Parecer nº:

MPC/53.979/2018

Processo nº:

TCE 11/00411949    

Origem:

Companhia Águas de Joinville

Assunto:

Regularidade e controle gerencial dos procedimentos de faturamento da Companhia Águas de Joinville.

Numeração Única:

MPC-SC 2.3/2018.513

 

Trata-se de tomada de contas especial oriunda de auditoria realizada na Companhia Águas de Joinville, com o objetivo de analisar a regularidade e o controle gerencial dos procedimentos de faturamento ocorridos de 01.01.2010 a 31.05.2011.

Após a realização dos trabalhos de fiscalização, da realização de audiência dos responsáveis e da manifestação da Diretoria de Controle da Administração Estadual e do Ministério Público de Contas, foram os autos remetidos ao gabinete do Relator, o qual se manifestou pela conversão do feito em tomada de contas especial, nos seguintes moldes (fls. 623-630):

 

3.1 – Determinar, com fundamento nos arts. 13 e 32 da Lei Complementar nº 202, de 2000, c/c o § 1º do art. 34 da Resolução n. TC-06/2001 e art. 1º da Decisão Normativa n. TC-0013/2015 a CONVERSÃO destes autos em TOMADA DE CONTAS ESPECIAL.

3.2 – Determinar a citação do Sr. HENRIQUE CHISTE NETO, ex-Diretor-Presidente da Companhia Águas de Joinville, no cargo de 16/06/2005 até 28/02/2009, CPF nº 541.663.308-53, residente e domiciliado na Rua Wolfgang Amon, nº 240, Bairro Costa e Silva, Joinville/SC. nos termos do art. 15, II, da Lei Complementar nº 202/2000, para no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b, do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa acerca da irregularidade abaixo identificada passível de imputação de débito e/ou aplicação de multa:

 3.2.1 Pelos valores pagos pelas ações judiciais a seguir descritas, por dano material e moral por suspensão indevida do fornecimento de água com fatura quitada, o que evidencia a omissão do então dirigente, em aceitar tais desembolsos sem determinar a apuração dos fatos, com levantamento das causas da ocorrência, certificando a possibilidade ou não de determinar o agente causador da prática, denotando falta de cuidado e diligência, ferindo, portanto, os artigos 153 e 154 da Lei 6.404/1976;

3.2.1.1 R$ 3.544,71 (três mil quinhentos e quarenta e quatro reais e setenta e um centavos), referente valor indenizado a Sra. Claudinéla da Silva Alves, por decisão exarada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos do processo 038.06.007839-9;

3.2.1.2 R$ 2.000,00 (dois mil reais), referente valor indenizado ao Sr. Osmar Benvenutti, por decisão exarada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos do processo n. 038.07.046857-2;

3.2.1.3 R$ 3.000,00 (três mil reais), referente valor indenizado ao Sr. Edson José Gehlen, por decisão exarada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos do processo n. 038.07.039048-4.

3.3 – Determinar a citação do Sr. ATANÁSIO PEREIRA FILHO, Diretor-Presidente da Companhia Águas de Joinville, no período de 01/03/2009 a 31/03/2011, inscrito no CPF nº 070.331.689-34, com endereço na Rua Saldanha Marinho, nº 392, Centro, Florianópolis, CEP 88010-450 e do Sr. LUIZ ALBERTO DE SOUZA, Diretor-Presidente, no cargo desde 01/04/2011 a 06/10/2013, inscrito no CPF nº 070.331.689-34, com endereço na Rua Saldanha Marinho, nº 392, Centro, Florianópolis, CEP 88010-450para no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b, do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno, apresentar alegações de defesa acerca da irregularidade abaixo identificada passível de aplicação de multa:

3.3.1 Existência de distorções na fixação dos salários de empregados, embora com o mesmo nível técnico, por ir de encontro ao princípio da isonomia, conforme previsto pelo art. 461 da CLT, caracterizando ato de mera liberalidade do gestor, procedimento este vedado pelo artigo 154, § 2°, “a”, da Lei nº. 6.404/1976. (item 2.3 do Relatório n. 027/2015);

3.4 – Determinar o encaminhamento do presente processo à Divisão de Protocolo – DIPO, da Secretaria Geral deste Tribunal, para que proceda a respectiva conversão em Tomada de Contas Especial e posterior remessa à Diretoria de Controle da Administração Estadual para que proceda à CITAÇÃO dos responsáveis.

3.5Dar ciência desta decisão aos responsáveis e à Companhia de Águas de Joinville. (Grifos no original)

 

Realizada a citação, o Sr. Atanásio Pereira Filho apresentou resposta às fls. 643-646, o Sr. Henrique Chiste Neto às fls. 735-742 e o Sr. Luiz Alberto de Souza às fls. 748-749.

Por fim, sobreveio novo relatório técnico, sob o nº 477/2016, com a seguinte conclusão (fls. 834-840):

 

3.1 Preliminarmente, que encaminhe os autos a Consultoria Geral para que complemente o estudo efetuado às fls. 617-622, que trata sobre a possibilidade de empregados comissionados nas sociedades de economia mistas (item 2.4 deste Relatório), esclarecendo o seguinte:

a) Qual deve ser o procedimento para formalizar a relação jurídica entre o nomeado e a empresa estatal?

b) Haverá registro na carteira de trabalho – CTPS? Em caso, negativo, qual o documento adequado?

c) Faz-se necessário o recolhimento/depósito de FGTS? Em caso positivo, quando da despedida (demissão/exoneração do comissionado), incidirá ou não a multa sobre saldo do FGTS?

d) Sobre a alteração do Prejulgado 1871, principalmente em relação a parte em que afronta o art. 143 da Lei Federal nº 6.404/1976.

 

3.2 Julgar IRREGULARES, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, alíneas “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, ambos da Lei Complementar nº 202/2000, a presente Tomada de Contas Especial e condenar o Responsável, Sr. Henrique Chiste Neto, CPF n° 541.663.308-53, ao pagamento de débito, a seguir discriminado, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres da Companhia Águas de Joinville, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar nº 202/2000), calculado a partir da data de ocorrência do fato gerador do débito, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar nº 202/2000):

3.2.1 - R$ 2.000,00 (dois mil reais), referente a valor pago pela Companhia Águas de Joinville em condenação na Ação nº 038.07.046857-2, ajuizada por Osmar Benvenutti, em afronta ao art. 153 da Lei nº 6.404/1976, por não ter agido com a diligência que deve empregar na administração da empresa, além de configurar ato de mera liberalidade às custas da Companhia, o que é vedado pelo art. 154, §2º, a, do mesmo diploma legal (item 3.1.2 deste Relatório);

3.2.2 - R$ 3.000,00 (três mil reais), valor pago pela Companhia Águas de Joinville em condenação proferida nos autos da Ação nº 038.07.039048-4, ajuizada por Edison José Gehlen, em razão de não ter agido com a diligência que deveria empregar na administração da empresa, em afronta ao art. 153 da Lei nº 6.404/1976, além de configurar ato de mera liberalidade às custas da Companhia, o que é vedado pelo art. 154, §2º, a, do mesmo diploma legal (item 3.1.3 deste Relatório).

3.3 Determinar ao atual gestor da Companhia Águas de Joinville, Sr. JALMEI JOSÉ DUARTE, ou quem vir a substituí-lo, para que:

3.3.1 Adote procedimentos eficientes e eficazes a fim de amenizar as perdas de água tratada originada por vazamentos, seja melhorando a rede de tubulações existentes, seja investindo em técnicas mais modernas de condução de água (item 3.5.1 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.2 Agilize junto aos usuários o redirecionamento dos hidrômetros que se encontram na parte interna das residências, deslocando-os para local com acesso visual externo, onde haja possibilidade de leitura/medição, em observância as diretrizes da estatal (item 3.5.2 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.3 Fiscalize, de forma eficiente, as construções existentes no município, a fim de evitar que haja obras sem ligações de água (abastecendo-se com vizinhos), além de verificar e coibir a existência de eventuais ligações clandestinas (item 3.5.3 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.4 Reveja os contratos com as empresas terceirizadas exigindo desempenho de acordo e maior comprometimento dos leituristas, a fim de evitar tantas reclamações por partes dos usuários, bem como prejuízos a estatal (item 3.5.4 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.5 Aprimore o controle gerencial das cobranças, a fim de evitar a existência de valores cujo “pagador” não seja identificado pela estatal, bem como adote procedimentos (rotinas), em relação aos pagamentos de faturas realizadas em duplicidade ou a maior, a fim de comunicar o pagante e fazer a compensação, automaticamente, com faturas posteriores, ou mesmo devolver, em espécie, se assim for requerido (item 3.5.5 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.6 Seja diligente ao efetuar o cancelamento do fornecimento de água ao usuário, bem como ter cuidado para não inserir indevidamente o nome deste nos cadastro de inadimplentes (SPC/SERASA), para evitar mais prejuízos com condenações por danos morais (item 3.5.6 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.7 Adote medidas no sentido de identificar os responsáveis, quantificar o dano e fazer ressarcir aos cofres públicos da empresa o montante despendido em ações judiciais que resultaram em condenação por danos morais, sob pena de o gestor omisso ser pessoalmente responsável por tal débito (item 3.5.7 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.8 Proceda, se necessário for, aos ajustes devidos em relação a possíveis de distorções na fixação dos salários de empregados de mesmo nível técnico e exercentes de mesma atividade (item 3.5.9 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015 e item 2.2 deste Relatório);

3.3.9 Faça constar nos contratos com as empresas terceirizadas (empreiteiras) para que estas executem as obras por completo, não deixando buracos abertos, sem proteção e/ou sem obstáculo que impeça a aproximação de pessoas, bem como não deixe materiais (resíduos) de obras em via pública, além de efetivamente fiscalizar todas as obras contratadas e exigir a adequados mecanismos de proteção e prevenção (item 3.5.10 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.10 Providencie a regularização (escritura e registro de imóveis) de todos os bens imóveis que possui (item 3.5.11 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015).

 

É o relatório.

 

1. Irregularidades ensejadoras de imputação de débito e/ou aplicação de multa

 

1.1. Pagamento de indenização por dano material e moral por suspensão indevida do fornecimento de água com fatura quitada

 

Destaque-se, inicialmente, que a Companhia Águas de Joinville foi condenada em ações judiciais ao pagamento de indenizações por danos materiais e morais, em razão da suspensão irregular de fornecimento de água.

Em um primeiro momento, apontou-se a condenação da estatal em diversas ações judiciais. No entanto, averiguou-se, posteriormente, que muitas demandas foram objeto de discussão na prestação de contas anual da Unidade Gestora.

Diante dessa constatação, restaram para a análise, neste caderno processual, as seguintes condenações: i) R$ 3.544,71 referente ao valor indenizado a Sra. Claudinéia da Silva Alves, por decisão exarada pelo TJ/SC nos autos nº 038.06.007839-9; ii) R$ 2.000,00 concernente ao valor indenizado ao Sr. Osmar Benvenutti, por decisão exarada pelo TJ/SC nos autos nº 038.07.046857-2; iii) R$ 3.000,00 atinente ao valor indenizado ao Sr. Edson José Gehlen, por decisão exarada pelo TJ/SC nos autos nº 038.07.039048-4.

Convém explicar, neste ponto, que a irregularidade não consiste na realização dos pagamentos das indenizações, mas na omissão em adotar providências administrativas para apurar a responsabilidade de quem deu causa aos atos ilícitos ensejadores de danos materiais e morais.

Para responder por este apontamento, chamou-se aos autos o Sr. Henrique Chiste Neto, o qual ocupou o cargo de Diretor-Presidente da estatal à época dos fatos.

Em sua defesa, o responsável aduz que ficou constatado que a prestadora de serviços de cortes e ligações – Terra Norte Construtora Ltda. – foi a responsável pelo corte irregular que ensejou a condenação no valor de R$ 3.544,71 (processo nº 038.06.007839-9), razão pela qual procedeu ao desconto de tal montante dos valores pagos mensalmente à empreiteira.

No tocante à condenação no importe de R$ 2.000,00 (processo nº 038.07.046857-2), comenta que o corte de fornecimento de água ocorreu em virtude de erro de digitação no momento do pagamento da fatura.

Assevera que a empresa Raiz Soluções Inteligentes Ltda., que é a responsável por alimentar o sistema, não conseguiu efetuar a conferência das faturas pagas dentro de tempo hábil por falta de estrutura. Defende, ainda, que eventual ação regressiva estaria fadada ao insucesso, causando, assim, verdadeiro desperdício financeiro.

Assinala que a condenação no montante de R$ 3.000,00 (processo nº 038.07.039048-4) ocorreu em razão de sustação no fornecimento dos serviços por erro do sistema SANSYS, o qual emitiu aviso automático para corte, mesmo constando o registro de pagamento. Conclui, por fim, que eventual ação de regresso também seria improdutiva, pois não foi possível identificar um responsável pelo erro observado no sistema.

Quanto aos argumentos acima apresentados, entende-se que somente podem ser acolhidas as justificativas atinentes à indenização na importância de R$ 3.544,71 (processo nº 038.06.007839-9), já que restou comprovado (fl. 744) que houve o desconto na conta da empresa Terranorte Construtora Ltda.

As demais justificativas apresentadas, com o devido respeito, devem ser rechaçadas. O responsável defende que não seria possível obter êxito nas ações regressivas, mas tal afirmação não passa de mera especulação.

Importante consignar que não foi adotada uma única medida sequer para ressarcir os cofres públicos, seja através de providências administrativas ou judiciais. É descabida, portanto, a alegação do gestor, o qual não empregou nenhum esforço satisfatório para tentar identificar os responsáveis pelos erros.

A Lei nº 6.404/1976, a qual trata das sociedades por ações, é cristalina ao dispor que “o administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios” (art. 153).

Aliado a isso, imperioso salientar que não é permitido ao administrador praticar qualquer ato de liberalidade à custa da companhia (art. 154, § 2º, “a”, da Lei nº 6.404/1976).

No caso em análise, observa-se que o gestor manteve-se inerte quando tinha a obrigação e o dever legal de agir, atraindo para si, portanto, a responsabilidade pelos fatos.

Logo, deve ser imputado débito ao Sr. Henrique Chiste Neto, no valor total de R$ 5.000,00 (processo nº 038.07.039048-4 e processo nº 038.07.046857-2), em virtude da omissão constatada.

 

 

1.2. Distorções na fixação dos salários dos empregados

 

A Diretoria de Controle da Administração Estadual, ao analisar as folhas de pagamento, constatou a existência de distorções na fixação dos salários dos empregados da Companhia Águas de Joinville, embora estes possuam o mesmo nível técnico.

Notadamente, tal situação fática viola o princípio da isonomia, pois empregados com as mesmas atribuições recebem remunerações distintas, o que é inaceitável.

Para responder por este apontamento restritivo, procedeu-se à citação do Sr. Atanásio Pereira Filho e do Sr. Luiz Aberto de Souza, ex-Diretores Presidentes da estatal.

Em suas respetivas defesas, os responsáveis alegam que após a realização de auditoria interna foi verificada a existência de incongruências no Plano de Cargos e Salários da Companhia.

Salientam que, com base no relatório de auditoria interna, foi constatada a necessidade de revisar o Plano de Cargos e Salários, sendo nomeada, para tanto, uma comissão com poderes para analisar, revisar e propor adequações no aludido Plano.

Discorrem que o Conselho de Administração da Companhia, diante do estudo realizado pela comissão, aprovou as alterações no Plano de Cargos e Salários, através da Resolução nº 001/2012, corrigindo, assim, o problema apontado.

Valendo-se de tais informações, a área técnica manifestou-se por realizar apenas uma determinação ao atual gestor da estatal, para que adote medidas preventivas e temporais, evitando que situações dessa natureza sejam reiteradas.

De fato, a proposição inicial para a aplicação de multa não deve ser mantida, pois os responsáveis demonstraram que adotaram providências dentro de um lapso temporal razoável.

É digno de nota, inclusive, que a irregularidade foi constatada pela própria Companhia através de auditoria interna, sendo determinada, em sequência, a adoção de medidas para a correção dos fatos irregulares.

Mostra-se pertinente comentar que as distorções nos pagamentos ocorreram em virtude de previsão constante no Plano de Cargos e Salários, não se tratando, portanto, de ato de liberalidade dos gestores.

Não pode passar despercebido, também, que os responsáveis não estavam à frente da estatal quando da aprovação das normas constantes no Plano de Cargos e Salários da Companhia Águas de Joinville.

Frente ao exposto, acompanho as conclusões expostas no relatório técnico, para que seja feita uma determinação ao atual gestor da Companhia para que adote sempre medidas preventivas e temporais, evitando, assim, problemas futuros.

 

1.3. Empregos comissionados

 

Apontou-se, no relatório técnico inicial, que a Companhia Águas de Joinville contratou empregados por meio de portarias para exercer “emprego comissionado” e, de acordo com a diretoria técnica, tal situação fática viola a regra do concurso público.

Reconhecendo a divergência sobre a possibilidade de sociedades de economia mista criarem empregos em comissão, o Relator determinou a remessa dos autos à Consultoria-Geral, a qual apresentou a seguinte conclusão sobre o assunto (fl. 622):

 

Diante do exposto, a Consultoria Geral encaminha ao Exmo. Sr. Relator o estudo ora realizado, destacando que sobre o tema este Tribunal de Contas já possui entendimento firmado no Prejulgado 1871, no sentido de que a sociedade de economia mista pode criar, por ato próprio, empregos em comissão, destinados apenas às funções de direção, chefia ou assessoramento, em quantidade mínima necessária, devendo, no entanto, submeter previamente o ato à deliberação da Diretoria Executiva, parecer do Conselho Fiscal e homologação, tanto do Conselho de Administração quanto da Assembleia Geral.

 

Com base no estudo apresentado pela Consultoria Geral e, ainda, tendo em vista as jurisprudências que versam sobre o assunto, o Conselheiro Relator considerou que não existe irregularidade nas contratações, razão pela qual não incluiu tal apontamento na decisão que converteu o feito em tomada de contas especial.

No relatório derradeiro, a Diretoria de Controle da Administração Estadual fez algumas ponderações acerca da possibilidade de contratações de empregados em comissão e teceu, ainda, algumas observações em relação ao parecer exarado pela COG, senão vejamos (fls. 839):

 

Sobre essa conclusão apresentada pela Consultoria Geral e a respectiva aplicabilidade do Prejulgado 1871 no mundo fático, entende-se por necessários alguns esclarecimentos a fim de evitar que esta Corte de Contas emita decisão contrária a norma legal e/ou que em decorrência da aplicação de uma decisão desta Corte sobrevenha imbróglios administrativos ou até mesmo despesas indevidas suportadas por parte dos “jurisdicionados”.

Vejamos: o Prejulgado 1871, desta Corte de Contas, estabelece que as sociedades de economia mistas podem criar por ato próprio, empregos em comissão, destinados às funções de direção, chefia ou assessoramento, mas não esclarece como será formalizada essa relação, num evidente entendimento simétrico da previsão constitucional sobre as funções de confiança e os cargos em comissão (CRFB, art. 37, V) aplicados aos regimes estatutários.

Ocorre que o permissivo constitucional exige lei especificando as condições e percentuais mínimos, e sabidamente a respectiva relação jurídica se forma por ato de nomeação pelo ente público e posse do “comissionado”, existindo regras (normativo legal) disciplinando claramente os procedimentos em relação ao vínculo previdenciário, etc.

No entanto, diferentemente da situação antes descrita, numa estatal de direito privado, como é o caso da auditada, a relação jurídica entre empresa e empregados é formalizada por meio de contrato (contrato de trabalho), pelo regime da CLT, e nessa condição surge a obscuridade de como proceder para formalizar a relação “autorizada” pelo referido Prejulgado 1871 desta Corte de Contas.

Nessa esteira e diante das obscuridades decorrentes, a situação merece algumas ressalvas. 

A primeira ressalva que se faz é que o referido Prejulgado 1871 não estabelece qual será o mecanismo para formalizar a relação jurídica com os tais “empregados comissionados”.

Tem-se que ao afirmar pela possibilidade de instituição dos “comissionados” sem norma legal estabelecendo tal procedimento, esta Corte de Contas deve indicar os meios de formalizar a relação jurídica, disciplinando se há necessidade de firmar contrato entre as partes ou designação unilateral da entidade. Ainda, faz-se necessário disciplinar se há necessidade de registro em carteira de trabalho – CTPS do “comissionado”, ou não, e nesse caso como seria essa formalização. Por último, faz-se necessário disciplinar se é devido ou não o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS (direito previsto para as relações baseadas em contrato de trabalho), bem como sobre a respectiva multa quando da “exoneração” do comissionado.

A outra ressalva que se faz com referência ao referido Prejulgado 1871 é que ele afronta a Lei Federal nº 6.404/1976, art. 143. Afirma-se isso porque a previsão normativa emanada pela referida lei diz que a diretoria deverá ser “eleita” e assim a relação jurídica se formará pela eleição e posse do eleito, e não por “comissão” conforme diz o Prejulgado.

Nesse sentido, pelo menos a parte do Prejulgado 1871 que autoriza a instituição de comissionados pera exercer a função de direção da estatal está equivocada, pois afronta norma legal conforme demonstrado, e nessa situação precisa ser revista e reformada.

Pelo exposto, a permanecer o entendimento desta Corte de Contas de que é possível a instituição de “emprego em comissão”, entende-se por necessários o enfrentamento e esclarecimento de tais ressalvas, conforme antes especificadas.

Assim, sugere-se ao Relator que reencaminhe a presente situação à Consultoria Geral deste Tribunal, se assim entender por necessário, a fim de complementar o embasamento sobre as ressalvas aqui levantadas, ou prosseguindo no mesmo diapasão, que promova a reforma do aludido Prejulgado, suprimindo a possibilidade de se criar dubiedade na forma de preenchimento dos cargos de direção em estatais. (Grifou-se)

 

Diante das considerações expostas acima, entendo que é adequado encaminhar as ponderações da Diretoria de Controle da Administração Estadual à Consultaria Geral, a fim de que esta se manifeste em relação às dúvidas suscitadas acima.

Assinale-se, neste ponto, que o assunto em tela merece ampla reflexão, de modo que sejam esgotadas todas as dúvidas relacionadas ao assunto, evitando, assim, decisões conflitantes.

Deve-se rever, portanto, o posicionamento contido no prejulgado nº 1871 do TCE/SC. Faz-se necessário, também, complementar e esclarecer as orientações constantes em tal manifestação emitida pela Corte de Contas.

 

2. Das determinações

 

Ao realizar a auditoria, a equipe técnica observou diversas situações que comprometem a eficiência dos trabalhos desenvolvidos pela Companhia Águas de Joinville. Em razão disso, sugeriu-se a realização das seguintes determinações (fl. 840):

 

3.3.1 Adote procedimentos eficientes e eficazes a fim de amenizar as perdas de água tratada originada por vazamentos, seja melhorando a rede de tubulações existentes, seja investindo em técnicas mais modernas de condução de água (item 3.5.1 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.2 Agilize junto aos usuários o redirecionamento dos hidrômetros que se encontram na parte interna das residências, deslocando-os para local com acesso visual externo, onde haja possibilidade de leitura/medição, em observância as diretrizes da estatal (item 3.5.2 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.3 Fiscalize, de forma eficiente, as construções existentes no município, a fim de evitar que haja obras sem ligações de água (abastecendo-se com vizinhos), além de verificar e coibir a existência de eventuais ligações clandestinas (item 3.5.3 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.4 Reveja os contratos com as empresas terceirizadas exigindo desempenho de acordo e maior comprometimento dos leituristas, a fim de evitar tantas reclamações por partes dos usuários, bem como prejuízos a estatal (item 3.5.4 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.5 Aprimore o controle gerencial das cobranças, a fim de evitar a existência de valores cujo “pagador” não seja identificado pela estatal, bem como adote procedimentos (rotinas), em relação aos pagamentos de faturas realizadas em duplicidade ou a maior, a fim de comunicar o pagante e fazer a compensação, automaticamente, com faturas posteriores, ou mesmo devolver, em espécie, se assim for requerido (item 3.5.5 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.6 Seja diligente ao efetuar o cancelamento do fornecimento de água ao usuário, bem como ter cuidado para não inserir indevidamente o nome deste nos cadastro de inadimplentes (SPC/SERASA), para evitar mais prejuízos com condenações por danos morais (item 3.5.6 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.7 Adote medidas no sentido de identificar os responsáveis, quantificar o dano e fazer ressarcir aos cofres públicos da empresa o montante despendido em ações judiciais que resultaram em condenação por danos morais, sob pena de o gestor omisso ser pessoalmente responsável por tal débito (item 3.5.7 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.8 Proceda, se necessário for, aos ajustes devidos em relação a possíveis de distorções na fixação dos salários de empregados de mesmo nível técnico e exercentes de mesma atividade (item 3.5.9 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015 e item 2.2 deste Relatório);

3.3.9 Faça constar nos contratos com as empresas terceirizadas (empreiteiras) para que estas executem as obras por completo, não deixando buracos abertos, sem proteção e/ou sem obstáculo que impeça a aproximação de pessoas, bem como não deixe materiais (resíduos) de obras em via pública, além de efetivamente fiscalizar todas as obras contratadas e exigir a adequados mecanismos de proteção e prevenção (item 3.5.10 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015);

3.3.10 Providencie a regularização (escritura e registro de imóveis) de todos os bens imóveis que possui (item 3.5.11 do Relatório de Reinstrução nº 027/2015).

 

Para se manifestar sobre tais sugestões de determinação, chamou-se aos autos o Sr. Roberto Luiz Carneiro (atual Diretor Presidente da Companhia Águas de Joinville).

Em resposta, o aludido gestor aduziu que estão sendo adotadas providências para sanar os apontamentos suscitados pelo corpo técnico, trazendo aos autos, inclusive, algumas medidas já empregadas.

Ainda assim, compartilho do entendimento do corpo instrutivo de que devem ser mantidas todas as determinações, com o intuito de que haja, de fato, a correção integral dos fatos apontados.

Ademais, no que tange à determinação contida no item 3.3.10 das conclusões da área técnica, entendo cabível a fixação do prazo de 60 dias para comprovação das medidas adotadas.

 

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, incisos I e II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se:

1. Por julgar irregulares, com imputação de débito, na forma do art. 18, III, alíneas “b” e “c”, c/c o art. 21, caput, ambos da Lei Complementar nº 202/2000, a presente Tomada de Contas Especial e condenar o Sr. Henrique Chiste Neto ao pagamento de débito a seguir discriminado, cujos valores devem ser atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais:

1.1. R$ 2.000,00 referente ao valor pago pela Companhia Águas de Joinville em condenação proferida nos autos da Ação nº 038.07.046857-2, ajuizada por Osmar Benvenutti, em afronta ao art. 153 da Lei nº 6.404/1976, por não ter agido com a diligência que deveria empregar na administração da empresa, além de configurar ato de mera liberalidade às custas da Companhia, o que é vedado pelo art. 154, § 2º, “a”, do mesmo diploma legal;

1.2. R$ 3.000,00 referente ao valor pago pela Companhia Águas de Joinville em condenação proferida nos autos da Ação nº 038.07.039048-4, ajuizada por Edison José Gehlen, em afronta ao art. 153 da Lei nº 6.404/1976, por não ter agido com a diligência que deveria empregar na administração da empresa, além de configurar ato de mera liberalidade às custas da Companhia, o que é vedado pelo art. 154, § 2º, “a”, do mesmo diploma legal.

2. Por determinar ao atual gestor da Companhia Águas de Joinville, Sr. Jalmei José Duarte, ou quem vir a substituí-lo, para que:

2.1. Adote procedimentos eficientes e eficazes a fim de amenizar as perdas de água tratada originada por vazamentos, seja melhorando a rede de tubulações existentes, seja investindo em técnicas mais modernas de condução de água;

2.2. Agilize junto aos usuários o redirecionamento dos hidrômetros que se encontram na parte interna das residências, deslocando-os para local com acesso visual externo, onde haja possibilidade de leitura/medição, em observância as diretrizes da estatal;

2.3. Fiscalize, de forma eficiente, as construções existentes no município, a fim de evitar que haja obras sem ligações de água (abastecendo-se com vizinhos), além de verificar e coibir a existência de eventuais ligações clandestinas;

2.4. Reveja os contratos com as empresas terceirizadas exigindo desempenho de acordo e maior comprometimento dos leituristas, a fim de evitar tantas reclamações por partes dos usuários, bem como prejuízos a estatal;

2.5. Aprimore o controle gerencial das cobranças, a fim de evitar a existência de valores cujo “pagador” não seja identificado pela estatal, bem como adote procedimentos (rotinas) em relação aos pagamentos de faturas realizadas em duplicidade ou a maior, a fim de comunicar o pagante e fazer a compensação, automaticamente, com faturas posteriores, ou mesmo devolver, em espécie, se assim for requerido;

2.6. Seja diligente ao efetuar o cancelamento do fornecimento de água ao usuário, bem como ter cuidado para não inserir indevidamente o nome deste nos cadastros de inadimplentes (SPC/SERASA), para evitar mais prejuízos com condenações por danos morais e/ou materiais;

2.7. Adote medidas no sentido de identificar os responsáveis, quantificar o dano e fazer ressarcir aos cofres públicos da empresa o montante despendido em ações judiciais que resultaram em condenação por danos morais e/ou materiais, sob pena de o gestor omisso ser pessoalmente responsável por tal débito;

2.8. Proceda, sempre que necessário, aos ajustes devidos em relação a possíveis de distorções na fixação dos salários de empregados de mesmo nível técnico e exercentes de mesma atividade;

2.9. Faça constar nos contratos com as empresas terceirizadas (empreiteiras) para que estas executem as obras por completo, não deixando buracos abertos, sem proteção e/ou sem obstáculo que impeça a aproximação de pessoas, bem como não deixe materiais (resíduos) de obras em via pública, além de efetivamente fiscalizar todas as obras contratadas e exigir adequados mecanismos de proteção e prevenção;

2.10. Providencie a regularização (escritura e registro de imóveis) de todos os bens imóveis que possui, fazendo comprovação à Corte das medidas adotadas, no prazo de 60 dias.

3. Por encaminhar os autos à Consultoria Geral para que complemente o estudo efetuado às fls. 617-622, que trata sobre a possibilidade de empregados comissionados nas sociedades de economia mista, esclarecendo o seguinte: i) Qual deve ser o procedimento para formalizar a relação jurídica entre o nomeado e a empresa estatal? ii) Haverá registro na carteira de trabalho – CTPS? Em caso, negativo, qual o documento adequado? iii) Faz-se necessário o recolhimento/depósito de FGTS? Em caso positivo, quando da despedida (demissão/exoneração do comissionado), incidirá ou não a multa sobre saldo do FGTS? iv) Sobre a alteração do Prejulgado 1871, principalmente em relação à parte em que afronta o art. 143 da Lei nº 6.404/1976.

4. Por dar ciência da decisão proferida pelo TCE/SC aos responsáveis e à Companhia Águas de Joinville.

Florianópolis, 07 de março de 2018.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador do Ministério

Público de Contas