TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Gabinete do Conselheiro Otávio Gilson dos Santos

PROCESSO Nº. : RPL 04/02778014
UG/CLIENTE : Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Gaspar
INTERESSADO : Alzira Material Filtrante e Saneamento Ltda.
RESPONSÁVEL : Luiz Carlos Reinert - Diretor Geral
ASSUNTO : Representação - Licitação (art. 113, da lei nº 8.666/93)
PARECER Nº. : GC-OGS/2004/499

Cuida o presente Processo, de expediente encaminhado a esta Corte de Contas pela empresa Alzira Material Filtrante e Saneamento Ltda., estabelecida na cidade de Biguaçú, em que relata a ocorrência de possível abuso de autoridade por parte do SAMAE da cidade de Gaspar, uma vez que, narra, a Representante foi coagida a devolver os valores recebidos da referida entidade em função do fornecimento de carvão antracitoso, licitado através do Convite nº 7/2004, de que foi vencedora, sob pena de suspensão dos direitos de licitar com o município e de declaração de inidoneidade para contratar.

Diz ainda (item 23), que "Diante do despótico ato pelos reflexos advindos em sua vida comercial e moral jamais manchadas e, não pretendendo submeter ao Poder Judicário a apreciação da questão, (...), outro caminho não restou à Representante senão de aceitar, (...), a proposta para o ressarcimento do valor recebido e retirar às suas expensas o produto fornecido, ...".

E mais (item 25), que o Representado há de ser "responsabilizado pelos enormes prejuízos causados à Representante, não só de ordem material, mas também pelo fator moral, posto que, foi maculado seu inabalado conceito comercial."

Enfim a Representante pede que sejam apuradas as responsabilidades pelas irregularidades concretizadas em decorrência do Convite 7/2004, lançado pelo SAMAE de Gaspar, ou, entendendo o Tribunal de Contas de outra forma, que seja realizada perícia relativamente ao produto objeto da licitação.

1.1 - Da Instrução

Autuado como Representação, nos termos do art. 113, da Lei de Licitações, os autos foram encaminhados, inicialmente, à Diretoria de Controle dos Municípios - DMU. Esta, entendendo que a Representação envolve aspectos de engenharia, o remeteu à Diretoria de Controle de Obras - DCO, para manifestação.

A DCO desta Corte, emitiu o Relatório nº 121/2004, de fls. 73 a 74, no qual afirma, em resumo, que a perícia solicitada pela Representante deve ser encaminhada a um laboratório apropriado, como o são os laboratórios da Universidade Federal de Santa Catarina e não ao Tribunal de Contas, que não procede tais tarefas.

Dizem ainda os Técnicos da DCO (fl. 74) que "se não houvesse a realização do Aditivo ao Convite (fl. 15), a empresa requerente (sic) não teria prosperado no certame licitatório pois, além de fornecer material fora da especificação, não estaria também fornecendo o material com o nome solicitado, no caso, 'Carvão Ativado'".

Retornando os autos à DMU, esta elaborou o Relatório nº 1.459/04 (fls. 75/80), concluindo, com suporte no relatório elaborado pela DCO, que a Representação em tela é improcedente uma vez que, para seu deslinde, necessita de perícia, o que não compete a esta Corte, sugerindo, assim, o arquivamento dos autos.

1.2 - Do Ministério Público

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas manifestou-se à fl. 82 acompanhando a proposição de arquivamento dos autos sugerida pelo Corpo Instrutivo.

É este o sucinto relatório.

2 - ANÁLISE e VOTO

De acordo com os fatos narrados pela empresa Representante (fls. 2 a 9), o SAMAE de Gaspar, aqui Representado, lançou em 11/02/2004, o Convite nº 7/2004, cujo objeto era a aquisição de 8 toneladas de carvão, conforme as especificações constantes do ato convocatório que se encontra às fls. 11 a 14.

Em 12/02/04, portanto, um dia após o lançamento do Convite, o Representado realizou um aditamento ao Convite em foco (fl. 15), estabelecendo que uma única alteração no objeto da licitação, que foi descrita da seguinte forma:

"CLÁUSULA PRIMEIRA: fica alterada a descrição do objeto na folha proposta para "carvão antracitoso" no lugar de "carvão ativado".

Todas as demais cláusulas e condições permaneceram inalteradas, a teor a cláusula segunda do mesmo Termo Aditivo de fl. 15.

Tendo vencido a licitação a Representante forneceu ao Representado o produto licitado, na quantidade de 8 toneladas de Carvão Antracitoso, recebendo, em 29/03/04, a contrapartida devida, de R$ 6.832,00, tornando-se assim a aquisição (compra e venda), perfeita e acabada.

Contudo, narra a Representante, em 15/04/04, 17 dias depois do pagamento, o Representado notificou a Representante, dizendo que o produto entregue era de qualidade inferior e diferente do especificado, ameaçando a Representante de penalidades previstas na cláusula 8.1 da Carta-Convite (fl. 13).

Diz a Representante que tendo havido modificação do objeto licitado, que passou de carvão ativado para carvão antracitoso, ocorreu também substancial e indiscutível alteração não só em relação à especificação química, como também em relação ao preço.

Disso decorre que, caso a Representante imaginasse que a alteração no objeto (de carvão ativado para carvão antracitoso) exigisse a permanência das características e especificações do "carvão ativado", a Representante não teria participado da licitação, uma vez que o "carvão ativado" tem valor de mercado muito superior, e, além disso, só existe um fornecedor do produto, finaliza a Representante.

Concluindo a Representante afirma que caso tenha ocorrido erro na escolha do produto licitado, tal erro não lhe pode ser atribuído, pois a responsabilidade é exclusiva do Representado.

Apesar de tudo isso em 03/05/04 o Representado, sem proporcionar qualquer direito de defesa à Representante, proferiu decisão em processo administrativo, impondo à Representante as seguintes penalidades:

a) devolução do valores recebidos (R$ 6.832,00);

b) suspensão do direito de licitar com o Município de Gaspar e suas autarquias;

c) publicação no Diário Oficial do Estado de declaração de inidoneidade da contratada/Representante.

Narra a Representante, que diante do ato despótico, e não pretendendo submeter a questão à apreciação do Poder Judiciário, decidiu, contrariada, aceitar a proposta para a devolução do valor recebido e retirar às suas expensas o produto fornecido.

Quer agora que o Representado seja responsabilizado pelos prejuízos causados à Representante, tanto os de ordem material como os de ordem moral. Por isso formula a presente Representação, para o fim de serem apuradas as responsabilidades pelas irregularidades, declarar nulas as penalidades impostas à Representante e, entendendo o Tribunal de Contas de forma diversa, a Representante pede a realização de perícia relativamente ao "carvão antracitoso" mencionado no Termo Aditivo ao Edital que foi entregue ao Representado.

Embora a Representação que se examina trate de Licitação e o art. 113, § 1º, da Lei nº 8.666/93 preveja a possibilidade de representação ao Tribunal de Contas contra irregularidades na aplicação da mesma lei, para os efeitos do controle das despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentos regidos pela Lei de Licitações, o objeto da presente Representação não se insere nas competências da Corte de Contas, previstas na Constituição Estadual (art. 59).

A fiscalização exercida pelo Tribunal de Contas tem em vista sempre a boa utilização dos dinheiros públicos. Por isso que, a Constituição Federal no seu art. 70, e a Constituição do Estado, no seu art. 58, para o que mais de perto nos concerne, estabelece que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Estado e dos órgãos e entidades da administração pública, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, será exercida pela Assembléia Legislativa com auxílio do Tribunal de Contas.

No exame que o Tribunal de Contas exerce, quanto à legalidade, legitimidade e economicidade dos atos praticados pelas entidades referidas, não se vislumbra, a não ser reflexamente, qualquer defesa de interesses particulares.

O exercício do controle e fiscalização do Tribunal de Contas visa a proteção do Estado, do Erário, do cidadão enquanto contribuinte, e não dos interesses particulares enquanto entes econômicos e sujeitos de proteção econômica e moral. Para isso existem o Poder Judiciário e o Ministério Público.

Fogem, portanto, do exame exercido pelo Tribunal de Contas, as questões que envolvem o possível direito à indenização e/ou realização de perícia, e até mesmo, no caso presente, ao possível abuso de poder de que se teria valido o Representado para coagir a Representante a realizar a devolução dos valores legitimamente recebidos em função da compra e venda efetuada.

Face o exposto,

VOTO, no sentido de que o Egrégio Plenário adote a decisão que ora submeto a sua apreciação:

2.1 – Não Conhecer da presente Representação formulada pela empresa Alzira Material Filtrante e Saneamento Ltda., nos termos do art. 113, § 1º, da Lei nº 8.666/93, contra o Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Gaspar - SAMAE, tendo em vista os procedimentos da licitação do Convite nº 7/2004 levado a efeito pelo referido ente para aquisição de carvão, uma vez que o objeto visado - indenização por prejuízos causados à Representante, ou a realização de perícia -, são procedimentos que não se inserem nas competências da Corte de Contas;

2.2 - Dar ciência desta Decisão, do Parecer e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório Técnico nº 1.459/2004 (fls. 75 a 80) à empresa Alzira Material Filtrante e Saneamento Ltda.

2.3 - Determinar o arquivamento dos autos.

Gabinete do Conselheiro, em 25 de outubro de 2004.

Otávio Gilson dos Santos

Conselheiro Relator