Parecer
nº: |
MPC/52.104/2017 |
|
Processo
nº: |
TCE 13/00430106 |
|
Origem: |
Fundo
de Desenvolvimento Social -FUNDOSOCIAL |
|
Assunto: |
Tomada
de Contas Especial referente à NE 1927, 19/08/2009, valor de R$ 28.849,00,
aquisição de materiais esportivos, e NE 4788, de 26/11/2009, valor de R$
38.260,00, pagamento de serviços de terraplanagem, repassados à Associação
Esportiva e Recreativa Uruguaia - RSAG. |
|
Numeração
Única: |
MPC-SC 2.3/2017.1474 |
Trata-se de Tomada de Contas Especial
instaurada internamente pela Secretaria Executiva de Supervisão de Recursos
Desvinculados[1],
em decorrência de diversas irregularidades avistadas em processos de concessão
de recursos públicos no Fundo de Desenvolvimento Social no decorrer do
exercício de 2009.
Após a instrução processual, a Diretoria de
Controle da Administração Estadual manifestou-se nos seguintes termos (fls. 620-653):
3.1 Julgar irregulares, com imputação de débito,
fundamentado
do art. 18, inciso III, alíneas “b” e “c” c/c o art.
21, caput, da Lei Complementar n.º 202/2000 (estadual), as contas pertinentes a presente Tomada de Contas Especial, referente às Notas de Empenho nºs. 1927
e 4788 (fls. 37 e 245), no valor total
de R$ 67.109,00,
repassados à Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia, pelo Fundo de Desenvolvimento Social -
FUNDOSOCIAL, de acordo com os
relatórios emitidos nos autos.
3.2 Condenar solidariamente os responsáveis
Sr. Douglas Correa (então presidente
da Associação Esportiva e Recreativa
Uruguaia), inscrito no CPF sob o nº 047.987.899-41, com endereço na
Estrada Geral Uruguaia, s/nº, próximo a Comunidade Pinheiral, Bairro Uruguaia,
Braço do Norte/SC, CEP 88.750-000; a pessoa jurídica Associação Esportiva e Recreativa
Uruguaia (proponente do
projeto), inscrita no CNPJ sob o nº 09.164.475/0001-98, com endereço na Estrada
Geral Uruguaia s/nº, próximo a Comunidade Pinheiral, Bairro Uruguaia, Braço do Norte/SC, CEP 88.750-000; a Srª. Neuseli Junckes Costa, inscrita no
CPF sob o nº 569.986.869-00, com endereço na Rua João Batista Meirise, 63,
casa, Bairro Roçado, São José/SC, CEP 88.108-115; o Sr. Cleverson Siewert, inscrito no CPF sob o nº 017.452.629-62,
neste ato representado pelo Procurador Luciano Zambrota, inscrito na OAB/SC sob
o nº 16.266, no endereço – de seu procurador constituído, Rua Laurindo Januário
da Silveira, nº 4466, Bairro Lagoa da Conceição, Florianópolis/SC, CEP
88.062-201; a empresa Farias Terraplenagem Ltda. ME, inscrita no CNPJ sob o nº 00.221.773/0001-06, com endereço
na Rodovia SC 438, Km 30 - Trevo, Braço do Norte /SC, CEP 88.750-000 e a
empresa LS Comércio de Materiais
Esportivos Ltda. ME, inscrita no CNPJ sob o nº 07.258.927/0001-75, com endereço na Rua
Nereu Ramos, 22, Bairro Centro, Grão Pará/SC, CEP 88.890-000, ao recolhimento
da quantia de até R$ 67.109,00, fixando-lhe o prazo de 30
(trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico
desta Corte de Contas – DOTC-e, para comprovar, perante este Tribunal, o
recolhimento do valor do débito ao Tesouro do Estado, atualizado monetariamente
e acrescido dos juros legais (arts. 21 e 44 da Lei Complementar n.º 202/2000 -
estadual), calculados a partir da data de liberação dos recursos (20/08/2009 e
27/11/2009) sem o que, fica desde logo, autorizado o encaminhamento de peças
processuais ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, para que adote
providências à efetivação da execução da decisão definitiva (art. 43, II, da
Lei Complementar nº 202/2000 - estadual), conforme segue:
3.2.1 De
responsabilidade solidária do Sr.
Douglas Correa, e da pessoa jurídica Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia já qualificados
nos autos, sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei
Orgânica deste Tribunal, em face da:
3.2.1.1 ausência de comprovação da realização do objeto proposto e
da destinação dos materiais, aliada à ausência da movimentação em conta
bancária, através de cheques nominais e individualizados por credor, não
demonstrando a boa e regular aplicação dos recursos públicos, no montante de R$ 67.109,00, contrariando o art. 9º da
Lei nº 5.867/1981 (estadual), o art. 144, § 1º
da Lei Complementar nº 381/2007 (estadual), art. 16, caput, do
Decreto nº 307/2003 (estadual),
os arts. 47, 49 e 52, III da Resolução TC nº 16/1994 e Orientações para Prestação de Contas da Secretaria
de Estado da Fazenda (itens 2.3.1.1 e 2.3.1.4 deste
Relatório);
3.2.2 De responsabilidade solidária da Sra. Neuseli Junckes Costa, e do Sr. Cleverson Siewert, já qualificados,
sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste
Tribunal, por irregularidades que concorreram para a ocorrência do dano, em
face do:
3.2.2.1 Repasse irregular de recursos no
montante de R$ 67.109,00, valor já
incluído no item 3.2 desta conclusão, por meio
de esquema paralelo aos procedimentos estabelecidos na legislação e sem
observância dos requisitos legais e regulamentares, em descumprimento ao
estabelecido nos arts. 2º e 6º da Lei nº 5.867/1981 (estadual);
nos arts. 1º, 2º, § 1º e 5º da Lei nº 13.334/2005 (estadual),
art. 21 do Decreto Estadual nº 2.977/2005 e art. 116, § 1º da Lei Federal nº
8.666/1993, bem como os princípios
da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade, razoabilidade,
economicidade e eficiência, contidos no art. 37, caput da Constituição Federal/1988 e no
art. 16, caput e 5º da Constituição
do Estado de Santa Catarina/1989, inclusive da
motivação dos atos administrativos; nos arts. 7º e 8º, III do Decreto Estadual
nº 2.977/2005; e nos arts. 60 e 61, c/c o art. 116, caput da Lei Federal nº 8.666/1993, e arts. 120 e 130 da Lei
Complementar Estadual nº 381/2007 (item 2.2.1 deste
Relatório).
3.2.3 De responsabilidade da Empresa LS Comércio de Materiais Esportivos Ltda.
ME, já qualificada,
sem prejuízo de aplicação de multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste
Tribunal, em face da:
3.2.3.1 emissão
de notas fiscais inidôneas, haja vista a ausência de comprovação da realização
do objeto e do efetivo fornecimento das mercadorias, no valor de R$ 28.849,00, valor já incluído no
item 3.2 desta conclusão, nos termos dos arts. 49,
52, II e III, e do art. 60, II e III, todos da Resolução TC 16/1994, vigente à
época (item 2.4 deste Relatório).
3.2.4 De responsabilidade da
Empresa Farias Terraplenagem
Ltda. ME, já qualificada, sem prejuízo de aplicação de
multa prevista no art. 68 da Lei Orgânica deste Tribunal, em face da:
3.2.4.1 emissão
de nota fiscal inidônea, haja vista a ausência de comprovação da realização do
objeto e da efetiva realização dos serviços, no valor de R$ 38.260,00,
valor já incluído no item 3.2 desta conclusão, nos
termos dos arts. 49, 52, II e III, e do art. 60, II e III, todos da Resolução
TC 16/1994, vigente à época (item 2.4 deste Relatório).
3.3 Aplicar ao Sr.
Douglas Correa, já qualificado, multa prevista no art. 70, inciso
II, da Lei Complementar nº 202/2000 (estadual), fixando-lhe o prazo de 30
(trinta) dias a contar da publicação do Acórdão no DOTC-e, para comprovar
perante este Tribunal o recolhimento dos valores ao Tesouro do Estado, sem o
que fica, desde logo, autorizado o encaminhamento de peças processuais ao
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas para que adote providências à
efetivação da execução da decisão definitiva (arts. 43, II e 71 da Lei
Complementar nº 202/2000 - estadual), em face:
3.3.1 ausência de
declaração do responsável de que o material e/ou serviço foi prestado,
contrariando o inciso VII, do art. 44, da Resolução nº TC-16/1994 e o art. 24,
XI, do Decreto nº 307/2003 (estadual) (item 2.3.2 deste Relatório);
3.3.2 apresentação das
prestações de contas com atraso de 463 e 390 dias, respectivamente, em
descumprimento ao art. 8º da Lei nº 5.867/1981 (estadual) (item 2.3.3 deste
Relatório).
3.4 Declarar o Sr. Douglas Correa e a pessoa jurídica Associação
Esportiva e Recreativa Uruguaia impedidos de receber novos recursos
do erário até a regularização do presente processo, consoante dispõe o art. 16,
§ 3º da Lei nº 16.292/2013 (estadual), c/c o art. 1º, § 2º, inciso I, alíneas “b” e “c” da Instrução Normativa TC nº 14/2012 e o art. 61, III, § 6º do
Decreto Estadual nº 1.196/2017.
3.5 Dar ciência do Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o
fundamenta ao Sr. Cleverson Siewert e ao seu procurador
(fl. 526), a Sra. Neuseli Junckes Costa, ao Sr. Abel Guilherme da Cunha, ao Sr. Douglas Correa e ao seu procurador
(fl. 610), à Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia e ao seu procurador
(fl. 610), à empresa LS Comércio de Materiais Esportivos Ltda. ME, à empresa Farias Terraplenagem Ltda. ME e ao seu
procurador (fl. 511), e à Secretaria Executiva de Supervisão de Recursos Desvinculados.
3.6 Encaminhar cópia deste Relatório, do Relatório e Voto do Relator, bem como do
Acórdão, ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
(Grifos no original)
É o relatório.
1.
Considerações iniciais
Ressalte-se, em primeiro lugar, que o caso em
análise faz parte de um grandioso esquema fraudulento ocorrido durante o
exercício de 2009 no Fundo de Desenvolvimento Social, com a participação de
servidores, gestores e particulares.
Com efeito, impõe-se rememorar que, nos
termos dos relatórios técnicos elaborados pela Diretoria de Controle de
Administração Estadual, houve um prejuízo aos cofres públicos no vultoso
montante de R$ 6.389.558,72.
Importante salientar, na ocasião, que o
Ministério Público de Contas, ao analisar processos semelhantes, manifestou-se
pela citação dos superiores hierárquicos[2]
da Sra. Neuseli Junckes Costa, a qual é apontada como executora do esquema
fraudulento de repasses de verbas públicas através do Fundo de Desenvolvimento
Social no ano de 2009.
Procurou-se demonstrar que, ainda que não
existissem provas de uma conduta positiva dos superiores hierárquicos, houve
inequívoca omissão, visto não ser aceitável a ideia de que uma única servidora
pública pudesse ter o controle de todo o procedimento de concessão de recursos
públicos - desde o pedido inicial até a aprovação das contas prestadas - sem
que houvesse o mínimo de fiscalização.
É digno de nota, inclusive, que o Tribunal de
Contas catarinense, semanalmente, condena determinados gestores e ordenadores
primários em razão de suas condutas omissas.
O Relator, ao se manifestar nos feitos
semelhantes, divergiu desse posicionamento, pois, no seu entender, não existiam
provas suficientes da participação dos superiores hierárquicos da servidora
Neuseli Junckes Costa nos casos examinados. O Relator fez a ressalva de que tal
raciocínio poderia ser revisto caso surgissem novos elementos capazes de
evidenciar a responsabilidade dos gestores que compunham a cadeia hierárquica.
Diante
do entendimento do Relator no sentido de que haveria a necessidade de novos
elementos de convicção para que fosse adotada a providência solicitada, o
Ministério Público de Contas buscou medidas que pudessem colaborar para o
correto desenrolar do processo.
Oportuno comentar que foi solicitado, através
de notificação formal, o comparecimento da Sra. Neuseli Junckes Costa junto a
este órgão. Contudo, tal responsável não compareceu à oitiva agendada.
Somado a isso, buscou-se a troca de
informações e a união de esforços com o Ministério Público Estadual, o qual
também investiga o esquema fraudulento avistado neste feito.
Em decorrência desse trabalho conjunto,
obteve-se a informação de que a Sra. Neuseli Junckes Costa foi presa
preventivamente em 13.06.2016. Tal prisão, no entanto, foi relaxada em
02.08.2016, ante a concessão da ordem no habeas
corpus impetrado perante o Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
A propósito, sobreleva destacar que diversas
ações foram ajuizadas pelo Ministério Público Estadual junto ao Poder
Judiciário no intento de ressarcir o erário.
As ações protocolizadas pelo Ministério
Público Estadual estão em fase inicial de tramitação e até o presente momento
não se obteve informações novas que pudessem contribuir para a instrução dos
processos que estão em curso no TCE/SC.
Em razão disso e tendo em vista os princípios
aplicáveis ao processo - celeridade e razoável duração -, entendo necessário,
neste momento, analisar o mérito do presente feito, sem sugerir a
complementação de citação, consoante proposto em outros feitos que tramitam no
Tribunal, versando sobre a aludida fraude.
Ressalve-se, no entanto, que o Ministério
Público de Contas reitera o seu entendimento de que a medida mais acertada
seria a citação dos superiores hierárquicos da Sra. Neuseli Junckes Costa, pois
há elementos suficientes neste caderno processual para adotar a linha de
raciocínio exarada por este órgão.
Feita essa introdução e após deixar
registrado o posicionamento do Ministério Público de Contas a respeito do
assunto, passo a analisar os apontamentos levantados pela área técnica.
2.
Do processo de concessão de recursos públicos
Cabe ter presente, ao adentrar na análise
meritória, que o Fundo de Desenvolvimento Social repassou à Associação
Esportiva e Recreativa Uruguaia o valor total de R$ 67.109,00.
Ao analisar o processo de concessão, a
Diretoria de Controle da Administração Estadual observou a existência de um
esquema paralelo aos procedimentos estabelecidos na legislação e, ainda, a
inobservância de diversos requisitos legais e regulamentares.
Para corroborar, saliente-se que, além da
fraude constatada nos autos, restaram vislumbradas ainda as seguintes
irregularidades: a) ausência de expressa autorização do Chefe do Poder
Executivo, em desacordo ao art. 6º da Lei Estadual nº 5.867/1981; b) ausência
de emissão de parecer fundamentado de análise do pedido formulado pela entidade,
contrariando o art. 1º, o art. 2º, § 1º e o art. 5º da Lei Estadual nº
13.334/2005; c) ausência de aprovação do programa ou da ação pelo Conselho
Deliberativo do Fundo de Desenvolvimento Social, em afronta ao art. 7º e ao
art. 8º, inciso III, do Decreto Estadual nº 2.977/2005; d) ausência de
formalização do contrato ou ajuste entre as partes, em violação ao art. 60 e ao
art. 61 c/c art. 116, caput, da Lei
nº 8.666/1993.
A par disso, assinale-se que foram chamados
aos autos para responder solidariamente por tais apontamentos restritivos o Sr.
Abel Guilherme da Cunha (ordenador primário), o Sr. Cleverson Siewert
(ordenador secundário e Secretário Executivo de Gestão dos Fundos Estaduais) e
a Sra. Neuseli Junckes Costa (Analista da Receita Estadual).
Prestigiando uma melhor análise das defesas
apresentadas pelos responsáveis, passo a examiná-las individualmente.
2.1.
Defesa do Sr. Abel Guilherme da Cunha
Saliente-se que a Diretoria de Controle da
Administração Estadual aduziu, em seu relatório técnico inicial, que o Sr. Abel
Guilherme da Cunha, além de ser o ordenador primário da despesa, foi o
responsável por convidar a Sra. Neuseli Junckes Costa para integrar a sua
equipe no Fundo de Desenvolvimento Social quando ainda exercia as atribuições
do cargo de Diretor Financeiro.
Ao encontro disso, faz-se oportuno citar que
a Sra. Neuseli era convidada pelo Sr. Abel para participar de reuniões
fechadas, sem a participação de seus superiores hierárquicos, o que demonstra o
grau de confiança e a ligação existente entre tais agentes.
É digno de nota, também, que foi o Sr. Abel
quem indicou, formalmente, a Sra. Neuseli para substituir o Diretor de Gestão
dos Fundos Estaduais - Sr. Giovani Machado Seemann - durante o seu gozo de
férias.
Presente esse contexto, anote-se que a equipe
técnica, após analisar a contestação apresentada pelo Sr. Abel Guilherme da
Cunha, afastou a sua responsabilidade, sob o argumento de que a nota de empenho
acostada aos autos não está assinada.
Com o devido respeito ao entendimento
consubstanciado no relatório técnico derradeiro, mas tenho para mim que o caso
exige desfecho diverso, pelas razões que passo a expor.
Em primeiro lugar, acentue-se que é fato
incontroverso que o Sr. Abel Guilherme da Cunha era ordenador primário à época
dos fatos, o que pode ser vislumbrado, inclusive, em sua defesa.
Como é sabido, a função de ordenador está
intimamente ligada à atividade administrativa de execução orçamentária da
despesa, envolvendo, por consequência, a responsabilidade gerencial dos
recursos públicos.
Sobre o assunto, Guido Kops[3]
salienta:
As mais variadas
circunstâncias, em que pode ser colhido qualquer ato de despesa pública,
conduzem inflexivelmente ao autorizador ou ordenador dessa despesa. No âmago da
despesa se revela sempre um ordenador. De consequência, este assume a primeira
e mais importante responsabilidade na efetivação da despesa. Por outra, a nota
tônica da responsabilidade insere imanente na figura do ordenador ou
autorizador.
Nesse mesmo trilhar, acrescente-se que a
Corte de Contas catarinense tem posicionamento sedimentado de que “no
que concerne à responsabilidade administrativa, o ordenador de despesa
original, assim definido em lei, responde pelos atos e fatos praticados em sua
gestão”[4].
De
igual sorte, o Tribunal de Contas da União tem entendimento firme de que o
ordenador de despesas é pessoalmente responsável pelos atos dos quais resultem
despesas para a Administração Pública.
Para
corroborar, eis a transcrição do seguinte excerto:
O ordenador de despesas é pessoalmente responsável por todos
os atos dos quais resultem despesas para a União.
Deve, por isso, cercar-se de todas as cautelas possíveis ao autorizar despesas.
Não basta aferir a regularidade formal do processo. É preciso que os elementos
formadores do processo tenham sido constituídos de acordo com as normas que
regem a matéria e o princípio da economicidade seja observado. A afirmação de que apenas deram
seqüência a ato já previamente constituído não pode ser acolhida. O poder/dever
de diligência do ordenador de despesas impõe a ele a verificação da
regularidade dos atos de gestão sob todos os aspectos, sobretudo da adequação
do valor do contrato ao seu objeto.
O
exame da regularidade da despesa não se exaure na verificação da adequada
formalização do processo. A demonstração da despesa realizada deve induzir à
compreensão de que a observância das normas que regem a matéria proporcionou o
máximo de benefício com o mínimo de dispêndio (Constituição Federal, art. 70,
parágrafo único e DL 200/67, arts. 90 e 93)[5].
(Grifou-se)
À
luz dessa orientação, pode-se deduzir que é inadmissível que o ordenador da
despesa não tenha o mínimo de cautela ao autorizar os gastos públicos e ao
administrar o dinheiro da sociedade.
Feitas
essas considerações, sublinhe-se que a alegação da equipe técnica de que a nota
de empenho colacionada ao feito não está assinada não tem o condão de afastar a
responsabilidade do gestor.
Note-se
que os relatórios concernentes às notas de empenho acostados ao feito (fl. 37 e
fl. 245) foram emitidos em 06.10.2010 pelo servidor Sebastião Luiz Pereira. O
empenho, por sua vez, ocorreu efetivamente em 19.08.2009 e 26.11.2009.
Em
outras palavras, denota-se que o documento suscitado pela área técnica trata-se
de um mero relatório extraído do sistema SIGEF/SC um ano após o repasse do
dinheiro público.
Forçoso
admitir, portanto, que a ausência de assinatura no relatório da nota de empenho
juntado aos autos não afasta a responsabilidade do Sr. Abel Guilherme da Cunha,
pois sequer corresponde à época da concessão.
Não
bastasse isso, ressalte-se que a ausência da assinatura na nota de empenho pode
ser vista, em tese, como uma irregularidade, mas não serve para afirmar que o
ordenador primário não sabia do repasse do dinheiro público.
Como
é sabido, o empenho consiste em apenas uma das fases da despesa. Ainda que
supostamente o Sr. Abel não tenha emitido a nota de empenho - o que não se
acredita -, vê-se que tal gestor foi responsável por determinar a realização da
última etapa do dispêndio - o pagamento.
Nessa
linha de argumentação, cumpre consignar que o Decreto-Lei nº 200/1967 conceitua
que ordenador de despesa é toda e
qualquer autoridade de cujos atos resultem emissão de empenho, autorização de
pagamento, suprimento ou dispêndio de recursos (art. 80, § 1º).
Deduz-se, assim, que eventual irregularidade na
nota de empenho, por si só, não é o suficiente para afastar a responsabilidade
do ordenador de despesa, cuja atribuição não se restringe à emissão de tal
documento.
Ademais,
não me parece razoável afirmar que o Sr. Abel Guilherme da Cunha, na condição
de ordenador primário, não tinha ciência da emissão de 196 notas de empenho, no
valor total de R$ 6.389.558,72,
atreladas a repasses fraudulentos em um único exercício.
Acresça-se
a esse raciocínio, ainda, que a Sra. Neuseli Junckes Costa ocupava o cargo de
Analista da Receita Estadual e não possuía ingerência tamanha a ponto de
determinar a transferência de recursos públicos na ordem de aproximadamente 6,4
milhões em um único ano.
Embora
o Sr. Abel Guilherme da Cunha afirme que não exercia qualquer interferência
sobre a Diretoria de Gestão dos Fundos Estaduais e sobre a Secretaria Executiva
de Gestão de Fundos Estaduais, percebe-se que tal argumento não é aceitável.
Ora,
se tal agente aceitou ser ordenador de despesa da Unidade, mostra-se
incongruente a afirmação de que não possuía qualquer responsabilidade pela atividade administrativa de execução orçamentária dos
gastos públicos.
De igual modo, vê-se que a alegação de que a
fraude perpetuada no Fundo de Desenvolvimento Social ocorreu em lugar físico
diverso daquele em que o Sr. Abel exercia suas funções de Diretor de
Investimentos e Participações Públicas não é relevante a ponto de afastar a sua
responsabilidade.
A acumulação de duas atribuições, por sua
vez, apenas demonstra que tal gestor deveria exercer suas funções com
responsabilidade, ante o grau de confiança que lhe foi depositado.
Dessa forma, pode-se inferir que o Sr.
Abel deve responder pelos pagamentos que autorizou e, por corolário, deve ser
condenado ao ressarcimento ao erário e ao pagamento de multa.
2.2.
Defesa do Sr. Cleverson Siewert
Registre-se, neste ponto, que o Sr. Cleverson
Siewert, em 2009, estava à frente da Secretaria Executiva de Gestão dos Fundos
Estaduais e, ainda, era ordenador secundário de despesa.
Em razão de tais atribuições, tal gestor foi
chamado aos autos para responder, de forma solidária, pela fraude avistada no
Fundo de Desenvolvimento Social e, ainda, pelas diversas irregularidades nos
processos de concessão de recursos públicos.
No intento de afastar a sua responsabilidade,
o Sr. Cleverson Siewert aduz que determinou, em 2010, a adoção de providências
administrativas, com vistas à elucidação da conjuntura fática.
Pontuou, também, que a responsabilidade pelos
fatos irregulares deve ser atribuída exclusivamente à Sra. Neuseli Junckes
Costa, uma vez que tal servidora articulou um esquema fraudulento, sigiloso e
suficientemente capaz de enganar, por certo período de tempo, os gestores.
Em arremate, a defesa assinalou que o
Ministério Público Estadual está apurando os fatos e que o nome do Sr.
Cleverson em nenhum momento foi citado como autor ou partícipe de quaisquer
irregularidades.
Para a Diretoria de Controle da Administração
Estadual, tais argumentos não prosperam, porquanto houve omissão do Sr.
Cleverson Siewert ao fiscalizar e supervisionar os seus subordinados.
Atrelado a isso, o corpo técnico asseverou
que a adoção de providências administrativas somente restou efetivada quando
tal responsável assumiu a Secretaria de Estado da Fazenda, em 2010.
A meu ver, a interpretação dada ao caso
concreto pela Diretoria de Controle da Administração Estadual é acertada e está
em consonância com as regras e com os princípios aplicáveis à espécie.
Na condição de superior hierárquico, o Sr.
Cleverson Siewert tinha a obrigação funcional de orientar, controlar,
supervisionar e fiscalizar os serviços desempenhados por seus subordinados.
Vale destacar, oportunamente, que as
atribuições elencadas acima dizem respeito ao poder hierárquico.
Cumpre registrar que a hierarquia, conceito
ínsito à organização da administração pública, envolve verdadeiros poderes e
não meras faculdades.
No
caso em apreço, evidencia-se que o Sr. Cleverson Siewert não exerceu o mínimo de controle, fiscalização e
supervisão dos serviços desempenhados pela Sra. Neuseli Junckes Costa.
É inadmissível, pois, uma servidora montar
processos de concessão de recursos públicos, repassar vultosos valores a
entidades particulares e ainda forjar falsas prestações de contas sem que
houvesse qualquer fiscalização.
Relembra-se, em tempo, que o Sr. Cleverson
possuía as atribuições de Secretário da pasta e ordenador secundário da
despesa, o que, notadamente, aumenta a sua responsabilidade pelos fatos aqui
discutidos.
Nessa
linha de raciocínio, entende-se que “não é razoável
excluir a culpabilidade daqueles que possuíam atribuições fiscalizatórias para
evitar os danos ou, ainda, poderiam ter implantado controles de gestão
financeira tendentes a coibir o mau uso de recursos públicos. A grave
responsabilidade daqueles que gerenciam bens públicos passa, necessariamente,
pelo estabelecimento de controles e rotinas eficientes na sistemática de
movimentação de valores”[6].
Frente ao exposto, conclui-se que o Sr. Cleverson Siewert deve
responder solidariamente pelo dano causado aos cofres estatais, sem prejuízo da
multa proporcional ao dano.
2.3.
Defesa da Sra. Neuseli Junckes Costa
A última defesa a ser analisada é a da Sra.
Neuseli Junckes Costa, a qual foi apontada como executora e peça principal de
todo o esquema fraudulento ocorrido no Fundo de Desenvolvimento Social em 2009.
Ao cotejar os autos, observam-se diversos
elementos de provas capazes de demonstrar que a Sra. Neuseli atuou diretamente
nos repasses irregulares, desde a formalização do pedido de concessão até a
baixa das prestações de contas.
Não é demasia relembrar, a propósito, que tal
responsável foi presa preventivamente e responde por diversas ações de
improbidade administrativa, em decorrência da fraude aqui mencionada.
Atrelado a isso, sublinhe-se que a Sra.
Neuseli foi submetida a processo administrativo disciplinar, o qual resultou na
sua demissão qualificada.
Em sua defesa - intempestiva -, a Sra.
Neuseli tenta imputar a responsabilidade pelos atos ímprobos e irregulares a
outros agentes públicos. No entanto, não trouxe aos autos uma única prova
sequer a fim de confirmar suas alegações.
Em razão disso, valho-me integralmente das
considerações feitas pela Diretoria de Controle da Administração Estadual
quanto à necessidade de responsabilização da Sra. Neuseli Junckes Costa.
Para finalizar este ponto, acresça-se que a
Sra. Neuseli deve responder pelo débito de forma solidária e, ainda, deve ser
condenada ao pagamento de multa proporcional ao dano, ante a gravidade da sua
conduta.
3.
Do processo de prestação de contas
Sabe-se
que aquele que recebe dinheiro oriundo dos cofres do erário deve comprovar, de
forma ampla e robusta, a sua boa utilização.
Nesse
sentido, anote-se o teor do art. 140, da Lei Complementar Estadual nº 284/2005:
Art. 140. Prestará
contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize,
arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos, ou
pelos quais o Estado responsa, ou que, em nome deste, assuma obrigações de
natureza pecuniária.
§ 1º Quem quer que
utilize dinheiro público, terá de comprovar o seu bom e regular emprego, na
conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades
administrativas competentes.
Na oportunidade, sobreleva mencionar que o
ônus da prova da boa e da regular aplicação dos recursos públicos compete ao
gestor, conforme se depreende da jurisprudência sedimentada pelo Tribunal de
Contas da União:
TCE. APLICAÇÃO IRREGULAR
DE PARTE DE RECEITAS ORIUNDAS DE CONVÊNIO COM ENTIDADE FEDERAL. CITAÇÃO.
REVELIA. CONFIGURAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO, EM DECORRÊNCIA DE ATO DE GESTÃO
ILEGÍTIMO OU ANTIECONÔMICO. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. RECURSO DE
REVISÃO. CONHECIMENTO. NÃO-PROVIMENTO. CIÊNCIA AOS INTERESSADOS.
1. A
configuração de dano ao Erário, em decorrência de ato de gestão ilegítimo ou
antieconômico, importa no julgamento pela irregularidade, na condenação em
débito e na aplicação de multa.
2. Nos processos de contas que
tramitam nesta Casa, compete ao gestor o ônus da prova da boa e da regular
aplicação dos recursos públicos que lhe são confiados, o que independe da comprovação de ter se configurado o
crime de improbidade administrativa, da ocorrência de enriquecimento ilícito ou
de locupletamento por parte do recorrente[7].
(Grifou-se)
Nesse
mesmo passo, tem-se o entendimento do Tribunal de Contas de Santa Catarina,
conforme se vislumbra no voto lavrado pelo Conselheiro Substituto Cleber Muniz
Gavi:
TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE
RECURSOS ANTECIPADOS DO FUNCULTURAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA BOA E REGULAR
APLICAÇÃO DOS RECURSOS. AUTORREMUNERAÇÃO. PAGAMENTOS À FAMILIARES. DESPESAS
ILEGAIS E INJUSTIFICADAS. IRREGULARIDADE DAS CONTAS. DANO AO ERÁRIO. OMISSÕES
DO PODER CONCEDENTE. MULTA.
1. Nos processos de contas o onus probandi é do gestor dos recursos públicos, que
é pessoalmente responsável pela boa e regular aplicação dos recursos repassados
e tem o ônus de provar a execução do objeto pactuado, das despesas vinculadas
ao mesmo e trazer à colação elementos que demonstrem o atendimento ao interesse
público e a inexistência de lesão ao patrimônio público.
2. A
aplicação de recursos públicos impõe a observância de regramentos que garantam
sua destinação única e exclusiva a finalidades que correspondam ao interesse
público. Despesas que caracterizam autorremuneração e pagamento a familiares
devem ser considerados ilegais quando atenderem a interesses exclusivamente
particulares e não atingirem à finalidade pública.
3. Os
atos e omissões que revelam irregularidades na aprovação de projetos para
financiamento no âmbito do SEITEC,
por inobservância aos dispostivos legais e regulamentares que regem a
matéria, são sujeitos à aplicação de multa[8].
(Grifou-se)
Fixada
essa premissa, saliente-se que, no presente caso, não restou comprovada a boa e
a regular aplicação dos recursos públicos, em razão das seguintes
irregularidades: a) ausência de comprovação da realização do objeto proposto e
da efetiva realização das despesas; b) comprovação das despesas com notas
fiscais em cópias; c) documentos fiscais com descrição insuficiente dos
produtos contratados e ausência de outros meios supletivos de prova da
aquisição dos produtos e da prestação dos serviços; d) ausência da movimentação
da conta bancária através de cheques nominais e individualizados por credor; e)
ausência de declaração do responsável de que o material foi recebido e/ou
serviço foi prestado; f) apresentação de prestação de contas fora do prazo
legal.
A
par dos apontamentos restritivos, registre-se que a subvenção social foi
repassada pelo Fundo de Desenvolvimento Social à Associação Esportiva e
Recreativa Uruguaia em duas oportunidades, primeiramente no valor de R$
28.849,00 e, após, no montante de R$ 38.260,00.
Nos
termos dos planos de aplicação (fl. 10 e fl. 237), o dinheiro público seria empregado
em materiais esportivos, como camisas, calções, chuteiras, tênis, bolas e redes
e, ainda, na aquisição de um trator esteira, de uma máquina retroescavadeira e
de uma máquina pá carregadeira.
Mostra-se
oportuno salientar, na ocasião, que os maquinários seriam utilizados para
serviços de terraplanagem no local onde seria construída a sede da entidade, o
campo de futebol e a área de lazer. Ainda com os valores repassados, previu-se
a promoção de eventos esportivos com a finalidade de integrar pessoas e de
levar a prática do esporte para localidades mais isoladas.
No
entanto, não foi isso que ocorreu. Ao cotejar o feito, percebe-se que inexistem
provas satisfatórias que comprovem a realização dos projetos sociais propostos
pela entidade recebedora dos recursos públicos.
Para
corroborar essa linha de raciocínio, anote-se que a Gerência de Auditoria de
Recursos Antecipados realizou uma verificação in loco na sede da Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia e não
vislumbrou elementos suficientes para atestar a regularidade das contas.
A
propósito, extrai-se do relatório emitido pelo aludido órgão de fiscalização (fl.
53):
De acordo com o plano
de aplicação (fl. 04), os recursos seriam destinados para aquisição de 28
agasalhos, 84 camisas treino, 84 calções treino, 168 coletes treinos, 55
camisas jogo, 55 calções jogo, 92 pares de meia, 46 pares de chuteiras, 46
pares tênis futsal, 22 bolas de campo, 20 bolas de futsal, 400 metros rede
nylon, 02 redes futsal, 04 redes campo, 04 jogos de bochas.
Contudo, não foi
possível constatar se os recursos em questão foram efetivamente utilizados na
aquisição de materiais esportivos, visto que não foram apresentados a relação
dos beneficiados, nem se obteve confirmação da alegada distribuição do material
esportivo.
Conforme
se depreende, não foi apresentada qualquer lista dos beneficiados com os
materiais esportivos e as poucas camisas encontradas na sede da entidade
possuíam estampas de patrocínio.
No tocante ao maquinário, a Gerência de
Auditoria de Recursos Antecipados consignou (fl. 260):
Apesar das alegações
do Sr. Douglas, a constatação fática é que no local não houve qualquer serviço
de terraplanagem ou outro trabalho de remoção de terra em período recente, após
o repasse dos recursos, conforme fotografias em anexo.
Feitos
esses registros, acrescente-se que notas fiscais, por si só, não são
suficientes para comprovar a execução dos projetos, até mesmo porque foi
apresentada apenas a cópia dos documentos fiscais, o que vai de encontro ao
Decreto Estadual nº 307/2003.
Somado
a isso, tem-se de comentar que as notas não estão devidamente detalhadas, pois
não trazem a descrição dos produtos, como a marca, o tamanho e o material. Não
se vislumbra, outrossim, outros meios supletivos de prova da aquisição dos
produtos e da prestação dos serviços.
Vale
salientar, ademais, que a conta bancária não foi movimentada através de cheques
nominais e individualizados por credor, mas através de saque bancário, o que
caracteriza violação ao art. 16, caput,
do Decreto Estadual nº 307/2003.
Para
agravar ainda mais a situação fática, observa-se que não há declaração do
responsável de que o material foi recebido e os serviços foram prestados, conforme
determina o art. 24 do Decreto Estadual nº 307/2003.
Não
bastasse tudo isso, colhe-se dos autos que a prestação de contas foi
apresentada com mais de um ano de atraso, demonstrando, assim, a falta de
comprometimento daquele que recebeu o recurso público.
Presente
todo esse contexto, pontue-se que a Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia
e o Sr. Douglas Correa apresentaram defesa em conjunto e alegaram, em suma,
que: i) a responsabilidade deve recair somente sobre os ordenadores da despesa;
ii) não há que se falar em responsabilidade solidária; iii) os recursos públicos
foram devidamente aplicados; iv) a prestação de contas foi protocolizada.
Como se pode perceber, os argumentos trazidos
à baila são extremamente frágeis, pois, além de não passarem de meras
alegações, não foram acostadas aos autos provas de que os projetos foram efetivamente
executados.
Ressalte-se,
ademais, que não deve haver a responsabilização somente daqueles que repassaram
a subvenção social. Faz-se necessário, pois, condenar solidariamente as pessoas
que efetivamente receberam o recurso e o aplicaram em finalidade diversa.
A
mera prestação de contas, por sua vez, não exime os responsáveis pelas
ilegalidades avistadas no processo. Note-se, em tempo, que a prestação de
contas protocolizada pela Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia e pelo Sr.
Douglas Correa não possui o mínimo de elementos necessários a demonstrar a
execução dos planos de aplicação.
Não
havendo provas nesse sentido, entende-se que deve haver a devida restituição dos
valores aos cofres públicos - com os acréscimos legais - e a aplicação de multa.
De
igual modo, deve ser mantida a responsabilidade das empresas que emitiram os
documentos fiscais, uma vez que não comprovaram que entregaram efetivamente as
mercadorias e que prestaram os serviços constantes na nota.
Como
é sabido, todo aquele que concorre para a prática de ato irregular, seja como
contratante ou parte interessada, deve responder de forma solidária pelo
prejuízo causado à administração.
Nesse
sentido, eis a disposição constante na Lei Complementar Estadual nº 202/2000:
Art. 18. As contas
serão julgadas:
[...]
III — irregulares,
quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) omissão no dever
de prestar contas;
b) prática de ato de
gestão ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração à norma legal ou
regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou
patrimonial;
c) dano ao erário
decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; e
d) desfalque, desvio
de dinheiro, bens ou valores públicos.
§ 1º O Tribunal poderá julgar irregulares as
contas no caso de reincidência no descumprimento de determinação de que tenha
ciência o responsável, feita em processo de prestação ou tomada de contas.
§ 2º Nas hipóteses do inciso III, alíneas c e
d, deste artigo, o Tribunal, ao julgar irregulares as contas, fixará a
responsabilidade solidária:
a) do agente público
que praticou o ato irregular e
b) do terceiro que, como contratante ou parte
interessada na prática do mesmo ato, de qualquer modo, haja concorrido para a
ocorrência do dano apurado.
§ 3º Verificada a
ocorrência prevista no parágrafo anterior deste artigo, o Tribunal
providenciará a imediata remessa de cópia da documentação pertinente ao
Ministério Público Estadual, para ajuizamento das ações civis e penais
cabíveis. (Grifou-se)
Na
espécie, a empresa LS Comércio de Materiais Esportivos Ltda. ME e a empresa Farias
Terraplanagem Ltda. ME apresentaram suas respectivas defesas nos autos, mas em
nenhum momento conseguiram comprovar que os produtos e serviços descritos nas
notas fiscais haviam, de fato, sido entregues e realizados.
Assim
sendo, valho-me das conclusões lançadas pela Diretoria de Controle da
Administração Estadual, no sentido de responsabilizar solidariamente as
referidas empresas pelo dano provocado aos cofres estatais.
Ante
o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida
pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se:
1. Por julgar irregulares, com imputação
de débito, as
contas pertinentes a presente Tomada de Contas Especial, referente às Notas de Empenho nºs.
1927 e 4788, no valor
total de R$ 67.109,00, repassados pelo Fundo de
Desenvolvimento Social à Associação
Esportiva e Recreativa Uruguaia.
2. Por
condenar solidariamente o Sr.
Douglas Correa, a pessoa jurídica Associação
Esportiva e Recreativa Uruguaia, a Sra. Neuseli Junckes Costa, o Sr.
Cleverson Siewert, o Sr. Abel Guilherme da Cunha, a empresa Farias Terraplenagem Ltda. ME e a empresa LS
Comércio de Materiais Esportivos Ltda. ME ao
recolhimento da quantia de até R$ 67.109,00,
conforme segue:
2.1. De
responsabilidade solidária do Sr. Douglas Correa e da pessoa jurídica Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia o valor de R$
67.109,00, sem prejuízo de aplicação de multa, em face dos seguintes apontamentos:
2.1.1. Ausência de comprovação da realização do objeto proposto e
da destinação dos materiais, aliada à ausência da movimentação em conta
bancária através de cheques nominais e individualizados por credor, não
demonstrando a boa e regular aplicação dos recursos públicos;
2.2. De responsabilidade solidária da Sra.
Neuseli Junckes Costa, do Sr. Abel Guilherme
da Cunha e do
Sr. Cleverson Siewert o valor de R$
67.109,00, sem prejuízo de aplicação de multa, em face do seguinte apontamento:
2.2.1. Repasse irregular de
recursos por meio de esquema paralelo aos procedimentos estabelecidos na
legislação e sem observância aos requisitos legais e regulamentares.
2.3. De responsabilidade solidária da empresa
LS Comércio de Materiais Esportivos Ltda. ME o
valor de R$ 28.849,00, sem prejuízo de aplicação de
multa, em face do seguinte
apontamento:
2.3.1. Emissão de notas fiscais inidôneas, haja vista a ausência
de comprovação da realização do objeto e do efetivo fornecimento das
mercadorias.
2.4. De responsabilidade da empresa
Farias Terraplenagem Ltda. ME o valor R$
38.260,00, sem prejuízo de aplicação de multa, em face do seguinte
apontamento:
2.4.1. Emissão de nota fiscal inidônea, haja vista a ausência de
comprovação da realização do objeto e da efetiva realização dos serviços.
3. Por aplicar multa ao Sr. Douglas Correa, com
fulcro no art. 70, inciso II, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, em face
dos seguintes apontamentos:
3.1. Ausência
de declaração do responsável de que o material e/ou serviço foi prestado,
contrariando o inciso VII, do art. 44, da Resolução nº TC-16/1994 e o art. 24,
XI, do Decreto Estadual nº 307/2003;
3.2. Apresentação
das prestações de contas com atraso de 463 e 390 dias, respectivamente, em
descumprimento ao art. 8º da Lei Estadual nº 5.867/1981.
4. Por
declarar o Sr. Douglas Correa e a pessoa jurídica Associação Esportiva e Recreativa Uruguaia impedidos de receber
novos recursos do erário até a regularização do presente processo, consoante
dispõe o art. 16, § 3º da Lei nº 16.292/2013 (estadual), c/c o art. 1º, § 2º,
inciso I, alíneas “b” e “c” da Instrução Normativa TC nº 14/2012
e o art. 61, III, § 6º do Decreto Estadual nº 1.196/2017.
5. Por
remeter as informações contidas nestes autos ao Ministério Público do Estado de
Santa Catarina, em observância ao art. 18, § 3º, da Lei Complementar Estadual
nº 202/2000, para a adoção das providências que entender cabíveis.
6. Por
dar ciência da decisão proferida pelo TCE/SC aos responsáveis e ao Fundo de
Desenvolvimento Social.
Florianópolis,
14 de novembro 2017.
Diogo
Roberto Ringenberg
Procurador
do Ministério
Público
de Contas
[1] A Secretaria Executiva de Recursos
Desvinculados era denominada, em 2009, de Diretoria de Gestão dos Fundos
Estaduais – DIFE.
[2] Sra. Márcia Almeida Sampaio Goulart
(Gerente de Execução Orçamentária e Financeira – GEORF), Sr. Giovani Machado
Semann (Diretor de Gestão de Fundos Estaduais – DIFE), Sr. Cleverson Siewert
(Secretário Executivo de Gestão dos Fundos Estaduais) e Sr. Antônio Marcos
Gavazzoni (Secretário de Estado da Fazenda).
[3] KOPS, Guido. Os ordenadores da
despesa pública e a sua responsabilidade. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/viewFile/24166/22941.
Acesso em: 21 nov. 2016.
[4] Trecho extraído do prejulgado nº
1533, do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina.
[5] BRASIL, Tribunal de Contas da União.
Acórdão nº 661/2002 – Plenário. Disponível em: www.tcu.gov.br.
Acesso em: 22 nov. 2016.
[6] ARRAES, ANA. Autos do Processo nº AC-1340-20/12-P, Plenário. (TCU). Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 22 nov. 2016.
[7] BRASIL, Tribunal de Contas da União. TC 013.473/2004-9,
do Plenário. Rel. José Jorge. J. em: 27 fev. 2013. Disponível em: www.tcu.
gov.br. Acesso em: 08 dez. 2015.
[8] SANTA CATARINA, Tribunal de Contas.
TCE 10/002299497, do FUNCULTURAL. Rel. Cleber Muniz Gavi. J. em: 19 ago. 2015.