulando, não raramente, períodos de férias e licenças não
gozadas, em benefício do Estado, cuja conversão em pecúnia, normalmente, deve
ocorrer de maneira parcelada, para ajustar-se ao fluxo de caixa determinado
pelo regime de “duodécimos” orçamentários.
A celeuma de longa
data sobre as verbas conhecidas como “auxílio moradia” pendem de posicionamento
final da Suprema Corte, o que, espera-se, deva ocorrer em breve. Ficará, por
certo, a lição para as administrações da Justiça e do Ministério Público
nacionais de que o tentador aceno do Poder Legislativo não deve ser bem
recebido, nem mesmo quando este esteja travestido de “única solução”, no
costumeiro cenário de negociações pouco republicanas, que adentrem, por birra
ou mal disfarçada represália, no direito a uma remuneração digna por quaisquer
agentes públicos, notadamente aqueles investidos nas chamadas carreiras de
estado.
Sobre as rubricas
suscitadas nos pagamentos demonstrados pelo representante tem-se que a
Resolução nº 9/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, define o que
se encontra sujeito ao teto remuneratório constitucional:
Art. 6º Estão sujeitas ao teto constitucional todas
as parcelas remuneratórias, inclusive as vantagens pessoais, exceto as seguintes verbas:
I – de caráter indenizatório:
a) ajuda de custo
para mudança e transporte;
b)
auxílio-alimentação;
c) auxílio-moradia;
d) diárias;
e) auxílio-funeral;
f) indenização de
férias não gozadas;
g) indenização de
transporte;
h) licença-prêmio
convertida em pecúnia;
i) outras parcelas
indenizatórias previstas em lei.
II – de caráter permanente:
a)benefícios
percebidos de planos de previdência instituídos por entidades fechadas, ainda
que extintas;
b) benefícios
percebidos do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS em decorrência de
recolhimento de contribuição previdenciária oriunda de rendimentos de atividade
exclusivamente privada.
III – de caráter eventual ou temporário:
a) auxílio
pré-escolar;
b) benefícios de
plano de assistência médico-social;
c) bolsa de estudo
que tenha caráter remuneratório;
d) devolução de
valores tributários e/ou contribuições previdenciárias indevidamente
recolhidas.
Parágrafo único. É
vedada, no cotejo com o teto remuneratório, a exclusão de parcelas que não
estejam arroladas nos incisos e alíneas deste artigo.
Art. 7º. Não podem
exceder o valor do teto remuneratório, embora não sejam somados entre si, nem
com a remuneração do mês em que se der o pagamento:
I – adiantamento de
férias;
II – gratificação
natalina;
III – adicional
constitucional de férias;
IV - remuneração ou
provento decorrente do magistério, nos termos do art. 128, inciso II, alínea d,
da Constituição Federal;
V - gratificação pela
prestação de serviço à Justiça Eleitoral de que trata o art. 50, VI, da Lei nº
8.625/93 e a Lei nº 8.350/91;
VI - gratificação
pela participação, como membro, em sessão do Conselho Nacional do Ministério
Público ou do Conselho Nacional de Justiça;
VII - gratificação de
magistério por hora-aula proferida no âmbito do Poder Público;
VIII- abono de
permanência em serviço, no mesmo valor da contribuição previdenciária, conforme
previsto no art. 40, § 19, da Constituição Federal, incluído pela Emenda
Constitucional nº 41, de 31 de dezembro de 2003.
IX – pensão por
morte;
Parágrafo único. O
adiantamento de férias previsto no inciso I fica sujeito ao cotejo com o teto
do mês de competência da remuneração antecipada.
Como se vê, as verbas
de natureza indenizatória devem se referir a reembolsos/ressarcimentos
retroativos ou ulteriores, destinados a cobrir despesas que o servidor público
teve ou terá, com base no que dispõe a legislação pertinente.
Nos casos citados,
verificados com mais atenção, constatou-se o pagamento de verbas tidas como
indenizatórias que incidiram na remuneração de agentes cujo tempo de carreira
poderia justificar tais pagamentos parcelados inúmeras vezes, ainda que no
mesmo ano.
O âmbito de definição
do cronograma de enfrentamento desses passivos potenciais, representados pelo
acúmulo de verbas indenizatórias, pertence tão somente ao administrador público
e ao legislador que, oportunamente, pode e deve, imiscuir-se em tais decisões
na chamada peça orçamentária.
Ante
o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida
pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se:
1)
pelo acompanhamento do posicionamento técnico vertido
ao Relatório 5.016/2015;
2)
pelo arquivamento do feito.
Florianópolis,
02
de março de 2017.
Diogo
Roberto Ringenberg
[1] Sr. Andrey Cunha Amorim.
[2] Fls. 25-42.
[3]
Fl. 26.
[4]
Fl. 27.
[5]
Fl. 29.
[6]
Fl. 32.
[7]
Fl. 33.
[8] Fl. 34.
[9] Fl. 36.
[10] Fl. 37.
[11] Respectivamente às fls. 37 e 39.
[12] Fl. 40.
[13] Fl. 41.
[14] Respectivamente às fls. 33 e 36.
[15] Fls. 27-28.
[16] Sr. Affonso Ghizzo Neto.
[17] Sr. Luis Felipe de Oliveira Czesnat.
[18] Cf. IBGE, PNAD_retrospectiva_2012_2016_Brasil:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pnad_continua_mensal/default_retrospectiva.shtm
Opção: Retrospectiva 2012- 2016 Brasil (arquivo em formato XLS)