PARECER       :

MPTC/53785/2018

PROCESSO nº     :

REP 13/00454200    

ORIGEM          :

Prefeitura de São Francisco do Sul

INTERESSADO     :

Luciana Schaefer Filomeno

ASSUNTO         :

Irregularidades na gestão do Hospital e Maternidade Municipal Nossa Senhora da Graça

NÚMERO UNIFICADO:

MPC-SC/2.1/2018.63

 

1 – RELATÓRIO

Cuida-se de Representação formulada pela Dra. Luciana Schaefer Filomeno, Exma. Promotora de justiça, noticiando possíveis irregularidades na gestão do Hospital Municipal Nossa Senhora das Graças, localizado no município de São Francisco do Sul.

Auditores da Diretoria de Controle dos Municípios – DMU sugeriram o não conhecimento da Representação, ante a ausência de requisitos para tanto, e a inclusão da matéria no plano de auditorias do Tribunal (fls. 76/78).

Opinei pelo conhecimento da Representação, por vislumbrar a existência de indícios de irregularidades (fls. 79/83).

A Representação foi conhecida, sendo determinada a apuração dos fatos (fls. 84/87).

Foi realizada diligência e, em resposta, foram encaminhados os documentos de fls. 108/111.

Auditores da DMU identificaram possíveis irregularidades, sugerindo audiência dos responsáveis (fls. 115/126-v).

Determinadas as audiências (fl. 126-v) e notificados os responsáveis (fls. 127/134), alegações de defesa foram apresentadas como segue: - Sra. Nadirinez Bologoni, secretária de saúde (fls. 139/288); - Sr. Sergio Matto Lomelino, interventor (fls. 291/308); - Sr. Lucio Daniel Junior, ex-diretor geral do Hospital e Maternidade Municipal Nossa Senhora da Graça (fls. 310/320); - Sr. Iverson Pavanello, interventor do Hospital e Maternidade Municipal Nossa Senhora da Graça (fls. 332/349); - Sr. Luiz Roberto de Oliveira, prefeito (fls. 351/373); - Sra. Rosângela Aparecida Zavarizi Medeiros, presidente da Cruz Vermelha Brasileira (fls. 376/385).

Auditores do Tribunal sugeriram a inclusão dos senhores Douglas Calheiros Machado, Carlos Eduardo Messias Id e Marcos Scarpato, ex-secretários de saúde, no rol de responsáveis (fls. 391/409-v).

A Exma. Relatora anuiu com a proposição, determinando a audiências dos responsáveis (fls. 409-v), as quais foram efetivadas por meio dos ofícios de fls. 410/412-v.

O Sr. Douglas Calheiros Machado e o Sr. Carlos Eduardo Messias Id apresentaram alegações de defesa, respectivamente, às fls. 416/426 e fls. 429/452.

Apesar de regularmente notificado, o Sr. Marcos Scarpato permaneceu inerte (fl. 454).

Por fim, auditores da DMU recomendaram a parcial procedência dos fatos da Representação, com aplicação de multas aos responsáveis.

Vieram-me os autos.

 

2 – MÉRITO

2.1 – Aprovação das contas prestadas pela entidade Cruz Vermelha Brasileira – Filial Santa Catarina contratada para administrar a gestão do Hospital e Maternidade Nossa Senhora da Graça por meio do Contrato de Gestão nº 01/2012, no exercício de 2012 (item 2.2.1 do Relatório nº DMU – 1175/2017).

A restrição foi atribuída ao Sr. Luiz Roberto de Oliveira, prefeito, e a Sra. Nadirinez Bolognini, secretária de saúde à época.

O Sr. Luiz Roberto de Oliveira asseverou que não era de sua responsabilidade analisar e julgar as contas apresentadas, mas da Comissão de Avaliação e Fiscalização - da Secretaria de Saúde, nos termos da Lei Municipal nº 1.263/2011 (fl. 355).

A seu turno, a ex-secretária de saúde informou que as contas foram reprovadas durante sua gestão, “pelo descumprimento das metas no aspecto técnico e financeiro por ultrapassar os limites contratuais, demonstrando dessa forma má gestão da Cruz Vermelha, agregando aos fatos atraso no envio das prestações de contas que foram solicitadas reiteradas vezes pelo conselho” (fl. 140).

Auditores da DMU sugeriram a desconsideração da restrição (fls. 462-v/464).

A reprovação das contas restou demonstrados nos autos, notadamente pela ata de reunião da CAF (fls. 246/250) e ofício encaminhado ao prefeito (fls. 252/255), além da instauração de tomada de contas especial, concluindo pela regularidade com ressalva das contas (fls. 992/1000 da TCE – pendrive de fl. 111).

Desta feita, não há irregularidade a ser perquirida pelo Tribunal de Contas.

 

2.2 – Realização de despesa pela Cruz Vermelha Brasileira – Filial Santa Catarina durante a administração e gestão do Hospital e Maternidade Nossa Senhora da Graça por meio do Contrato de Gestão nº 01/2012 no exercício de 2012, mediante ausência do devido procedimento licitatório ou equivalente previsto em regulamento próprio durante a gestão dos recursos repassados pelo Município de São Francisco do Sul.

Foram apontados como responsáveis a Cruz Vermelha Brasileira – Filial Santa Catarina e sua presidente, Sra. Rosangela Aparecida Zavarizi Medeiros.

Em sede de justificativas, os responsáveis limitaram-se a encaminhar o regulamento próprio que teria sido utilizado para fins de contratação de obras, bens e serviços durante o período em que estiveram à frente da administração do Hospital (fls. 376/383).

Auditores da DMU anotaram que os responsáveis não lograram demonstrar a realização de procedimentos licitatórios ou de seleção previstos no citado regulamento (fls. 401-v/407).

Sobre o assunto, eis os termos do art. 4º, VIII, da Lei Federal nº 9.637, de 15-5-98, que dispõe sobre a qualificação de entidades em organizações sociais e a criação de Programa Nacional de Publicização:

 

Art. 4º Para os fins de atendimento dos requisitos de qualificação, devem ser atribuições privativas do Conselho de Administração, dentre outras:

[...]

VIII - aprovar por maioria, no mínimo, de dois terços de seus membros, o regulamento próprio contendo os procedimentos que deve adotar para a contratação de obras, serviços, compras e alienações e o plano de cargos, salários e benefícios dos empregados da entidade;

 

No âmbito estadual, foi editada a Lei nº 12.929/2004,[1] impondo a necessidade de apresentação pelas OS’s de regulamento próprio para contratação de fornecedores.

Assim julgou o Supremo Tribunal Federal a respeito:[2]

 

As dispensas de licitação instituídas no art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93 e no art. 12, §3º, da Lei nº 9.637/98 têm a finalidade que a doutrina contemporânea denomina de função regulatória da licitação, através da qual a licitação passa a ser também vista como mecanismo de indução de determinadas práticas sociais benéficas, fomentando a atuação de organizações sociais que já ostentem, à época da contratação, o título de qualificação, e que, por isso, sejam reconhecidamente colaboradoras do Poder Público no desempenho dos deveres constitucionais no campo dos serviços sociais. O afastamento do certame licitatório não exime, porém, o administrador público da observância dos princípios constitucionais, de modo que a contratação direta deve observar critérios objetivos e impessoais, com publicidade de forma a permitir o acesso a todos os interessados.

 

Desta feita, embora as organizações sociais não estejam obrigadas a licitar, devem adotar procedimento de seleção, visando resguardar os princípios constitucionais previsto no art. 37, caput, da Constituição.

No caso dos autos, no exercício de 2012, foram realizados repasses de recursos públicos à Cruz Vermelha, totalizando R$ 3.395.546,99 (fl. 122).

Os responsáveis apresentaram regulamento próprio de seleção de fornecedores e prestadores de serviços para o Hospital, no qual há previsão de que a seleção se daria mediante julgamento objetivo em estrita conformidade com os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da economia (art. 3º).

Foram definidas como modalidades de seleção a coleta de preço e a concorrência pública, além de hipóteses de dispensa e inexigibilidade (art. 6º).

Em que pese a comprovação da existência do citado regulamento, os responsáveis não trouxeram aos autos documentos que comprovem a efetiva realização dos procedimentos nele enunciados.

Assim, a irregularidade está caracterizada, devendo a responsável, pessoa física, ser sancionada a respeito.

 

2.3 – Realização de despesas sem o devido procedimento licitatório ou equivalente previsto em regulamento próprio na gestão dos recursos repassados pelo Município de São Francisco do Sul, durante os exercícios de 2013/2015.

Ressai dos autos que, a partir do exercício de 2013, após a intervenção na gestão do contrato firmado com a Cruz Vermelha, a Prefeitura retomou para si a administração do Hospital.

Apurou-se que, nesse período, foram realizadas diversas despesas sem o devido procedimento licitatório ou equivalente.

A responsabilidade foi atribuída como segue: - referente ao exercício de 2013, aos senhores Luiz Roberto de Oliveira, prefeito à época, Sérgio Mattos Lomelino, interventor, Lúcio Daniel Júnior, diretor-geral do Hospital na época, e Douglas Calheiros Machado, secretário de saúde; - referente aos exercícios de 2014/2015, aos senhores Luiz Roberto de Oliveira, prefeito, Iverson Pavanello, interventor à época, Carlos Eduardo Messias Id, secretário de saúde de 31-1-2014 a 19-2-2015, e Marcos Scarpato, secretário de saúde de 20-2-2015 a 31-3-2015.

Os responsáveis Sérgio Mattos Lomelino (fls. 291/308), Lúcio Daniel Júnior (fls. 310/320), Iverson Pavanello (fls. 332/349) e Luiz Roberto de Oliveira (fls. 351/373) entoaram justificativas semelhantes, sustentando que as contratações eram realizadas conforme procedimentos estabelecidos em regulamento próprio.

Não carrearam aos autos documentos que comprovem a efetiva realização dos procedimentos prescritos no citado regulamento.

Assim, não apresentaram razões capazes de derruir a responsabilidade que sobre eles recai.

Por outro lado, o Sr. Carlos Eduardo Messias Id informou que, a partir da edição do Decreto nº 1.964, de 6-12-2013, as contas prestadas pelos interventores do Hospital foram endereçadas diretamente ao prefeito, a quem coube a responsabilidade pelo seu exame (fls. 429/449).

O mencionado decreto encontra-se acostado à fl. 442 dos autos, corroborando as justificativas do responsável.

Dessarte, a responsabilidade do Sr. Carlos Messias Id, bem como do Sr. Marcos Scarpato, secretários de saúde no exercício de 2015, deve ser afastada.

 

3 – CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108 da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta pela ADOÇÃO da solução proposta por meio do Relatório nº DMU-2244/2017, de fls. 455/467-v, ressaltando que a multa do item 3.1.1 (fl. 467) deve ser aplicada somente à pessoa física.

Florianópolis, 6 de abril de 2018.

 

Aderson Flores

Procurador



[1] Art. 28. A Organização Social fará publicar, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da assinatura do Contrato de Gestão, regulamentos aprovados pela Comissão de Avaliação e Fiscalização, contendo os procedimentos que serão adotados, no âmbito do Contrato de Gestão, para:

I - contratação de obras e serviços;

II - compras e contratação de pessoal; e

III - plano de cargos e salários.

[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processo ADI nº 1923. Relator: Ministro Ayres Brito. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Voto__ADI1923LF.pdf.>. Acesso em: 28-2-2017.