PROCESSO Nº:

REC-11/00439525

UNIDADE GESTORA:

Prefeitura Municipal de Bom Retiro

RECORRENTE:

Jair Jose Farias

PROCURADORES:

Priscila Nunes Farias e Noel Antônio Tavares de Jesus

ASSUNTO:

Recurso de Reconsideração da decisão exarada no processo TCE-09/00061006 - Tomada de Contas Especial - Conversão do processo REP-09/00061006 - Representação acerca de irregularidades na concessão de adiantamento de viagem nos exercícios de 2005 a 2007

PARECER Nº:

COG - 623/2011

 

Recurso de Reconsideração. Prefeito Municipal. Prestação de Contas de recursos antecipados para despesas em viagens. Irregularidades. Dano ao erário. Imprescritibilidade. Constituição Federal. Prescrição decenal para multas impostas pelo Tribunal de Contas. Aplicação do Código Civil ante a ausência de norma especial. Improcedência.

 

Sr. Consultor,

 

1. INTRODUÇÃO

 

Trata-se os autos de Recurso de Reconsideração, em face do disposto no art. 77 da Lei Complementar Estadual n. 202/2000, interposto pelo Sr. Jair José Farias, ex-prefeito do Município de Bom Retiro, por intermédio de seu procurador (instrumento de procuração às fls. 2703 dos autos TCE 09/00061006) em vista da imputação de débito e aplicação de multas mencionadas no itens 6.1, 6.2 e subitens 6.2.1 e 6.2.2 do Acórdão n. 0493/2011 exarado nos autos do processo TCE 09/00061006, publicada no DOTC-e n. 777, de 08/07/2011, conforme certificado à fl. 2.688 dos autos originários, cujo teor é o seguinte:

 

1. Processo nº: TCE-09/00061006 (apenso o Processo n. REP-09/00066660)

2. Assunto: Tomada de Contas Especial – Conversão do Processo n. REP-09/00061006 – Representação de Agente Público acerca de irregularidades na concessão de adiantamentos de viagem nos exercícios de 2005 a 2007

3. Responsável: Jair José Farias

4. Unidade Gestora: Prefeitura Municipal de Bom Retiro

5. Unidade Técnica: DMU

6. Acórdão nº: 0493/2011

 

VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à Tomada de Contas Especial pertinente a irregularidades na concessão de adiantamentos nos exercícios de 2005 a 2007, praticadas no âmbito da Prefeitura Municipal de Bom Retiro.

Considerando que o Responsável foi devidamente citado, conforme consta na f. 2476 dos presentes autos;

 Considerando que as alegações de defesa e documentos apresentados são insuficientes para elidir irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório DMU n. 3255/2009;

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alíneas "b" e "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas na Prefeitura Municipal de Bom Retiro, relativamente à concessão de adiantamentos de viagem nos exercícios de 2005 a 2007, e condenar o Responsável – Sr. Jair José Farias – ex-Prefeito Municipal de Bom Retiro, CPF n. 250.756.839-91, ao pagamento da quantia de R$ 4.903,25 (quatro mil novecentos e três reais e vinte e cinco centavos), em face do recebimento de adiantamentos para a realização de despesas com viagens sem comprovação do caráter público das mesmas, em desacordo com o disposto no art. 4º c/c o art. 12, § 1º, da Lei n. 4.320/64 (item 2.1 Relatório DMU), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos cofres do Município, atualizado monetariamente e acrescido dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir da data da ocorrência do fato gerador do débito, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000).

 

 6.2. Aplicar ao Sr. Jair José Farias – anteriormente qualificado, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

 

6.2.1. R$ 500,00 (quinhentos reais), pela emissão de empenhos cujos históricos apresentam especificação insuficiente, não evidenciando com clareza a finalidade das despesas realizadas, em desacordo com os arts. 56, I, da Resolução n. TC-16/94 e 61 da Lei n. 4.320/64 (item 1.1 do Relatório DMU);

 

6.2.2. R$ 500,00 (quinhentos reais), pela existência de irregularidades nas Prestações de Contas dos recursos recebidos pelo Responsável, a título de adiantamento para viagens, em desacordo com o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei (municipal) n. 1.290/95 e 31, 34 e 60 da Resolução n. TC-16/94 (item 3.1 do Relatório DMU).

 

6.3. Dar ciência deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, ao Responsável nominado no item 3 desta deliberação, à Representante nos Processos ns. REP-09/00061006 e REP-09/00066660 e à Prefeitura Municipal de Bom Retiro.

 

7. Ata nº: 32/2011

8. Data da Sessão: 01/06/2011.

 

É o relato perfunctório.

Passa-se ao exame dos requisitos intrínsecos e extrínsecos em sede recursal.

 

2. ANÁLISE

 

2.1. DA ADMISSIBILIDADE

 

Os recursos em geral possuem requisitos de admissibilidade intrínsecos os quais dizem respeito a própria existência do direito de recorrer, tais como cabimento, legitimação para recorrer, interesse de recorrer e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer e os requisitos extrínsecos relacionados com o exercício desse direito, como a tempestividade, regularidade formal e preparo, este último não acolhido neste Tribunal de Contas. Vejamos cada um deles.

 

Cabimento

 

No presente caso foi manejado o Recurso de Reconsideração, previsto no art. 77 da Lei Complementar estadual n. 202/00, manejável contra decisão proferida em processo de tomada de contas especial. E mais, pelo que se extrai dos autos, o recurso é singular, haja vista que não há notícia ou registro da interposição de outro recurso contra o acórdão n. 0493/2011 antes da interposição do presente recurso por parte do Recorrente.

 

Legitimação

 

Verifica-se que o Recorrente está habilitado a se irresignar em face da decisão desta egrégia Corte de Contas acima noticiada, haja vista que durante a tramitação do processo originário foi apontado como Responsável pelo suposto ato irregular considerado no acórdão atacado, daí resultando a pertinência subjetiva, a teor do disposto no art. 133 do Regimento Interno desta Corte de Contas.

 

Interesse recursal

 

Ante o resultado do processo TCE 09/00061006, com o presente recurso o Recorrente poderá obter uma situação mais vantajosa, considerando-se a situação em que o colocou a decisão recorrida. O recurso, portanto, é útil e necessário.

 

Inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer

 

Não há nos autos originários qualquer ato que importe em renúncia ao direito de recorrer ou em aceitação da decisão, tal como a realização de pagamento da multa (preclusão lógica consistente na perde de um direito ou de uma faculdade processual pelo exercício de atividade incompatível com o seu exercício), tampouco nestes autos, qualquer ato que importe na desistência do recurso interposto.

No que toca aos requisitos extrínsecos, tem-se a dizer:

 

Tempestividade

 

Verifica-se que o acórdão recorrido acima referenciado foi publicado no DOTC n. 777 de 08/07/2011 e o presente recurso foi interposto em 26/07/2011 (fl. 02), portanto, atendido ao prazo legal (30 dias) estabelecido no art. 77 da Lei Complementar estadual n. 202/2000.

 

Regularidade formal

 

Observa-se que o recurso observou o preceito do art. 77 da Lei Complementar estadual n. 202/2000, pois foi interposto atendendo a forma escrita e contendo a fundamentação do pedido de reforma da decisão recorrida na petição de interposição.

Nesse sentido, considerando que todos os requisitos foram atendidos, opina-se pelo conhecimento do recurso.

 

 

2.2. MÉRITO

 

Irresignado com o desfecho apresentado nos autos do processo TCE 09/00061006, retornou o Recorrente pleiteando a reforma do acórdão n. 0493/2011 para fins de exclusão da imputação de débito e das multas aplicadas ou, alternativamente, a redução do valor imputado. A seguir serão abordados os argumentos de defesa apresentados pelo Recorrente, separando-os para facilitar a compreensão da matéria.

 

2.2.1. DECADÊNCIA.

 

Destacou o Recorrente acerca da impossibilidade de ser imputado responsabilidade ao ex-Prefeito Municipal em função do decurso do prazo de cinco anos, contados da data da realização do ato apontado como ilegal, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, da proporcionalidade e da razoabilidade, destacando que no âmbito federal vige o art. 54 da |Lei n. 9.784/99 a qual prevê que o direito de a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

Nesse sentido, ressaltou o Recorrente que “passados mais de cinco anos da ocorrência dos fatos (referindo-se aos atos praticados no ano de 2005), não pode o órgão controlador impor punição”, pois o “decurso do tempo acaba por vedar a revisão pretendida pela Administração” (fl. 04).

No caso sob exame, verifica-se que o Tribunal Pleno considerou a hipótese de dano ao erário, a qual segundo a Constituição Federal afirma em seu § 5º do art. 37 que é imprescritível as ações de ressarcimento, logo, não há impedimento para que o Tribunal de Contas firme o título executivo com vista a buscar o integral ressarcimento ao erário municipal.

 

 

2.2.2. PRESCRIÇÃO

 

Alegou o Recorrente que a multa imposta não poderá permanecer válida haja vista que o art. 54 da Lei federal n. 9.784/99 teria fixado o prazo de 5 anos para a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários.

Segundo o entendimento já pacificado nesta Corte de Contas, no que tange à prescrição da penalidade multa, a qual pode ser reconhecida a qualquer tempo, já que os débitos são imprescritíveis, conforme reza o art. 37, §5º, da CF, esta Consultoria Geral já se manifestou no COG - 890/07, exarado nos autos do processo RPJ - 01/01193963, no seguinte sentido:

 

 

Administrativo. Civil. Aplicação subsidiária do Código Civil, ante a ausência de previsão específica quanto à prescrição da pretensão punitiva da Corte de Contas. Na ausência de fixação de menor prazo, expirado o prazo decenal previsto no artigo 205 do Código Civil (Lei 10.406/2002), subsidiariamente aplicável a este Tribunal, resta inviabilizado o exercício do poder sancionatório (aplicação de multa) afeto à missão constitucional atribuída a esta Casa. Não se constatando a exaustão do prazo prescricional, cumpre à Corte de Contas, diante de irregularidade irrefutável, exercer o poder-dever de aplicar a pertinente sanção.

 

Nesse parecer foi destacado Parecer COG-432/2007 que apontou o seguinte entendimento:

 

[...]

Com se observa, o Novo Código Civil (Lei nº 10.406/02) trouxe como regra geral a seguinte determinação legal: “Art. 205. A prescrição ocorre em 10 (dez) anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.

E como regra de transição o disposto no artigo art. 2.028: “Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data da sua entrada me vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

Esta Corte de Contas sustentou o entendimento acima explanado (utilização do prazo prescricional de 10 anos) em Relatório elaborado no Processo nº PDI-01/01547447, pelo Exmo. Sr. Conselheiro Relator Moacir Bertoli:

 

Prescrição Administrativa e (novo) Código Civil

 

Trago à reflexão, pois vem a tempo, a Conferência realizada pelo Senhor Auditor Substituto de Conselheiro Pedro Henrique Poli de Figueiredo, do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, sob o título “Panorama Geral das Alterações - Bens Públicos”, em evento promovido no período de agosto a outubro de 2003 através da Escola de Gestão e Controle Francisco Juruena, daquele Tribunal, tendo como tema “A Administração Pública no Novo Código Civil” [1].

 

Textualmente, o Dr. Pedro Henrique Poli de Figueiredo chamou atenção para os seguintes aspectos relativos à prescrição:

 

A prescrição no novo Código Civil

E uma última provocação e que diz respeito ao tema, que é a questão da prescrição e sua inserção no âmbito do direito público. (...).

 

Quanto aos prazos de prescrição, o artigo 205 vai dizer: ‘A prescrição ocorre em 10 anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”. A regra anterior era: ‘As ações pessoais prescrevem ordinariamente em 20 e as reais em 10 anos.’ OK, essa era a regra. Agora a regra é de 10 anos quando não tiver prazo especial. Vou dizer o seguinte: aquela primeira observação que eu fiz de que o Código não faz mais restrição no sentido de que regula só a vida privada de todos. Qual é a influência que tem esse prazo de 10 anos? No que diz respeito à prescrição quinqüenal das dívidas passivas do poder público, segundo o Decreto nº 20.910/32, essa está mantida porque o Código Civil vai ressalvar ‘quando a lei não lhe haja fixado prazo menor’.

 

Agora, atinentemente à prescritibilidade, quando o poder público está numa posição ativa, tirando a regra tributária que tem pretensão especial lá no Código Tributário Nacional, como é que vai ocorrer? Agora, naquela posição ativa do poder público? A meu ver, esse prazo de 10 anos é o que vai reger a prescritibilidade quando o poder Público estiver na posição ativa. Porque, por exemplo, o prazo para anular atos administrativos eivados de vícios para a União há texto expresso, a Lei nº 9.784, que estipula em 5 anos para a administração federal anular atos administrativos viciados. Nós podemos aplicar esse prazo ao Estado do Rio Grande do Sul? Não havendo regra expressa, no meu entendimento, no Estado do Rio Grande do Sul, ou nos municípios do Estado do Rio Grande do Sul, atinentemente ao prazo para anular atos administrativos, entendo que a regra geral do prazo de 10 anos deva ser utilizada até que venha a ser editada regra própria.  (...). Então aqui, a meu ver, esse prazo de 10 anos vai ser o prazo de prescritibilidade das relações enquanto não houver regra especial regendo o tempo. (...)” (Edição Especial - Revista TCE/RS, nº 36, pp. 18/19).

 

 

Idêntico raciocínio entendo seja válido com referência ao disposto no § 5º do art. 37, da CF, que prevê que “a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário (...)”.

 

Enquanto essa lei não for aprovada, qual a regra que deve ser aplicada? Sabe-se que não existe uniformidade sobre o assunto. Arrola-se como exemplo, os Tribunais de Contas da União[2], do Distrito Federal[3] e do Rio Grande do Sul[4]. Cada qual tem debatido a matéria ao longo dos últimos anos sem haver chegado a um consenso.

 

Pondero que, ao invés de se utilizar a analogia, mostra-se bem mais razoável e menos sujeito a divergências adotar a regra do art. 205 do Código Civil instituído pela Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (vigente a/c de 10/01/2003, conforme art. 2.044), que define clara e objetivamente que “a prescrição ocorre em 10 (dez) anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.

 

Ora, se não existe lei própria aplicável no âmbito do Estado de Santa Catarina dispondo sobre a matéria, com mais razão a pendência se soluciona através da norma do art. 205 do Código Civil, quer seja, quanto à prescrição da pretensão punitiva, quer seja quanto ao conhecimento dos atos sujeitos ao controle desta Corte de Contas.

 

 

 

No caso dos autos, a questão que deu azo à aplicação de multa foi o fato de que Recorrente não ter comprovado o caráter público das despesas realizadas com os valores recebidos a título de adiantamento para realização de despesas com viagens.

A citação foi cumprida em 18/05/2009 (fl. 2479 dos autos da TCE 09/00061006, por meio do Ofício n. 6.132/2009 (fl. 2476), oportunidade em que foi interrompido o transcurso do prazo prescricional, a teor do disposto no art. 202, inc. I do Código Civil, aplicável subsidiariamente, ante a ausência de norma especial.

Dispõe o parágrafo único do citado art. 202 do Código Civil de 2002 que “a prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper”.

No caso, recomeçou o prazo prescricional em 18/05/2009 e o Acórdão impugnado foi publicado no DOTC-e n. 777, de 08/07/2011, portanto, antes dos 10 anos a que se refere o art. 205 do Código Civil. Desta forma, rechaça-se a tese da prescrição alegada.

 

2.2.3. DA COMPROVAÇÃO DA EFETIVA REALIZAÇÃO DAS VIAGENS E SEU CARÁTER PÚBLICO

 

 

Segundo o Recorrente, o Conselheiro relator, nos autos do processo TCE 09/0061006 reconheceu que as viagens efetivamente ocorreram, salientando que as viagens eram realizadas pelo ex-Prefeito na tentativa de “levar os anseios da comunidade às autoridades estaduais” (fl. 07).

Destacou o Recorrente que à época não recebia verbas a título de adiantamento de despesas para viagens, mas sim, diárias para cobrir as despesas com pousada, alimentação e locomoção, de modo que não havia a obrigatoriedade de comprovar a totalidade das despesas, mas sim, que “as notas ficais servem tão somente para comprovar que os deslocamentos ocorreram” (fl. 08), de modo que o fato de “constar na nota fiscal mais de uma refeição não muda o fato do então Prefeito receber sua diária, a qual serve para indenizar despesas com pernoite e alimentação”.

Para o Recorrente, notas fiscais rasuradas ou com informações equivocadas não descaracterizam o caráter público da despesas realizadas, principalmente pelo fato de eventuais falhas nesses documentos não poderiam ser imputados ao ex-prefeito, mas aquele que emitiu ou que recebeu os documentos defeituosos.

Por fim, alternativamente, requereu o Recorrente que, na hipótese de não ser acolhido o pedido de revisão da decisão para excluir a imputação de débito, o Tribunal Pleno passa-se a considerar como irregular somente a parte superior ao valor despendido apenas com a pessoa do Prefeito, assim “se um uma nota fiscal constar três jantares, o correto é dividir o valor por três e imputar débito de tão somente 2/3 do total, diminuindo o valor despendido pelo Prefeito, pois é certo que suas viagens tinha caráter público” e que foram realizadas observando os princípios norteadores da Administração Pública (fl. 08/09).

Não há razão ao Recorrente, pois ao contrário do que afirmou, a Diretoria Técnica deste Tribunal apontou que as despesas mencionadas não se trata de valores pagos ao ex-Prefeito Municipal a título de diárias, mas sim, de adiantamentos financeiros lhe autorizado para a realização de viagens, as quais não foram explicitadas nos documentos contábeis de origem, o que motivou a imputação de débito.

Como bem salientou a Diretoria Técnica, verificou-se diversas irregularidades, inclusive o pagamento de diária cumulada com o adiantamento de despesas para viagens, além de despesas com combustíveis sem comprovação da regularidade no dia 24/05/2007, despesas com jantares durante período de férias (fl. 2656), situação que se demonstra contrário aos argumentos apresentados pela defesa.

Também não há razão para o pedido de subtração de parte dos valores imputados, pois não tendo o ex-Prefeito demonstrado a legitimidade das despesas, é de se imputar débito pela totalidade, pois a despesa é reputada integralmente sem finalidade pública, principalmente com pagamento de combustíveis para veículo não identificado como sendo da municipalidade (fl. 2.319 do TCE 09/00061006. Afinal, a diferença de apenas um minuto entre dois abastecimentos ocorreu por qual razão? E como justificar o pagamento de despesas com jantares para 5, 6 ou 15 pessoas, se não havia informações sobre a quantidade de pessoas que acompanhavam o ex-prefeito em viagens oficiais?

Em relação à multa apontada no item 6.2.1 do Acórdão recorrido, argumentou o Recorrente que não cabe ao Prefeito emitir os empenhos, tampouco conferir uma a uma todas as notas de empenhos emitidas pela municipalidade, tarefa esta que é afeita aos servidores públicos que compõe a assessoria do Prefeito, pois “os Prefeitos Municipais têm muitíssimos assuntos de suma importância para resolver diuturnamente, não tendo tempo para esse tipo de serviço, delegando-o a pessoas que acreditam ser competentes e capazes” (fl. 09).

Não há razão ao Recorrente, pois ainda que seja a pessoa que redige o documento, é certo que cabe ao ordenador da despesa realizar o exame da sua regularidade, de modo que ao firmar o documento sem que este esteja devidamente preenchido, assume o gestor a responsabilidade pela sua emissão, assim, sujeitando-se às eventuais penalidades aplicadas pelos órgãos de controle externo.

Já em relação à multa do item 6.2.2, ponderou o Recorrente que “em momento algum foi procedido em desacordo com os artigos 321, 34 e 60 da Resolução TC 16/94 e em desacordo com a Lei Municipal 1.290/95, devendo tal multa ser cancelada” (fl. 09).

A irregularidade noticiada no item 6.2.2 do Acórdão recorrido refere-se a um dos principais responsabilidades atribuídas as pessoas que recebem ou gerenciam recursos públicos, conforme previsto na Lei n. 4.320/64 e na própria Constituição Federal, Estadual e na própria Lei Orgânica dos municípios brasileiros.

No caso o ex-Prefeito Municipal ao determinar realizar as despesas com recursos que tiveram origem no orçamento público do município e ordenando que o pagamento fosse feito a quem de direito sem que houve a devida comprovação da sua finalidade pública, principalmente, diante dos indícios de irregularidade noticiados, especialmente a ausência de informações sobre as finalidades das despesas realizadas e irregularidades em alguns pagamentos, conforme noticiado às fls. 2655-26563.

Diante de todo o exposto, resta concluir pela total improcedência dos argumentos apresentados, de modo que, opina-se pela manutenção do Acórdão recorrido.

 

3. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Vice-Presidente César Filomeno Fontes proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:

 

          3.1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, interposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, contra o Acórdão nº 0493/2011, exarado na Sessão Ordinária de 01/06/2011, nos autos do Processo nº TCE 09/00061006, e no mérito negar provimento, ratificando na íntegra a Deliberação Recorrida.

          3.2. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer da Consultoria Geral ao Sr. Jair Jose Farias, à Prefeitura Municipal de Bom Retiro e ao procurador Dr. Noel Antonio Tavares de Jesus.

 

Consultoria Geral, em 31 de outubro de 2011.

 

 SANDRO LUIZ NUNES

AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO

 

De acordo:

 

 JULIANA FRITZEN

COORDENADORA

 

Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Vice-Presidente César Filomeno Fontes, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 HAMILTON HOBUS HOEMKE

CONSULTOR GERAL



[1] Os estudos (conferências) do Ciclo resultaram em Edição Especial da Revista do TCE/RS, sob o nº 36, maio/2004.

[2] TCU. Processo TC-549.037/1996-8, decisão Plenária de 09/05/2003. Transcrição parcial às fls. 30/32 destes autos.

[3] TC/DF. Ministério Público Especial. Processo nº 1718/90. Parecer nº 156/99.TC/DF. Processo nº 4863/97. Julgamento em 22/04/2004. Manifestação pela inaplicabilidade pelo Tribunal de Contas do DF do art. 54 da Lei Federal n. 9.784/99 “quando obstar o exercício do controle externo a cargo” do TC/DF. Menciona decisão preferida com relação ao processo nº 3454/93. Nestes autos, apreciados em 03/02/2004, é dito que “A prescrição administrativa aplicada às atividades de controle externo tem sido uma matéria tormentosa”. Foi proposto pela Presidência do Tribunal o adiamento do voto de desempate, sendo determinado à “4ª ICE que proceda, em autos apartados, um levantamento das decisões judiciais sobre a matéria, em especial, a decisão definitiva do Mandado de Segurança ajuizado no Supremo Tribunal Federal e, ao final, emitir o seu entendimento sobre a matéria”. O Mandado de Segurança em referência é de nº 24.540, sendo proposto perante o STF por servidor aposentado, contra o Acórdão nº 86/2002 do TCU “que julgou ilegal a aposentadoria concedida ao impetrante”, sendo um dos argumentos do impetrante a prescrição administrativa. A decisão do STF acerca do MS 24.450 foi publicada no DJ de 18/06/2004, sem que a questão da prescrição fosse abordada.

[4] A posição do TCE/RS consta transcrita neste Relatório.