PARECER
nº: |
MPTC/51363/2017 |
PROCESSO
nº: |
RLA 14/00492669 |
ORIGEM: |
Fundo Rotativo da Penitenciária Sul |
INTERESSADO: |
|
ASSUNTO: |
Auditar as aplicação de recursos do Fundo
Rotativo da Penitenciária de Florianópolis, e demais Fundos, noticiadas da
REP 13/00696807 e no PDA 13/00707930. |
Trata-se de auditoria
ordinária in loco realizada no Fundo
Rotativo da Penitenciária Sul, executada pela Diretoria de Controle da
Administração Estadual com o objetivo geral de apurar possíveis irregularidades
na aplicação de recursos do Fundo durante o exercício de 2013 (e eventualidades
de 2012 e 2014), conforme noticiado nos processos REP n. 13/00696807 e PDA n.
13/00707930.
À fl. 7 dos autos consta o
Ofício n. TCE/DCE/AUD. 14.292/2014, por meio do qual os auditores fiscais de
controle externo credenciados à auditoria foram apresentados ao Sr. Deiveison
Querino Batista, então Diretor da Penitenciária Sul.
À fl. 8 consta a Matriz de
Planejamento, contendo as seguintes questões de auditoria: 1) as despesas relativas à aplicação dos recursos decorrentes do
trabalho dos reeducandos, pertencentes ao Fundo Rotativo estão sendo realizadas
de acordo com a legislação vigente?; 2) o
Fundo Rotativo está realizando adequadamente a arrecadação de suas receitas?;
3) o controle interno realizou auditoria
ou análise nos registros e demonstrações contábeis relacionados à origem e
aplicação de recursos, na execução orçamentária?
As informações requeridas
constituíram-se de notas de empenho; ordens bancárias; documentos
comprobatórios da despesa pública; registros contábeis e informações gerenciais
do Fundo acerca da arrecadação; documentos utilizados como suporte para os
registros contábeis e as informações gerenciais; relatórios ou pareceres das
auditorias realizadas no período; atuação do controle interno nas atividades e
processos; e relatório de controle interno.
Em seguida, foram juntados os
documentos constantes às fls. 9-392, divididos da seguinte maneira:
“Representação” (fls. 9-42); “Demonstrativos das Receitas e Despesas” (fls. 43-65);
“Despesas realizadas com o Departamento Administração Prisional” (fls.
66-103v); “Despesas realizadas com aquisição de uniformes para os servidores da
Penitenciária Sul – Exercício de 2014” (fls. 104-144); “Despesas realizadas com
aquisição de uniformes para os servidores da Penitenciária Sul – Exercício
2013” (fls. 145-280); “Despesas realizadas com aquisição de uniformes para os
servidores da Penitenciária Sul – Presídio Regional de Araranguá – Exercício de
2012” (fls. 281-344); “Veículos da Penitenciária Sul – Unidades Avançadas de
Imbituba e Laguna – Presídio Regional de Criciúma – Tubarão – Araranguá” (fls.
345-356); “Irregular cálculo dos valores devidos aos reeducandos em razão de
serviços prestados” (fls. 357-359); “Ausência de evidenciação contábil dos
recursos depositados em contas correntes bancárias destinados às remunerações
dos detentos” (fls. 360-385v); “Não exploração das potencialidades de geração
de receita” (fls. 386-390); e “Ausência de Controle Interno” (fls. 391-392).
Às fls. 393-399 foram
acostadas as “Matrizes de Achados e de Responsabilização”.
Em seguida, foram juntados os
“Termos de Cooperação firmados com as empresas Preservale Saneamento Ambiental
Ltda. ME; IBRAP Indústria de Alumínio e Plásticos S/A; Município de Forquilhinha;
Município de Criciúma; Município de Araranguá; Salvaro Ind. e Comércio de
Madeiras Ltda.; SG Construções; e Transporte Cavera Ltda. EPP” (fls. 400-470.
Após a juntada dos documentos
de fls. 9-470, conforme mencionado acima, a Diretoria de Controle da Administração
Estadual apresentou o Relatório DCE n. 502/2014 (fls. 471-495), em cuja
proposta de encaminhamento sugeriu a audiência dos responsáveis pelas
irregularidades então identificadas.
À fl. 495v, o Relator
manifestou-se de acordo pela realização de audiência.
A Sra. Soraya Costa Elias,
então Contadora do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul, foi notificada por meio
do Ofício TCE/DCE n. 20.329/2014 (fl. 496). O termo de recebimento consta à fl.
506.
O Sr. Everaldo Elias Vieira,
então Contador do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul, foi notificado por meio
do Ofício TCE/DCE n. 20.330/2014 (fl. 497). O respectivo Aviso de Recebimento
consta à fl. 508.
O Sr. Sadi Beck Júnior, então
Secretário de Estado da Justiça e Cidadania, foi notificado por meio do Ofício
TCE/DCE n. 20.328/2014 (fl. 498). O termo de recebimento consta à fl. 505.
O Sr. Arlindo Pagnan, então
Gerente de Atividades Laborais da Penitenciária Sul, foi notificado por meio do
Ofício TCE/DCE n. 20.327/2014 (fl. 499). O respectivo Aviso de Recebimento
consta à fl. 507.
A Sra. Ada Lili Faraco de
Luca, então Secretária de Estado da Justiça e Cidadania, foi notificada por
meio do Ofício TCE/DCE n. 20.326/2014 (fl. 500). O termo de recebimento consta
à fl. 504.
O Sr. Leandro Antônio Soares
Lima, então Diretor do Departamento de Administração Prisional, foi notificado
por meio do Ofício TCE/DCE n. 20.325/2014 (fl. 501). O termo de recebimento
consta à fl. 503.
O Sr. Deiveison Querino
Batista, então Diretor da Penitenciária Sul, foi notificado por meio do Ofício
TCE/DCE n. 20.324/2014 (fl. 502). O respectivo Aviso de Recebimento consta à
fl. 508.
Após as referidas
notificações, os Srs. Sady Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca apresentaram
solicitação de prorrogação do prazo de apresentação de defesa por 30 dias, a
qual restou deferida à fl. 509, sendo o termo de deferimento, por sua vez,
acostado às fls. 625-628. Frise-se que os responsáveis apontados não
apresentaram resposta, conforme atestado à fl. 629, deixando, assim,
transcorrer in albis os prazos
legalmente previstos, tornando-se sujeitos aos efeitos da revelia dispostos no
art. 15, § 2º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, c/c o art. 17, § 6º,
da Resolução n. TC-06/2001.
O Sr. Leandro Antônio Soares
Lima também obteve o deferimento da solicitação de prorrogação do prazo para
apresentação de defesa (fls. 511-512). Posteriormente, apresentou
justificativas de defesa às fls. 543-562 e juntou documentos às fls. 563-565.
O Sr. Everaldo Elias Vieira
apresentou suas justificativas de defesa às fls. 514-524.
A Sra. Soraya Costa Elias
apresentou suas justificativas de defesa às fls. 526-536.
O Sr. Deiveison Querino
Batista apresentou solicitação de prorrogação do prazo para apresentação de
defesa por 30 dias às fls. 538-539, a qual restou deferida à fl. 538. Após,
obteve o deferimento de nova solicitação de prorrogação de prazo por mais 15
dias (fl. 567). Posteriormente, apresentou suas justificativas de defesa às
fls. 578-597 e juntou documentos às fls. 598-623.
O Sr. Arlindo Pagnan
apresentou solicitação de prorrogação do prazo para apresentação de defesa por
30 dias às fls. 541-542, e novamente à fl. 569, sendo ambas deferidas (fls. 541
e 569). Posteriormente, apresentou suas justificativas de defesa às fls.
571-576.
Após a apresentação das
informações e documentos referidos, a Diretoria de Controle da Administração
Estadual apresentou o Relatório DCE n. 002/2016 (fls. 630-657v), em cuja
conclusão sugeriu a aplicação de multas aos responsáveis e fixou determinações
e recomendações, nos seguintes termos (fls. 656v-657v):
3.1 CONHECER do relatório de
auditoria realizada no Fundo
Rotativo da Penitenciária Sul, relativamente à
análise das receitas e despesas atinentes ao trabalho dos reeducandos, para considerar irregulares estes atos, com
fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar n.
202/2000.
3.2 APLICAR aos responsáveis nominados
nos itens abaixo, multa prevista no artigo 70, da Lei
Complementar nº 202/2000 (estadual) c/c art. 109, II, do regimento Interno,
fixando o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no
DOTC-e, para comprovar ao Tribunal o recolhimento das multas ao Tesouro do
Estado, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para
cobrança judicial, disposto nos arts. 43, II, e 71 da LC nº 202/2000:
3.2.1
senhores
Deiveison Querino Batista, Diretor
da Penitenciaria Sul, à época, CPF nº 005.758.309-99, residente a rua Joaquim
Angelo, nº 218, Bairro Monte Castelo, Tubarão, SC, CEP 887025-70, Leandro Antônio Soares Lima, Diretor do
Departamento de Administração Prisional, à época, CPF 588.019.369-15, residente
a rua Sergio Candido, 214, casa, Carianos, Florianópolis, SC, CEP
88047-560, Ada
Lili Faraco De Luca, Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania.,
CPF n° 226.271.111-91, residente na Rua Dr. Jorge Luiz Fontes, n° 310,
Centro, Florianópolis - SC, CEP n°88020-900, em face de:
3.3 DETERMINAR, no
prazo a ser assentado por este Egrégio Tribunal, com fundamento no inciso IX do
artigo 59 da Constituição Estadual de 1989 e o inciso XII do artigo 1º da Lei
Complementar nº 202 (estadual), à Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania, na pessoa do seu representante legal, para que adote e comprove
a este Tribunal as providencias adotadas, pelo que segue:
3.3.1
devolução do montante de R$ 44.747,40 corrigidos monetariamente, ao Fundo Rotativo da Penitenciária Sul, por
conta da realização de despesas que deveriam ser custeadas pelo Fundo
Penitenciário de Santa Catarina – FUPESC, em atendimento a Lei nº 5.455,
de 29 de junho de 1978, e alterações posteriores, e no Decreto nº 2.312, de 15
de outubro de 1997(estadual) com alterações produzidas pelo Decreto estadual nº
132, de 12 de abril de 1999 (itens 2.1 deste relatório);
3.3.2 promova alterações na
legislação, especialmente no que se refere à regulamentação dos serviços
realizados pelos apenados, estabelecendo critérios objetivos de cálculo dos
valores devidos aos detentos em razão de serviços prestados nas unidades
prisionais (item 2.4 deste
relatório);
3.3.3 a abertura de contas correntes individualizadas em todo o sistema
prisional para depósito do pecúlio (resultado do trabalho assalariado) dos
apenados, em estrita observância à Lei nº 14.410, de 16 de abril de 2008
(estadual) (item 2.6 deste relatório);
3.4
DETERMINAR,
no prazo a ser assentado por este
Egrégio Tribunal, com fundamento no inciso IX do artigo 59 da Constituição
Estadual de 1989 e o inciso XII do artigo 1º da Lei Complementar nº 202
(estadual), à Secretaria
de Estado da Fazenda, na pessoa de seu representante legal, para que
adote providências, por meio da
Diretoria de Contabilidade Geral – DCOG, para estabelecer procedimentos com
vistas a realizar o registro contábil dos valores do pecúlio prisional pelo
Fundo Rotativo da Penitenciária Sul (item 2.7 deste relatório).
3.5
RECOMENDAR à
Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania que adote providências pelo que segue:
3.5.1 realize
estudos com vistas a garantir o ressarcimento das despesas com energia elétrica
e água, pelas empresas conveniadas que se utilizam dos espaços internos das
unidades prisionais, bem como o trabalho dos reeducandos para produção de
mercadorias e/ou serviços (item 2.5 deste relatório);
3.5.2 verifique
junto às unidades
prisionais da real necessidade de postos de trabalho e adote providências para
a realização de novos convênios com empresas interessadas para ofertar novos
serviços dentro das Unidades Prisionais (item 2.8 deste relatório).
3.6 Dar ciência da Decisão, com remessa de cópia do
presente Relatório e do Voto que a fundamentam, aos Responsáveis à época, Srs. Sadi Beck Junior, Leandro Antônio Soares
Lima, Deiveison Querino Batista, Arlindo Pagnan, Soraya Costa Elias e Everaldo Elias Vieira, e a sra. Ada
Lili Faraco de Luca, Secretária de Estado da Justiça e Cidadania.
Em seguida, vieram os autos a
este Ministério Público de Contas para manifestação.
Note-se que a fiscalização
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do órgão em
questão está inserida entre as atribuições dessa Corte de Contas, consoante os
dispositivos constitucionais, legais e normativos vigentes (arts. 70 e 71,
inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; arts. 58 e
59, inciso IV, da Constituição Estadual; art. 1º, inciso V, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000; e art. 8° c/c art. 6° da Resolução n. TC-06/2001).
Passa-se, assim, à análise
das irregularidades levantadas pela Diretoria de Controle da Administração Estadual.
1. Irregularidades
identificadas pelo Relatório DCE n. 502/2014
1.1.
Realização de despesas, no
montante de R$ 44.747,40, com recursos do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul,
fora das finalidades previstas na Lei Estadual n. 5.455/78 e no Decreto
Estadual n. 2.312/97, alterado pelo Decreto Estadual n. 132/99
O item 4.1.1.1 da proposta de
encaminhamento e achado 1 do Relatório DCE n. 502/2014 identificou o pagamento
de despesas[1]
pelo Fundo Rotativo da Penitenciária Sul – nos exercícios de 2012, 2013 e 2014 –
fora das finalidades previstas na legislação de regência da matéria, a qual
determina expressamente que a receita dos fundos rotativos estaduais deve ser
aplicada nos respectivos estabelecimentos prisionais.
Foram apontados como
responsáveis pela irregularidade os Srs. Deiveison Querino Batista, Leandro
Antônio Soares Lima e Ada Lili Faraco de Luca.
O responsável Deiveison Querino Batista iniciou suas
justificativas afirmando (fl. 578) que o Fundo encontra-se sob a constante
supervisão técnica da Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, realizada
através de sua Diretoria de Planejamento e Avaliação, especialmente pela
Gerência de gestão de fundos. Alegou ter tratado de conhecer o ambiente e
aprofundar seus conhecimentos específicos a fim de promover as mudanças de
forma gradual, atendendo aos preceitos esperados pelos órgãos superiores e pela
estrutura de controle.
Nesse sentido, argumentou
(fl. 579) inexistir processo preparatório capaz de entregar à Administração
Pública indivíduo apto a atuar em diversos e complexos ambientes prisionais,
tanto na sua atividade stricto sensu
como em sua gestão financeira, sendo demandado um período de absorção e
adaptação de todo o fluxo de demandas e formas adotadas pelos procedimentos e
processos gerenciais.
Ponderou (fl. 579) que,
apesar de a legislação regente nortear alguns parâmetros, não contemplaria
muitas das singularidades inerentes ao sistema, de modo que caberia ao gestor,
fundado no princípio da segurança pública, dar andamento aos trabalhos de forma
a ordenar os costumes até o estabelecimento de formas “mais profissionalizadas,
ainda que adaptadas”.
O responsável contextualizou
(fl. 579), ainda, a mudança na estrutura da Secretaria, resultante do
desmembramento do sistema prisional da Secretaria de Segurança Pública em 2010,
destacando que todos os processos e trâmites teriam sido alterados sem que
houvesse alinhamentos e nem o devido treinamento acerca da formatação ideal,
ocasionando a adaptação das unidades por seus respectivos gestores conforme as
metodologias existentes.
Nesse ponto, arrazoou (fl.
579) que, conforme o art. 1º da Lei Estadual n. 5.455/78 e entendimento dessa
Corte de Contas, o Fundo Rotativo da Penitenciária Sul é subordinado à
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania através de sua Diretoria de
Planejamento e Avaliação, por intermédio da Gerência de Gestão dos Fundos, de
modo que seria responsável por estabelecer os parâmetros, normas e
procedimentos. Contudo, segundo o responsável, essa supervisão técnica jamais
teria existido.
Ressaltou, igualmente (fl.
580), a inexistência de quadro de pessoal técnico-administrativo nos quadros da
Secretaria, de modo que a atividade administrativa das unidades prisionais do
Estado de Santa Catarina seria exercida “sem o profissionalismo devido, acarretando,
no mais das vezes, a acumulação irregular de funções pelo agente
penitenciário”. Acrescentou a este panorama o fato de as penitenciárias
estaduais atuarem na condição de mantenedoras das unidades menores (presídios),
cujas crises e situações emergenciais dificultariam o regular trâmite laboral,
inviabilizando ações de planejamento e execução de médio prazo. O responsável
explicou que, por interpretação errônea da lei, as unidades acabaram adotando
comportamento equivocado no âmbito do próprio Departamento de Administração
Prisional.
Aduziu (fl. 580), nesse
sentido, que a legislação de regência dos Fundos estaria desatualizada,
causando equívocos em sua aplicação, fazendo com que recursos fossem
erroneamente encaminhados às unidades prisionais do Estado.
O responsável frisou (fls.
580-581) que em nenhum momento a auditoria tratou de casos de desfalque, desvio
de bens ou outra irregularidade causadora de dano ao erário, bem como ação ou
omissão praticada com dolo ou má-fé. Acerca do processo de execução das
despesas, destacou que foram evidenciadas as dificuldades e demonstrado o
entendimento da necessidade de adoção da via mais aprimorada nas atividades,
tanto que teria havido a migração gradativa das necessidades para a consonância
com a legislação vigente.
Reportou (fl. 581) a
realização de reunião com os contadores da Secretaria de Estado da Fazenda
acerca da implantação de processo licitatório, admitindo a dificuldade de
regularização do fundo e criação da comissão de licitação, em parte diante dos já
mencionados empecilhos relativos ao quadro de pessoal técnico-administrativo.
Nesse contexto, relatou (fl. 582) que somente em 2014 um grupo de servidores
fora recrutado e treinado na área, ressaltando que mudanças e novas medidas
“levam tempo e dedicação”, sendo que a atual Direção estaria possibilitando a
implantação gradativa dos procedimentos legais.
Diante do contexto fático
exposto, o responsável admitiu (fl. 582) que
[...] foram realizadas várias compras por
decreto de emergência tais como materiais de construção, consertos de viaturas,
ração para animais, entre outros. O dispêndio com materiais de construção faz
parte de atos rotineiros participantes de política preventiva a eventuais fugas
e ampliação da capacidade das unidades prisionais, sendo maior do que o
autorizado para esta unidade.
Diante deste cenário o fundo rotativo
necessitava de resposta imediata, pela motivação do interesse na segurança
pública e no bem estar social, ante a urgência dos acontecimentos.
Assim, considerando os bens de uso coletivo, a
ausência de oficina mecânica credenciada e ausência de processos preventivos de
apoio da SJC para ações emergenciais quanto à manutenção de veículos, o fundo
ajudou na manutenção de algumas viaturas, pois também eram de uso da penitenciária,
vez que transportavam presos daqui para outras unidades.
Ao final de suas
justificativas, o responsável requer (fl. 583) que esse Tribunal de Contas
determine à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania (SJC) que sane a
irregularidade apontada, ressarcindo o montante de R$ 44.747,40 ao Fundo
Rotativo da Penitenciária Sul pelo Fundo Penitenciário do Estado de Santa
Catarina – FUPESC.
O responsável Leandro Antônio Soares Lima iniciou
suas alegações afirmando (fl. 543) que a opção política adotada incumbiu o
Departamento de Administração Prisional (DEAP) apenas da execução da política
pública para o sistema penal prisional do Estado, explicando (fl. 544) que este
departamento e os demais estabelecimentos penais do Estado seriam dotados
exclusivamente da administração e segurança externa de cada qual, mas tão
somente no que concerne à execução penal.
Nesse sentido, destacou que a
Lei Complementar Estadual n. 381/2007 estruturou o Departamento de
Administração Prisional nas seguintes unidades: Diretoria de Administração
Prisional; Gerência de Execução Penal; Gerência de Orientação e Assistência ao
Egresso; Gerência Judiciária; Gerência de Apoio Psiquiátrico; Gerência de
Presídios; Gerência de Casa de Albergado; Gerência de Escolta e Vigilância
Prisional. Concluiu que a gestão penitenciária estaria circunscrita às
competências descritas na Lei de Execuções Penais.
Em seguida, transcreveu (fls.
544-545) o art. 64 da Lei Complementar Estadual n. 381/2007, asserindo que a
lei em referência cria e dá competência aos seguintes órgãos, pertencentes à
estrutura da SJC (fls. 545-546): Diretoria Administrativa e Financeira e suas
respectivas subdivisões e Diretoria de Planejamento e Avaliação e suas
respectivas subdivisões. Após, concluiu (fl. 546) que a atividade administrativa
desconcentrada realizada pelo DEAP resume-se apenas ao trato operacional, “mas
tão somente no que diz respeito à Lei de Execução Penal”, ao passo que a
atividade-meio de cunho técnico-administrativo exercida nas unidades prisionais
competiria diretamente à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania nos seus
níveis de direção estratégica e gerencial.
Nessa medida, o responsável
buscou atribuir toda a responsabilidade à Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania, argumentando no sentido de que (fl. 547), ainda que o DEAP
pretendesse avocar a competência técnica de supervisão e fiscalização das
compras realizadas pelos fundos rotativos dos estabelecimentos provisórios e de
execução penal do sistema penitenciário, faltar-lhe-ia pessoal administrativo especializado.
O responsável argumentou,
ainda (fl. 547), nos mesmos moldes já referidos, a ausência de apontamento, por
parte da auditoria, de desfalque, desvio de bens ou outra irregularidade
ocasionadora de dano ao erário, bem como ação ou omissão praticada com dolo ou
má-fé, frisando que os materiais listados estariam devidamente evidenciados e
visualizados pela própria auditoria.
Por fim, concluiu (fls.
547-548) que seria o caso de essa Corte de Contas determinar à Secretaria de
Estado da Justiça e Cidadania o saneamento da irregularidade apontada,
ressarcindo ao Fundo Rotativo da Penitenciária Sul o valor correspondente aos
gastos verificados pela auditoria.
A responsável Ada Lili Faraco de Luca, conforme já
exposto na parte introdutória deste parecer, apesar de regularmente
cientificada do conteúdo dos presentes autos, deixou transcorrer in albis os prazos legais previstos para
apresentação de alegações de defesa, sujeitando-se aos efeitos da revelia, tal
como previsto no art. 15, § 2º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.
Em que pesem as
justificativas e argumentos apresentados pelos responsáveis, entendo pela
manutenção da irregularidade.
Inicialmente, cabe salientar
que o cerne argumentativo das alegações de defesa apresentadas se refere, em
apertada síntese, às dificuldades estruturais existentes no âmbito dos órgãos
de segurança pública à época dos fatos que deram azo à irregularidade ora
discutida, somadas à suposta ausência/deficiência de substrato legislativo
hábil a permitir a exata gestão e aplicação dos recursos conforme as
respectivas competências. Nesse sentido, inclusive, buscou-se transferir a
responsabilidade à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania.
Contudo, conforme se extrai
dos autos, a auditoria in loco reuniu
documentação e informações as quais, em cotejo com os dispositivos legais e
normativos que regem a matéria em discussão, permitem concluir que, de fato, as
despesas foram realizadas irregularmente.
Consoante disposto na “Tabela
01 – Relação de empenhos com pagamentos de despesas para a sede do DEAP” (fl.
632), foram dispendidos R$ 6.654,00 na aquisição de camisetas para
funcionários, cadeiras, divisórias, peças e acessórios de escritório, bem como
peças para manutenção de veículo, todos no interesse do Departamento de Administração
Prisional (DEAP).
Ocorre que a Lei Estadual n.
5.455/78 autorizou a criação do Fundo Rotativo nos estabelecimentos provisórios
e de execução penal do sistema penitenciário estadual, prevendo em seu art. 1º
o seguinte:
Art. 1º Fica
o Poder Executivo autorizado a instituir Fundo Rotativo nos estabelecimentos
provisórios e de execução penal bem como nos Centros de Internamento para
adolescentes autores de ato infracional, existentes ou que venham a ser
criados, subordinados à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, destinado
à aquisição, transformação e revenda de mercadorias e à prestação de serviços,
bem como à realização de despesas correntes e de capital.
§ 1º As despesas
correntes previstas no "caput" deste artigo limitar-se-ão às
classificadas como material de consumo e serviços de terceiros e encargos e as
de capital classificadas como investimentos.
§ 2º Poderá o Fundo
Rotativo destinar até 25% (vinte e cinco por cento) dos recursos financeiros
para manutenção e custeio do estabelecimento a que pertença.
Tal Fundo passou a ser
regulado com a edição do Decreto Estadual n. 2.312/97, cujo art. 4º foi
alterado pelo Decreto Estadual n. 132/99, passando a contar com a seguinte
redação:
Art. 4o Os recursos do Fundo Rotativo serão aplicados nos estabelecimentos
provisórios e de execução penal, integrantes do Sistema Penitenciário do Estado
e Centros de Internamento para Adolescentes Autores de Ato Infracional,
em despesas correntes e de capital (grifei).
Percebe-se, de imediato, a
irregularidade das despesas efetuadas no interesse do DEAP mediante a
utilização de recursos do Fundo Rotativo, uma vez que o DEAP não se enquadra na
qualificação legal de “estabelecimento provisório e de execução penal”, mas, ao
contrário, configura-se como órgão da Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania, conforme entabulado no art. 65, inciso III, da Lei Complementar
Estadual n. 381/2007.
Desse modo, eventuais
dispêndios relacionados à infraestrutura do órgão, tanto no aspecto objetivo
quanto subjetivo, deveriam ser custeados com recursos do Fundo Penitenciário do
Estado de Santa Catarina (FUPESC), ao qual competem despesas da natureza
realizada no DEAP, conforme previsto no art. 3º da Lei Estadual n. 10.220/96:
Art. 3º Os
recursos do Fundo Penitenciário do Estado de Santa Catarina - FUPESC são
aplicados em:
I - reforma,
ampliação e construção de estabelecimentos penais, prisionais e de custódia do
Estado;
II - renovação
e ampliação da frota de veículos;
III - aquisição
de materiais permanentes diversos;
IV - manutenção
dos estabelecimentos penais, prisionais e de custódia;
V - incentivo a programas sociais, de ensino, de
cultura e médico-hospitalares na área penitenciária;
VI - supervisão técnico-administrativa do
Sistema Penal;
VII - treinamento e capacitação de recursos
humanos vinculados ao Sistema Penal.
IX - na remuneração de profissionais nomeados
judicialmente para a realização de perícias de dependência toxicológica,
sanidade mental, cessação de periculosidade, criminológicas e outras;
X - na locação de imóveis destinados ao abrigo
de internos do Hospital da Custódia e Tratamento que tenham, por laudo
pericial, atestada a cessação de sua periculosidade (grifei).
Conforme observado, as
despesas com camisetas para funcionários, cadeiras, divisórias, peças e acessórios
de escritório, bem como peças para manutenção de veículo, se inserem nas
definições insculpidas nos incisos I a IV do art. 3º transcrito acima, de modo
que se revela flagrante o equívoco quanto à aplicação de recursos em objeto
desconexo com as finalidades previstas.
A mesma análise apresentada
acima deve ser aplicada à situação consubstanciada na “Tabela 02” (fls.
632v-634), que traz a relação de notas de empenho destinadas ao pagamento de
despesas com aquisição de uniformes, capa para chuva e calçados para os
Servidores do Presídio Regional de Araranguá e para os servidores da
Penitenciária Sul, perfazendo um dispêndio total de R$ 38.093,40.
Tais despesas deveriam ter
sido acobertadas pelos recursos vinculados ao FUPESC, e não por aqueles
oriundos do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul que, conforme visto, se prestam
a objetivo diverso.
Assim, a aplicação de recursos do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul em tais
despesas, apesar de não causar dano ao erário ou configurar desfalque, desvio
de dinheiro, bens ou valores públicos, violou norma legal, ensejando, por esse
motivo, a cominação de multa por parte desse Tribunal, a teor do disposto no
art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.
Já
quanto ao argumento de que não houve dolo ou má-fé no presente caso, convém esclarecer que, no que compete a esse Tribunal de
Contas, não há qualquer dispositivo na Lei Complementar Estadual n.
202/2000 que exija comprovação de má-fé como requisito para imputabilidade.
Mais ainda, no âmbito do Direito Administrativo, não há que se indagar sobre a
boa ou má-fé do agente. Sobre o tema, destaco as palavras de Celso Antônio
Bandeira de Mello[2],
que bem sintetiza esse entendimento:
11. (d) Princípio da
exigência de voluntariedade para incursão na infração – O Direito propõe-se a
oferecer às pessoas uma garantia de segurança, assentada na previsibilidade de
que certas condutas podem ou devem ser praticadas e suscitam dados efeitos, ao
passo que outras não podem sê-lo, acarretando consequências diversas, gravosas
para quem nelas incorrer. Donde, é de meridiana evidência que descaberia
qualificar alguém como incurso em infração quando inexista a possibilidade de
prévia ciência e prévia eleição, in
concreto, do comportamento que o livraria da incidência na infração e,
pois, na sujeição às sanções para tal caso previstas. Note-se que aqui não se
está a falar de culpa ou dolo, mas de coisa diversa: meramente do animus de praticar dada conduta.
Ademais, no que diz respeito
à tese argumentativa de que a responsabilidade recairia tão somente sobre a
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, a área técnica trouxe,
oportunamente, os seguintes esclarecimentos (fl. 638):
Contudo, a documentação acostada aos autos
comprova que o ex-Diretor do DEAP, tinha conhecimento das despesas realizadas,
ao passo que firmou termo de cessão de uso (fl. 103) extemporaneamente para dar
um viés de legalidade às despesas realizadas pelo Fundo Rotativo da
Penitenciária Sul e que foram destinadas à nova sede do DEAP, no qual era
Diretor, no Município de Palhoça.
Destaca-se que além do Fundo Rotativo Sul,
também foram utilizados recursos dos Fundos Rotativos de Florianópolis e
Curitibanos, para mobiliar a nova sede do Departamento de Administração
Prisional, conforme fazem prova os termos de cessão de uso firmado pelo DEAP
com estas unidades (fls. 38v e 41).
Nesse sentido, não obstante a
competência atribuída à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania para gestão
do fundo rotativo e fiscalização das atividades administrativas e técnicas,
configurou-se a responsabilidade do Diretor da Penitenciária Sul e do Diretor
do Departamento de Administração Prisional em razão da subscrição dos
documentos que autorizaram as despesas tidas como irregulares, demonstrando a
sua ciência a respeito.
Dessa maneira, entendo pela
manutenção da irregularidade originalmente apontada pela equipe de auditoria,
com a consequente aplicação de penalidade da multa aos responsáveis, conforme
prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, sem
prejuízo da determinação sugerida pela área técnica, no sentido de que a
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, na qualidade de superior
hierárquica do Departamento de Administração Prisional, devolva o montante de
R$ 44.747,40 ao Fundo Rotativo da Penitenciária Sul.
1.2.
Ausência de licitação para
realização de despesas com aquisições de ração animal, materiais de construção
para reforma de presídios, uniformes e acessórios para agentes penitenciários e
manutenção e conservação de veículos, durante o exercício de 2013, cujos
valores são superiores ao montante em que é dispensável a licitação, em afronta
ao art. 37, inciso XXI, da CRFB/88, bem como aos arts. 2º e 3º da Lei n.
8.666/93
O item 4.1.2.1 da proposta de
encaminhamento e achado 2 do Relatório DCE n. 502/2014 apurou a realização de
despesas[3]
baseadas em procedimento de dispensa de licitação, no exercício de 2013, sem
que o Fundo apresentasse elementos informativos ou documentos comprobatórios
hábeis a demonstrar a efetiva emergência no caso concreto.
A presente irregularidade foi
atribuída à responsabilidade do Sr. Deiveison Querino Batista.
Em suas alegações de defesa,
o responsável alegou, preliminarmente (fl. 583), a existência de aspectos
relevantes, na conjuntura dos fatos, que não teriam sido identificados e
precisavam ser suscitados.
Em relação à inadequação do
Decreto Estadual n. 4.013/06, que declarou situação de emergência no sistema
prisional catarinense, alegou não deter competência para desrespeitá-lo, por
não se tratar de análise do mérito do ato político-administrativo.
Afirmou (fl. 583) ter
incorrido em “ato administrativo precário”, porém não doloso ou regido por
má-fé, uma vez que as necessidades e demandas que foram supridas teriam em sua
essência um “teor emergencial de urgência notória”, para a qual a auditoria não
teria atentado.
Contestou (fl. 584) o
apontamento de ausência de demonstração de fatores de urgência, alegando
existirem no próprio relatório de auditoria situações comprovadas para
aplicação contingenciada dos recursos destacados, referentes à aquisição de
peças e serviços de conserto de viaturas.
Salientou (fl. 584) que mesmo
em face da licitação de tais bens, haveria a identificação de inconsistência em
razão da natureza do dispêndio e da regulação do uso das verbas do Fundo
Rotativo, uma vez que não haveria entendimento claro quanto ao uso destas
verbas na legislação estadual. Argumentou, ainda, que a atribuição quanto ao
fechamento de contratos com oficinas credenciadas para a manutenção de veículos
seria atribuição da Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, ressaltando a
problemática da falta de manutenção das frotas das unidades prisionais.
Enfatizou (fl. 584) a
anotação de irregularidade seria improcedente em razão de a Comissão de
Licitação sequer estar em funcionamento, uma vez que somente em novembro de
2014 teria sido disponibilizado o Curso de Licitações e Contratos,
imprescindível à atuação daquela.
No que diz respeito à
aquisição de ração animal, o responsável apresentou as seguintes justificativas
(fl. 585):
Quando da mudança de direção da penitenciaria
sul em outubro/2011, haviam cachorros que eram utilizados para ajudar na guarda
externa da unidade. Importante ressaltar que tais animais foram doados à esta
unidade após o ingresso de diversas lideranças da facção criminosa conhecida
como PGC – Primeiro Grupo Catarinense, doação até mesmo da Polícia Militar.
Ocorre que em 2011 não havia Comissão de
Licitação designada, sendo o procedimento adequado o envio de Comunicação
Interna ao Departamento de Administração Prisional para que realizasse o
procedimento licitatório para aquisição de ração, porém do envio do pedido até
a conclusão da licitação sabe-se que ultrapassariam 30 (trinta) dias para a
finalização da contratação, o que certamente causaria a morte dos animais,
devido à falta de alimentação.
Com relação à aquisição de
materiais de construção para a reforma de presídios, o responsável atribuiu
(fl. 585) sua necessidade ao contexto de fugas observado nos Presídios
Regionais de Araranguá e Criciúma, associados ao desgaste de grades e
equipamentos, bem como a movimentações coletivas dos reclusos contra a ordem do
ergástulo, os quais teriam causado uma sequência de danos estruturais. Aduziu
que esses fatos estariam comprovados em diversas comunicações por parte dos
agentes de plantão, asserindo que tais situações não poderiam ficar sem
enfrentamento imediato por parte do gestor, de forma a se manter a segurança
interna e externa. Ainda nessa discussão, reconheceu “a precariedade no
processamento administrativo de dispensa de licitação”, mas alegando a
existência de “fatos notórios para a caracterização das urgências”.
Acerca da aquisição de
uniformes e calçados para os servidores da Penitenciária Sul, o responsável
informou (fl. 585) que os serviços de escoltas que antes era realizado pela
Polícia Militar passou a ser atribuição dos agentes penitenciários a partir de
2013, ressaltando que quando da interrupção dos serviços de apoio da Polícia
Militar, não teria havido prévia comunicação, o que teria gerado a necessidade
da aquisição sob exame de forma imediata.
Além do referido, destacou
(fl. 586) o texto do art. 63 da Lei Complementar Estadual n. 472/2009, o qual
prevê que “o Estado fornecerá uniformes e
os equipamentos de proteção, quando exigidos pelo estabelecimento,
gratuitamente, em conformidade com o art. 31 da Lei nº 6.745, de 1985”,
comentando em seguida que na situação observada haveria “a precariedade do
processo administrativo em sua forma mais rígida” aliada à “caracterização da
situação de urgência comprovada e documentada”. Ao final, o responsável
concluiu pela existência de motivos suficientes a justificar a ausência de
rigor processual, consubstanciados no fato da inexistência de um setor
específico de licitações ou de quadro técnico-administrativo de servidores.
Inicialmente, entendo
importante trazer à baila alguns esclarecimentos acerca da matéria sob
discussão.
A licitação
é a regra quando a Administração compra ou contrata bens e serviços, em
respeito ao princípio da isonomia e da indisponibilidade do interesse público.
Apenas excepcionalmente – e em exemplos taxativos – é dispensável a licitação.
É sabido que a CRFB/88
preceitua, no seu art. 37, inciso XXI, a obrigatoriedade, em regra, de os
contratos firmados pela Administração Pública serem precedidos de processos
licitatórios. Não obstante, a Lei n. 8.666/93 trouxe alguns dispositivos que
tratam da contratação direta, para hipóteses onde é inviável realizar uma
licitação (inexigibilidade) ou quando o processo licitatório puder trazer algum
tipo de prejuízo ao interesse público (dispensa).
Merece aqui especial atenção
ao termo “dispensável” para a licitação, utilizado no art. 24, caput, da Lei 8.666/93. Marçal Justen
Filho[4]
afirma que a dispensa de licitação se
verifica “em situações em que, embora viável a competição entre particulares, a
licitação afigura-se objetivamente inconveniente ao interesse público".
Na mesma linha Antônio Roque
Citadini[5]
aduz que:
[...] a licitação é dispensada, como se pode
ver, em situações descritas pela legislação, nas quais se poderá, em tese,
realizar o procedimento licitatório, mas que, pelas razões em cada caso
apontado, entende-se desnecessário o certame, já que sua realização não
propiciaria ao Poder Público a escolha de proposta economicamente mais
adequada, nem o pronto atendimento do interesse público (nacional, estadual ou
local) que requer providências imediatas.
Pode-se concluir, então, que,
ao afastar a regra básica de que toda a contratação no âmbito do Poder Público
requer uma prévia licitação, deve-se fundamentar muito bem todas as razões que
levaram o administrador a dispensar um certame licitatório, devendo ele
comprovar os motivos pelos quais a licitação não seria vantajosa ou mesmo seria
divergente do interesse público.
É que, considerando a licitação
como regra geral a ser seguida antes das contratações, imposta pela própria Lei
Maior do País, qualquer exceção deve
ser interpretada da forma mais restrita possível, sob pena de se
abarcar situações para as quais o legislador não previu a dispensa e que podem
ferir princípios básicos que devem nortear toda a gestão pública, especialmente
as contratações, como a isonomia, a legalidade, a impessoalidade, a moralidade
e a probidade administrativa.
Nessa linha já se pronunciou
o Tribunal de Contas da União, ao tratar da aplicabilidade da regra referente
às hipóteses de dispensa de licitação. Veja-se trechos do voto condutor do
Ministro Augusto Sherman Cavalcanti, nos autos do processo n. TC-019.027/2003:
Ora, se
a dispensa de licitação se configura em exceção à regra
constitucional e, mais, se o instituto incide sobre situações nas quais a realização de licitação
seria viável, claro está que o art. 24 da Lei n° 8.666/93 deve ser
aplicado com o máximo de rigor e cautela, de modo a se evitar a
utilização indevida da autorização legal para fugir à realização da licitação.
Nesse caso, deve operar uma
das regras fundamentais da
hermenêutica: aquela que
determina que as exceções
sejam interpretadas restritivamente. Veja-se, assim, que é exatamente nessa linha que segue a jurisprudência desta Corte, bem como a doutrina, ao afirmarem que a enumeração constante do art.
24 da Lei de Licitações é exaustiva, não admitindo interpretação extensiva ou analogia. [...]
Em consequência dessa
restrição, uma determinada situação fática somente será
alcançada pela hipótese de dispensa de licitação se apresentar elementos que preencham perfeitamente os
requisitos estabelecidos na norma" (grifei).
Dentre inúmeras hipóteses, a
Lei n. 8.666/93 elencou em seu art. 24, inciso IV, a possibilidade de dispensa
de licitação “nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando
caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo
ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros
bens, públicos ou particulares”, como uma forma de respaldar o estado de
necessidade decorrente de situações gravosas observadas em uma localidade. Para
esses casos, é importante a apresentação de documentação que comprove a
situação emergencial, conforme preceitua o art. 26, parágrafo único, inciso I,
da Lei de Licitações.
Pois bem.
Conforme se extrai das
Tabelas 3 a 7 (fls. 639-643v) dispostas no relatório técnico final, houve a
realização de despesas com serviços de manutenção
e conservação de veículos no montante de R$ 13.715,50; aquisição de peças
para veículos no montante de R$
54.624,00; aquisição de ração animal
no montante de R$ 9.090,00;
aquisição de materiais de construção para
reforma de presídios no montante
de R$ 14.873,72; e aquisição de uniformes e calçados para servidores da Penitenciária Sul no
montante de R$ 15.695,00.
A maior parte dessas despesas
se deu através de dispensa de licitação calcada no Decreto Estadual n.
1.427/13, cujo texto declarou Situação de Emergência no Sistema Prisional do
Estado, autorizando a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania a contratar,
na forma do art. 24, inciso IV, da Lei n. 8.666/93, obras, bens e serviços
necessários ao atendimento da situação emergencial declarada.
É imperioso notar,
entretanto, que a mera declaração de situação de emergência não chancela toda e
qualquer contratação posterior por meio de dispensa, sob pena de se permitir a
supressão das disposições previstas na legislação nacional, cuja observância é
a regra, e não a exceção. Nesse contexto, cabe verificar se as premissas
fáticas de fato se amoldam às situações excepcionais previstas em lei.
Em seu relatório inicial, a
equipe de auditoria delineou as seguintes considerações (fl. 480):
[...] verificou-se que o Fundo não apresentou
elementos informativos, nem documentos comprobatórios que demonstram ter
ocorrido realmente a emergência com urgência, a simples emergência, não
dispensa a licitação, isto só acontece quando devidamente caracterizada a
emergência, o que não ocorreu no caso em análise.
O problema que se constatou é que o
Fundo Rotativo, na época oportuna, não observou a necessidade das aquisições
acima citadas.
A simples urgência não dispensa a licitação, ela
decorre do atraso com que foram tomadas as devidas medidas para as aquisições.
Além do mais o tempo decorrido entre
uma aquisição e outra, conforme demonstram os empenhos abaixo relacionados
descaracterizou o enquadramento da situação como caso de emergência,
acompanhada de urgência, que admitisse dispensa de licitação; pelo observado,
houve tempo mais que suficiente para realização do processo licitatório.
Também, é oportuno lembrar, que a gravidade
da situação do sistema prisional vem sendo declarada por meio de sucessivos
decretos estaduais, desde, ao menos, o ano de 2006 – Decreto nº. 4013, de 16 de
fevereiro de 2006 (estadual) – sendo que a última providência neste sentido se
limitou à autorização de dispensa de licitação para as aquisições da Secretaria
de Estado da Justiça e Cidadania, sem que se possa defluir a adequação desta medida
a uma situação de emergência que vem sendo reconhecida há, pelo menos nove anos.
O procedimento infringe a
Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, XXI e as disposições dos arts. 2º
e 3º da Lei Federal nº 8.666/93, em face da ausência de licitação para dar
suporte à realização de despesa pública, que deve consignar o montante a ser
gasto no exercício financeiro e estimado por meio de planejamento adequado que
abarque todo o período, conforme se depreende do disposto nos arts. 15, § 7º,
II e 57, caput, ambos da Lei Federal nº 8.666/93 (grifei).
De fato, o responsável, na
qualidade de Diretor da Penitenciária Sul, gestor do fundo e ordenador das
despesas, deveria ter melhor considerado toda essa conjuntura fática referida
pela equipe de auditoria antes de alocar recursos fiando-se tão somente na
permissão concedida pelo Decreto mencionado.
Notadamente no que diz
respeito às despesas com serviços de
manutenção e conservação de veículos, aquisição
de peças para veículos e aquisição de
uniformes e calçados para servidores,
entendo que essas se configuram como despesas correntes, regulares, rotineiras
e previsíveis, de modo que de maneira alguma se poderia enquadrá-las como
despesas albergadas em hipóteses de dispensa de licitação fundada em situação
emergencial.
No que se refere às despesas
com aquisição de ração animal, apesar de as justificativas apresentadas pelo
responsável se revestirem de um grau de subjetividade que, em tese, permitiria
considerar pela sua regularidade, impende observar que o valor dispendido (R$
9.090,00) excede aquele previsto pela análise combinada entre os arts. 24,
inciso II, e 23, inciso II, alínea “a”, da Lei n. 8.666/93, que preveem a
possibilidade de dispensa de licitação para compras de até R$ 8.000,00.
Ademais, considerando-se que a primeira nota de empenho data de 19.02.2013 e a
última, de 12.11.2013, verifica-se que houve tempo mais do que hábil para que
se procedesse ao devido procedimento para aquisição de ração, sendo
desnecessárias as sucessivas aquisições por meio de dispensa.
Por sua vez, no que tange às
despesas com aquisição de materiais de construção para reforma de presídios,
entendo que se pode considerá-las regulares, uma vez que o art. 24, inciso I,
c/c o art. 23, inciso I, alínea “a”, da Lei n. 8.666/93, permite que se
dispense a licitação para obras e serviços de engenharia até o montante de R$
15.000,00, de modo que os R$ 14.873,72 gastos revelam-se afetos ao limite legal
em comento.
Cabe esclarecer que a área
técnica, ao examinar as justificativas e documentos apresentados pelo
responsável, alterou seu entendimento original, considerando possível o
afastamento da penalidade de multa ao gestor sob o argumento de que a
documentação remetida teria comprovado os esforços empreendidos durante todo o
exercício de 2014 no sentido de regularizar a situação do Fundo Rotativo e
constituir a Comissão de Licitação.
Entretanto, entendo que tal
conclusão não pode ser extraída da precária documentação apresentada pelo
responsável.
Em primeiro lugar, as
despesas efetuadas são anteriores às medidas referidas, de modo que, caso se
pudesse acolher a sugestão da área técnica, os supostos esforços do gestor
teriam, na realidade, o condão de retroagir e afastar o caráter irregular das
despesas realizadas.
Em segundo lugar, considero
questionável o nível dos comprovados “esforços despendidos” pelo responsável no
sentido de sanar a situação observada. Conforme se pode observar dos documentos
anexados aos autos, tem-se uma singela troca de e-mails (fls. 598 e 604-605)
tratando acerca da realização de inscrição de servidores efetivos para
participação em cursos de capacitação[6].
Em que pese tais medidas
denotarem um interesse no sentido de capacitar servidores e melhor gerir o
quadro técnico-administrativo, entendo que não se revelam suficientes a ponto
de caracterizar uma efetiva orientação no sentido de privilegiar a licitação e
todas as suas características no âmbito da unidade gerida.
Portanto, do cotejo das
informações, documentos e justificativas apresentadas e analisadas neste item,
considero pertinente sugerir que seja mantida parcialmente a irregularidade, no
que diz respeito às despesas relacionadas nas Tabelas 3, 4, 5 e 7 do relatório
técnico final (fls. 639-643v), com a consequente aplicação de penalidade de
multa ao responsável, prevista no art. 70, inciso II, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000, observando-se a proporcionalidade entre esta e as
condutas praticadas.
1.3.
Veículos da Penitenciária Sul
e dos Presídios Regionais de Criciúma e Araranguá, trafegando sem identificação
e com placas frias, contrariando o art. 2º, § 3º, da Portaria Estadual n.
032/05, bem como o art. 5º da Lei Estadual n. 7.987/90 e a Lei n. 9.503/97
O item 4.1.2.2 da proposta de
encaminhamento e achado 3 do Relatório DCE n. 502/2014 apurou a existência de
onze veículos – pertencentes à Penitenciária Sul e aos Presídios Regionais de
Criciúma e Araranguá – trafegando sem identificação e com placas frias, em
contrariedade às legislações estadual e federal de regência.
A presente irregularidade
também foi atribuída à responsabilidade do Sr. Deiveison Querino Batista.
Em suas alegações de defesa,
o responsável argumentou (fl. 586) que o art. 116 do Código de Trânsito
Brasileiro estabelece que os veículos de propriedade da União, dos Estados e do
Distrito Federal, devidamente registrados e licenciados, somente quando
estritamente usados em serviço reservado de caráter policial, poderão usar
placas particulares, obedecidos os critérios e limites estabelecidos pela
legislação que regulamenta o uso de veículo oficial.
Comentou (fl. 586) que tal
dispositivo deveria ser interpretado teleologicamente, perquirindo-se qual a
razão de a lei restringir a possibilidade de caracterização das placas dos
veículos de propriedade dos entes federativos reservados ao serviço policial.
Respondeu, em seguida, que a razão se liga à natureza e aos riscos da
atividade, não sendo racional que a lei exigisse a identificação dos veículos
utilizados por autoridades incumbidas de realizar investigações.
Sob tal contexto, explicou
(fl. 587) que o Departamento Estadual de Administração Prisional (DEAP) e suas
unidades prisionais exercem trabalho de extrema periculosidade, seja pelas
tentativas de fuga frequentes e de resgate de presos, seja pelas organizações
criminosas atuantes dentro e fora do cárcere. Aduziu que:
Os veículos descaracterizados e com placas
particulares estão destinados ao núcleo de inteligência penitenciária desta
unidade que é órgão integrante da Diretoria de Inteligência e Informação da SJC
e ao uso de veículos batedores, bem como ao uso em serviço, dentro das
atividades inerentes ao cargo, do Diretor da penitenciaria e do chefe de
segurança.
Os veículos batedores são utilizados quando de
transferências de presos pertencentes às facções criminosas bem como ao
encaminhamento destes para as audiências em que são réus.
Saliente-se que a escolta de presos
e todo o serviço de apoio é feito pelas unidades penitenciárias e não mais pela
Polícia Militar.
Ocorre que dentre os veículos auditados apenas
um utiliza placa de segurança conforme segue:
Presídio de Araranguá: Uno Mille Fire Placa MBT
4373, nunca utilizou placa de segurança; Meriva Placa MEP0852, já utilizou
placa de segurança, porém em razão da expiração de prazo de validade esta
utilizando placa oficial e Parati Placa MJT 5671, está aguardando renovação de
autorização de placa de segurança, conforme documentos em anexo.
Presídio de Criciúma: Corsa Placa MEA6461 e
Ducato Placa MBS 6885, os veículos já foram baixados da frota do Presídio.
Penitenciária Sul: Zafira Placa DJR 8002, Uno
MBT 4393 e Blazer MCJ 8781, nenhum dos citados veículos utilizam placas frias,
todos utilizam placas oficiais, bem como já solicitamos baixa do veículo Zafira
da frota de veículos da Penitenciária Sul.
Posteriormente, o responsável
asseriu (fl. 587) que o Presídio de Araranguá, que exerce a administração da
justiça criminal, teria requerido a descaracterização das placas de alguns
veículos oficiais, fundamentando-se na necessidade de resguardar a segurança
dos presos em transferências e audiências. Nesse sentido, o responsável afirmou
(fl. 588) não visualizar qualquer afronta legal ou imoralidade administrativa
nos atos examinados.
Ao final, o responsável
atestou (fl. 588) que foi no contexto referido que o DETRAN/SC, no uso de suas
competências, teria autorizado a utilização de placas particulares pelos
veículos relacionados na auditoria procedida, alegando que o mesmo raciocínio
deveria ser aplicado para os veículos não identificados com a logomarca do
Estado.
De
fato, ao compulsar a legislação, encontra-se a exceção à utilização de
identificação particular em veículos destinados a serviços policiais, a teor do
disposto no art. 5º da Lei Estadual n. 7.987/90:
Art. 5º Os veículos oficiais do
Estado devem, obrigatoriamente, serem identificados como tal, mediante
aposição, em local visível, de seu número de ordem e do órgão a que servem.
§ 1º Os veículos de representação
serão identificados apenas pelas respectivas placas.
§ 2º Ressalvada a hipótese prevista
no § 3º deste artigo, e expressamente vedada a identificação de veículos
oficiais como particulares.
§ 3º Excetuam-se das disposições
deste artigo os veículos utilizados pelas Polícia Civil e Militar,
exclusivamente, em atividades de segurança que exijam absoluto sigilo.
(grifei)
De
igual modo, disciplina o art. 116 do Código de Trânsito Brasileiro:
Art. 116. Os veículos de propriedade
da União, dos Estados e do Distrito Federal, devidamente registrados e
licenciados, somente quando estritamente usados em serviço reservado de caráter
policial, poderão usar placas particulares, obedecidos os critérios e limites
estabelecidos pela legislação que regulamenta o uso de veículo oficial.
Dessa
maneira, perante o arcabouço normativo e a autorização concedida pelo DETRAN/SC
para o uso das placas com identificação particular, entendo que a restrição
deve ser afastada.
1.4.
Irregular cálculo dos valores
devidos aos reeducandos em razão de serviços prestados, afrontando os arts. 1º
e 2º do Decreto Estadual n. 1.634/00, o art. 29 da Lei de Execuções Penais, e o
art. 7º, inciso IV, da CRFB/88
O item 4.1.3.1 da proposta de
encaminhamento e achado 4 do Relatório DCE n. 502/2014 apurou a realização de
trabalho por parte dos reeducandos sem a devida remuneração, bem como a
ausência de regulamentação específica acerca dos valores concedidos pelo
trabalho dos detentos.
Foram apontados como
responsáveis pela irregularidade os Srs. Deiveison Querino Batista, Leandro
Antônio Soares Lima e Arlindo Pagnan.
O responsável Deiveison Querino Batista argumentou
(fl. 588) que, ante a ausência de fatores críticos/graves motivadores da quebra
de mudança no comportamento do gestor que adentra o ambiente, o trâmite
funcional deveria ser mantido até o conhecimento de toda a rotina
administrativa. Salientou que essa conduta seria um “comportamento propagado
pelos teóricos da gestão administrativa, sendo senso comum em todas as obras
que tratem de administração pública/privada”.
Nessa medida, explicou (fls.
588-589) ser hábito corriqueiro de toda as unidades – e por “total
desconhecimento do entendimento do Sr. Juiz Corregedor” – não praticar o devido
pagamento no importe de R$ 1,00/dia, alegando, contudo, não ter havido em
momento algum má-fé de sua parte, afirmando tratar-se de valor irrisório.
Acerca do valor previsto, o
responsável decidiu (fl. 589) “passar ao largo desta discussão jurídica” em
função de a diária ser fixada por decreto do Governador do Estado, de modo que
não teria competência para desrespeitar a norma atacada sem incidir em ofensa
direta ao princípio da legalidade.
Ao final de suas alegações,
quanto aos valores dos trabalhos dos detentos sem regulamentação específica,
esclareceu (fl. 589) ser exigido mensalmente um número fixo de dúzias de
prendedores de roupas que, se atingido, resulta na concessão do benefício da
remição de pena do mês de referência, concedido pelo juízo da execução penal da
comarca.
O responsável Leandro Antônio Soares Lima,
inicialmente, manifestou (fl. 549) sua ilegitimidade para discorrer acerca da
questão procedimental da matéria discutida, sob a justificativa de que a
discussão estaria além de suas competências.
Em seguida, alegou (fls.
550-551) a ausência de elementos de ação/omissão jurídica, bem como culpa/dolo
e relação de causalidade, reiterando em parte as justificativas mencionadas
anteriormente no item 1 deste parecer, no sentido de que a atividade
administrativa desconcentrada realizada pelo DEAP se resumiria ao trato
operacional, mas tão somente no que diz respeito à Lei de Execuções Penais,
sendo que a atividade de cunho administrativo e técnico, exercida nas unidades
operacionais, competiria diretamente à Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania nos seus níveis de direção estratégica e gerencial.
Nessa trilha, alegou (fl.
551) que a responsabilidade pelo planejamento, formulação e normatização das
políticas públicas para o sistema prisional catarinense pertenceria à
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, por meio de suas diretorias. Em
síntese, o responsável buscou atribuir toda a responsabilidade pela
irregularidade em exame à SJC (fls. 551-552).
Por sua vez, o responsável Arlindo Pagnan manifestou-se (fls.
571-572) nos mesmos termos em que o Sr. Deiveison Querino Batista, conforme já
reproduzido acima.
Antes de adentrar o mérito da
irregularidade, impende salientar que a matéria sob análise já foi objeto de
discussão em processo análogo[7].
Naquela oportunidade, manifestei-me por meio do Parecer n. MPTC/43527/2016,
tecendo as considerações iniciais que passo a reproduzir em seguida:
O achado de auditoria teve por base a Lei
Estadual n. 5.455/78 e o Decreto Estadual n. 1.634/00, que assim disciplinaram
a remuneração do trabalho executado pelos sentenciados:
Lei Estadual n. 5.455/78:
Art. 2º Constituem recursos financeiros do
Fundo: [...]
II – os resultantes da prestação de serviços e
da revenda de mercadoria; [...]
IV – as receitas oriundas de convênios
celebrados entre o Estado e instituições públicas e privadas, cuja execução
seja da competência da Secretaria da Justiça.
Decreto Estadual n. 1.634/00:
Art. 1º O valor do trabalho executado por
sentenciado dentro dos estabelecimentos penais do Estado de Santa Catarina é
fixado em R$ 1,00 (um real) a diária, sendo que, para os serviços conveniados
realizados pelos detentos a remuneração poderá chegar ao valor de até 1 (um)
salário mínimo, não podendo ser inferior a ¾ (três quartos) do mínimo, conforme
disciplina a Lei de Execuções Penais.
Art. 2º Do produto da remuneração do detento
será destinado o percentual de 25% (vinte e cinco por cento) a título de
ressarcimento ao Estado.
Além dessas normas, são utilizados como
parâmetros para definição da remuneração dos serviços prestados pelos apenados
a Constituição Federal, a Lei de Execuções Penais e a Lei Complementar Estadual
n. 529/2011, que dentre seus dispositivos contêm a seguinte previsão:
CRFB/88:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...]
IV – salário mínimo, fixado em lei,
nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e
às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário,
higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe
preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.
Lei n. 7.210/84:
Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia
tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.
§ 1° O
produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que
determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a
manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação
prevista nas letras anteriores.
Lei Complementar Estadual n. 529/2011:
Art. 52. O trabalho do preso será
remunerado mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três quartos do
salário-mínimo regional, qualquer que seja o seu tipo ou categoria.
Em que pese o tratamento legal dado à matéria, não há na Unidade a
regulamentação da renda paga aos apenados mediante uma prévia tabela de valores
[...].
Percebe-se, portanto, que o
contexto fático e a legislação aplicável naqueles autos são em grande medida
coincidentes com a presente discussão, de modo que se afigura plausível a
adoção, em parte, das mesmas considerações e conclusões então externadas. Na
oportunidade em tela, entendi ser suficiente a determinação para que a Unidade
Gestora e a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania adotassem medidas
direcionadas à alteração da legislação regente no que se refere à
regulamentação do trabalho dos apenados.
Cabe esclarecer, nesse ponto,
que o processo ora adotado como parâmetro já foi inclusive objeto de julgamento
pelo Tribunal Pleno, tendo sido exarada a Decisão n. 0306/2017, publicada no
Diário Oficial Eletrônico do Estado n. 2195, de 07.06.2017, cujo item 6.4.2
recomendou à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania a realização de estudos visando à adequação da legislação estadual
relacionada à regulamentação dos serviços realizados pelos apenados,
estabelecendo-se critérios objetivos para cálculo dos valores devidos aos
detentos em razão de serviços prestados nas unidades prisionais.
Trata-se de solução que se
coaduna com o entendimento adotado pela área técnica nestes autos (fl. 648v),
de modo que reputo – em igual medida – ser suficiente a determinação à Unidade
Gestora e à SJC para que adotem providências no sentido de realizar estudos
visando à adequação da legislação estadual relacionada à regulamentação dos
serviços realizados pelos apenados, estabelecendo-se critérios objetivos para
cálculo dos valores devidos aos detentos em razão de serviços prestados nas
unidades prisionais.
1.5.
Ausência de ressarcimento de
despesas de energia elétrica e água realizadas por empresas conveniadas, em
desacordo com o art. 2º, inciso IV, da Lei Estadual n. 5.455/78, e com o art.
37 da CRFB/88
O item 4.1.4.1 da proposta de
encaminhamento e achado 5 do Relatório DCE n. 502/2014 constatou que as
despesas de energia elétrica e de água geradas por todas as empresas
conveniadas, instaladas dentro da estrutura da Penitenciária Sul, estariam
sendo suportadas pelo Estado sem que houvesse o necessário reembolso pelas
empresas, importando em seu enriquecimento ilícito em prejuízo do erário,
infringindo os princípios constitucionais da legalidade e da eficiência.
Foram apontados como
responsáveis os Srs. Leandro Antônio Soares Lima, Deiveison Querino Batista,
Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca.
O responsável Leandro Antônio Soares Lima, em suas
alegações de defesa, qualificou (fl. 553) o presente apontamento como fruto de
“atividade cognitiva conduzida unicamente por pura lógica dedutiva de obtuso
viés”, a qual não teria evidenciado “a necessária presença da existência dos
elementos ação/omissão antijurídica, culpa/dolo e relação de causalidade”.
Argumentou (fl. 553) que o
ônus de sua responsabilidade adveio das atribuições que lhe eram conferidas no
exercício da função ocupada, porém salientando que não detinha competência
alguma para exigir qualquer cobrança de tarifas de energia elétrica e água às
empresas conveniadas. Nesse sentido, asseriu (fls. 553-554) que a competência
para assinar contratos, convênios, acordos e outros atos administrativos, de
acordo com a Lei Complementar Estadual n. 381/2007, seria do Secretário de
Estado (no caso, do Secretário de Estado da Justiça e Cidadania).
Sob este aspecto, esclareceu
(fl. 554) que a chancela por ele dada aos convênios realizados entre a SJC e os
particulares seria juridicamente irrelevante, configurando mera práxis administrativa. Por fim, concluiu
que, ante a inexistência de ação/omissão de sua parte, a imputação de
responsabilidade não deveria permanecer.
O responsável Deiveison Querino Batista afirmou (fls.
589-590) que lhe fora imputada responsabilidade unicamente em função de figurar
como Diretor da Penitenciária Sul e, consequentemente, acumular a função de
gestor do Fundo Rotativo da unidade prisional. Por tal razão, reputou o
apontamento da auditoria como emanado de “dedução equivocada”, sem comprovação
de qualquer ação ou omissão de sua parte.
Relativamente a tal fato,
alegou (fl. 590) não deter competência alguma para exigir qualquer cobrança das
tarifas de energia elétrica e água dos conveniados. Embasou suas assertivas nas
disposições contidas nos arts. 6º e 7º da Lei Complementar Estadual n.
381/2007, concluindo (fl. 591) que a responsabilidade imputada não deveria
permanecer, enfatizando, ao final, que os convênios celebrados com empresas
privadas não estabeleceriam quaisquer cláusulas que permitissem a cobrança de
taxas inerentes às despesas com água e energia, conforme contido no termo de
cooperação que foi anexado.
Os responsáveis Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca, conforme já referido mais de uma vez,
apesar de regularmente notificados acerca dos termos processuais, não
apresentaram quaisquer manifestações de defesa, sujeitando-se aos efeitos da
revelia dispostos no art. 15, § 2º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.
Quanto à questão da
responsabilização, ainda que o art. 7º da Lei Complementar Estadual n. 381/2007
disponha expressamente acerca da competência atribuída aos Secretários de
Estado para “assinar contratos, convênio, acordos e outros atos administrativos
bilaterais ou multilaterais de que o Estado participe”, os termos de cooperação
inseridos na documentação de fls. 400-470 contêm também as assinaturas dos
responsáveis, enquanto ocupantes dos cargos de Diretor do Departamento de
Administração Prisional e da Penitenciária Sul.
Ademais, na condição de Diretores, os então gestores
enquadravam-se exatamente no conceito de responsáveis “por dinheiros, bens e
valores da administração direta e indireta”, consoante inclusive a seguinte
norma da Resolução n. TC-06/2001 (Regimento Interno dessa Corte de Contas):
Art.
133. Em todas as etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de
atos sujeitos a registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada
aos responsáveis ou interessados ampla defesa.
§
1º Para efeito do disposto no caput, considera-se:
a) responsável
aquele que figure no processo em razão da utilização, arrecadação, guarda,
gerenciamento ou administração de dinheiro, bens, e valores públicos, ou pelos
quais o Estado ou o Município respondam, ou que, em nome destes assuma
obrigações de natureza pecuniária, ou por ter dado causa a perda, extravio, ou
outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário; (grifei)
Tal entendimento é
corroborado pelas ponderações trazidas pela área técnica (fl. 649v):
Contudo, deve-se atentar que a responsabilidade
não se materializa unicamente à assinatura do instrumento legal firmado. Como
responsáveis pelas unidades prisionais, os gestores devem primar pela boa
aplicação dos recursos públicos, e buscar junto à Secretaria providências para
adequar os convênios à legislação de regência.
Não obstante tais
considerações, um exame mais detido do caso concreto em cotejo com decisões
proferidas em processos análogos permite vislumbrar solução alternativa.
Nos autos do processo RLA n.
14/00442211, já mencionado acima, o auditor Cleber Muniz Gavi, Relator do caso,
ao proferir seu voto sobre matéria similar, delineou o seguinte entendimento:
Volvendo
a atenção para o caso concreto, ainda que presente indícios de que as despesas
com energia elétrica e água, realizadas pelas empresas conveniadas,
devessem ser ressarcidas ao Estado, destaco que os documentos juntados nos
autos não permitem identificar com a precisão necessária qual o valor
despendido e, em tese, passível de ressarcimento. Ante a inexatidão material
das mencionadas despesas, não há liquidez e certeza acerca do montante que
pudesse constituir eventual débito ou mesmo avaliar a gravidade da restrição
ora considerada.
Destarte,
em que pese a discordância do órgão ministerial, acompanho o convencimento
exarado pela área técnica, no sentido de afastar a aplicação de
penalidade, sendo suficiente uma recomendação à Secretaria de Estado da Justiça
e Cidadania para que adote providências para revisão dos convênios firmados e
inclua cláusulas de ressarcimento das despesas com energia elétrica e água
consumidas pelas entidades conveniadas dentro das unidades prisionais
(grifei).
Levando em consideração a
grande similaridade entre as matérias discutidas, tanto sob o aspecto fático
quanto legal, considero plausível a adoção da mesma conclusão em comento.
Dessa maneira, apesar da
configuração da situação irregular, entendo suficiente a sugestão de
recomendação à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania para que adote
providências voltadas à revisão dos convênios firmados e inclua cláusulas de
ressarcimento das despesas com energia elétrica e água consumidas pelas
entidades conveniadas dentro das unidades prisionais.
1.6.
Ausência de conta bancária
individualizada – Caderneta de Poupança – dos detentos, em desacordo com o
previsto no art. 4º, § 5º, da Lei Estadual n. 14.410/08, nos arts. 52, § 2º, e
102 da Lei Complementar Estadual n. 529/2011, bem como no art. 41, inciso IV,
da Lei de Execuções Penais
O item 4.1.5.1 da proposta de
encaminhamento e achado 6 do Relatório DCE n. 502/2014 verificou a ausência de
contas individualizadas (cadernetas de poupança) com a finalidade de formação
de Pecúlio Prisional, atualizando os valores economizados e mantendo o poder de
compra, violando, dessa maneira, direito expresso dos presos, conforme previsto
no art. 41, inciso IV, da Lei de Execuções Penais.
Foram apontados como
responsáveis os Srs. Leandro Antônio Soares Lima, Deiveison Querino Batista,
Arlindo Pagnan, Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca.
O responsável Leandro Antônio Soares Lima admitiu
(fl. 556) ser indubitável que a legislação usada como referência no presente
achado deixa clara a necessidade de constituição de pecúlio prisional por meio
de uma caderneta de poupança. Informou que a ausência de conta individualizada
para os condenados seria um problema de todos os Fundos Rotativos
Penitenciários do Estado, ponderando que a solução passaria por um tratamento
uniforme em todo o sistema penal catarinense, via Secretaria de Estado de
Justiça e Cidadania.
Manifestou (fl. 556) entender
que a competência para celebração de contrato, convênio, acordo ou outro ato
administrativo bilateral ou multilateral com instituição bancária oficial do
Estado seria do Secretário de Estado, isso quando não exigida a chancela do
Governador. Novamente, transcreveu (fls. 556-557) os arts. 6º e 7º da Lei
Complementar Estadual n. 381/2007.
Nesse sentido, reiterou os
argumentos já relatados em itens anteriores, pelos quais alegou que a
responsabilização estaria além de suas atribuições, bem como de que a atividade
desempenhada pela DEAP se resumiria ao trato operacional, concluindo (fl. 558)
que, em última análise, a responsabilidade recairia sobre a Secretaria de
Estado da Justiça e Cidadania, através de sua Diretoria de Planejamento e
Avaliação, por intermédio da Gerência de Planejamento, Orçamento e Convênios.
Os Srs. Arlindo Pagnan e Deiveison
Querino Batista se manifestaram, em síntese, nos mesmos termos em que já
referido, conforme se observa em suas respectivas alegações de defesa às fls.
572-574 e 591-593, acrescentando que a falta de controle objeto da presente
análise já fora alvo de Auditoria Interna realizada pela Secretaria de Estado
da Fazenda de Santa Catarina, por meio da Diretoria de Auditoria Geral.
Esclareceram que, no intuito de padronizar os procedimentos, estaria sendo
iniciado um projeto piloto na Unidade de Florianópolis, cujas características
permitiriam geração de informações com qualidade, relevância e transparência,
podendo dar melhor suporte à contabilidade a fim de evidenciar os atos de
gestão envolvidos no processo de pagamento de pecúlios aos condenados.
Os responsáveis Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca, conforme já exaustivamente exposto, apesar
de regularmente notificados acerca dos termos processuais, não apresentaram
quaisquer manifestações de defesa, sujeitando-se aos efeitos da revelia
dispostos no art. 15, § 2º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.
Conforme disposto pelo
art. 102 da Lei Complementar Estadual n. 529/2011, o pecúlio prisional
corresponde ao saldo financeiro resultante da dedução das despesas atinentes à
indenização pelos danos causados e manutenção carcerária sobre a remuneração
pelo trabalho do apenado.
Em igual sentido, dispõe
a Lei de Execuções Penais:
Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante
prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.
§ 1° O produto da remuneração pelo
trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que
determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
b) à assistência à família;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a
manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação
prevista nas letras anteriores.
§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte
restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será
entregue ao condenado quando posto em liberdade (grifei).
Essa soma deveria ser
guardada de forma individualizada em caderneta de poupança para manutenção de
seu poder de compra até sua disponibilização para o preso ao final da pena,
como forma de garantir sua segurança econômica e obstar a reincidência
criminal.
Dessa forma, verifica-se que
a omissão por parte dos responsáveis enseja a possibilidade de manifesto
prejuízo aos detentos.
No entanto, diante da
magnitude da problemática enfrentada quando se descortina o panorama em que
inserida, afigura-se temerário atribuir total responsabilidade aos gestores,
desconsiderando-se justamente o grau de dificuldade da tarefa a ser
empreendida, somada ao fato de que há evidentes medidas sendo tomadas no
sentido de resolução da questão.
Mais uma vez a adoção dos
autos RLA n. 14/00442211 a título de processo paradigma vem a calhar, na medida
em que a problemática enfrentada naquele processo diz respeito à situação
verificada na Penitenciária de Florianópolis, tornando-se perceptível que a
necessária solução perpassa por um rol de medidas que abranjam todo o sistema
penitenciário e prisional do Estado de Santa Catarina.
Nessa medida, imprescindível
atentar para as considerações apostas pelo voto do Relator, Cleber Muniz Gavi,
nas quais pondera a questão em cotejo com suas causas e consequências,
inclusive citando exemplo prático. Veja-se:
Diante
desse quadro, considerando as
dificuldades práticas para regularização da falha identificada e não havendo
nos autos informações que retirem a credibilidade das alegações da defesa,
entendo não ser possível identificar total omissão por parte dos gestores.
Trata-se, sem dúvida, de um problema de complexa solução,
não havendo, por exemplo, como esta Corte de Contas compelir o Banco do Brasil
ou qualquer outra instituição financeira a proceder à abertura de contas de
poupança para os detentos, o que tem sido o principal entrave, conforme noticiado pela
Diretoria da Penitenciária de Florianópolis.
No entanto, a despeito de todas as dificuldades apontadas, é
imperioso que a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania dê continuidade às
tentativas para abertura de contas individualizadas, por constituir esta uma obrigação estatuída pela
Lei de Execuções Penais e pela Lei Estadual n. 14.410/2008.
Aliás, a
constatação de falhas contábeis na evidenciação dos recursos depositados nas
contas bancárias destinadas à remuneração dos detentos, conforme abordado no
item II.12 deste voto, revela que a
rotina atualmente adotada constituiu um fator de grande risco para os próprios
gestores do Fundo Rotativo, que podem vir a responder por eventuais
inconsistências na conta destinadas à remuneração dos detentos.
Segregar manualmente, a partir de uma única conta bancária global, o valor
devido a cada detento (inclusive considerando o reajuste e os juros da
poupança), constitui tarefa extremamente complexa e passível de erros.
E não se
trata de mera cogitação. No Estado do Rio Grande do Sul, semelhante prática
levou descontrole dos valores devidos aos reclusos, o que deu causa a
instauração de um inquérito civil público pelo Ministério Público estadual.
Para conhecimento, transcreve-se abaixo o teor da notícia publicada na internet,
na data de 04.01.2016, pelo Jornal Zero Hora:
“Procuram-se apenados
que seriam donos de R$ 8 milhões
Susepe se perde na
contabilidade das contas-pecúlio e Ministério Público investiga irregularidade
O descontrole nas cadeias gaúchas
não se resume à falta de vagas. A Superintendência dos Serviços Prisionais
(Susepe) se perdeu na contabilidade das contas-pecúlio de apenados. Presos
ganharam dinheiro a mais, outros ficaram sem receber e existem R$ 8 milhões que
não se sabe a quem pertencem.
Um inquérito civil público aberto
pelo Ministério Público (MP) investiga a irregularidade e tenta localizar os
donos do dinheiro ou, em caso de morte, seus herdeiros. Estimativa da
Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado indica que são milhares de
beneficiários, grande parte com direito a receber valores irrisórios de até R$
10, mas há casos de quantias mais polpudas como R$ 20 mil.
O preso trabalhador tem retido 20%
do ganho em uma poupança, a conta-pecúlio, cujo valor ele pode sacar ao final
da pena. Essa deveria ser a regra, mas até o início de 2014, não vinha sendo
respeitada. Os recursos ingressavam no sistema contábil da Susepe e até
estagiários tinham acesso.
Eles podiam alterar valores que
seriam repassados aos presos, sem que o sistema registrasse o nome de quem fez
a operação, assim como não havia condições de rastreamento. Quantias diminuíam
ou aumentavam sem qualquer controle.
O resultado disso foi uma balburdia
financeira, com duplicidade de correção em alguns casos, permitindo saques
indevidos que somaram R$ 817 mil, segundo aponta o inquérito civil do MP. Em
contrapartida, de outros apenados o dinheiro sumiu, ficando com saldo negativo.
Auditoria do Tribunal de Contas do Estado apontou a irregularidade.
– O preso trabalha na expectativa de
ter uma poupança e quando tem direito a ela, descobre que não tem nada –
lamenta o juiz-corregedor Alexandre de Souza Costa Pacheco.
O mecanismo de
gerenciamento dos pecúlios foi modificado pela Susepe em abril de 2014, criando
contas individuais para cada preso, com indicação de número de CPF e melhorando
a segurança no controle das verbas. Mas, mesmo assim, ainda há problemas de
gestão nas contas.
– É um sistema muito burocrático. O
dinheiro passa por vários órgãos antes da liberação aos presos, demorando de
três a seis meses – afirma Pacheco.
Em novembro, uma reunião entre
juízes, promotores, representantes do Banrisul e da Susepe discutiu o assunto
sem chegar a um consenso. Por causa desses problemas, o Conselho de Supervisão
dos Juizados de Execução Penal (Consep) do TJ decidiu que magistrados poderão
suspender o recolhimento dos 20% para poupança, autorizando que os presos
recebam salário integral a cada mês. Na Vara de Execuções Criminais (VEC) de
Porto Alegre, essa medida será adotada a partir deste mês.
O que é
A conta-pecúlio é prevista no artigo
29 da Lei de Execução Penal que abrange a remuneração do trabalho prisional.
Determina que uma parcela do valor pago ao preso seja reservada a um pecúlio,
em caderneta de poupança, para ser entregue a ele quando obtiver a liberdade.
As empresas que contratam presos no
Rio Grande do Sul repassam 20% do salário para a Susepe, que depois transfere
para o Banrisul. Quando termina de cumprir a pena, o preso é autorizado a sacar
o dinheiro para recomeçar a vida fora da cadeia.
A falha
Por erros de gestão, a Susepe perdeu
o controle sobre as contas, permitindo saques a mais por alguns presos e
deixando outros com saldo a menos e até negativo, além de não saber a quem
pertencem R$ 8 milhões.
O problema ganhou maior dimensão à
medida que a Susepe cada vez menos atende às necessidades nas cadeias, como
roupas, calçados, materiais de higiene e medicamentos, forçando o Judiciário a autorizar
saques não só para os detentos que ganharam liberdade, mas também para presos
trabalhadores ainda encarcerados.
O que diz a Susepe
Por meio da assessoria de
comunicação, a superintendência informou que se manifestaria a partir desta
segunda-feira.”
(Fonte:
http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2016/01/procuram-se-apenados-que-seriam-donos-de-r-8-milhoes-4943494.html)
Os fatos noticiados são suficientemente representativos dos
riscos inerentes ao sistema de controle atualmente adotado pelos Fundos
Rotativos Prisionais de Santa Catarina. Além disto, é possível identificar que posteriormente o Estado
do Rio Grande do Sul logrou êxito na abertura de contas individuais para cada
preso, sendo este, portanto, um referencial para que a Secretaria de Justiça e
Cidadania procure regularizar a situação no nosso Estado, o que será objeto de
determinação.
Considerando que a
determinação sugerida pelo Relator foi acolhida pelo Pleno por meio do item
6.2.2 da Decisão n. 0306/2017, proferida no processo RLA n. 14/00442211,
entendo pela determinação à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania para
que adote providências imediatas visando à abertura de contas correntes
individualizadas para o depósito do pecúlio dos detentos, em atendimento à
legislação de regência.
1.7.
Ausência de evidenciação
contábil dos recursos depositados em contas correntes bancárias destinados às
remunerações dos detentos, em afronta aos arts. 85 e 89 da Lei n. 4.320/64, bem
como ao art. 6º da Resolução n. 750/93 do Conselho Federal de Contabilidade,
alterada pela Resolução n. 1.367/11 do Conselho Federal de Contabilidade
O item 4.1.6.1 da proposta de
encaminhamento e achado 7 do Relatório DCE n. 502/2014 verificou que os
recursos recebidos pelo Fundo Rotativo da Penitenciária Sul eram depositados
pelas entidades conveniadas ao Fundo diretamente em contas correntes bancárias
específicas, sem os necessários registros contábeis, em ofensa aos arts. 85 e
89 da Lei n. 4.320/64, bem como ao princípio da oportunidade, insculpido no
art. 6º da Resolução do Conselho Federal de Contabilidade n. 750/93.
Foram apontados como
responsáveis os Srs. Deiveison Querino Batista, Soraya Costa Elias e Everaldo
Elias Vieira.
O responsável Deiveison Querino Batista alegou (fl.
593) que “elimina-se a responsabilidade e a posse do Fundo sobre tais
compromissos nos registros contábeis, por meio dos lançamentos a crédito nas
contas ora citadas”, uma vez que configurariam contas do setor de pecúlio de
cada unidade, sendo destinadas única e exclusivamente ao depósito de pagamento
pelos serviços prestados pelos apenados.
Informou, ainda, que o
depósito de 75% já era estipulado no termo de cooperação com as empresas, não
se confundindo com o valor do Fundo, concluindo que a imputação não prospera,
face à previsão contratual para que os valores destinados aos apenados fossem
devidamente depositados nas contas informadas pela auditoria.
O responsável Everaldo Elias Vieira frisou,
inicialmente (fl. 516), que a contabilidade de todos os Poderes e Órgãos
Estaduais é efetuada por meio do Sistema Integrado de Planejamento e Gestão
Fiscal (SIGEF), que é o sistema oficial de planejamento, orçamento, finanças e
contabilidade do Estado de Santa Catarina. Desse modo, em função de a
contabilidade estar atrelada ao SIGEF, todos os registros contábeis
(automáticos/manuais) seriam realizados por meio de informações presentes no
sistema.
Em seguida, traçou as
seguintes explicações pormenorizadas do funcionamento do sistema de registros
(fls. 516-521):
No caso em tela, a contabilidade evidencia 25%
dos recursos recebidos, que são depositados na conta arrecadação do Fundo
Rotativo Sul pelas entidades conveniadas. A partir do ingresso destes recursos
na conta arrecadação a contabilidade passará a evidenciar os atos de gestão que
dependam de execução orçamentária e financeira que é controlada e evidenciada
pelo SIGEF.
Os 75% dos recursos restantes, que competem aos
detentos com a finalidade de ressarcimento dos trabalhos realizados, são
depositados diretamente nas contas pecúlio pelas entidades conveniadas.
Acontece que os domicílios bancários citados no
item 2.7 do Relatório 502/2014, não são controlados pelo SIGEF. Ou seja, a
movimentação nestas contas não é realizada através de execução orçamentária e
financeira no SIGEF, nem transita de forma extra orçamentária no SIGEF.
Os domicílios bancários referentes às contas
pecúlio são abertos pelo Banco do Brasil no CNPJ do Fundo Rotativo, atrelados
ao cadastro de um gestor com poderes para movimentá-la, geralmente, o
responsável pelo setor de pecúlio dos fundos rotativos. A movimentação na conta
pecúlio ocorre sem passar pelos processos de execução orçamentária e financeira
do órgão.
Neste caso, como os 75% dos recursos não
transitam pela conta arrecadação do fundo, não há de se falar em evidenciação
contábil destes valores como Ativo – Caixa ou equivalente de caixa e Passivo –
Obrigações.
A partir do momento que os 75% dos recursos
transitarem pela conta arrecadação do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul, à
contabilidade passará a evidenciar a entrada dos recursos como um Ativo – Caixa
ou equivalente de Caixa e a contrapartida como Receita para posterior
empenhamento (execução orçamentária) ou – dedução da receita – para
transferência destes recursos para as contas pecúlio, dependendo na
padronização dos procedimentos que forem adotados pela Secretaria de Estado da
Justiça e Cidadania já que hoje não existe padronização alguma.
Contudo, no passado, em alguns fundos rotativos,
houve uma tentativa da contabilidade em registar a movimentação das contas
pecúlio – independentemente destes recursos transitarem ou não pela conta
arrecadação – com o objetivo de demonstrar o saldo do passivo do Fundo Rotativo
para com os detentos, porém os registros, principalmente os referentes à saída
dos recursos, não apresentavam suporte documental. Em alguns Fundos, inclusive,
a contabilidade não tinha acesso aos extratos bancários.
Nesse caso, a contabilidade evidenciava, além do
que já se registra atualmente, o saldo das contas pecúlios como um Passivo -
Depósito Diversas Origens - DDO.
O saldo em DDO evidencia que o Estado recebeu
por algum motivo o recurso, mas atua apenas como depositário, tendo que em um
momento futuro devolver o recurso para o beneficiário, neste caso, o detento.
Porém, tal registro não era revestido de confiabilidade e tempestividade,
tampouco agregava qualidade da informação contábil, visto que:
a) a movimentação das contas pecúlio não é
realizada por meio de execução orçamentária e financeira, tampouco com
documento emitido pelo SIGEG;
b) o contador, na maioria das vezes, não recebia
os extratos bancários, e mesmo quando recebia em tempo hábil, os extratos
bancários para efetuar o lançamento dos saldos, o mesmo não apresentava
informação suficiente para respaldar os lançamentos;
c) os extratos bancários evidenciam apenas
entradas e saídas de recursos, não demonstram os credores, tampouco os
favorecidos em cada pagamento;
d) pelo fato do gestor da conta possuir poderes
para movimentá-la, uma saída de recurso demonstrada no extrato poderia ser
referente ao pagamento de um, de vários ou até mesmo de nenhum detento.
e) para se obter o saldo da conta como DDO era
preciso lançar todas as entradas de recursos, presumindo que se referiam aos
depósitos das empresas conveniadas, e em seguida proceder ao estorno do DDO com o somatório das saídas no período,
presumindo também, que se referiam ao pagamento dos detentos, ou seja, uma mera
movimentação contábil sem documentação hábil;
f) com o valor do saldo remanescente da conta de
passivo - DDO, não se tem a informação individualizada do valor devido a cada
detento.
Portanto, por falta de documentação hábil, a
diretoria de Contabilidade Geral em conjunto com os contadores responsáveis
pelos Fundos Rotativos, decidiram por não mais realizar tal procedimento, até
que houvesse mudanças nos procedimentos que permitissem homogeneidade e
fidedignidade das informações.
Considerando que para proceder ao registro na
contabilidade de um fato é necessário que ele seja confiável e tempestivo
(oportuno), como o contador não dispõe de informações com tais atributos se
torna inviável o registro da informação, conforme menciona a Resolução n.
1367/20 do Conselho Federal de Contabilidade:
"Artigo 6º O Princípio da Oportunidade
refere-se ao processo de mensuração e apresentação dos componentes patrimoniais
para produzir informações íntegras e tempestivas.
Parágrafo único. A falta de integridade e
tempestividade na produção e na divulgação da informação contábil pode
ocasionar a perda de sua relevância, por isso é necessário ponderar a relação
entre a oportunidade e a confiabilidade da informação." (destaque nosso)
Um registro contábil deverá ser baseado ainda em
alguns atributos da informação contábil, que é a confiabilidade e a
tempestividade, conforme previsto na Resolução n. 1.121/2008:
"Para ser útil, a informação deve ser
confiável, ou seja, deve estar livre de erros ou vieses relevantes e
representar adequadamente aquilo que se propõe a representar. Uma informação
pode ser relevante, mas a tal ponto não confiável em sua natureza ou divulgação
que o seu reconhecimento pode potencialmente distorcer as demonstrações
contábeis."
"Quando há demora indevida na divulgação de
uma informação, é possível que ela perca a relevância. A Administração da
entidade necessita ponderar os méritos relativos entre a tempestividade da
divulgação e a confiabilidade da informação fornecida."
Em suma, o frágil controle nas contas pecúlios
inviabiliza o registro contábil de sua movimentação.
A falta de controle nas contas pecúlios dos
Fundos Rotativos do Estado de Santa Catarina já foi alvo de Auditoria Interna
realizada pela Secretaria de Estado da Fazenda por meio da Diretoria de
Auditoria Geral -- DIAG.
Fruto desta auditoria surgiu a Informação DÏAG
n° 0167/2012, que faz referência a fragilidade, por parte dos Gestores do
Fundo, do controle em fichas de papel ou até mesmo em excel, do valor devido a
cada apenado, bem como do valor depositado em uma conta única - pecúlio,
ficando sob a guarda e gerenciamento de um responsável, gerando sérias
fragilidades em termos de procedimentos, controles, evidenciação e
transparência.
Desta forma, para que haja registro contábil
confiável e tempestivo, faz-se necessário que os Gestores dos Fundos criem
melhorias nos procedimentos de controles, evidenciação e transparência.
Em seguida, o responsável
destacou (fl. 521) a existência de Informação DIAG n. 0167/2012 visando “às
boas práticas para o controle do trabalho dos reeducandos, bem como o controle
da remuneração”, destacando iniciativa promovida pelo Governo do Estado de Minas
Gerais no sentido de implementação de processo de pagamento eletrônico dos
reeducandos, atrelado à legislação sobre o tema.
Informou, ainda (fl. 522), a
inexistência de padronização no que tange aos procedimentos relativos à
execução dos recursos provenientes do labor dos apenados, ressaltando o início
de projeto piloto na Unidade de Florianópolis. Ao final, registrou que o pleito
que ressai do apontamento da auditoria é inviável, tendo em vista o modus operandi adotado pela gestão dos
fundos rotativos.
A responsável Soraya Costa Elias apresentou
argumentos nos mesmos e exatos termos em que referido acima (fls. 527-536).
Em que pesem os fatos
narrados e os argumentos apresentados, as
informações obtidas apenas confirmam os apontamentos efetuados pela equipe de
auditoria, tendo em vista que a falta de documentação hábil e o controle
deficiente dos recursos prejudicam o registro contábil, em violação ao disposto
nos arts. 85 e 89 da Lei n. 4.320/64 e no art. 6º da Resolução n. 750/93 do
Conselho Federal de Contabilidade, alterada pela Resolução n. 1.367/11 do
Conselho Federal de Contabilidade.
Como bem expôs a
Diretoria de Controle da Administração Estadual (fl. 653v):
Assim como em diversas
outras áreas do Estado, os registros contábeis são realizados com base em
registros gerenciais. Entende-se necessário tornar o registro gerencial
confiável para gerar uma contabilidade confiável. Necessariamente a
contabilidade deve buscar a verdade dos fatos e não optar por omitir a
informação nas demonstrações contábeis.
Estando, assim, a
administração dos recursos da conta pecúlio sob responsabilidade do Fundo
Rotativo da Penitenciária Sul, é imprescindível - e não mera opção – a sua evidenciação
contábil.
Mesmo diante das
justificativas dos responsáveis, em especial no que se refere à notícia de que
estaria em implantação um projeto piloto para regularização do sistema de
contabilidade, conjuntura a qual, em um primeiro momento, afasta a aplicação de
multas aos gestores, vejo como necessária a determinação e estipulação de
prazo, por parte dessa Corte de Contas, para que o Fundo Rotativo da
Penitenciária Sul adote providências para estabelecimento de uma metodologia de
controle que permita a realização dos registros contábeis da conta pecúlio.
Dessa maneira, entendo – nos
moldes em que disposto no item 6.3 da Decisão n. 0306/2017, proferida no
processo RLA n. 14/00442211 – pela fixação de prazo para que a Secretaria de
Estado da Fazenda, por meio da Diretoria de Contabilidade Geral (DCOG),
comprove a adoção de procedimentos com vistas a realizar o registro contábil
dos valores do pecúlio prisional pelo Fundo Rotativo da Penitenciária Sul.
1.8.
Não exploração das
potencialidades de geração de receita em desacordo com o art. 37 da CRFB/88 e
com os arts. 1º, 28 e 31 da Lei de Execuções Penais
O item 4.1.7.1 da proposta de
encaminhamento e achado 8 do Relatório DCE n. 502/2014 considerou que o
potencial de arrecadação de receitas pertinentes ao Fundo Rotativo da
Penitenciária Sul seria maior do que os valores que vinham sendo arrecadados,
alertando sobre a necessidade da adoção de providências para o aumento da
receita originária dos serviços prestados pelos reeducandos às empresas
privadas.
Foram apontados como
responsáveis pela irregularidade os Srs. Leandro Antônio Soares Lima, Deiveison
Querino Batista e Arlindo Pagnan.
O responsável Leandro Antônio Soares Lima alegou (fl.
559) que a feitura e celebração de convênio entre o Estado e as instituições
públicas e privadas, visando à abertura de postos de trabalho aos condenados,
passam por um nível de competência superior. Argumentou tratar-se de um nível
de competência política atrelada aos titulares dos cargos estruturais à
organização política, de modo que somente a tais agentes competiria a “formação
da vontade superior do Estado”.
Mais uma vez, o responsável
baseou-se (fl. 560) nos ditames dos arts. 6º e 7º, inciso IV, da Lei
Complementar Estadual n. 381/2007, bem como no art. 74 da Lei de Execuções
Penais, buscando afastar o ônus de sua responsabilidade, reiterando (fl. 561)
toda a teia argumentativa já expendida e reproduzida nos itens anteriores deste
parecer.
Os responsáveis Arlindo Pagnan e Deiveison Querino Batista apresentaram, em síntese, as mesmas
justificativas e argumentos referidos acima (fls. 574-576 e 594-595, respectivamente).
A respeito das
responsabilidades definidas ao decorrer da instrução, entendo que se pode
imputá-la tanto a Secretários de Estado da Justiça e Cidadania – pela
competência para celebração dos convênios – como também a Diretores, seja
Penitenciário ou do Departamento de Administração Prisional, – pela gestão e
fiscalização da Unidade. Isso porque o fato de a competência para abrir novos
postos de trabalho estar atrelada à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania
não afasta o dever dos gestores de identificar os problemas e reportá-los ao
ente competente para adoção das providências cabíveis.
Entretanto, a
irregularidade em questão não se reveste de gravidade suficiente para aplicação
de sanção pecuniária aos responsáveis, sendo razoável uma recomendação à
Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania para que verifique a necessidade de
aumento dos postos de trabalho e, caso positiva, adote providências para
celebração de novos convênios com empresas interessadas em ofertar novos
serviços dentro desses estabelecimentos.
1.9.
Ausência de Controle Interno,
em desacordo com o art. 62, § 1º, da Constituição Estadual, os arts. 29 e 30,
inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 381/2007, o art. 2º, inciso II, do
Decreto Estadual n. 2.056/09, bem como com os Decretos Estaduais n. 772/12 e n.
1.670/13
O item 4.1.8.1 da proposta de
encaminhamento e achado 9 do Relatório DCE n. 502/2014 constatou a ausência de
qualquer constituição de controle interno do Fundo Rotativo da Penitenciária
Sul, frustrando os objetivos de verificar a exatidão e fidelidade dos dados
orçamentários, financeiros, operacionais, patrimoniais e contábeis,
relacionados às receitas e despesas.
A presente irregularidade foi
atribuída aos Srs. Deiveison Querino Batista, Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco
de Luca.
Em suas alegações de defesa,
o responsável Deiveison Querino Batista
alegou (fl. 596) que a competência para designar servidor público responsável
pelo controle interno seria exclusiva dos titulares ou dirigentes máximos dos
órgãos da administração do Poder Executivo estadual.
Transcreveu (fl. 596) o
disposto no art. 1º do Decreto n. 1.670/13, concluindo que dele decorreria a
competência do Secretário de Estado da Justiça e Cidadania para designar
servidor responsável pelo controle interno, por meio de portaria. Nesse
sentido, informou que a Portaria n. 0554/GEPES/DIAF/SJC/2014 teria designado o
servidor Jonas Santana Martins para responder pelo controle interno da
Penitenciária Sul, acumulando, “ainda que informalmente, também a função de controle
interno do Fundo Rotativo da Penitenciaria Sul”.
Os responsáveis Sadi Beck Júnior e Ada Lili Faraco de Luca, conforme já exaustivamente referido,
apesar de regularmente notificados, não apresentaram quaisquer manifestações de
defesa.
No relatório técnico inicial
(fl. 492v), a Diretoria de Controle da Administração Estadual assinalou a
presente irregularidade destacando a importância da implementação de um sistema
de controle interno nos órgãos públicos e aduzindo, entretanto, que “não se
percebeu qualquer constituição do controle interno do Fundo Penitenciário
Rotativo Sul com foco nas receitas e despesas da Unidade em 2013 (fl. 392)”.
Tal documento de fl. 392 é
cópia de excerto do Diário Oficial do Estado n. 19.891 (01.09.2014), do qual se
sublinhou a nomeação do Sr. Jonas Santana Martins para responder pelo controle
interno do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul em 27.08.2014.
Agora, no relatório técnico
final, estranhamente a instrução trouxe a seguinte conclusão (fl. 656):
O sr. Deiveison Querino Batista, trouxe em sua
defesa, que fora designado por meio da portaria nº 554/2014, expedida em
27/08/2014, o Sr. Jonas Santana Martins para exercer função de controle interno
da unidade.
Cópia da referida portaria foi encaminhada pela
defesa e anexada na fl. 623 destes autos, sendo a sua publicação objeto de
confirmação por esta Instrução, que constatou que a mesma ocorreu na data de
01/09/2014 (DOE nº 19.891 – pg. 2).
A indicação de pessoa responsável pelo controle
interno da unidade, elide nesta oportunidade, a irregularidade inicialmente
anotada. Contudo, importante lembrar que a responsabilidade dos gestores e
também do servidor nomeado, não se finda, e a atuação mediante fiscalização,
acompanhamento e orientação e controle dos atos e fatos de natureza orçamentária,
financeira, operacional, patrimonial e contábil devem ser perseguidos, em
obediência a legislação de regência.
Ora, nota-se clara
divergência entre os posicionamentos da equipe técnica em seus relatórios.
Inicialmente, a restrição, da maneira como anotada, referia-se ao fato de não
haver qualquer controle interno na unidade no ano de 2013, porquanto referiu-se
– e destacou – que o servidor em questão havia sido nomeado para a função
somente em 01.09.2014. Por outro lado, concluiu a instrução, no último
relatório, que tal nomeação – que justamente havia sido considerada para
embasar a irregularidade – serviria para demonstrar que a restrição estaria
elidida.
De qualquer maneira, apesar
de tal problemática, este órgão ministerial entende que, diante da detida
análise de todo o contexto do presente caso concreto, não houve irregularidade
suficiente a apenar os responsáveis com pena de multa, restando a relevante
questão do controle interno, aparentemente, observada no Fundo Rotativo da
Penitenciária Sul.
2. Conclusão
Ante o exposto, o Ministério
Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I
e II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se:
2.1.
pela
IRREGULARIDADE, na forma do art. 36,
§ 2º, alínea “a”, da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000, dos seguintes atos:
2.1.1. Realização de despesas, no
montante de R$ 44.747,40, com recursos do Fundo Rotativo da Penitenciária Sul,
fora das finalidades previstas na Lei Estadual n. 5.455/78 e no Decreto
Estadual n. 2.312/97, alterado pelo Decreto Estadual n. 132/99;
2.1.2.
Ausência de
licitação para realização de despesas com aquisições de ração animal, uniformes
e acessórios para agentes penitenciários e manutenção e conservação de
veículos, durante o exercício de 2013, cujos valores são superiores ao montante
em que é dispensável a licitação, em afronta ao art. 37, inciso XXI, da
CRFB/88, bem como aos arts. 2º e 3º da Lei n. 8.666/93;
2.2. pela APLICAÇÃO DE MULTAS aos responsáveis, na forma prevista no art. 70,
inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, diante das irregularidades
acima referidas nos itens 2.1.1 e 2.1.2 desta conclusão, da seguinte maneira:
2.2.1. aos Srs. Deiveison Querino Batista, Diretor da
Penitenciária Sul à época dos fatos, Leandro
Antônio Soares Lima, Diretor do Departamento de Administração Prisional à
época dos fatos, e à Sra. Ada Lili
Faraco de Luca, Secretária de Estado da Justiça e Cidadania à época dos
fatos, em face da irregularidade elencada no item 2.1.1 da conclusão deste
parecer;
2.2.2. ao Sr. Deiveison Querino Batista, Diretor da Penitenciária Sul à época dos
fatos, em face da irregularidade elencada no item 2.1.2 da conclusão deste
parecer;
2.3. pelas DETERMINAÇÕES
constantes dos itens 3.3.1 a 3.3.3 à Secretaria de Estado da Justiça e
Cidadania e do item 3.4 à Secretaria de Estado da Fazenda, dispostas na
conclusão do Relatório DCE n. 002/2016 (fls. 656v-657), para adoção de
providências no prazo a ser estipulado por essa Corte de Contas;
2.4. pelas RECOMENDAÇÕES
à Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, anotadas nos itens 3.5.1 e 3.5.2
da conclusão do Relatório DCE n. 002/2016 (fl. 657).
Florianópolis, 3 de outubro
de 2017.
Cibelly Farias Caleffi
Procuradora
[1] Foram despendidos R$
44.747,40, vinculados ao Fundo Rotativo, para atender despesas do DEAP, na sua
nova sede em Palhoça, bem como para despesas da Secretaria de Estado da Justiça
e Cidadania, tais como aquisição de cadeiras, divisória Eucatex, perfis e porta
com todos os acessórios para a sede do DEAP, camisetas para os funcionários, e
aquisição de uniformes e calçados para os servidores da Penitenciária Sul,
conforme detalhado às fls. 475v-479v.
[2]
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso
de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 805.
[3] Foram identificadas despesas
com aquisições de ração animal, material de construção para reforma de
presídios, uniformes e acessórios para agentes penitenciários e manutenção e
conservação de veículos.
[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e
Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2005.
[5] CITADINI, Antonio Roque. Comentários e Jurisprudência sobre a
Lei de Licitações Públicas.
São Paulo: Max Limonad, 1999.
[6] “Formação de Pregoeiros,
Licitações e Contratos Administrativos” e “Treinamento nos Sistemas LIC e
e-LIC” (fls. 599-602).
[7] Processo RLA n. 14/00442211,
originado de auditoria in loco
realizada no Fundo Rotativo da Penitenciária de Florianópolis, abrangendo a
apuração de possíveis irregularidades na aplicação de recursos do Fundo,
noticiadas nos processos REP n. 13/00696807 e PDA n. 13/00707930, com as
receitas e despesas atinentes ao trabalho dos reeducandos no exercício de 2013
e eventualidades de 2012 e 2014, considerando-se a vigência dos contratos
auditados, em cumprimento à programação de auditoria do período de abril de
2014 a março de 2015.