Processo n.

CON 08/00484045

Unidade Gestora

Prefeitura Municipal de Água Doce

Interessado

Antônio José Bissani – Prefeito Municipal

Assunto

Conversão em pecúnia de licença-prêmio e férias não usufruídas quando da aposentadoria ou falecimento do servidor.

Relatório n.

756/2008

 

 

1. Relatório

 

Tratam os presentes autos de consulta formulada por Antônio José Bissani, Prefeito Municipal de Água Doce, acerca da possibilidade de indenizar (converter em pecúnia), quando da aposentadoria ou de qualquer outra forma de extinção do vínculo funcional de servidor público com a Administração Pública, as licenças-prêmio e férias não usufruídas.

 

Os autos foram encaminhados à Consultoria Geral, que através do Parecer COG n. 645/08, procedeu à competente análise instrutiva.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas se manifestou por meio do Parecer MPTC n. 6.370/2008, da lavra do Procurador Carlos Humberto Prola Júnior, no qual acolhe os termos da resposta sugerida pela Consultoria Geral.

 

2. Voto

 

Os requisitos e pressupostos necessários ao conhecimento da presente consulta foram atendidos pelo Consulente.

 

 

 

A dúvida manifestada pela autoridade consulente se refere ao fato de que não existe na legislação local previsão para se “converter em pecúnia”, leia-se, indenizar, as licenças-prêmios não usufruídas quando da exoneração do servidor ou mesmo seu falecimento, impedindo assim, no seu entender, o gozo do benefício adquirido.

 

A COG, ao analisar os termos da lei local assim se manifestou à fl. 20:

 

[...]

Como se pode ler dos dispositivos legais acima transcritos, existe a previsão de incorporação ao patrimônio jurídico dos beneficiários o direito à fruição de férias e licença-prêmio, contudo não se observa o direito à conversão em pecúnia, para o caso de não terem gozado durante o período em que mantiveram vínculo com o Poder Público Municipal.

 

Esse, então, o alvo da consulta formulada, qual seja, a possibilidade da conversão em pecúnia, quando da ocorrência de exoneração ou do falecimento do servidor.

 

Mais adiante, à fl. 21, a Consultoria Geral colaciona o seguinte entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF:

 

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO, INDENIZAÇÃO DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA POR NECESSIDADE DE SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. QUESTIONAMENTO ACERCA DO NEXO DE CAUSALIDADE. IMPOSSIBILIDADE.

1. O Pleno desta Corte, com base na teoria da responsabilidade objetiva do Estado, firmou exegese segundo a qual é devida a indenização ao servidor de benefício não gozado, por interesse do serviço. [...] Agravo Regimental provido.” (AgRg no RE nº 234.093/RJ, 2ª Turma, Rel. Ministro Maurício Corrêa, DJ 04/12/1999, p. 11) (grifamos).

 

 

Têm-se ainda os julgados do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõem acerca da matéria:

 

PROCESSO CIVIL. SERVIDOR APOSENTADO. FÉRIAS NÃO GOZADAS. CONVERSÃO EM PECÚNIA. [...].

É devido o pagamento de férias convertidas em pecúnia em virtude da aposentadoria do servidor, face à natureza indenizatória de tais verbas. Enriquecimento ilícito na Administração que não se admite. Precedentes.

[...].” (Quinta Turma. Resp nº 273.799/SC, Rel. Ministro Edson Vidigal. DJ 04/12/2000)[1].

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. APOSENTADORIA. [...] CONVERSÃO EM PECÚNIA. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. DIREITO DO SERVIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. PRECEDENTES. DESNECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE E DA SUPREMA CORTE.

[...]

2. A conversão em pecúnia das licenças-prêmios não gozadas em razão do interesse público, independe de previsão legal expressa, uma vez que esse direito está calcado na responsabilidade objetiva do Estado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, e não no art. 159 do Código Civil, que prevê a responsabilidade subjetiva. Precedentes do STF.

3. É cabível a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada em razão do serviço público, sob pena de configuração do enriquecimento ilícito da Administração. Precedentes desta Corte.

4. Recurso especial conhecido e desprovido.” (STJ: 5ª Turma: Resp 631.858-SC, Rel. Ministra Laurita Vaz. J. 15/03/2007, DJ 23/04/2007, p. 291) (grifamos)[2].

 

ADMINISTRATIVO. MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO. LICENÇA-PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE.

1. A Lei Complementar nº 75/93, não disciplinou a hipótese de conversão em pecúnia das licenças-prêmio não usufruídas e não contadas em dobro, por ocasião da aposentadoria. Contudo, em seu art. 287, determina a aplicação subsidiária das normas gerais referentes aos servidores públicos.

2. Esta Corte, apreciando as disposições insertas no art. 87, § 2º da Lei nº 8.112/90, em sua redação original, cujo teor é semelhante ao disposto no art. 222, inciso III, § 3º, alínea ‘a’, tem proclamado que há direito à conversão em pecúnia das licenças-prêmio não gozadas e não contadas em dobro, quando da aposentadoria, sob pena de locupletamento ilícito da Administração[3].

3. Foge à razoabilidade jurídica que o servidor seja tolhido de receber a compensação pelo não-exercício de um direito que incorporara ao seu patrimônio funcional e, de outra parte, permitir que tal retribuição seja paga aos herdeiros, no caso de morte do funcionário. Recurso não conhecido.” (Resp 556.100 DF, 5ª Turma. Rel. Ministra Laurita Vaz, DJU de 02/08/2004).

 

Assim, a COG assevera que:

 

[...] não há dúvida de que, no caso de exoneração e aposentadoria, são devidas ao servidor licenças-prêmios e férias não gozadas quando o pedido da concessão do servidor for denegado pela Administração à vista do interesse público, por se tratar de responsabilidade civil objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal [...].

[...]

No caso, não se pode aventar o fato de ausência de previsão legal específica para conversão em pecúnia de licença-prêmio de servidores exonerados ou herdeiros de servidores falecidos para justificar o não-pagamento, uma vez que se trata de responsabilidade civil do Município, decorrente diretamente de comando constitucional (art. 37, § 6º), o que é suficiente para aferição por parte dos servidores. Portanto, em sintonia com o próprio vernáculo, deve a Administração estar atenta para informar ao servidor em tempo hábil, em caso de exoneração ou aposentadoria, o direito adquirido às licenças-prêmios e/ou férias.

[...]

Ressalte-se que afastamentos do cargo decorrentes de eventos imprevisíveis, tais como aposentadoria por invalidez e falecimento, não exigem do servidor, preliminarmente, a negação do direito ao gozo da licença-prêmio em razão do interesse público para a futura conversão em benefício próprio ou dos herdeiros, considerando a natureza indenizatória do quantum.

[...]

Logo, estando comprovado que o ex-servidor foi exonerado ou faleceu sem que lhe fosse propiciada a fruição de licença-prêmio ou férias, ou seja, direito já adquirido, compete à Administração do Município, independentemente de determinação judicial, indenizá-lo ou a seus herdeiros.

 

Não seria correto impedir a conversão em pecúnia de maneira administrativa se, reiteradas vezes, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal vêm reconhecendo como legítima e legal essa conversão.

[...]

Registre-se, ainda que, os períodos de licença e férias não desfrutadas pelo servidor que vier a falecer na ativa serão convertidos em pecúnia em favor dos beneficiários da pensão.

 

Diante do exposto, a COG sugere a revogação dos Prejulgados ns. 313, 985, 1087, 1391, 1474, 1625, por estarem em desacordo com o atual entendimento jurisprudencial, e a reforma dos Prejulgados ns. 1301 e 1824, nos termos expostos às fls. 30/31 e 33.

 

Sendo assim, e considerando que o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas se manifesta no mesmo sentido do entendimento da Consultoria Geral, proponho ao egrégio Plenário a seguinte decisão:

 

2.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.

 

2.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

 

         2.2.1. Em razão da aposentadoria ou de outra forma de extinção do vínculo funcional de servidor público com a Administração Pública, é possível, independentemente de previsão legal expressa, a indenização (conversão em pecúnia) de licença-prêmio ou férias adquiridas e não usufruídas por motivo de necessidade de serviço ou conveniência da Administração, devidamente comprovados, visto que se trata de verba indenizatória decorrente do art. 37, § 6º, da Constituição da República, sob pena de configuração do enriquecimento sem causa da Administração Pública.

 

        2.2.2. Nas hipóteses de afastamentos do cargo em razão de eventos imprevisíveis, tais como, aposentadoria por invalidez ou falecimento, configurado o direito do servidor ao gozo daqueles benefícios (férias ou licença-prêmio), a concessão da respectiva indenização (conversão em pecúnia) independe de prévio requerimento do servidor e negativa da Administração Pública.

 

        2.3. Com fundamento no art. 156 da Resolução n. TC-06/2001, reformar os Prejulgados ns. 1301 e 1824, que passam a vigorar com a seguinte redação:

 

1301

1. Ao Vice-Prefeito que exerce cargo de Secretário Municipal, verificada a ausência de impedimento na Lei Orgânica do Município, lhe é permitido optar entre o subsídio atribuído ao mandato de Vice-Prefeito, e aquele fixado para o cargo de Secretário Municipal.

 

O Vice-Prefeito nomeado para exercer cargo de Secretário Municipal que optar pelo subsídio do cargo eletivo somente terá direito ao subsídio mensal fixado em parcela única, não incidindo os benefícios assegurados aos servidores públicos preconizados no § 3º do art. 39 da Constituição Federal.

 

O Vice-Prefeito nomeado para exercer cargo de Secretário Municipal que optar pelo subsídio do cargo público de Secretário terá os mesmos benefícios atribuídos aos servidores públicos, previstos no § 3º do art. 39 da Constituição Federal, entre eles o direito a décimo terceiro é férias acrescidas de 1/3 sobre o subsídio; podendo ser indenizado por férias legalmente concedidas e não-gozadas somente quando conjugados os seguintes fatores:

a) as férias não terem sido gozadas por haver motivo de relevante interesse público, ou seja, por necessidade de serviço, ou por conveniência da administração;

b) deixar o cargo que ocupa;

c) o Secretário Municipal não ser servidor efetivo do ente.

 

2. O servidor público efetivo ocupante de cargo de Secretário do mesmo Município pode optar entre a remuneração do cargo efetivo e o subsídio do cargo de Secretário, desde que autorizado pela legislação local, vedada a percepção cumulativa.

 

As vantagens inerentes ao cargo efetivo não são devidas ao servidor que venha a exercer o cargo de Secretário Municipal, o qual deve ser remunerado pela forma de subsídio fixado em parcela única. Ditas vantagens permanecem latentes, só retomando-se o pagamento quando do retorno do servidor ao cargo efetivo.

 

 

 

 

 

1824

Até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98, podem os servidores computar em dobro, para fins de aposentadoria, as férias e licenças-prêmio não gozadas.

 

Por se tratar de responsabilidade civil objetiva do Estado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, após a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20, ou se o tempo ficto anterior à referida alteração não for utilizado para fins de aposentadoria, os servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios poderão ser indenizados por férias e licenças-prêmio não gozadas, se:

a) as férias ou licenças-prêmio não foram usufruídas em razão de convocação da Administração, por motivo de relevante interesse público e conveniência da Administração (necessidade de serviço), devidamente comprovado;

b) o servidor deixar o cargo que ocupa, por aposentadoria, exoneração a pedido ou exoneração pela Administração, neste caso quando se trata de servidor ocupante de cargo em comissão.

 

        2.4. Revogar os Prejulgados ns. 313, 985, 1087, 1391, 1474, e 1625, com fundamento no art. 156 da Resolução n. TC-06/2001.

 

        2.5. Determinar ao Consulente que, em futuras consultas, encaminhe parecer de sua assessoria jurídica, nos termos do art. 104, V, do Regimento Interno do Tribunal de Contas.

 

        2.6. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer n. COG-645/08, ao Prefeito Municipal de Água Doce, Sr. Antônio José Bissani.

 

2.7. Determinar o arquivamento dos autos.

 

Florianópolis, 07 de novembro de 2008.

 

 

 

Conselheiro Salomão Ribas Junior

Relator

 



[1] À fl. 21.

[2] À fl. 25.

[3] À fl. 25.