Parecer nº:

MPC/DRR/55.931/2018

Processo nº:

PDI 04/04905218    

Origem:

Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN

Assunto:

Despesas a título de vantagem pessoal e gratificação.

Numeração única:

MPC-SC 2.3/2018.1093

 

 

 

Trata-se de processo instaurado a partir do encaminhamento de cópia de trabalhos de auditoria realizados pela Secretaria de Estado da Fazenda na Companhia Catarinense de Águas e Saneamento S.A – CASAN.

Após a regular instrução do feito, o Tribunal Pleno prolatou a Decisão nº 3914/2014 nos seguintes termos (fls. 1478-1478v):

 

6.1. Em preliminar, cancelar o sobrestamento da apreciação do presente processo, exarado na Decisão n. 4055/2007, de 25/08/2014, deste Tribunal (f. 969), haja vista que ocorreu o julgamento definitivo da Medida Cautelar n. 01591-2005-036-12-00-0;

6.2. Conhecer do Relatório da Auditoria realizada na Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN - pela Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda, PSEF 82.551/037 - Relatório de Auditoria n. 04/2004, com abrangência sobre pagamentos realizados a título de vantagem pessoal (agregação) e da gratificação decorrente do exercício de função gratificada, nos exercícios de 1992 a 2011.

6.3. Determinar à Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN, através de seu titular, a adoção de providências administrativas, nos termos do art. 3º da Instrução Normativa n. TC-13/2012, para apurar os pagamentos realizados a título de vantagem pessoal (agregação) e da gratificação decorrente do exercício de função gratificada.

6.3.1. Caso as providências referidas no item anterior restarem infrutíferas, deve a autoridade competente proceder à instauração de tomada de contas especial, nos termos dos arts. 10, §1º, da Lei Complementar n. 202/00 e 7º da Instrução Normativa n. TC-13/2012, com a estrita observância do disposto no art. 12 da referida Instrução, para apuração do fato descrito acima, identificação dos responsáveis, quantificação do dano e obtenção de ressarcimento, sob pena de responsabilidade solidária).

6.3.2. Fixar o prazo de 95 (noventa e cinco) dias, a contar da comunicação desta deliberação, para que o atual Presidente da CASAN comprove a este Tribunal o resultado das providências administrativas adotadas, com fulcro no art. 11 da Instrução Normativa n. TC-13/2012, e, se for o caso, a instauração de tomada de contas especial, com vistas ao cumprimento do art. 7º da citada Instrução Normativa.

6.3.3. A fase interna da tomada de contas especial deverá ser concluída no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data de sua instauração, conforme dispõe o art. 11 da Instrução Normativa n. TC-13/2012.

6.4. Determinar ao atual Presidente da CASAN, com fulcro no art. 13 da citada Instrução, e alteração, o encaminhamento a este Tribunal de Contas do processo de tomada de contas especial, tão logo concluída.

6.5. Alertar a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN -, na pessoa de seu atual Presidente, que o descumprimento injustificado do prazo fixado nesta deliberação poderá ensejar a aplicação de multa, consoante previsto no art. 70, §1º, da Lei Complementar Estadual n. 202/2000.

6.6. Determinar à Secretaria-geral - SEG -, deste Tribunal, que acompanhe a deliberação constante do item 6.3, e subitens, e comunique à Diretoria-geral de Controle Externo - DGCE -, após o trânsito em julgado, acerca do cumprimento, ou não, da determinação para fins de registro no banco de dados e encaminhamento à Diretoria de Controle competente para consideração no processo de contas do gestor.

 

Em seguida, após constatado o não cumprimento da decisão plenária (fl. 1.486), a CASAN veio aos autos manifestar-se às fls. 1.489-1.492.

Mediante a Informação nº 331/2015 (fls. 1.496-1497), a área técnica sugeriu a aplicação de multa ao então Presidente da CASAN, Sr. Valter José Gallina, e propôs o reestabelecimento dos prazos para o cumprimento das determinações exaradas na Decisão nº 3914/2014.

Este órgão ministerial, na sequência, acompanhou o posicionamento da diretoria técnica (fls. 1.499-1.503).

O Relator formulou a sua proposta de voto às fls. 1.504-1.506v; contudo, em decorrência da superveniência da petição de fls. 1.513-1.526, protocolada pela CASAN, decidiu retirar o processo da pauta para realizar novo exame.

Ato contínuo, formulou novo voto (fls. 1.528-1.530), o qual foi submetido ao Tribunal Pleno que o ratificou, prolatando a Decisão nº 2049/2015 nos seguintes termos (fls. 1.531-1.531v):

 

6.1. Reiterar os termos da Decisão n. 3914/2014, de 25/08/2014, e assinar o prazo de 95 (noventa e cinco) dias, a contar da publicação desta Decisão no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado, para que a Unidade Gestora comprove a este Tribunal o cumprimento integral da decisão supramencionada.

6.2. Alertar o Diretor-Presidente da CASAN que o não cumprimento do item 6.1 desta deliberação implicará cominação das sanções previstas no art. 70, VI e §1º, da Lei Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, além de ser incluído no rol de responsáveis em tomada de contas especial a ser instaurada nesta Corte de Contas, conforme art. 10 da mesma lei.

6.3. Alertar o Titular do Controle Interno da Unidade para que atente para o cumprimento do item 6.2 desta deliberação, sob pena de responsabilização solidária, nos termos do art. 62 da Lei Complementar (estadual) n. 202/2000.

6.4. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, ao Sr. Valter José Gallina - Diretor-Presidente da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento - CASAN -, bem como à Assessoria Jurídica e ao controle interno daquela empresa.

 

Realizada a notificação do responsável, a CASAN informou, às fls. 1.537-1.541, sobre a instauração de tomada de contas especial para apuração dos fatos. A íntegra do aludido procedimento foi juntada aos autos às fls. 1.573-1.878.

Após a diretoria técnica sugerir a extinção do feito conforme as conclusões do processo interno (fls. 1.880-1.881), o Relator determinou à DIAG a realização de diligência para que fosse providenciada a juntada do relatório e do certificado de auditoria referentes à tomada de contas especial finalizada, como também determinou à diretoria técnica que apresentasse manifestação conclusiva sobre o resultado da apuração feita pela CASAN (fls. 1.882-1.883).

Em conclusão, a diretoria técnica elaborou a Informação nº 0055/2017, por meio da qual sugeriu (fls. 1.895-1.896):

 

Considerando o encaminhamento da SEG para que esta Diretoria verificasse o esgotamento do prazo para atendimento ao cumprimento da Decisão desta Corte.

Considerando o encaminhamento da Tomada de Contas Especial, processada no âmbito da CASAN, de forma completa e atendendo de forma plena a Instrução Normativa N.TC-13/2012.

Sugere-se o encaminhamento dos presentes autos a consideração do Sr. Relator, para conhecimento e se for o caso determinação arquivamento dos presentes autos, ao passo que se toma como referência o artigo 46, inciso IV da Resolução TC 09/2002.

 

É o relatório.

Ao compulsar os autos, em particular a tomada de contas especial instaurada no âmbito interno da CASAN, verifica-se, à primeira vista, a apuração dos fatos conforme determinado pela Decisão nº 2049/2015.

No entanto, de acordo com as conclusões do procedimento interno, não foram apontadas responsabilidades, tampouco houve a quantificação do dano ao erário.

Por sua vez, a Secretaria de Estado da Fazenda, ao analisar os procedimentos adotados pela comissão interna de tomada de contas especial, certificou a irregularidade das contas em questão no bojo do relatório nº 0004/17.

Deveras, a meu ver, existem elementos consistentes que permitem apontar os responsáveis, bem como calcular os prejuízos gerados pelo pagamento indevido de vantagens pessoais e gratificações a empregados da CASAN.

A partir dessa premissa, cabe tecer algumas considerações acerca das conclusões elencadas pela comissão interna da CASAN para afastar as responsabilidades dos envolvidos, extraídas das fls. 1.877-1.878, conforme segue:

 

a) a matéria era demasiadamente controvertida, constando dos autos do presente processo a edição de diversas normativas, documentos, pareceres, que até o ano de 2004 demonstram a necessidade de melhor orientação pelos órgãos envolvidos (CPF, PGE/SC, entre outros), inclusive com a necessidade de sua regulamentação, em que pese os termos da Resolução CPF nº 006/2000

 

Nesse ponto, cumpre assinalar que, se a matéria era de fato “demasiadamente” controvertida, o mínimo que deveria haver à época era cautela por parte dos ordenadores primários antes de conceder vantagens pessoais a empregados da CASAN sem a mínima segurança jurídica para tanto.

 

b) a CASAN suprimiu os pagamentos a título de vantagem pessoal (agregação) e da gratificação decorrente do exercício de função gratificada. Porém diante da liminar obtida em 17/05/2005 por meio da Medida Cautelar nº 1591/2005, até o trânsito em julgado da Ação Trabalhista nº 02451-2005-036-12-00-9, os pagamentos da rubrica 51 “vantagem pessoal” se deram com base em processo judicial ainda pendente de recurso, de forma que não há que se falar em ilegalidade dos pagamentos realizados até a supressão ocorrida no mês de setembro de 2011

 

Nada obstante o período em que o pagamento esteve assegurado por decisão judicial, houve a concessão do mesmo benefício em outras épocas, a partir de 1987, com a autorização e conveniência dos gestores da Companhia.

Dito isso, mesmo desconsiderando o período no qual os pagamentos encontraram amparo em decisão judicial, subsiste longo lapso temporal em que os cofres da Companhia tiveram que suportar, sem respaldo jurídico, pagamentos a título de vantagem pessoal, o que caracteriza dano ao erário passível de ressarcimento.

 

c) a Colenda Corte de Contas Estadual no TCE nº 04/04755305, acompanhada pelo Ministério Público de Contas, entendeu que a responsabilidade pela devolução de referidos valores deve recair sobre os servidores beneficiados, não podendo os ordenadores primários que não auferiram vantagem econômica nem praticaram atos de má-fé ser responsabilizados

 

Não há de se falar em responsabilização de empregados da Companhia que receberam valores de boa-fé. Tal ressalva, aliás, já consta anotada em manifestação anterior emanada por este órgão ministerial no presente feito.

De mais a mais, ao contrário do sustentado pela comissão interna, a responsabilização dos ordenadores primários não exige a obtenção de vantagem econômica, tampouco a demonstração de má-fé, bastando apenas a comprovação da sua atuação de forma contrária às normas legais.

 

d) não se vislumbra como se responsabilizar os ordenadores primários por fatos que remontam há quase 03 (três) décadas, haja vista que os eventos apurados no presente processo tiveram início no longínquo ano de 1987, que o processo PDI 04/04905218 somente foi instaurado no ano de 2004 e que a Decisão nº 2049/2015 foi publicada em 17/02/2016, sendo assim aplicável o instituto da prescrição previsto no art. 24-A da Lei Complementar n. 202/2000, conforme jurisprudência da Corte de Contas Estadual, com a consequente extinção do processo e baixa automática de responsabilidade de todos os ordenadores primários da CASAN

 

É consabido que o objetivo principal da investigação dos fatos é assegurar o ressarcimento dos danos causados ao erário, imputando o débito aos responsáveis.

Nessa hipótese, a Constituição Federal, em seu art. 37, § 5º, afasta a possibilidade de prescrição, sobretudo porque a persecução na esfera administrativa não visará à punição dos responsáveis, mas apenas à reparação dos prejuízos ocasionados aos cofres públicos.

À guisa de ilustração, colaciona-se o seguinte precedente do Tribunal de Contas da União nesse sentido:

 

A condenação em débito em processo de tomada de contas especial não tem caráter punitivo, possuindo, essencialmente, natureza jurídica de reparação civil pelo prejuízo causado ao erário, não sendo alcançada pelo instituto da prescrição da pretensão punitiva.[1]

 

Em face disso, os dispositivos legais relativos à prescrição citados nas conclusões da comissão não são aplicáveis ao caso concreto, não se tratando, portanto, de obstáculo jurídico ao ressarcimento dos danos.

 

e) devido ao alargado lapso temporal entre os fatos apurados no presente processo, eventual tentativa de responsabilização dos ordenadores primários poderia prejudicar o direito de defesa constitucionalmente protegido, sendo possível a extinção do processo PDI 04/04905218, considerando as contas iliquidáveis nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 202/2000, da Instrução Normativa – TCU nº 71, de 28 de novembro de 2012, e de acordo com os recentes julgados do TCE/SC colacionados ao presente Relatório

 

O direito de defesa apenas restaria prejudicado caso fosse imputado o débito aos responsáveis sem qualquer notificação para exercer o contraditório.

Contudo, a determinação para apuração interna, por meio de procedimento instaurado de acordo com as normas vigentes, foi considerado o meio adequado para assegurar a garantia constitucional em comento.

Da mesma forma, não há razão para extinção do feito pelo fato de as contas serem “iliquidáveis”.

Novamente, sublinhe-se que o procedimento estabelecido no âmbito da CASAN seria o meio apropriado para identificar os responsáveis e quantificar o dano causado à empresa.

De todo modo, conquanto infrutíferos os resultados do processo interno instaurado pela CASAN, conclui-se que ainda é possível apontar os responsáveis e calcular os prejuízos gerados por meio do pagamento indevido de vantagens pessoais e gratificações.

Para tanto, deve ser determinada a conversão do presente feito em Tomada de Contas Especial, com a inclusão dos atuais gestores no rol de responsáveis, nos termos do art. 10 da Lei Complementar nº 202/2000.

Ante o exposto, o Ministério Público de Contas, com amparo na competência conferida pelo art. 108, inciso II, da Lei Complementar nº 202/2000, manifesta-se pela conversão do presente feito em Tomada de Contas Especial, a fim de permitir a apuração das responsabilidades e a quantificação do dano ao erário verificado no âmbito da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento – CASAN em decorrência do pagamento indevido de vantagem pessoal e gratificação a seus empregados.

Florianópolis, 11 de junho de 2018.

 

Diogo Roberto Ringenberg

Procurador de Contas

 



[1] BRASIL, TCU. Acórdão nº 4214/2017. Primeira Câmara. Tomada de Contas Especial. Rel. Benjamim Zymler. J em: 06.06.2017. Disponível em: https://contas.tcu.gov.br/pesquisaJurisprudencia/#/detalhamento/12/dano%2520ao%2520er%25C3%25A1rio%2520imprescritibilidade/%2520/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520COLEGIADO%2520asc%252C%2520ANOACORDAO%2520desc%252C%2520NUMACORDAO%2520desc/true/1/false. Acessado em: 28.05.2018.