Parecer nº:

MPC/53.869/2018

Processo nº:

DEN 16/00165920

Un. Gestora:

Município de Imbituba

Assunto:

Irregularidades concernentes à criação do Fundo da Procuradoria Geral do Município - autos apartados do processo DEN-15/00412764

Numeração única:

MPC-SC 2.3/2018.458

 

 

 

Trata-se de denúncia formulada pelo Sr. Sérgio de Oliveira, relatando supostas irregularidades atinentes à criação do Fundo da Procuradoria Geral do Município de Imbituba.

O presente processo foi constituído em decorrência do Despacho Singular GAC/LEC-117/2016 (proferido no processo DEN 15/00412764), por meio do qual o Relator determinou o desentranhamento das fls. 02-151 da denúncia e o encaminhamento à Diretoria de Controle dos Municípios, para que esta adotasse as medidas cabíveis com relação aos fatos afetos a sua competência.

Após analisar a documentação apresentada pelo denunciante, a Diretoria de Controle dos Municípios emitiu o relatório nº 1139/2016, sugerindo conhecer da denúncia e julgá-la improcedente (fls. 80-85v).

É o relatório.

No que tange à admissibilidade da denúncia, acompanho o entendimento manifestado pela área técnica.

Passa-se ao exame do mérito.

A presente denúncia destina-se a averiguar possíveis irregularidades relacionadas à criação do Fundo da Procuradoria Geral do Município de Imbituba por meio da Lei Complementar nº 4.124, de 13 de junho de 2013, sem amparo no Plano Plurianual, na LDO e na LOA. Ademais, questiona a destinação dos honorários sucumbenciais ao referido fundo.

Cabe pontuar que a destinação dos honorários sucumbenciais aos procuradores do município está sendo analisada pela Diretoria de Atos de Pessoal no bojo dos autos nº DEN 15/00412764, razão pela qual não se analisará a matéria no presente feito.

No que se refere à instituição de Fundo da Procuradoria Geral, a área técnica pontuou que muitos municípios catarinenses adotaram esse modelo, a exemplo de Mafra, Itapema e Brusque.

Ainda no que tange à instituição de fundos, importante trazer a distinção entre fundos de destinação (caso dos autos) e fundos de participação, feita por Regis Fernandes de Oliveira[1]:

 

[...] os fundos de participação são os de caráter tributário, com previsão constitucional (esparsos entre os arts. 157 a 162 da Constituição) e de repasse automático, de que são exemplos principais o Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal e o Fundo de Participação dos Municípios. Ou seja, são fundos que preveem destinação a pessoas jurídicas específicas. [...] os fundos de destinação seriam receitas vinculadas a uma finalidade específica. A previsão deste fundo está no artigo 71 da lei 4.320/1964 que assim dispõe: “constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que por lei se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação”. [Grifou-se].

 

Em tempo, destacam-se os arts. 71 a 74 da Lei nº 4.320/64, os quais amparam a criação de fundos especiais, vejamos:

 

Art. 71. Constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que por lei se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação.

Art. 72. A aplicação das receitas orçamentárias vinculadas a turnos especiais far-se-á através de dotação consignada na Lei de Orçamento ou em créditos adicionais.

Art. 73. Salvo determinação em contrário da lei que o instituiu, o saldo positivo do fundo especial apurado em balanço será transferido para o exercício seguinte, a crédito do mesmo fundo.

Art. 74. A lei que instituir fundo especial poderá determinar normas peculiares de controle, prestação e tomada de contas, sem de qualquer modo, elidir a competência específica do Tribunal de Contas ou órgão equivalente.

 

Cabe pontuar também que a Constituição Federal, em seu art. 167, inciso IX, veda a instituição de fundos de qualquer natureza sem prévia autorização legislativa.

Em exame aos autos, verifica-se que a criação do Fundo da Procuradoria Geral do Município de Imbituba se deu por meio da Lei Complementar 4.214/2013[2], não se vislumbrando irregularidade com relação à instituição do referido fundo, já que houve autorização legislativa para sua criação.

O denunciante também questionou que o Plano Plurianual referente ao exercício de 2010-2013 (aprovado em 17 de julho de 2009), não faz menção a qualquer fundo. Da mesma forma, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual relativas ao exercício de 2013 (aprovadas em setembro e dezembro de 2012, respectivamente) são silentes quanto ao tema.

Cabe ressaltar, todavia, que a Lei Complementar Municipal nº 4.214/2013, que instituiu o mencionado Fundo, somente foi aprovada e publicada em junho de 2013. Assim, não haveria como estabelecer, previamente, a nova unidade orçamentária nas leis citadas pelo denunciante.

Todavia, como já ressaltado pela área técnica, a criação do fundo exige inclusão da unidade orçamentária no PPA e LDO. No caso ora analisado, esta ocorreu por meio da Lei Ordinária nº 4409/2014[3]:

 

Art. 1º Fica autorizado o Chefe do Poder executivo Municipal a proceder alteração para inclusão dos Órgãos, Unidades e Ações abaixo discriminadas no Plano Plurianual – PPA 2014-2017, Lei 4.233, de 13 de julho de 2013, e na Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO 2014, Lei 4.252, de 03 de outubro de 2013:

ÓRGÃO: 42 FUNDO MUNICIPAL DA PROCURADORIA GERAL- FMPG

UNIDADE: 42.01 Fundo Municipal da Procuradoria Geral

PROGRAMA 0005 Defesa do Interesse Público

AÇÃO: 2.150 Manutenção do Fundo da Procuradoria

 

Art. 2º Fica aberto crédito especial no valor de R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais) no Orçamento de 2014 para novos itens orçamentários, como segue:

ÓRGÃO: 42 FUNDO MUNICIPAL DA PROCURADORIA GERAL FMPG

UNIDADE: 42.01 Fundo Municipal da Procuradoria Geral PROGRAMA 0005 Defesa do Interesse Público

AÇÃO: 2.150 Manutenção do Fundo da Procuradoria

02.062.0005-2.150

3.1.90.00.00.00.00.00.0707 Aplicações Diretas 52.500,00 3.3.90.00.00.00.00.00.0707  Aplicações Diretas                8.750,00

4.4.90.00.00.00.00.00.0707   Aplicações Diretas               8.750,00

SOMA                                                                                70.000,00

 

Art. 3° Os recursos para abertura do crédito especial de que trata o artigo anterior correrão por conta da Anulação parcial e/ou total das seguintes dotações orçamentárias:

PREFEITURA MUNICIPAL DE IMBITUBA

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

Manutenção da Procuradoria Geral

02.062.0005-2.039

3.3.90.00.00.00.00.00.0707 (0185) Aplicações Diretas 35.000,00

4.4.90.00.00.00.00.00.0707 (0186) Aplicações Diretas 35.000,00

 

Verifica-se que a Lei nº 4409/2014 autorizou o Chefe do Poder Executivo a fazer as alterações necessárias no PPA referente aos exercícios de 2014-2017 e na LDO referente ao exercício de 2014, para inclusão do Fundo da Procuradoria Geral do Município, criado em 2013. Ademais, foi aberto crédito especial no orçamento de 2014 em favor do mencionado Fundo.

Ressalto, entretanto, que a medida mais acertada seria incluir a unidade relativa ao Fundo da Procuradoria Geral do Município já na redação original do PPA 2014-2017, da LDO 2014 e da LOA 2014.

Todavia, entendo que a medida legislativa adotada sanou, ainda que tardiamente, a situação irregular verificada no Município.

Por fim, cabe ressaltar que a Lei Complementar nº 4.214/2013, que instituiu o Fundo em exame, previu em seu corpo que:

 

Art. 10. Fica autorizado o Prefeito Municipal a regulamentar a presente Lei, criando os itens orçamentários necessários à perfectibilização desta Lei, e demais aspectos relativos ao fiel cumprimento da presente.

 

Art. 11. As despesas com a execução desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias.

 

Deve-se pontuar que, em virtude da dinamicidade inerente à administração – a exemplo da criação de novas unidades orçamentárias, conforme visto nestes autos –, foram introduzidos instrumentos que possibilitam certa flexibilidade ao gestor para que adeque o orçamento às suas necessidades, desde que devidamente autorizado por lei específica.

As alterações orçamentárias podem ser realizadas de diversas formas, dentre elas por meio de crédito adicional especial, medida adotada no presente caso.

Assim, entendo que, no presente caso, cabe apenas determinação à Unidade para que atente à necessidade de incluir tempestivamente nas leis orçamentárias as unidades orçamentárias que forem eventualmente criadas.

O denunciante alega ainda que o art. 2º da Lei Complementar nº 4.214/13 viola normas e princípios constitucionais, conforme segue:

[...]

7.1. O artigo 2º, inciso I, desta Lei Complementar ofende o artigo 22, inciso I, da Carta da República;

7.2. O artigo 2º, inciso II, desta Lei Complementar ofende o artigo 165, §5º, da Carta da República. Viola, portanto, o Princípio da Universalidade Orçamentária. Ademais, a LDO do Município de Imbituba prevê as despesas para a manutenção da Procuradoria Geral: folha 42;

7.3 O artigo 2º, inciso IV, desta Lei, ofende os Princípios Constitucionais da Moralidade, Impessoalidade e Legalidade, haja vista que o objeto do convênio celebrado com qualquer pessoa, mesmo que pública, comprometeria o cumprimento destes Princípios Basilares. Como que a Procuradoria-Geral do Município poderia se comportar, em litígio, com conveniado seu? Com inescondível parcialidade;

[...].

 

As normas retrocitadas possuem a seguinte redação:

 

Lei Complementar nº 4.214/2013

 

Art. 2º Constituem verbas do Fundo Municipal da Procuradoria Geral do Município de Imbituba:

I – nas ações judiciais de qualquer natureza, de competência da Procuradoria Geral do Município, em que for parte o Município de Imbituba, os honorários advocatícios fixados por arbitramento, por acordo ou por sucumbência;

II – dotação consignada no orçamento geral do Município;

[...]

IV – produto de convênios firmados com terceiros, cujo objeto seja transferência de valores destinados ao Fundo Municipal da Procuradoria Geral do Município de Imbituba.

 

 

Constituição Federal:

 

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

 

Art. 165, § 5º A lei orçamentária anual compreenderá:

I - o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público;

II - o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto;

III - o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público.

 

Dito isso, percebe-se que o denunciante está equivocado.

O Município, ao criar o fundo e prever como fonte de recursos os honorários advocatícios, não tratou de legislar acerca de nenhuma das matérias constantes no art. 22, I da CF/88. Apenas afetou essa receita por meio da criação de um fundo especial. A matéria, como se vê, relaciona-se ao orçamento municipal, sendo de competência do Município de Imbituba.

Percebe-se também que não há violação ao Princípio da Universalidade[4], pois o art. 2º e 3º da Lei Ordinária nº 4.409/2014 autorizou o Chefe do Poder Executivo a abrir crédito especial no valor de R$ 75.000,00 no Orçamento de 2014, para inclusão do Fundo Municipal da Procuradoria Geral. Ademais, essa despesa foi custeada por conta da anulação da dotação orçamentária referente à manutenção da Procuradoria Geral.

Ainda, para o denunciante, o artigo 2º, inciso IV, da Lei que cria o Fundo ofende os princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e legalidade, em virtude de uma possível parcialidade da Procuradoria Geral frente a um conveniado em eventual litígio, argumento fraco para embasar uma suposta ofensa aos princípios constitucionais citados.

Cabe ressaltar ainda que uma das atribuições do cargo de advogado público é a defesa institucional da Administração Pública. Dentre suas obrigações está a de fazer valer os princípios constitucionais e as leis pátrias. Para o exercício de suas atribuições lhe foi outorgada autonomia e independência funcional, as quais são prerrogativas indisponíveis para uma eficiente defesa do erário público. Assim, qualquer atuação que se desvie desses fins pode ensejar a aplicação de sanções administrativas ou mesmo penais.

Assim, entendo que as alegações do denunciante não procedem.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar no 202/2000, manifesta-se pelo acolhimento da conclusão constante no relatório nº 1139/2016, acrescendo apenas a necessidade de formular determinação à Unidade para que atente à inclusão tempestiva nas leis orçamentárias das unidades orçamentárias que forem eventualmente criadas.

Florianópolis, 02 de março de 2018.

 

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas

 

 



[1] OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 2ª ed. rev. atual. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2008. p. 284.

[2] Lei disponível no seguinte endereço eletrônico: http://www.legislador.com.br/imgLei/413909069_pdf13_2_4214_2013.pdf

[3] Dispõe sobre alteração do Plano Plurianual – PPA 2014-2017, da Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO 2014, e abre crédito especial para o exercício de 2014 para o Fundo Municipal de Cultura de Imbituba e Fundo Municipal da Procuradoria Geral do Município de Imbituba e dá outras providências. Disponível em

http://www.legislador.com.br/LegisladorWEB.ASP?WCI=LeiConsulta&ID=316&dsVerbete=ppa&

[4] No ordenamento jurídico brasileiro este princípio é consagrado pelos artigos 2º e 6º da Lei nº 4.320/64:

Art. 2º. A Lei de Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar obedecidos os princípios da unidade, universalidade e anualidade

Art. 6º. Todas as receitas e despesas constarão da Lei de Orçamento pelos seus totais, vedadas quaisquer deduções.