PARECER
nº: |
MPTC/50471/2017 |
PROCESSO
nº: |
REC 17/00151140 |
ORIGEM: |
Secretaria de Estado da Educação |
INTERESSADO: |
Eduardo Deschamps |
ASSUNTO: |
Recurso de Reexame da decisão exarada no
processo RLA- 1200456308 |
Trata-se o presente processo
de Recurso[1]
(fls. 4-9) interposto pelo Sr. Eduardo Deschamps, então Secretário de Estado da
Educação, em face do Acórdão n. 0762/2016, exarado nos autos do processo RLA n.
12/00456308, o qual aplicou multa ao recorrente, nos seguintes termos:
ACORDAM
os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em
Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos
arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Conhecer do Relatório de Auditoria
realizada na Secretaria de Estado da Educação, que se ocupou da regularidade
das despesas, dos registros e das demonstrações contábeis referentes à
aquisição de livros paradidáticos e de acervo para biblioteca escolar e, ainda,
quanto ao desempenho do controle interno no que tange ao controle e ao
acompanhamento dessas despesas, referentes aos exercícios de 2009 a 2011 e
eventualidades de 2012.
6.2. Aplicar aos Responsáveis a seguir
identificados, com fulcro nos arts. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 e
109, II, do Regimento Interno desta Corte de Contas, as multas adiante
elencadas, em razão de irregularidades de sua responsabilidade, fixando-lhes o prazo
de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário
Oficial Eletrônico do TCE – DOTC-e -, para comprovarem a este Tribunal o recolhimento
das multas ao Tesouro do Estado, ou interporem recurso na forma da lei,
sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança
judicial, observado o disposto nos art. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar: [...]
6.2.3. em virtude da ineficiência na entrega dos livros e materiais
paradidáticos, em afronta aos princípios da economicidade e da eficiência,
previstos no caput do art. 37 da Constituição Federal:
6.2.3.1. ao Sr. EDUARDO DESCHAMPS - Secretário de
Estado da Educação, CPF n. 6561.317.049-53, a multa no valor de R$
1.136,52 (mil cento e trinta e seis reais e cinquenta e dois centavos);
[...]
A
Diretoria de Recursos e Reexames emitiu o Parecer n. DRR-063/2017 (fls. 10-15v),
opinando pelo conhecimento da peça como sendo Recurso de Reexame e, no mérito,
pelo seu desprovimento, mantendo na íntegra os termos do acórdão recorrido.
Muito embora a presente peça recursal tenha sido
nomeada simplesmente como Recurso, a modalidade recursal correta para atacar
decisão proferida em processo de
fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro é o Recurso de
Reexame, a teor do que dispõe os arts. 79 e 80 da Lei Complementar Estadual n.
202/2000. Dessa forma, em atenção ao princípio da
fungibilidade, a presente peça deverá ser analisada e recebida como Recurso de
Reexame.
Nesse sentido, a parte é legítima para interpor o
presente Recurso de Reexame, uma vez que figurou como responsável pelo ato de
gestão irregular descrito na decisão recorrida.
O acórdão recorrido foi
publicado na imprensa oficial em 21.02.2017 e a peça recursal foi protocolizada
nessa Corte de Contas no dia 07.03.2017, sendo, portanto, tempestiva. Ainda, o
recurso obedece ao requisito da singularidade, porquanto foi interposto uma
única vez.
Logo, encontram-se presentes
todos os requisitos de admissibilidade do presente recurso, de maneira que se
passa, na sequência, à análise das alegações do recorrente.
Em síntese, o recorrente
alegou (fls. 4-7) que a escolha da logística de distribuição de livros técnicos
e literários adquiridos ou em estoque antes de sua posse, em 28.02.2012, seria
um ato administrativo discricionário da Administração, que não teria ferido o
princípio da economicidade e da eficiência, mencionando que, apesar de constar
no relatório – seguindo a concepção do Ministério Público de Contas – que o
recorrente não deveria ser responsabilizado por fatos anteriores à sua posse no
cargo de Secretário de Estado da Educação, o Relator, em seu Voto, manifestou-se
pela aplicação de multa ao recorrente, contradição essa que se repetiu na
deliberação recorrida.
Em que pesem os argumentos
apresentados pelo recorrente, observa-se que este órgão ministerial, no Parecer
n. MPTC/36816/2015 (fls. 3884-3930), acolheu as alegações de
defesa do Sr. Eduardo Deschamps para afastar a sua responsabilidade em face das
irregularidades
ocorridas anteriormente a sua posse no cargo de Secretário de Estado da
Educação, dentre as quais se encontram apenas a “ausência de fundamentação
técnica da decisão de aquisição e da justificativa de preços na aquisição de
livros e materiais paradidáticos”, o “planejamento insuficiente para aquisição
de acervo paradidático” e a “não constituição da comissão de recebimento dos
acervos paradidáticos”. Já em relação à “ineficiência na entrega dos livros e
materiais paradidáticos”, ao contrário do que afirmou o recorrente, esta
representante ministerial foi clara ao sugerir a aplicação de multas aos
responsáveis, nos seguintes termos (fls. 3926-3928):
7.
Conclusão
Ante o exposto, o
Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art.
108, incisos I e II da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
1. pela IRREGULARIDADE, na forma do art. 36, §
2º, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, dos seguintes atos:
[...]
1.3. Ineficiência na
entrega dos livros e materiais paradidáticos em afronta aos princípios da
economicidade e da eficiência, extraídos do art. 37 da CRFB/88, conforme item
3.2.3.1 da conclusão do relatório de reinstrução (fl. 3883); [...]
4. pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos Srs. Eduardo
Deschamps, Silvestre Heerdt, Paulo Roberto Bauer e Marco Antonio Tebaldi, então
Secretários de Estado da Educação, na forma prevista no art. 70, inciso II, da
Lei Complementar Estadual n. 202/2000, diante da irregularidade disposta no
item 3.2.3.1 da conclusão do relatório de reinstrução (fl. 3883);
O que se pode observar, na verdade, é que houve um equívoco por
parte do Relator ao manifestar à fl. 3950 que entende
com razão o Ministério
Público de Contas no sentido de não apenar o responsável Eduardo Deschamps por
essa irregularidade [ineficiência na entrega dos livros e materiais
paradidáticos], pois não ocupava o cargo de Secretário de Estado da Educação à
época, pois assumiu o cargo em 29.02.2012.
Apesar disso, a conclusão do Relatório e Voto de fls. 3947-3951v
seguiu o posicionamento adotado por este Ministério Público de Contas no
sentido de aplicar multa aos responsáveis – dentre eles, o Sr. Eduardo
Deschamps –, não sendo possível, desse modo, apontar qualquer contradição na
deliberação proferida pelo Tribunal Pleno dessa Corte de Contas (fls.
3952-3953), sendo que, mesmo que cabível, o instrumento adequado para esse
questionamento seria a apresentação de Embargos de Declaração, a teor do
disposto no art. 78 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.
Quanto às reiteradas
justificativas relacionadas ao poder discricionário de escolha da logística a
ser utilizada para a distribuição dos materiais, é importante ressaltar que a
discricionariedade atribuída ao gestor público não representa uma salvaguarda
para escolha da opção que bem entender, mas sim a liberdade de eleger a solução
que melhor satisfaça o interesse público, tudo em reverência aos princípios da
economicidade e da eficiência, expressos no art. 37, caput, e
70 da CRFB/88.
Trago, por
pertinente, o seguinte comentário da doutrina de Lucas Rocha Furtado[2] sobre os princípios
constitucionais da economicidade e eficiência:
A eficiência,
que foi elevada pela Constituição Federal à categoria de princípio geral da
Administração Pública, é um
dos aspectos da economicidade.
Esta, além da eficiência, compreende a eficácia e a efetividade. Temos,
portanto, que economicidade é gênero do qual a eficiência, a eficácia e a
efetividade são suas manifestações. [...]
A eficiência requer do responsável pela
aplicação dos recursos público o exame da relação custo/benefício da sua
atuação. O primeiro aspecto a ser considerado em termos de eficiência é
a necessidade de planejamento, de definição das necessidades e a indicação das
melhores soluções para o atendimento dessa necessidade pública. [...]
O primeiro passo para o
desenvolvimento de atividades de modo eficiente corresponde à necessidade de
planejamento dos gastos públicos; o segundo passo a ser dado está ligado à
definição das metas; e o terceiro passo corresponde ao exame dos custos
necessários à realização das metas.
Além do controle da
eficiência, exige-se igualmente do administrador o exame da eficácia e da
efetividade de sua atuação, eis que o próprio texto constitucional estabeleceu
que a Administração Pública
haverá de ser fiscalizada sob a ótica da economicidade, consoante seu art. 70 (grifei).
No presente caso, a auditoria elaborada no processo que originou o
presente recurso observou que os materiais e livros paradidáticos eram
entregues pela empresa C. Miloschewski e M.H. Maia Locação de Veículos Ltda.
nos almoxarifados das Secretarias de Estado do Desenvolvimento Regionais, de
onde eram levados até as escolas por veículos da SEDR ou de professores.
Sendo assim, tendo em vista o volume de gastos desembolsado na
contratação da empresa para prestar o serviço de transporte dos materiais, a
Diretoria de Recursos e Reexames ratificou a conclusão alcançada no processo de
conhecimento, destacando que (fls. 14v-15):
Apesar de o Recorrente
ter assumido o cargo de Secretário de Estado de Educação somente em 29/02/2012,
já com ano letivo iniciado, conforme afirma, este manteve o contrato com a
referida empresa, sendo que a Auditoria verificou que até o dia 06/09/2012
tinha custado aos cofres públicos o montante de R$ 1.674.821,88 (um milhão,
seiscentos e setenta e quatro mil, oitocentos e vinte e uma reais e oitenta e
oito centavos).
Em que pese o valor
expressivo da contratação para prestação desse serviço, o mesmo foi realizado
de forma precária conforme se depreende do Relatório de Auditoria, primeiro
pelo fato do material ter chego com atraso aos alunos da rede pública e, ainda,
obrigou, conforme verificado pela equipe de auditoria, em alguns casos, os
professores a usarem seus veículos particulares para efetivarem a entrega dos
materiais nas escolas.
Assim, ainda que se
trate de um ato discricionário, este não permite que as escolhas feitas pelo
administrador acarretem prejuízos financeiros, e qualquer perda relacionada à
educação de crianças e jovens da rede pública.
Dessa maneira, em
função da ausência de argumentos ou documentos capazes de alterar a deliberação
recorrida, entende-se pela manutenção da penalidade de multa aplicada ao
recorrente.
Ante o
Florianópolis, 22 de agosto
de 2017.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora