PARECER nº:

MPTC/52132/2017

PROCESSO nº:

REC 17/00176720    

ORIGEM:

Prefeitura Municipal de São José

INTERESSADO:

Andrey Vicente da Luz

ASSUNTO:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo TCE-0600068604.

 

 

 

Número unificado MPC: 2.2/2017.1190

 

Trata-se de Recurso de Reconsideração (petição de fls. 4-23 e documentos de fls. 24-31) interposto pela Sra. Gizelle Duarte da Silva, então Assessora Jurídica da Prefeitura Municipal de São José, em face do Acórdão n. 0748/2016, exarado nos autos do processo TCE n. 09/00068604, que aplicou multa à recorrente, nos seguintes termos:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, em: [...]

6.3. Aplicar aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno deste Tribunal, as multas adiante elencadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico do TCE - DOTC-e -, para comprovarem a este Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, ou interporem recurso na forma da lei, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar: [...]

6.3.4. Devido à classificação e consequente contratação da empresa G&P Projetos e Sistemas S.A., que ofereceu valor além do orçado pela Administração e com uma diferença a maior de R$ 504.000,00, em relação à proposta de menor valor apresentada, em violação aos arts. 40, X, da Lei n. 8.666/93 e 4º, VIII, IX e XI, da Lei n. 10.520/02, bem como aos princípios da economicidade, eficiência e boa administração pública (item 2.5 do Relatório do Relator): [...]

6.3.4.3. à Sra GIZELLE DUARTE DA SILVA - Assessora Jurídica da Prefeitura Municipal de São José em 2005, CPF n. 022.553.139-95, a multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). [...]

A Diretoria de Recursos e Reexames emitiu o Parecer n. DRR-125/2017 (fls. 32-39v), opinando pelo conhecimento do presente Recurso de Reconsideração e, no mérito, pelo seu provimento para cancelar a multa aplica à recorrente, ratificando-se os demais termos da decisão recorrida.

O Recurso de Reconsideração, com amparo no art. 77 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, é o adequado em face de decisão proferida em processo de prestação e tomada de contas, sendo a parte legítima para a sua interposição, uma vez que figurou como responsável pelo ato de gestão irregular descrito na deliberação recorrida.

O acórdão recorrido foi publicado na imprensa oficial em 17.02.2017 e a peça recursal foi protocolada nessa Corte de Contas em 31.03.2017, sendo, portanto, tempestiva[1]. Ainda, o recurso obedece ao requisito da singularidade, porquanto foi interposto uma única vez.

Logo, encontram-se presentes todos os requisitos de admissibilidade da presente peça recursal.

1.    Preliminares

1.1  Prescrição

Em sede recursal a Sra. Gizelle Duarte da Silva repisa os argumentos apresentados no processo principal – já rechaçados por esta representante ministerial e pelo Relator (fls. 1249-1276 e 1683-1706 do processo principal) – e alega, como preliminar, a prescrição da pretensão punitiva do Estado, tendo-se em vista o decurso de mais de cinco anos da ocorrência dos fatos, bem como a inaplicação do art. 37, § 5º, da CRFB/88, já que não teria havido dano ao erário municipal (fls. 5-8).

Não obstante, como já exaustivamente delineado por este órgão ministerial nos Pareceres n. MPTC/35729/2015 e n. MPTC/41577/2016 (fls. 1249-1276 e 1605-1617 do processo originário), razão não assiste à recorrente, conforme se extrai da Lei Complementar Estadual n. 588/2013, que disciplina a matéria, in verbis:

Art. 1º Fica acrescido o art. 24-A à Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, com a seguinte redação:

“Art. 24-A É de 5 (cinco) anos o prazo para análise e julgamento de todos os processos administrativos relativos a administradores e demais responsáveis a que se refere o art. 1º desta Lei Complementar e a publicação de decisão definitiva por parte do Tribunal, observado o disposto no § 2º deste artigo.

§ 1º Findo o prazo previsto no caput deste artigo, o processo será considerado extinto, sem julgamento do mérito, com a baixa automática da responsabilidade do administrador ou responsável, encaminhando-se os autos ao Corregedor-Geral do Tribunal de Contas, para apurar eventual responsabilidade.

§ 2º O prazo previsto no caput deste artigo será contado a partir da data de citação do administrador ou responsável pelos atos administrativos, ou da data de exoneração do cargo ou extinção do mandato, considerando-se preferencial a data mais recente. (NR)

Art. 2º O disposto no art. 24-A da Lei Complementar nº 202, de 2000, aplica-se, no que couber, aos processos em curso no Tribunal de Contas, da seguinte forma:

I - os processos instaurados há 5 (cinco) ou mais anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 2 (dois) anos para serem analisados e julgados;

II - os processos instaurados há pelo menos 4 (quatro) anos e menos de 5 (cinco) anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 3 (três) anos para serem analisados e julgados;

III - os processos instaurados há pelo menos 3 (três) anos e menos de 4 (quatro) anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 4 (quatro) anos para serem analisados e julgados; e

IV - os processos instaurados há menos de 3 (três) anos terão, a partir da publicação desta Lei Complementar, o prazo de 5 (cinco) anos para serem analisados e julgados (grifei).

Como se vê, essa Corte de Contas tem o prazo de 5 anos, contados da citação do responsável pelos atos administrativos impugnados, para proferir decisão definitiva sobre o processo. Ainda, a regra de transição estabelecida no art. 2º supratranscrito, prevê, em seu inciso III, que os processos instaurados há pelo menos 3 anos e menos de 4 anos da publicação daquela Lei Complementar deverão ser julgados em até 4 anos, conforme é o caso dos autos.

Com efeito, o processo principal foi autuado em 27.02.2009 e a publicação da Lei Complementar Estadual n. 588/2013 ocorreu em 15.01.2013. Logo, o processo tramitava há 3 anos e 11 meses no momento da publicação da lei, estando incluso, portanto, na hipótese do referido inciso III. Dessa forma, o processo em comento deveria ser analisado e julgado até 15.01.2017, o que de fato foi observado, visto que o processo foi julgado na sessão ordinária de 05.12.2016, tendo sido publicado na imprensa oficial em 17.02.2017, ou seja, o processo foi analisado e julgado antes do advento do prazo prescricional.

Frisa-se que o diploma em comento dispôs que os processos em trâmite devam ser simplesmente analisados e julgados, não trazendo na sequência o advérbio “definitivamente”. Assim, como o preceito legal não requer o julgamento definitivo, deve-se entender que a presente questão fora devidamente analisada e julgada dentro do prazo estipulado pela famigerada Lei Complementar Estadual.

Por outro lado, este órgão ministerial não desconhece que essa Corte de Contas disciplinou a aplicação da Lei Complementar Estadual n. 588/2013 por meio da Resolução n. TC-100/2014, a qual dispõe em seu art. 1º, inciso II:

Art. 1° Para efeitos da aplicação da Lei Complementar (estadual) n. 588, de 14 de janeiro de 2013, considera-se: [...]

II - processo analisado e julgado a que se refere o art. 2° da Lei Complementar (estadual) n. 588/2013, aquele que tenha decisão de que tratam os arts. 12, §2°[2], e 36, §2º[3], da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000, e que não caibam os recursos previstos nos arts. 77 e 79 deste mesmo diploma legal; (grifei)

O dispositivo acima transcrito faz referência às decisões definitivas proferidas pelo Tribunal, estabelecendo como “processo analisado e julgado” somente aqueles em que haja tal espécie de decisão, bem como não seja possível a interposição dos recursos de Reconsideração, Reexame ou Embargos de Declaração.

Se a Lei Complementar Estadual n. 588/2013 não fez menção a nenhum tipo específico de decisão, não poderia a Resolução n. TC-100/2014 pretender restringir o conceito de “processo analisado e julgado” apenas às decisões definitivas, sob pena de fulminar a fiscalização desse Tribunal, tendo em vista o longo tempo necessário para a apreciação das peças recursais interpostas nessa Corte de Contas.

Assim, a restrição pretendida pela Resolução n. TC-100/2014 afronta o princípio da legalidade, já que se a Lei Complementar Estadual n. 588/2013 não especifica um determinado tipo de decisão em seu art. 2°, não pode uma norma de hierarquia inferior pretender fazê-lo.

Celso Antônio Bandeira de Mello, após discorrer a respeito dos regulamentos, afirma que às resoluções aplicam-se, ainda com maior razão, os mesmos limites, já que na pirâmide jurídica, estão em nível inferior ao próprio regulamento, pois “enquanto este é ato do Chefe do Poder Executivo”, os regulamentos, instruções e portarias, por sua vez, “assistem a autoridades de escalão mais baixo e, de conseguinte, investidas de poderes menores”[4]. Continua o autor:

Se o regulamento não pode criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que já não estejam estabelecidos e restringidos na lei, menos ainda poderão fazê-lo instruções, portarias ou resoluções. Se o regulamento não pode ser instrumento para regular matéria que, por ser legislativa, é insuscetível de delegação, menos ainda poderão fazê-lo atos de estirpe inferior, quais instruções, portais ou resoluções. Se o Chefe do Poder Executivo não pode assenhorear-se de funções legislativas nem recebê-las para isso por complacência irregular do Poder Legislativo, menos ainda poderão outros órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta. (p. 370).

Acrescenta-se, ainda, que esta representante ministerial defende a imprescritibilidade de sanções pecuniárias definidas em processos que versem sobre danos ao erário. Neste contexto, deve ser ressaltada a redação, agora legítima, do art. 3º, inciso I, da Resolução n. TC-100/2014:

Art. 3° A aplicação do art. 24-A da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000 será afastada nas seguintes hipóteses:

I - incidência do art. 37, §5°, da Constituição Federal nos processos em que for caracterizado dano ao erário, conforme dispõem os arts. 15, §3°, 18, inciso lll e §2°, e 32 da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000; (grifei)

Ora, a presente norma regulamentar é evidente ao frisar a imprescritibilidade dos “processos em que for caracterizado dano ao erário”, não havendo espaço, portanto, para a cisão entre sanções passíveis de imputação de débito e de aplicação de multa, já que ambas se encontram em um mesmo “processo em que for caracterizado dano ao erário”, repita-se.

Trata-se, assim, de simples interpretação literal do mencionado dispositivo, não havendo, nem na Lei Complementar Estadual n. 588/2013, nem na Resolução n. TC-100/2014, amparo legal para o afastamento de multas aplicadas em processo cuja decisão declarou a existência de dano ao erário.

Por seu turno, especificamente acerca da decisão isolada do Supremo Tribunal Federal[5] apresentada pela Diretoria de Recursos e Reexames (fls. 34-35) como possível entendimento a ser aplicado ao presente caso, registra-se que o julgado, em apertada síntese, decidiu pela aplicação do prazo prescricional da Lei n. 9.873/99 – que estabelece prazo de prescrição para o exercício da aplicação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, e dá outras providências – às tomadas de contas especiais que tramitam no Tribunal de Contas da União, diante da ausência de qualquer disposição similar na Lei Orgânica da Corte de Contas da União.

Embora a Lei Orgânica do TCU não tenha estabelecido prazo para o exercício do poder punitivo a infrações submetidas à sua esfera de apuração, no Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, por outro lado, a matéria fora regulamentada por meio da Lei Complementar Estadual n. 588/2013, sendo, portanto, regra específica para essa Corte de Contas estadual.

Ademais, a decisão mencionada pela área técnica, além de se referir especificamente ao Tribunal de Contas da União – cujas competências e arcabouço normativo não se confundem com o contexto dos Tribunais de Contas estaduais –, ainda não representa qualquer entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal, estando longe de ser um posicionamento definitivo e de ter caráter vinculante ou natureza de repercussão geral.

Deve-se destacar, ainda, que tal precedente, em nome de excepcionais situações extremas que realmente se afastam de qualquer ideia de razoabilidade, acabam por ditar regras – baseadas em exceções, repita-se – tendentes a esvaziar a competência fiscalizatória das Cortes de Contas. Mostra-se evidente que a fiscalização de verbas públicas décadas após a ocorrência dos fatos a serem provados deve ser abrandada pela aplicação direta dos basilares princípios da segurança jurídica e da ampla defesa, e não a partir da estipulação de uma regra prescricional quinquenal que fulminará todo o esforço das Cortes de Contas para reaver danos ao erário.

Dessa forma, seja em razão da aplicação dos prazos prescricionais da Lei Complementar Estadual n. 588/2013 ou da imprescritibilidade da ação de ressarcimento dos danos causados ao erário e da impossibilidade de cisão entre sanções disposta no art. 3º, inciso I, da Resolução n. TC-100/2014, entendo que a prescrição não atingiu o presente processo.

1.2  Ilegitimidade passiva

Em sede preliminar, às fls. 8-10, a recorrente alega sua ilegitimidade passiva para figurar dentre os responsáveis pelas supostas irregularidades apontadas no processo, pois entende que não participou de qualquer ato decisório que resultou na contratação da empresa G&P Projetos e Sistemas S.A., de acordo com o que demonstraria o documento de fl. 313 do processo principal, assinado pelo então Procurador-Geral do Município de São José, ao expressar que inexistiriam “quaisquer impedimentos de ordem legal e judicial ao prosseguimento do procedimento licitatório Pregão n. 116/2005”.

Além disso, a recorrente afirma que a decisão judicial exarada nos autos n. 064.06.002379-5 teria ordenado o prosseguimento do feito, o que demonstraria que a inabilitação da empresa Outplan Marketing Interativo Ltda. teria sido decretada pelo Poder Judiciário.

 A questão, todavia, será analisada com o mérito recursal, pois com este se confunde.

2.    Mérito

A decisão recorrida aplicou multa à recorrente no valor de R$ 5.000,00 em razão da classificação e consequente contratação da empresa G&P Projetos e Sistemas S.A., que ofereceu valor além do orçado pela Administração e com uma diferença a maior de R$ 504.000,00 em relação à proposta de menor valor apresentada, em violação aos arts. 40, inciso X, da Lei n. 8.666/93, e 4º, incisos VIII, IX e XI, da Lei n. 10.520/02, bem como aos princípios da economicidade, da eficiência e da boa administração pública.

Em suas razões recursais a Sra. Gizelle Duarte da Silva argumenta que não foi a responsável pela decisão de contratar a empresa G&P Projetos e Sistemas S.A., sendo que a empresa Outplan Marketing Interativo Ltda. foi inabilitada pelo parecer elaborado pelo Pregoeiro e pela equipe de apoio, restando confirmada pela decisão judicial proferida nos autos do processo n. 064.06.002379-5 (fl. 10).

Assim, segundo a recorrente, ao analisar o mérito da questão, o Juiz da Vara da Fazenda Pública da Comarca de São José verificou que o objeto do edital era completamente distinto do objeto social da empresa Outplan Marketing Interativo Ltda., que não atendia, assim, o Edital do Pregão Presencial n. 116/2005 (fls. 11-13).

Defende, ainda, que a “manutenção da pretensão punitiva [...] ameaça sobremaneira a segurança jurídica, pois vai de encontra à matéria já julgada de forma definitiva pelo Poder Judiciário de Santa Catarina” (fl. 16), não podendo essa Corte de Contas rediscutir tal questão, eis que já judicialmente apreciada (fls. 16-18).

Explica a recorrente, então, que diante na inabilitação da empresa Outplan Marketing Interativo Ltda. – primeira colocada no certame –, foi procedida a análise da documentação da empresa classificada em segundo lugar, Gennari & Peartree Projetos e Sistemas S.A., que, por cumprir todas as exigências do edital, foi declarada a vencedora do certame (fls. 18-19). Aduz, ainda, a Sra. Gizelle Duarte da Silva que (fl. 19):

Não bastasse, a despesa só pode ser realizada a partir do momento em que é firmado contrato entre as partes. O Contrato n.º 085/2006 foi assinado pelo Prefeito Municipal, Sr. Fernando Melquíades Elias e pelo Secretário Municipal da Receita, Sr. Antônio Cezar Cabral (que sequer foi mencionado nas análises, relatórios, decisões, e etc.) e pelo representante legal da empresa Gennari & Peartree.

O gestor responsável pela decisão de firmar o contrato, ao invés de anular/ revogar o certame, era o Prefeito Municipal, ordenador primário e responsável pelo nascimento das obrigações decorrentes do contrato. Até então tudo se resume a uma mera expectativa de contratação, já que é cediço que a Administração não tem a obrigação de contratar aquilo que licita.

A Recorrente não possui responsabilidade sobre o contrato firmado, tampouco quanto aos valores pagos, já que não assinou as Ordens/ Autorizações de Serviços, tampouco as Ordens de Pagamento, que decorrem da aferição da execução do objeto, que era de responsabilidade da Secretaria Municipal da Receita.

Reitere-se que a proposta de menor valor deixou de ser considerada no certame em virtude da inabilitação da empresa Outplan, cuja decisão partiu do Poder Judiciário. A classificação da 2ª colocada obedeceu fielmente os ditames legais aplicáveis à modalidade pregão.

Por sua vez, a Diretoria de Recursos e Reexames, às fls. 38v-39, considerando os argumentos apresentados pelo Relator em seu voto (fls. 1701v-1702 do processo principal), entende que a responsabilidade da recorrente merece ser revista, porquanto a irregularidade em comento decorreu do fato de o Pregoeiro ter deixado de proceder à negociação do valor das propostas remanescentes (art. 4º e incisos da Lei n. 10.520/02) após a inabilitação da primeira colocada no certame, sendo que a Sra. Gizelle Duarte da Silva, na condição de Procuradora-Geral do Município[6], teve participação apenas quanto ao cumprimento da sentença judicial que inabilitou a empresa Outplan Marketing Interativo Ltda., não estando seus atos, assim, relacionados aos dispositivos normativos ofendidos.

Dessa maneira, a DRR defende que a restrição ora recorrida diz respeito a regras a serem observadas na elaboração do edital e a obrigação imposta ao Pregoeiro (fl. 38v), concluindo, então, pelo afastamento da multa aplicada à recorrente (fl. 39):

Portanto, não são ações cuja obrigação recaia sobre a atribuição funcional da Recorrente, nem tão pouco, se verifica no caso examinado, a participação da Recorrente nos atos irregulares constatados pelo Relator em seu Voto, uma vez que sua participação pelo que se verifica no parecer de fl. 313, foi no sentido de comunicar a decisão da sentença judicial que autorizou a continuidade do procedimento licitatório, não sentido de autorizar o pregoeiro a contratar pura e simplesmente conforme foi feito.

Ressalte-se, ainda, que o Edital do Pregão não foi sequer submetido a análise da Assessoria Jurídica, fato que inclusive originou a aplicação de multa verberada no item 6.3.2 do Acórdão recorrido.

Ao contrário da exaustiva fundamentação desta representante ministerial – Parecer n. MPTC/35729/2015 (fls. 1249-1276 do processo principal) – para justificar a aplicação da multa ora recorrida à Sra. Gizelle Duarte da Silva, o Relator, no Voto de fls. 1683-1706 daqueles autos, entendeu que embora os processos judiciais que tratavam da habilitação da empresa Outplan Marketing Interativo Ltda. tivessem sido analisados sem julgamento do mérito, teria havido, de fato, decisão judicial confirmando a inabilitação da empresa nos autos do processo 064.06.002379-5. Considerou o Relator, portanto, que a atuação dos gestores da Prefeitura Municipal de São José para a inabilitação da primeira colocada no certame teve respaldo judicial.

Desta forma, não obstante toda a fundamentação defendida por este órgão ministerial no processo de conhecimento[7], considerando as razões delineadas pelo Relator – e acolhidas pelo Tribunal Pleno nos autos principais – para justificar a aplicação de multa à recorrente, realmente o posicionamento da Diretoria de Recursos e Reexames quanto à ilegitimidade passiva da recorrente merece prosperar, uma vez que a responsável se limitou a aceitar a inabilitação “judicial” da empresa Outplan Marketing Interativo Ltda., restringindo-se ao Pregoeiro a responsabilidade pela contratação da empresa G&P Projetos e Sistemas S.A. em valor além do orçado pela Administração e com uma diferença a maior de R$ 504.000,00 em relação à proposta de menor valor apresentada, em violação aos arts. 40, inciso X, da Lei n. 8.666/93, e 4º, incisos VIII, IX e XI, da Lei n. 10.520/02, bem como aos princípios da economicidade, da eficiência e da boa administração pública.

Assim, tendo em vista a fundamentação utilizada pelo Relator – e consequentemente pelo Tribunal Pleno – para aplicar a multa ora recorrida, apesar do entendimento divergente desta representante ministerial, a insurgência da recorrente merece prosperar para que seja cancelada a multa aplicada no item 6.3.4.3 do acórdão ora recorrido.

3.    Conclusão

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, manifesta-se pelo CONHECIMENTO do Recurso de Reconsideração e, no mérito, pelo seu PROVIMENTO para o fim de cancelar a multa aplicada no item 6.3.4.3 do acórdão recorrido, mantendo-se hígidos seus demais termos.

Florianópolis, 8 de novembro de 2017.

 

Cibelly Farias Caleffi

Procuradora



[1] Considerando a contagem de prazo em dias úteis, a teor do disposto no art. 219 do Código de Processo Civil.

[2] Art. 12. A decisão em processo de prestação ou tomada de contas pode ser preliminar, definitiva ou terminativa. [...] § 2º Definitiva é a decisão pela qual o Tribunal julga regulares, regulares com ressalva ou irregulares as contas.

[3] Art. 36. A decisão do Tribunal de Contas em processos de fiscalização de atos e contratos e de apreciação de atos sujeitos a registro, pode ser preliminar ou definitiva. [...] § 2º Definitiva é a decisão pela qual o Tribunal: a) manifestando-se quanto à legalidade, eficiência, legitimidade ou economicidade de atos e contratos, decide pela regularidade ou pela irregularidade, sustando, se for o caso, a sua execução ou comunicando o fato ao Poder competente para que adote o ato de sustação; e b) manifestando-se quanto à legalidade de atos sujeitos a registro, decide por registrar ou denegar o registro do ato.

[4] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Editora Malheiros. 2011, p. 369.

[5] Trata-se de decisão da Primeira Turma do Pretório Excelso, proferida no Mandado de Segurança n. 32.201/DF (publicada em 07.08.2017), da lavra do Ministro Roberto Barroso.

[6] Na verdade, a Sra. Gizelle Duarte da Silva era Assessora Jurídica do Município à época dos fatos, e não Procuradora-Geral do Município, cargo este ocupado à época pelo Sr. Samuel Carlos Lima (conforme documentos de fls. 298 e 313 do processo principal).

[7] No sentido de que, em apertada síntese, todos os gestores responsáveis pela indevida inabilitação da primeira colocada do certame deveriam ser por isso responsabilizados, já que inexistente qualquer manifestação judicial definitiva de mérito que pudesse justificar a inabilitação ilegítima.