PARECER nº: |
MPTC/45741/2016 |
PROCESSO
nº: |
PCR 12/00200176 |
ORIGEM : |
Secretaria de Estado do Desenvolvimento
Regional – Grande Florianópolis |
INTERESSADO: |
Valter José Gallina e outros |
ASSUNTO : |
Prestação de Contas de Recursos Antecipados
referentes ao empenho nº 2182, de 20-6-2008, no valor de R$ 150.000,00
repassados ao Centro de Tradições Gaúchas Sela de Prata. |
1 – RELATÓRIO
Trata-se de prestação de contas
de recursos repassados pelo Fundo Estadual de Incentivo ao Turismo –
FUNTURISMO, no montante de R$ 150.000,00,[1] ao
Centro de Tradições Gaúchas Sela de Prata,
para realização do projeto “12ª BIGFEST/2008 – Festa de Aniversário de
Emancipação Administrativo-Política do Município de Biguaçu”.
A Secretaria de Estado de
Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis considerou regular com
ressalvas as contas prestadas.[2]
Posteriormente, os autos foram
remetidos ao Tribunal de Contas, em virtude de solicitação da Diretoria de
Controle da Administração Estadual.[3]
Auditores da DCE realizaram, preliminarmente,
diligências dirigidas à entidade beneficiada e à Secretaria de Finanças de
Tijucas.
Em resposta, o Sr. Paulo Augusto
Müller, atual presidente do CTG Sela de
Prata, encaminhou os documentos de fls. 152/163.
Ato contínuo, auditores do
Tribunal detectaram indícios de irregularidades para as quais há previsão legal
de imputação de débito e/ou aplicação de multas, pelo que sugeriram a citação
dos responsáveis.[4]
As citações foram realizadas,[5]
com alegações de defesa apresentadas como segue: - Sr. Sérgio Serafim da Silva
Mafra, presidente do CTG Sela de Prata,
à época (fls. 198/252); - Sr. Paulo Augusto Müller, atual presidente do CTG Sela de Prata (fls. 258/263); - Sr.
Valter José Gallina, ex-secretário de desenvolvimento regional da Grande
Florianópolis (fls. 267/284.
Após, auditores da DCE sugeriram
decisão de irregularidade das contas, com imputação de débito e aplicação de
multas aos responsáveis, além de impedimento para recebimento de novos
recursos.[6]
Por fim, vieram-me os autos.
2 –
MÉRITO
2.1 -
IRREGULARIDADES DE RESPONSABILIDADE DO SR. VALTER JOSÉ GALLINA – EX-SECRETÁRIO
DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL
2.1.1 –
Repasse de recursos para projeto da Prefeitura de Biguaçu
Auditores do Tribunal apontaram a
aprovação de projeto e repasse de recursos públicos à entidade privada sem fins
lucrativos, visando à consecução de projeto cuja organização e execução era de
responsabilidade do Município de Biguaçu.
Em suas alegações, o gestor
público sustentou que a participação do CTG
Sela de Prata se limitou a realização de shows artísticos e musicais,
mediante contratação de artistas e/ou conjuntos musicais, palco, cobertura,
equipamento de sonorização, barracas, divulgação e mídia (fls. 272/274).
O Sr. Sérgio Serafim da Silva
Mafra, então presidente da entidade proponente, aduziu ter ficado responsável
pela realização de todos os eventos, inclusive a preparação da estrutura do
local da festa (fls. 193/194).
Conforme ressai dos autos, a
Secretaria de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis aprovou e repassou
recursos públicos ao CTG Sela de Prata,
no montante de R$ 150.000,00, para realização de projeto cujo plano de trabalho
previa como objeto a realização de festa popular de aniversário do Município,
denominada BIGFEST (fl. 11).
Após a aprovação do projeto, foi
firmado contrato de apoio financeiro, cujo objeto consistiu no “repasse de
recursos para execução do Projeto denominado 12ª BIGFEST/2008 – FESTA DE
ANIVERSÁRIO DE EMANCIPAÇÃO ADMINISTRATIVA – POLÍTICA DO MUNICÍPIO DE BIGUAÇU”
(fl. 68).
Dos cartazes de divulgação do
evento anexados à prestação de contas é possível extrair que a idealização,
organização e execução do projeto pertencia a municipalidade de Biguaçu (fl.
80-v).
Some-se a isso que, à época, o
Município editou o Decreto Municipal nº 32, de 7 de abril de 2008,[7]
por meio do qual foi nomeada comissão encarregada de acompanhar a elaboração da
programação, a organização e o desenvolvimento das festividades da 12ª BIGFEST.
Desses fatos
pode-se concluir que a verdadeira responsável pela execução do projeto era a
Prefeitura de Biguaçu.
Não obstante
isso, ainda que a aprovação do projeto tenha sido de responsabilidade da
Secretaria Regional, não vejo como sancionar o seu gestor pela ausência de
processo licitatório no âmbito da Prefeitura de Biguaçu.
Neste passo,
tenho que a fundamentação da irregularidade deve se dar com base no descompasso
com os termos da Lei Estadual nº 13.336/2005, tendo em vista o repasse de
recursos a entidade privada cujas finalidades estatutárias não dizem respeito
ao objeto pactuado, qual seja, realização de festa alusiva ao aniversário de
pessoa jurídica de direito público, o Município de Biguaçu.
Saliento que
a alteração na capitulação legal da infração não significa inovação processual,
na medida em que os responsáveis se defenderam dos fatos que lhe foram
imputados.
2.1.2
– Ausência de parecer técnico e orçamentário emitido pela SEITEC
Auditores da
DCE identificaram a ausência de apreciação dos aspectos formais e orçamentários
previstos na legislação.
Sobre o
assunto, dispõe o art. 36, § 3°, do Decreto Estadual n° 1.291/2008:
Art. 36. Os projetos de cunho cultural, turístico e esportivo, de
âmbito estadual ou regional, deverão obrigatoriamente ser apresentados nas
Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional do domicílio do proponente,
juntamente com a documentação necessária, e submetidos à apreciação do Conselho
de Desenvolvimento Regional.
[...]
§ 3° - Todo projeto proposto deverá ser instruído jurídica e
administrativamente pelas Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional e
pela Diretoria do SEITEC, no caso dos projetos prioritários e especiais,
devendo ser solicitados todos os pareceres jurídicos, técnicos e orçamentários
que se fizerem necessários para instruir o julgamento dos Conselhos e Comitês
Gestores.
Da leitura
dos autos, não se vislumbra a análise técnica da SEITEC quantos aos aspectos
legais e orçamentários do projeto apresentado, havendo apenas singelo parecer
exarado pela Gerente de Políticas de Turismo da SEITEC (fl. 35).
Portanto, a restrição está
caracterizada, merecendo sanção o responsável.
2.1.3 –
Liberação de recursos após a realização do evento
De acordo com art. 43, VI, do
Decreto nº 1.291/2008, é vedada, sob pena de nulidade, a inclusão de cláusulas
contratuais que prevejam ou permitam a realização de despesas em data anterior
ou posterior a sua vigência.
No caso em tela, o projeto foi
realizado nos dias 2 a 4 e 9 a 18-5-2008 (fls. 80 e 82-v), ao passo que a
transferência do recurso ao proponente se deu apenas em 20-6-2008, mediante NE
nº 2182 (fl. 117).
Ou seja, o repasse se deu cerca
de três meses após a concretização do projeto.
Em situação análoga, o Tribunal
Pleno decidiu pela aplicação de multa ao gestor público:[8]
ACORDAM
os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos
arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar (estadual) n.
202/2000, em:
6.2.1.
De Responsabilidade do Sr. Gilmar Knaesel - ordenador primário quando da
transferência:
6.2.1.1. Aprovação do projeto e concessão de
recursos públicos sem a observância dos preceitos legais, que constituiu causa
necessária sem a qual não haveria o dano posterior (itens II.2.6 e II.3 do
Relatório do Relator);
6.3.1.2.
R$ 1.000,00 (mil reais), em virtude da ausência do Contrato/Termo de Apoio
Financeiro na prestação de contas, em desacordo com o disposto no art. 16, §3º,
do Decreto (estadual) n. 3.115/2005, vigente à época dos fatos (item 2.6.1.4 do
Relatório DCE);
6.3.1.3.
R$ 1.000,00 (mil reais), devido ao repasse do recurso fora do prazo
regulamentar e após a concretização do projeto, com grave infração à norma
regulamentar, prevista no art. 21, §5º, Decreto (estadual) n. 3.115/2005, com
as alterações promovidas pelo Decreto (estadual) n. 3.665/2005, vigente à
época, c/c o art. 9º, V, do Decreto (estadual) n. 307/2003 (item 2.6.1.6 do
Relatório DCE); (Grifo meu)
Desta feita, a restrição está
configurada, devendo o responsável ser sancionado a respeito.
2.2 –
IRREGULARIDADE DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA ENTIDADE PROPONENTE, DO SR.
SÉRGIO SERAFIM DA SILVA MAFRA E DO SR. VALTER JOSÉ GALLINA
2.2.1 – Ausência
de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos
Auditores da DCE apontaram a
ausência de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos, uma
vez que a documentação apresentada, além de se encontrar incompleta, apresenta
diversas irregularidades (fl. 298).
De fato, os documentos constantes
às fls. 101/144, 152/163, 193/252 e 258/263, não permitem que se conclua terem os
recursos sido aplicados na realização do projeto proposto, conforme detalhado
nos itens que seguem.
2.2.2 –
Indevida comprovação das despesas com publicidade e simulação de emissão de
cheque nominal ao credor
Auditores da DCE apontaram a
ausência de documentos necessários à comprovação de despesas com publicidade,
no montante de R$ 18.437,50.
Eis o que dispõe o art. 70, IX e
XI, do Decreto nº 1.291/2008:
Art. 70. As prestações de
contas de recursos antecipados, compostas de forma individualizada de acordo
com a finalidade da despesa e no valor da parcela, conterão os seguintes
documentos, no que couber, conforme o objeto do instrumento legal:
IX - comprovação material da realização adequada do projeto, por
meio de contrato de prestação de serviço, folder, cartaz do evento, exemplar de
publicação impressa, CD, DVD, fotografia de eventos e restaurações, entre
outros;
XI - documentos comprobatórios das despesas realizadas, tais como
notas fiscais, recibos, folhas de pagamento, relatórios de resumo de viagem,
ordens de tráfego, bilhetes de passagem, cartão de embarque, guias de
recolhimento de encargos sociais e de tributos, Certificado de Registro e
Licenciamento de Veículo – RENAVAN, entre outros;
Para comprovar as
despesas, o responsável anexou as notas fiscais de fls. 104/107, todas emitidas
pela RBS – TV de Florianópolis S/A.
Contudo, como
observado por auditores da DCE, nos referidos documentos fiscais há menção a que
se referem a despesas com publicidades veiculadas em agosto de 2008, após a
pretensa realização do evento.
Assim, tais
documentos não se prestam a comprovar despesas com publicidade supostamente
realizadas no projeto, eis que a 12ª BIGFEST ocorreu entre os dias 2 a 18-5-2008.
Além disso, auditores do Tribunal
detectaram que o cheque nº 00004, supostamente emitido à RBS – TV de Florianópolis, para pagamento de despesas com
publicidade (fl. 108), em verdade, foi dirigido ao Sr. Ademir S. Tesser,
conforme demonstra o microfilme de fl. 159.
Desse modo, tendo em vista o dano
ao erário, a devolução do valor é medida que se impõe.
Além disso, o caso demanda
comunicação ao Ministério Público Estadual, ante a existência de indícios de
crime.
2.2.3 –
Ausência de contrato de exclusividade artística das bandas musicais “Inimigos
da HP” e “Engenheiros do Havaí”
Neste ponto, o responsável asseverou
o seguinte (fl. 195):
Segue anexo
o contrato firmado entre a empresa Fábrica de Show, Projetos Culturais e
Produções Ltda., sediada a Rua Coronel Isidoro, 220, Centro, Tijucas, SC e a
empresa Banana’s Promoções e Eventos, contratada do CTG Sela de Prata para
organização, promoção e realização da 12a BIGFEST/2008. A empresa
Banana’s Promoções e Eventos, intermediou a vinda das Bandas Inimigos da HP e
Engenheiros do Hawaii, infelizmente, não temos a cópia do contrato da Banda
Inimigos da HP, não conseguimos com a empresa Fábrica de Show, Projetos
Culturais e Produções Ltda., ela nos falou que arquiva documentos por até 05
anos.
Devido a
esse fato, entramos em contato com a Produtora que agencia vários artistas,
entre eles, a Banda Inimigos da HP, solicitando um orçamento para termos
parâmetro no valor pago em 2008 e no preço de mercado (hoje).
Em 2008 ano
do evento foi pago o valor de R$ 55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais), nota
fiscal 00358 (pág. 111 do relatório) onde, a banda estava no auge de carreira,
como pode ser visto no orçamento apresentado, o valor cobrado hoje para o show
é de R$ 48.000,00 + despesas extras, o que ultrapassaria o valor pago pelo CTG
Sela de Prata.
No mais, é
notória a confirmação e apresentação das Bandas como pode ser comprovado pelos
documentos apresentados e se desejar visualizado, acessando os seguintes
endereços: http://www.mp3tunes.tk/download?v=wfmqw-IHEEI
e http://www.youtube.com/watch?=jk7eM4y-fOo.
(Grifo do original)
Auditores da DCE consideraram
mantida a restrição, salientando o seguinte (fl. 301):
Por
conseguinte, este Corpo Técnico entende não constar dos autos o “Contrato de
Exclusividade Artística” da empresa Fábrica de Shows Projetos Culturais e
Produções Ltda – ME (Zoom Music Hall) e as bandas musicais “Inimigos da HP” e “Engenheiros
do Havaí”, haja vista que a contratação direta é para o artista; no caso do
empresário sua intermediação é aceita desde que comprovado se tratar de
empresário exclusivo do artista contratado e que a despesa efetuada com os
recursos públicos repassados se restrinja ao seu cachê.
Da leitura dos autos, verifica-se
que, de fato, o responsável não logrou êxito em comprovar que a credora Fábrica de Shows, Projetos e Produções Ltda
é detentora da exclusividade artística das bandas musicais em comento.
Ao contrário, junto às alegações,
anexou contrato firmado com uma empresa (Banana’s
Promoções e Eventos Ltda – ME), para a contratação da banda “Engenheiros do
Havaí” (fls. 176/176-v).
As notas fiscais de fls. 110 e
111 dão conta do pagamento de R$ 100.000,00 à empresa Fábrica de Show, Projetos Culturais e Produções Ltda – ME,
supostamente relacionado aos shows das bandas Inimigos da HP e Engenheiros
do Havaí.
No caso, não ficou demonstrado o
pagamento às bandas.
Assim, está caracterizada a
irregularidade para a qual há previsão legal de imputação de débito aos
responsáveis.
2.2.4 –
Falta de demonstração de todas as receitas obtidas com patrocinadores, vendas
de ingressos, vendas em stands, bem
como demonstração de que todas receitas foram utilizadas para realização do
projeto proposto
A restrição decorre da ausência de
demonstração de todas as receitas auferidas nos eventos, e do destino dado a
tais recursos, em ofensa ao disposto no art. 44, I, do Decreto Estadual nº
1.291/2008.[9]
Em sua defesa, o responsável
apresentou as seguintes alegações (fls. 195/196):
As
receitas com a venda dos ingressos e vendas de stands foram utilizadas para
fazer frente às despesas com a promoção da BIGFEST, inclusive com a contratação
de artistas, conjuntos musicais, shows, etc., em consonância ao Art. 5º da Lei
no 2.550, de 27 de dezembro de 2007, que prevê:
Art.
5º - As receitas com a venda dos ingressos, apoios, patrocínios, doações e
outras, e comercialização dos espaços internos da sede campestre e do imóvel
supracitado pertencerão ao CTG Sela de Prata, para fazer frente às despesas com
a promoção da BIGFEST, inclusive com a contratação de artistas, conjuntos
musicais, shows, etc...
Para
a realização da 12ª BIGFEST foram montadas 02 (duas) estruturas, uma grande
estrutura no parque CTG Sela de Prata e outra de estrutura média nas
proximidades da Praça Nereu Ramos.
Ao
todo foram 13 (treze) dias de festas, dias 02, 03, 04 e 09 a 18 de maio de
2008, com inúmeras apresentações, como pode ser comprovada na programação em
anexo, shows nacionais e locais, rodeio crioulo, exposições, concursos, show
pirotécnico, bailes, parques de diversões.
Sendo
03 (três) dias de Gincana Social e Cultural da 12ª BIGFEST, nas proximidades da
Praça Nereu Ramos, sem cobrança de ingresso, conforme Lei nº 2.550, de 27 de
dezembro de 2007, no seu artigo 3º § 2º, 3º, 4º e 5º, transcrito abaixo:
ART.
3º - Fica o CTG Sela de Prata autorizado a cobrar ingresso das pessoas para
adentrarem no local do evento realizado em sua sede, no valor de R$ 5,00 (cinco
reais), nos dias 11/05, 15/05, 17/05 a partir das 18:00 horas e 18/05, e
também:
(...)
§
2º - Nos dias 02, 03 e 04 de maio, nas proximidades da Praça Nereu Ramos, será
realizada a Gincana Social e Cultural da 12a BIGFEST, não sendo cobrado
ingresso, com entrada franca.
§
3º No dia 17/05 o ingresso corresponderá a 1 Kg (um quilo) de alimento não
perecível, até as 18:00 horas.
§
4º As pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, terão entrada
franca.
§
5º As crianças até 10 anos, quando acompanhadas de seus pais ou responsáveis,
ficarão isentas do pagamento do ingresso.
Diante
do exposto, o Município já havia definido a quem deveria pertencer as receitas
com a venda dos ingressos e vendas de stands, revertendo para o projeto
incentivado, ou seja, para a realização da 12ª BIGFEST, art. 5º Lei Municipal nº
2.550, de 27 de dezembro de 2007, observado o Artigo 3º § 1, 2, 3, 4, 5 e 6 da
mesma lei municipal, transcritos acima, haja vista, que o valor repassado tanto
do Município quanto do Estado, não seriam suficientes para um evento de tamanha
proporção e investimento. Documentos fls. 08 a 10.
Restou demonstrado ter havido
cobrança de ingressos para o evento, sendo o valor de R$ 10,00 para ingressos antecipados,
e R$ 15,00 para os adquiridos no dia do evento (fls. 216/234).
Ademais, o evento contou com
diversos patrocinadores, conforme se infere do cartaz de divulgação contido às
fls. 80/83.
Afora isso, restou demonstrado
que o CTG Sela de Prata contou com o
patrocínio oficial da Prefeitura de Biguaçu, que efetuou repasse no montante de
R$ 140.000,00 para realização do evento (fl. 167).
Ainda assim, em nenhum momento os
recursos arrecadados foram incluídos na prestação de contas, em clara ofensa ao
art. 70, XIII, do Decreto Estadual nº 1.291/2008, que assim dispõe:
Art. 70. As
prestações de contas de recursos antecipados, compostas de forma
individualizada de acordo com a finalidade da despesa e no valor da parcela,
conterão os seguintes documentos, no que couber, conforme o objeto do
instrumento legal:
[...]
XIII - demonstração de todas as despesas e receitas envolvidas, no
caso de evento aberto ao público, inclusive aquelas auferidas por meio de
outros patrocínios e bilheteria, as quais deverão ser integralmente aplicadas
no objeto do contrato, não podendo gerar lucro ao contratado;
O responsável não trouxe
documentos que comprovem que os recursos foram revertidos em favor do projeto,
tal como determina o art. 44. I, do mesmo diploma normativo.
Os fatos narrados colocam em
xeque a lisura na aplicação dos recursos públicos recebidos.
A ausência de demonstrativo das
receitas auferidas e de sua destinação acarreta a impossibilidade de se aferir
a real necessidade de a entidade receber recurso público estadual para promoção
do projeto.
Desta feita, o caso é para
decisão de irregularidade das contas, com imputação de débito aos responsáveis.
2.3 –
CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO GESTOR PÚBLICO
A possibilidade de
responsabilização solidária dos gestores máximos dos órgãos repassadores de
verbas públicas vem sendo discutida com frequência pelo Tribunal, dando
oportunidade ao amadurecimento da jurisprudência sobre o assunto.
Em relação a existência de falhas
de ordem formal durante a aprovação de projetos, a Corte de Contas vem se
posicionando pela ausência de responsabilidade solidária do gestor, quando não
haja outras irregularidades que, aliadas às falhas formais detectadas, revelem
ação negligente e temerária do secretário na liberação dos recursos
(TCE-11/00344060 e TCE-12/00111661).
Todavia, a depender da gravidade
das irregularidades no processamento dos pedidos de repasse, o Tribunal já
decidiu pela responsabilização solidária (TCE-11/00340316).
Ilustrativo, no ponto, voto
proferido pelo Conselheiro Substituto Cleber Muniz Gavi, chancelado pelo
Egrégio Tribunal Pleno por meio da Decisão nº 112/2015:[10]
Há,
de fato, circunstâncias nas quais este relator, considerando estas mesmas
restrições, propõe a responsabilização pelo dano. Mas trata-se de casos em
que, aliados a restrições de ordem formal durante a aprovação do projeto, se
aglutinam outros dados, revelando que a ação negligente ou imprudente do gestor
levou a liberação de recursos em condições nas quais já se poderia antever os
riscos decorrentes da ausência de cautela na concessão do benefício [alto
valor do repasse, parecer contrário do PDIL ou qualquer outro órgão responsável
pela análise dos projetos, reiteração de repasses para a mesma entidade em
semelhantes condições, não regularidade na prestação de contas anterior,
generalidade do projeto apresentado e aprovado, ausência de especificação de
despesas no projeto apresentado e aprovado, etc [...]. (Grifo meu)
No caso sob análise, além de
irregularidades formais na tramitação do repasse, vislumbra-se a existência de
conduta particularmente temerária do gestor na liberação dos recursos,
porquanto o repasse se deu após a realização do projeto, sem que tivessem sido
adotadas providências prévias à transferência dos recursos com vistas a
confirmar a efetiva execução do evento nos moldes propostos.
Em função disso, a atuação do
gestor levou à liberação de recursos em condições nas quais já se poderia
antever os riscos decorrente da ausência de cautela, justificando a
responsabilização solidária.
Sobre o ponto, colaciono o
seguinte excerto do voto proferido pelo Conselheiro Substituto Cleber Muniz
Gavi, no julgamento do processo nº TCE-11/00340316:[11]
A propósito da temerária atuação do ex-gestor da SOL, também se
assoma o fato de que, tendo sido o repasse posterior ao evento supostamente
incentivado, dever-se-ia ao menos aferir se existiam despesas idôneas e suficientemente
comprovadas para fazer frente ao montante de recursos públicos que seriam
repassados.
Desta forma, diante da
existência destas circunstâncias fáticas, subsistem fundamentos para
responsabilização solidária do Sr. Gilmar Knaesel pelo débito apurado.
Portanto, opino pela condenação
solidária do gestor pelo dano havido ao erário.
2.4 –
IRREGULARIDADE DE RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL DO SR. SÉRGIO ERAFIM DA SILVA
MAFRA
2.4.1 –
Movimentação incorreta da conta bancária
Auditores do Tribunal apontaram que
os cheques utilizados não foram cruzados, em desacordo com a regra do art. 58 do
Decreto Estadual nº 1.291/2008.[12]
O responsável alegou que, embora
a conta bancária tenha sido movimentada incorretamente, não houve má gerência
dos recursos e nem prejuízo ao erário (fl. 197).
O Egrégio Tribunal Pleno já decidiu
pela aplicação de multa em casos tais, senão vejamos:[13]
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do
Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões
apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e
1° da Lei Complementar n. 202/2000, em: [...]
6.2. Aplicar ao Sr. EDSON ROBERTO BÚRIGO –
anteriormente qualificado, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo
de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial
Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao
Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o
encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts.
43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000: [...]
6.2.2.11. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em
face da não utilização de cheques cruzados para pagamento das despesas,
contrariando o inciso § 2º do art. 58 do Decreto (estadual) n. 1.291/2008
(item 2.2.2.11 do Relatório DCE); [...] (Grifo meu)
Desta forma, cabível aplicação de
sanção pecuniária ao responsável.
2.4.2 –
Realização de despesas sem a comprovação de 3 orçamentos ou justificativas da
escolha
Apontou-se a realização de
despesas, no montante de R$ 31.562,50, sem a realização prévia de três orçamentos
justificando o preço da contratação, em desacordo com a norma do art. 48, I, do
Decreto Estadual nº 1.291/2008.[14]
O responsável juntou cópia dos
orçamentos realizados junto às empresas LGP
Produções Artísticas Ltda (fl. 246), Claudinho
Planet Music Ltda - ME (fl. 247) e Fabrica
do Show (fl. 248).
Diante disso, a restrição merece
ser afastada.
2.4.3 –
Ausência de comprovação da contrapartida social
O responsável aduziu o seguinte
(fl. 198):
A
contrapartida social prevista nos arts. 52 e 53 do Decreto nº 1.291/08, se deu
em observância ao artigo 3º Lei nº 2.550, de 27 de dezembro de 2007:
1. Entrada franca,
sem cobrança de ingresso no dia 02, 03 e 04 de maio, quando foi realizada a
Gincana Social e Cultural da 12a BIGFEST;
2. Distribuição de
todos os alimentos não perecíveis arrecadados no dia 17/05, quando o ingresso
era 1K de alimento, doados a entidades assistenciais do município;
3. Entrada franca
para todos os dias do evento, para pessoas com idade igual ou superior a 60
(sessenta) anos;
4. Crianças até 10
anos, quando acompanhadas de seus pais ou responsáveis, ficarão isentas do
pagamento do ingresso, todos os dias do evento;
5. E por último,
preço acessível do ingresso, para que toda a população e visitantes pudessem se
divertir nos 18 dias de festas em comemoração aos 175 anos do Município de
Biguaçu.
Diante
do exposto, informo que todas as informações prestadas são verdadeiras e os
documentos anexos são reprodução fiel dos originais. Coloco-me à disposição
para outros esclarecimentos, que Vossa Excelência entender necessários.
Na Cláusula Quarta do Contrato de
Apoio Financeiro restou acordado o seguinte (fl. 69):
CLÁUSULA QUARTA – DA CONTRAPARTIDA
I
– Para efeito de contrapartida, o proponente assumirá a responsabilidade de
arrecadar alimentos, atividades para grupos da 3ª idade, gincana social,
apresentação de show para entretenimento da população local, termos do artigo
52 e ss. do Decreto nº 1.291, de 18 de abril de 2008. (Negrito do original)
O responsável não juntou qualquer
documento capaz de comprovar a realização da contrapartida social.
O Egrégio Tribunal Pleno já
decidiu pela aplicação de multa em situação análoga:[15]
ACORDAM
os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos
arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
[...]
6.2.
Aplicar aos Responsáveis a seguir identificados, com fundamento no art. 69 da
Lei Complementar (estadual) n. 202/00 c/c o art. 108, parágrafo único, do
Regimento Interno deste Tribunal, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhes o
prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário
Oficial Eletrônico desta Corte de Contas - DOTC-e, para comprovarem perante
este Tribunal o recolhimento das multas cominadas ao Tesouro do Estado, ou
interporem recurso na forma da lei, sem o que, fica desde logo autorizado o
encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto os arts.
43, II, e 71, da citada Lei Complementar:
6.2.1.
ao Sr. HEINE WITHOEFT - Presidente do Instituto Jaraguá do Sul de Turismo e
Eventos à época, CPF n. 309.000.699-53, as seguintes multas:
[...]
6.2.1.3.
R$ 1.136,52 (mil cento e trinta e seis reais e cinquenta e dois centavos), em
face da ausência de comprovação da aplicação da contrapartida constante no
projeto aprovado pelo órgão concedente, contrariando o art. 21 do Decreto
(estadual) n. 3.115/2005 (vigente à época). (Grifei)
Dessarte, caracterizada a
irregularidade, opino pela aplicação de multa ao responsável.
4 –
CONCLUSÃO
Ante o exposto, o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, com amparo na
competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar n° 202/2000,
manifesta-se pela adoção das seguintes providências:
4.1 – DECISÃO de IRREGULARIDADE das CONTAS,
com imputação de débito, nos termos do art. 18, III, c, da Lei Complementar Estadual n° 202/2000.
4.2 – CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA dos responsáveis, CTG Sela de Prata, Sr. Sérgio Serafim da
Silva Mafra, ex-presidente da entidade, e Sr. Valter José Gallina, ex-secretário
de desenvolvimento regional da Grande Florianópolis, no pagamento da quantia de
R$ 150.000,00, em face da não comprovação da boa e regular aplicação dos
recursos públicos repassados.
4.3 – APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Sérgio
Serafim da Silva Mafra, ex-presidente da entidade, e ao Sr. Valter José
Gallina, ex-secretário de desenvolvimento regional da Grande Florianópolis, nos
termos do art. 68 da Lei Complementar nº 202/2000, em virtude da irregularidade
descrita no item anterior.
4.4 - APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Valter José
Gallina, ex-secretário de desenvolvimento regional da Grande Florianópolis, nos
termos do art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000, em virtude das
seguintes irregularidades:
4.4.1 – Aprovação de projeto e liberação de
recursos para entidade privada sem fins lucrativos para realização de projeto
cuja organização pertencia a ente público, em descompasso com os termos da Lei
Estadual nº 13.336/2005;
4.4.2 – Aprovação de projeto e repasse de
recursos públicos mesmo ausente o parecer técnico e orçamentário emitido pelo
SEITEC, em desacordo com o disposto no art. 36, § 2º, do Decreto Estadual nº
1.291/2008;
4.4.3 – Liberação de recursos públicos após a
realização do evento, contrariando o disposto no art. 43, VI, do Decreto
Estadual nº 1.291/2008.
4.5 – APLICAÇÃO de MULTA ao Sr. Sérgio
Serafim da Silva Mafra, nos termos do art. 70, II, da Lei Complementar Estadual
nº 202/2000, em virtude das seguintes irregularidades:
4.5.1 – Ausência de apresentação de três orçamentos
e declaração de exclusividade para contratação de bandas, em contrariedade ao disposto
no art. 48, I e II, e art. 70, IX e XXI, do Decreto Estadual nº 1.291/2008;
4.5.2 – Incorreta movimentação da conta
bancária, em desacordo com a norma do art. 58, § 2º, do Decreto Estadual nº
1.291/2008;
4.5.3 – Ausência de comprovação da
contrapartida social, contrariado o disposto nos arts. 25, II, 52 e 53 do
Decreto Estadual nº 1.291/2008, além de Cláusula Quarta do Contrato nº
9070/2008.
4.6 - DECLARAÇÃO
de IMPEDIMENTO de percepção de novos recursos do Erário, pelo CTG Sela de Prata e pelo Sr. Sérgio
Serafim da Silva Mafra, durante o prazo de 3 anos, contados da data do trânsito
em julgado da decisão condenatória irrecorrível proferida pelo TCE/SC, nos termos do art. 16 da Lei nº 16.292/2013 c/c art. 61 do
Decreto nº 1.309/2012.
4.7 – COMUNICAÇÃO ao MINISTÉRIO
PÚBLICO ESTADUAL acerca dos fatos tratados no item 2.2.2 deste parecer,
ante a existência de indícios de crime, uma vez que se detectou que o cheque nº
00004, supostamente emitido à RBS – TV de
Florianópolis, para pagamento de despesas com publicidade (fl. 108), em
verdade, foi dirigido ao Sr. Ademir S. Tesser, conforme demonstra o microfilme
de fl. 159.
Florianópolis, 6 de
julho de 2017.
Aderson Flores
Procurador
[1] Nota de empenho nº 2182 (fl. 117).
[2] Fl. 144.
[3] Fls. 3/4.
[4] Fls. 169/182-v.
[5] Fls. 184/186 e 191/192.
[6] Fls. 287/310-v.
[7] Art. 1º - Fica nomeada a Comissão de que
trata o artigo 7º da Lei nº 2.550/07, integrada por 4 (quatro) servidores, que
ficará encarregada de acompanhar a elaboração da programação, a organização e o
desenvolvimento das festividades em seu dia a dia, com poderes para apresentar
sugestões e fazer alterações, além de resolver os casos omissos, visando
atingir o sucesso da 12ª BIGFEST. Ver tópico
Art. 2º - A Presidência da Comissão Organizadora da 12ª BIGFEST,
será exercida pelo Sr. Afonso José dos Santos Filho - Secretário Municipal de
Cultura, Esporte, Turismo e Lazer. Ver tópico
Art. 3º - Ficam nomeados como integrantes da Comissão, os
seguintes representantes:
- Jane Maria Guilherme Trierweiler - (Secretária Municipal de
Assistência Social);
- Jair Rubens da Silva - (Secretário Municipal de Transporte e
Trânsito);
- Júlio César de Freitas - (Secretário Municipal de Finanças).
Art. 4º - Este Decreto entrará em vigor na data de sua
publicação. Ver tópico
[8] Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina. Processo n° TCE-11/00349291.
Relator: Conselheiro Substituto Cleber Muniz Gavi. Acórdão n° 37/2015. Data da
sessão: 18-2-2015.
[9] Art. 44. É vedada, ainda, a aprovação de
projetos cujo objeto ou despesa consista na:
I - realização de shows ou espetáculos que cobrem ingressos e
que não revertam para a finalidade do projeto;
[10] Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina. Processo nº TCE-11/00344060. Relator:
Conselheiro Substituto Cléber Muniz Gavi. Data da sessão: 18-2-2015.
[11] Disponível em: < file:///C:/PROG-TCE/Processos/RepoEletronico/2014/1100340316/4085027.htm>.
Acesso em: 18-1-2016.
[12] Art. 58. A liberação dos recursos
financeiros pelo contratante dar-se-á obrigatoriamente mediante a emissão de
ordem bancária em nome do proponente, para crédito em conta individualizada e
vinculada.
§ 1º A conta bancária vinculada deverá ser identificada com o
nome do proponente acrescida da expressão contrato e do nome do contratante.
[13] Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina. Processo n° PCR-10/00812070.
Relator: Conselheiro César Filomeno Fontes. Acórdão n° 2034/2011. Data da
sessão: 30-11-2011.
[14] Art. 48. A aquisição de
produtos e a contratação de serviços com recursos públicos transferidos a
entidades privadas e pessoas físicas deverão observar os princípios da impessoalidade,
moralidade e economicidade, sendo necessário, no mínimo:
I - apresentação
de três orçamentos originais para justificar o preço de aquisição dos produtos
ou serviços;
II - comprovação
de exclusividade, por meio de atestado fornecido pelo órgão de registro do
comércio local, no caso de inviabilidade de competição.
[15] Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina. Processo n° PCR-11/00291005.
Relator: Conselheiro Luiz Eduardo Cherem. Acórdão n° 522/2016. Data da sessão:
29-8-2016.