Processo n.

CON-08/00422449

Unidade gestora

Prefeitura Municipal de Itapema

Consulente

Sr. Sabino Bussanello

Assunto

Consulta – Pagamento de diárias a Conselheiros Tutelares

Voto n.

GCCFF-731/2008

 

 

Conselheiro Tutelar. Diárias.

O Conselheiro Tutelar faz jus ao pagamento de diárias quando as mesmas se referirem a atividades afetas à referida função.

 

 

1. RELATÓRIO

 

Tratam os autos n. CON-08/00422449 de consulta formulada pelo Sr. Sabino Bussanello, Prefeito Municipal de Itapema, indagando acerca da viabilidade do pagamento de diárias a conselheiros tutelares, tendo em vista que nem a lei instituidora do Conselho Tutelar naquele Município, nem o diploma legal que dispõe sobre a concessão de diárias prevêem expressamente aqueles agentes como possíveis beneficiários.

 

Encaminhados os autos à Consultoria Geral – COG, foi elaborado o Parecer n. 501/08, sugerindo o não-conhecimento da consulta, sob o entendimento de não versar a mesma acerca de questão formulada em tese.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal, por meio do Parecer n. MPTC-3914/2008, acompanhou o entendimento da Consultoria.

 

Em seguida vieram-me os autos, na forma regimental, para voto e respectiva proposta de Decisão.

A priori, manifestei-me no sentido de acompanhar a Consultoria e o Ministério Público. Contudo, na Sessão Plenária de 13 de agosto de 2008, a partir das discussões e sugestões emanadas de alguns dos membros deste Egrégio Tribunal, no sentido de que a presente consulta poderia, sim, ser interpretada como questão formulada em tese, proporcionando, dessa forma, os esclarecimentos argüidos pelo gestor, solicitei a retirada de pauta destes autos.

 

Determinei, por conseguinte, o encaminhamento da peça em tela ao Órgão Consultor, a fim de que o mesmo emitisse manifestação quanto ao mérito da indagação proposta, o que foi devidamente levado a efeito.

 

O Ministério Público, por seu turno, mediante o Parecer MPTC 6063/2008, corroborou a manifestação da Consultoria quanto à resposta meritória.

 

Por derradeiro, retornaram os autos a este Gabinete para análise e voto.

 

            2. VOTO

 

 

            Preliminarmente, constata-se que a consulta em tela cumpre os requisitos necessários à admissibilidade.

 

Quanto à indagação propriamente dita, nota-se que o consulente questiona acerca da possibilidade do pagamento de diárias ao conselheiro tutelar. Situação a impulsionar a dúvida do consulente é a ausência de menção expressa aos conselheiros, tanto na lei que disciplina a concessão de diárias, quanto na lei que cria o Conselho Tutelar.

 

            A Consultoria Geral, ao proceder à satisfação do questionamento formulado, inferiu em síntese que, embora não haja, no artigo 1º da Lei Municipal nº 2296/2005, menção expressa aos conselheiros tutelares, referida norma é perfeitamente aplicável aos que executam referido mister, considerando que os mesmos exercem função pública, ainda que sem cargo. Merece guarida a manifestação da COG.

 

            Eis o que dispõe o artigo 1º da Lei nº 2296/2005:

 

Art. 1º - Aos agentes políticos e servidores públicos municipais da administração direta ou fundacional que tiverem que se deslocar a serviço, para fora do território do Município, conceder-se-á além do transporte, o pagamento de diária a título de indenização das despesas de alimentação, hospedagem e outras despesas que tiver no local de destino.

 

 

De fato, expressamente não estão elencados os conselheiros tutelares entre os possíveis beneficiários da concessão de diárias. Contudo, tal circunstância não deve constituir óbice à não extensão daquele direito ao conselheiro.

 

Indubitável que o exercício efetivo da função de conselheiro tutelar constitui serviço público relevante, necessário e obrigatório nos municípios, nos termos do artigo 135 da Lei nº 8069/90. Nota-se, ademais, que é vigente nesta Corte o entendimento segundo o qual o Conselheiro Tutelar desempenha função pública, sujeitando-se, inclusive, às vedações constitucionais de acumulação.

O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente qualifica a função de conselheiro como sendo serviço público relevante. Todavia, o Conselheiro Tutelar não deve ser tomado como funcionário público, mas pode ser compreendido na acepção de servidor público em sentido amplo, uma vez que exerce, nitidamente, função pública, legalmente qualificada como relevante.

Tal é a relevância do Conselho Tutelar e, conseqüentemente, da função desempenhada por seus membros, que o Estatuto da Criança e do Adolescente, no parágrafo único do artigo 134, impõe a necessidade de previsão de recursos para o funcionamento e custeio das atividades daquele Órgão.

São atribuições do Conselho Tutelar, elencadas no artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;

II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII;

III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:

a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;

b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações.

IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente;

V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;

VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;

VII - expedir notificações;

VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário;

IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;

X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;

XI - representar ao Ministério Público, para efeito das ações de perda ou suspensão do pátrio poder.

 

            Portanto, ante a relevância de tais atribuições, acha-se desarrrazoado inviabilizar, por exemplo, a participação do conselheiro tutelar em eventos que visam potencializar e aprimorar sua atuação, ou seu eventual deslocamento para desempenho de suas atividades, tais como a realização de diligências.  Nota-se que a não disponibilização de diárias para tais finalidades acaba por obstaculizar, quiçá engessar a atuação daqueles agentes, cujo papel na sociedade revela-se de suma importância.

            A título ilustrativo menciona-se a Associação Catarinense de Conselheiros Tutelares – ACCT,  que periodicamente promove eventos destinados à atualização e discussões acerca de temas afetos à atividade dos Conselheiros Tutelares, com o escopo de otimizar o trabalho daqueles agentes. Nesse sentido, destaca-se o Encontro Estadual dos Conselhos Municipais e  Tutelares dos Direitos da Criança e do Adolescente e o Congresso Estadual de Conselheiros Tutelares.

 

Infere-se que os eventos acima assinalados constituem apenas exemplos de uma miscelânea de situações que podem ensejar o deslocamento do conselheiro tutelar. Eventos que, sem dúvida, contribuem para o desempenho de um papel cada vez mais salutar perante a comunidade, que é o do conselheiro tutelar na salvaguarda dos direitos de crianças e adolescentes.

 

Dessa forma, a não menção expressa aos conselheiros tutelares na lei que disciplina a concessão de diárias no Município de Itapema não deve ter o condão de afastar daqueles agentes tal possibilidade.

 

Não é razoável e tampouco justo, além de ser, via de regra, inviável, que o próprio conselheiro tutelar tenha que dispor de seus próprios recursos, normalmente de pouca monta, para financiar eventuais deslocamentos, necessários ou recomendáveis no âmbito da nobre função que exerce no Município.

 

Daí a necessidade do pagamento de diárias quando configuradas situações a ensejá-las. Trata-se, em verdade, de compensar o “servidor” por despesas efetuadas no exercício de sua função. Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “não se pode pretender que o servidor que faça gastos indispensáveis ao exercício de suas atribuições não receba a devida compensação pecuniária. Trata-se de aplicação pura e simples de um princípio geral de direito que impõe a quem quer que cause prejuízo a outrem o dever de indenizar.” [1]

 

            Destarte, a inserção dos conselheiros tutelares no diploma legal que disciplina a concessão de diárias no Município de Itapema, ou na lei que cria e regulamenta o Conselho Tutelar, ou, ainda, em instrumento normativo específico, revela-se oportuna, posto que elidiria quaisquer dúvidas acerca da possibilidade ou não do pagamento das mesmas àqueles agentes.

 

Contudo, ainda que a legislação municipal não faça referência expressa, conclui-se viável o pagamento de diárias ao conselheiro tutelar, na qualidade de servidor público em sentido amplo, tendo em vista que o mesmo exerce função pública, no desempenho de serviço público relevante em órgão permanente, legalmente instituído no Município. Nas palavras de Tânia da Silva Pereira, o Conselho Tutelar, “uma vez criado por lei, é órgão da administração municipal e, portanto, sujeito às normas gerais de Direito Administrativo e de Direito Público em geral”. [2]

           

Ante o exposto, voto no sentido de que o Tribunal Pleno adote a decisão que ora submeto à sua apreciação:

 

        6.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.

 

6.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

Os membros do Conselho Tutelar que se ausentarem do Município em face da realização de diligências e/ou participação em eventos relacionados com matéria de sua competência e reconhecidos como de interesse relevante farão jus ao pagamento de diárias.

 

6.3. Determinar ao consulente que as futuras consultas encaminhadas a esta Corte venham instruídas com parecer da assessoria jurídica da unidade.

 

6.4. Dar ciência desta Decisão, bem como do Voto que a fundamenta, à Prefeitura Municipal de Itapema.

 

 

Gabinete do Conselheiro, 13 de novembro de 2008.

 

 

 

 

CÉSAR FILOMENO FONTES

Conselheiro Relator

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 1998.

[2] PEREIRA, Tânia da Silva. Direito da Criança e do Adolescente – Uma Proposta Interdisciplinar. São Paulo: Renovar, 2000.