ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete da Auditora Sabrina Nunes Iocken

 

PROCESSO N.º: RPJ 04/01743365

UNIDADE GESTORA: PREFEITURA MUNICIPAL DE GASPAR

INTERESSADO: SR. MURILO ADAGHINARI

ASSUNTO: REPRESENTAÇÃO ACERCA DE SUPOSTAS IRREGULARIDADES PELA DESTINAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS A ENTIDADE PRIVADA MEDIANTE CONVÊNIO

 

        

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de Representação Judicial encaminhada a este Tribunal em 15/04/2004 pelo Exmo. Promotor de Justiça, Sr. Murilo Adaghinari, que remeteu cópias dos procedimentos instaurados pelo Ministério Público, a partir de representações enviadas àquele órgão, nas quais foram apontadas supostas irregularidades na execução do “Programa de Abrigamento” na comarca de Gaspar, que é mantido com verbas públicas.

Analisados os pressupostos de admissibilidade, à luz do que dispõe o artigo 65, §1º, da Lei Complementar nº 202/00, e com a anuência do MPTC, a Representação foi conhecida por meio da Decisão nº 353/2005.

Em março/2005 a Diretoria de Denúncias e Representações realizou inspeção in loco, objetivando verificar irregularidades cometidas pela destinação de recursos públicos dos municípios de Gaspar, Ilhota e Luís Alves à entidade privada, mediante convênio, a qual resultou no Relatório de Inspeção nº 100/05, datado de 1º/02/2006, por meio do qual foi sugerida a conversão do presente processo em Tomada de Contas Especial, nos termos do artigo 65, §4º, da LC nº 202/00, a definição de responsabilidade solidária e a citação de diversas pessoas em razão de irregularidades descritas no mencionado relatório.

Mediante despacho, o então Relator, Conselheiro José Carlos Pacheco, determinou a realização de audiência para que os responsáveis apresentassem justificativas para as divergências abordadas na conclusão do relatório elaborado pela DDR, sendo assim procedido:

 

 

Nome

Qualificação

Audiência

Recebimento

Resposta fls.

Docs. fls.

Sérgio Hammes

Responsável pela Conferência Vicentina

Of. 2.471/06

MP 15/03/06

470 a 472

473 a 491

Pedro Celso Zuchi

Ex-Prefeito Municipal de Gaspar

Of. 2.472/06

MP 21/03/06

494 a 499

500 a 542

Roberto da Silva

Ex-Prefeito Municipal de Ilhota

Of. 2.690/06

MP 24/02/06

 

 

Érico Gielow Neto

Prefeito Municipal e Gestor do Fundo da Infância e Adolescência de Luiz Alves

Of. 2.691/06

MP 24/02/06

346 a 348

349 a 371

Paulo Drun

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Ilhota

Of. 2.692/06

MP 01/03/06

439 a 442

443 a 455

Dialison Cleber Vitti

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Ilhota

Edital nº 058/2006 – DOE 17.856, de 03/04/06

 

 

 

Maria de Souza Silva Mass

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Gaspar

Of. 2.694/06

MP 24/02/06

 

 

Lídia Regina Dehmer Schramm

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Gaspar

Of. 2.695/06

 

DEVOLVIDO

 

 

Cláudia Rath Dal Ri

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Luiz Alves

Of. 2.696/06

MP 24/02/06

373 a 375

376 a 398

Edite Scola

Ex-Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Luiz Alves

Of. 2.697/06

MP 24/02/06

400 a 402

403 a 425

 

Ressalto que não consta dos autos comprovante de que a audiência à Sra. Lídia Regina Dehmer Schramm tenha sido efetivada. O Ofício encaminhado via correio foi devolvido (fl. 433) e, a despeito do despacho proferido pelo então Relator para que fosse realizada audiência via edital, não há documentos que comprovem a sua realização.

Acrescento que além da Sra. Lídia Regina Dehmer Schramm, o Sr. Dialison Cleber Vitti e a Sra. Maria de Souza Silva Mass não se manifestaram no presente processo.

Por força dos artigos 1º e 2º da Resolução nº TC-10/2007, que alterou a estrutura e as competências dos órgãos auxiliares do Tribunal de Contas de Santa Catarina, e do artigo 1º, I, “b”, e III, da Portaria nº TC-136/2007, o presente processo foi encaminhado à Diretoria de Controle dos Municípios.

Após análise dos autos, a DMU elaborou o Relatório nº 1.314/2008 por meio do qual sugeriu considerar irregular a ausência de justificativa do Responsável pela aplicação de dinheiros públicos de seu bom e regular emprego, na conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades administrativas, em descumprimento ao artigo 49 da Resolução Nº TC-16/94, e aplicar multas aos responsáveis em decorrência da irregularidade.

O MPTC (Parecer nº 5361/2008) manifestou-se por acompanhar a sugestão da Diretoria Técnica.

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

Inicialmente é pertinente esclarecer que a análise realizada pela DDR ocorreu sobre a formalização e a execução de dois convênios firmados entre os Municípios de Gaspar, Ilhota e Luiz Alves e a Conferência Vicentina de Gaspar:

1º Convênio:

Convenentes

 

a)           Município de Gaspar, representado pelo Sr. Pedro Celso Zuchi, Prefeito Municipal, através do Fundo Municipal de Infância e Adolescência, representado pelo Sr. Valdair Mauro Debus, Ordenador de Despesas;

b)           Município de Ilhota, representado pelo Sr. Roberto da Silva, Prefeito Municipal;

c)           Município de Luiz Alves, representado pelo Sr. Érico Gielow Neto, Prefeito Municipal.

Conveniado

 

Conferência Vicentina de Gaspar, entidade de assistência social, sem fins lucrativos, representada pelo seu presidente Sr. Sérgio Hammes.

Valor

R$ 6.495,05

Objeto

Execução do Programa “Casa Lar”, que visa a criação e manutenção de abrigo para atendimento de crianças e adolescentes em situação de risco dos Municípios de Gaspar, Ilhota e Luiz Alves

Data

30/01/2002

Vigência

De 01/02/2002 a 31/01/2003

De 01/02/2003 a 31/01/2004 – 1º termo aditivo

O convênio destinava-se ao custeio de despesas com pagamento de aluguel e manutenção do local em que funcionava o abrigo, incluindo água, luz e telefone; remuneração da equipe de trabalho no local; despesas administrativas; despesas com alimentação, saúde, educação, lazer e transporte dos abrigados.

 

2º Convênio:

Convenentes

 

a)            Município de Gaspar, representado pelo Sr. Pedro Celso Zuchi, Prefeito Municipal, através do Fundo Municipal de Infância e Adolescência, representado pela Sra. Maria de Souza e Silva Mass, Ordenadora de Despesas;

b)           Município de Ilhota, representado pelo Sr. Roberto da Silva, Prefeito Municipal;

c)           Município de Luiz Alves, representado pelo Sr. Érico Gielow Neto, Prefeito Municipal.

Conveniado

 

Conferência Vicentina de Gaspar, entidade de assistência social, sem fins lucrativos, representada pelo seu presidente Sr. Sérgio Hammes.

Valor

Até R$ 10.000,00

Objeto

Execução do Programa “Casa Lar”, que visa a manutenção do abrigo “Casa Lar” para atendimento de crianças e adolescentes em situação de risco dos Municípios de Gaspar, Ilhota e Luiz Alves

Data

25/04/2003

Vigência

De 01/02/2003 a 31/01/2004

01/02/2004 a 31/03/2004– 1º termo aditivo

Da mesma forma que o primeiro convênio, o segundo destinava-se ao custeio de despesas com pagamento de aluguel e manutenção do local em que funcionava o abrigo, incluindo água, luz e telefone; remuneração da equipe de trabalho no local; despesas administrativas; despesas com alimentação, saúde, educação, lazer e transporte dos abrigados.

Por meio do 1º Termo Aditivo foi formalizada a retirada do Município de Luiz Alves, por desinteresse na continuidade do mesmo, e a assinatura, como ordenadora de despesas do Fundo Municipal da Infância e Adolescência de Gaspar, da Sra. Lídia Regina Demmer Schramm.

A Diretoria técnica apontou como responsáveis pelas irregularidades verificadas, distinguindo-os de acordo com o período em que ocuparam os cargos:

- Sr. Sérgio Hammes, diretor-presidente da Conferência Vicentina de Gaspar à época da vigência dos convênios em discussão;

- Sr. Pedro Celso Zuchi, ex-Prefeito de Gaspar;

- Sra. Maria de Souza e Silva Mass, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Gaspar entre janeiro e 13 de outubro de 2003;

- Sra. Lídia Regina Dehmer Schramm, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Gaspar entre 14 de outubro de 2003 e 06 de janeiro de 2005;

- Sr. Roberto da Silva, Prefeito Municipal de Ilhota e Gestor do Fundo Municipal da Infância e da Adolescência;

- Sr. Paulo Drun, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Ilhota entre 01 de setembro de 2003 e 31 de dezembro de 2004; e

- Sr. Dialison Cleber Vitti, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Ilhota entre 05 de outubro de 2002 e 31 de agosto de 2003.

 

A seguir passo a analisar as irregularidades apontadas inicialmente pela DDR, as manifestações dos responsáveis e da DMU e apresento minhas considerações acerca dos fatos apontados.

 

1. Realização de gastos irregulares, sem amparo convenial e desconsiderando o interesse público na manutenção da Casa Lar de Gaspar, contrariando os princípios constitucionais da eficiência e da legalidade previstos no caput do artigo 37 da Carta Magna, bem como o estabelecido no artigo 116, § 3o, da Lei Federal n. 8.666/93, no montante de R$ 4.842,62 (quatro mil, oitocentos e quarenta e dois reais e sessenta e dois centavos), conforme o descrito no item 6 do Relatório nº 100/05.

De acordo com a Instrução, a despesa apontada como irregular provém basicamente do pagamento de:

- serviços de mecânica e aquisição de combustíveis para automóvel, já que a Prefeitura deveria ter disponibilizado o veículo para a entidade particular usar na prestação dos serviços;

- aquisição de medicamentos, já que a Prefeitura possui farmácia básica; e

- aquisição de vestuário, que deveria ficar a cargo das famílias.

As justificativas apresentadas pelos responsáveis são bastante similares e se reportam ao fato de que os convênios previam a realização de despesas com alimentação, saúde, educação, lazer e transporte dos abrigados, o que daria suporte às despesas realizadas.

Ao proceder a reanálise dos autos, a DMU considerou que os gastos são regulares, de interesse público, e que provêm do Termo de Convênio.

Esclareço inicialmente que o Plano de Trabalho (fls. 359 a 370) apresentado pela Conferência Vicentina e utilizado como referência para a fixação dos valores repassados à conveniada previa a realização das seguintes despesas:

- pessoal – R$ 4.395,05;

- aluguel – R$ 600,00;

- encargos (água, luz, telefone etc.) – R$ 300,00;

- alimentos – R$ 800,00;

- material de limpeza – R$ 200,00;

- diversos (fraldas, roupas, remédios etc.) – R$ 200,00.

Verifico, portanto, que as despesas, levantadas pela Instrução, com manutenção do veículo (R$ 272,00) e com a aquisição de combustíveis (2.734,00) não estavam previstas no referido Plano de Trabalho.

Contudo, tendo em vista que os dois convênios previam o custeio das despesas com o transporte dos abrigados e que inexistem nos autos indícios de que as despesas realizadas não tenham se destinado a esse fim, considero que tais despesas são regulares, cabendo recomendação às Prefeituras de Gaspar, Ilhota e Luiz Alves para que nos próximos convênios que vierem a ser firmados observem a adequação entre seus objetos e planos de trabalho aprovados e as prestações de contas apresentadas.

 

2. Assinatura de convênio com a Conferência Vicentina visando o repasse de recursos financeiros públicos à entidade privada, contrariando o determinado no artigo 116, seus parágrafos e respectivos incisos, da Lei Federal n. 8.666/93, sendo que os convênios em questão já nasceram com vício insanável em seus elementos constitutivos e processuais, faltando-lhe requisitos legais básicos, conforme descrito nos itens "3", "4" e "5" do Relatório nº 100/05).

A presente irregularidade foi desmembrada pela Instrução nas que constam dos itens 3, 4, 5 e 6, analisadas adiante.

 

3. Descumprimento dos dispositivos constantes no art. 116, § 1º, incisos I a VII, da Lei Federal n. 8666/93, quando da celebração dos convênios supra-referidos, quanto a necessária aprovação do competente plano de trabalho proposto pela organização interessada, tal como descrito no item “5” do Relatório nº 100/05.

A irregularidade apontada pela Instrução consiste na ausência de plano de trabalho contendo a identificação do objeto, as metas a serem atingidas, as etapas ou fases de execução, o plano de aplicação dos recursos, a proposta de cronograma de desembolso financeiro e a previsão de início e fim da execução do objeto, bem como da conclusão das etapas ou fases programadas, o que contraria o artigo 116, §1º, da Lei nº 8.666/93.

Conclui a Instrução que a Administração não poderia ter firmado os convênios sem os respectivos planos de trabalho, os quais não poderiam ser avaliados nem aprovados.

De acordo com a reanálise realizada pela DMU, o plano de trabalho foi apresentado junto às fls. 359 a 370 dos autos e contém todos os requisitos exigidos pelo artigo 116, §1º da Lei nº 8.666/93, o que torna insubsistente a irregularidade inicialmente apontada.

Analisando os presentes autos verifico que, de fato, o plano de trabalho anexado às fls. 359 a 370 e datado de outubro de 2001 contém os requisitos previstos pelo artigo 116, §1º, da Lei nº 8.666/93, o que sana a irregularidade inicialmente apontada.

 

4. Contratação pelas Prefeituras de entidade particular, a Conferência Vicentina, para o exercício da administração do Programa de Abrigamento em tela, sem qualquer competência e experiência anterior para as atribuições a ela delegadas, e por não constar de suas finalidades estatutárias a realização de tais serviços, contrariando o disposto no artigo 5o, § 2o, alínea "h", da Lei Municipal de Gaspar n. 1.432/93 e o princípio da eficiência previsto no caput do artigo 37, da Constituição Federal, como descrito no item 3 do Relatório nº 100/05.

Foi apontado no Relatório de Inspeção que o objeto dos convênios firmados Conferência Vicentina não se encontra entre os objetivos definidos pelo artigo 3º de seu Estatuto, datado de 20/03/1954, e ainda que as administrações municipais de Gaspar, Ilhota e Luiz Alves não realizaram a verificação da capacidade técnica da conveniada.

Foi destacado ainda que de acordo com o artigo 5º, §2º, da Lei Municipal de Gaspar nº 1.432/93, que dispõe sobre a política municipal de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, havia necessidade de capacitação técnica por quem viesse a exercer as atividades ora em questão.

Destaco das alegações de defesa constantes dos autos, parte da manifestação apresentada pelo Sr. Pedro Celso Zuchi:

Quanto ao primeiro item gostaríamos de informar que a referida entidade tem mais de 50 anos, sendo que em um livro sobre sua história vamos encontrar vários trabalhos realizados pela entidade, além dos mencionados em seu estatuto, sempre na área social, auxiliando a comunidade, por isso ser reconhecida por toda a comunidade Gasparense, pelos serviços prestados à comunidade. A Pastoral da Criança (que atende e acompanha, nas comunidades carentes, mães gestantes e crianças de 0 a 6 anos); cursos de Formação Profissional; auxílio às famílias (crianças e idosos) com alimentação, roupas e outros; são algumas das atividades desenvolvidas, nesta cidade, por abnegados cristãos leigos ligados à Igreja Católica. O trabalho da entidade pelas crianças foi motivo de visita, pela Coordenadora Nacional da Pastoral da Criança Senhora Zilda Arns, em 2002, ano em que a entidade comemorou seus 50 anos. Desta forma entendemos que a referida entidade mantinha atividades com criança e adolescente, quer seja diretamente pela Pastoral da Criança, quer seja no auxílio e treinamentos para adolescentes carentes na busca do primeiro emprego.

Quanto ao segundo item gostaríamos de lembrar da Resolução de 2001, do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente, onde deliberam pela implantação do programa de abrigamento "Casa Lar", bem como pela entidade Conferência Vicentina, para desenvolver o programa. Gostaríamos de lembrar ainda que o referido Conselho participou de outras reuniões sobre o programa, enquanto do seu desenvolvimento, sendo que em uma reunião no mês de julho apresenta solicitações as Prefeituras Municipais, onde deixam claro que contratação de psicólogos e outros técnicos, não eram responsabilidade da Casa Lar. Estes profissionais eram colocados a disposição pela Prefeitura de Gaspar, entendemos que desde apresentação do programa estava claro qual seriam as contratações da Conferência Vicentina. Quanto a treinamentos, estamos enviando em anexo, vários eventos que a equipe que trabalhava na Casa Lar participou, sendo alguns deles promovidos pelo Conselho de Direitos.

Acima de tudo a entidade Conferência Vicentina desenvolveu o programa por vários meses com reuniões periódicas, onde participavam representantes da própria entidade, das administrações municipais, dos Conselhos Tutelares e de Direitos da Criança e Adolescente, bem como do Ministério Público e do Poder Judiciário. Durante todos estes meses não foram feitas reclamações das várias entidades sobre o desenvolvimento do Programa. Desta forma entendemos que os objetivos do programa foram alcançados, e portanto entendemos que a administração não deva ser penalizada.

De acordo com a DMU deve ser ponderado que, de acordo com a documentação remetida, a entidade Conferência Vicentina atua a mais de 50 anos na área social e vários documentos comprovam a realização de trabalhos nesta área.

Verifico, no presente caso, que a despeito não estar previsto de maneira específica, pelo estatuto da entidade, como objetivo o abrigamento de crianças e adolescentes, no próprio Plano de Trabalho havia previsão da participação de equipes técnicas dos Municípios, compostas por assistentes sociais, psicólogos e pedagogos, na execução dos convênios, ficando à cargo da entidade conveniada a parte relativa à assistência social, que já era usualmente praticada.

Acrescento ainda que a necessidade de “assessoramento superior integrado e multidisciplinar de profissionais especializados” prevista pelo artigo 5º, §2º, “h”, da Lei Municipal de Gaspar nº 1.432/93, refere-se diretamente aos serviços sociais que fazem parte do atendimento dos direitos da criança e do adolescente do Município de Gaspar, previstos pelo artigo 3º, III, da mesma lei, e não ao Programa de Abrigo previsto pelo artigo 5, §1º, “d”, do citado diploma legal, e que é objeto dos convênios analisados.

Lei Municipal de Gaspar nº 1.432/93

Art. 3º - O atendimento dos direitos da criança e do adolescente no Município de Gaspar far-se-á através de:
I - Políticas sociais básicas de educação, saúde, recreação, esporte, cultura, lazer, profissionalização e outras, assegurando-se em todas o tratamento com dignidade e respeito á liberdade e a convivência familiar e comunitária;
II - Políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitam;
III - Serviços especiais, nos termos desta Lei;
IV - Integração eficiente e operacional de todos os órgãos e serviços responsáveis para o atendimento inicial e seqüente à Criança e ao Adolescente que dele necessitar, preferencialmente num mesmo local e com todos os recursos materiais e humanos necessários;
V - A mobilização da opinião pública no sentido de incentivar a indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade.
Art. 5º - O Município poderá criar os programas e serviços a que aludem os incisos II e III do artigo 3º desta Lei, ou estabelecer consórcio intermunicipal para atendimento regionalizado, instituído e mantendo entidades governamentais de atendimento mediante prévia autorização do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.
§ 1º - Os programas serão classificados como de proteção ou sócio-educativo, e destinar-se-ão a:
a) - orientação e apoio sócio familiar;
b) - apoio sócio educativo em meio aberto;
c) - colocação familiar;
d) - abrigo;
e) - liberdade assistida;
f) - semiliberdade;
g) - internação.
§ 2º - Os serviços especiais visam a:
a) prevenção e atendimento médico e psicossocial as vitimas de negligencia, maus tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão e outros;
b) identificação e localização de pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes desaparecidos;
c) proteção jurídico social, especialmente por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente.
d) serviço odontológico, preventivo e curativo;
e) atendimento à Criança e ao Adolescente portadores de deficiências;
f) pesquisa e estudo sócio-econômico-cultural;
g) profissionalização integrada;
h) assessoramento superior integrado e multidisciplinar de profissionais especializados;
i) planejamento integrado de secretarias.

Nesse sentido e acompanhando o entendimento manifestado pela DMU, considero que a irregularidade inicialmente apontada deve deixar de subsistir.

 

5. Ausência do cumprimento pela Administração, do princípio da motivação e pela inexistência da preocupação em preservar o interesse público ao operacionalizar o sistema de transferência de responsabilidades, contrariando o disposto no art. 2o, da Lei Federal n. 9784/99 e o art. 16, § 5º, da Constituição Estadual, tal como relatado no item 4 do Relatório nº 100/05.

6. Ausência do cumprimento dos princípios da isonomia e da impessoalidade, tal como instituídos, respectivamente, no § 1o, do artigo 39, e no artigo 5o, da Constituição Federal e no caput do artigo 37 da Carta Magna, quando da escolha da Conferência Vicentina como operadora do Programa de Abrigamento em questão, por inexistirem procedimentos objetivos e prévios que indicassem claramente ser a terceirização dos serviços o melhor caminho, que aquela entidade fosse a mais adequada a prestá-los e que os custos decorrentes de sua prestação fossem os que acabaram sendo, como descrito no item 4 do Relatório nº 100/05.

A irregularidade apontada pela instrução funda-se no fato de inexistir documentação administrativa anterior à deflagração dos convênios, o que inviabiliza o atendimento do Princípio da Motivação dos Atos Administrativos, e leva ao descumprimento dos Princípios da Isonomia e da Impessoalidade em razão da impossibilidade de serem comprovados os requisitos abaixo elencados:

- a existência de atos destinados a verificar a necessidade e a conveniência da execução dos serviços de abrigamento de crianças e adolescentes de forma terceirizada;

- que a Conferência Vicentina era a entidade mais adequada a prestar os serviços;

- a regularidade dos custos apresentados.

Destaco novamente das alegações de defesa constantes dos autos, parte da manifestação apresentada pelo Sr. Pedro Celso Zuchi:

Dentre as questões citadas neste item, primeiramente gostaríamos de nos reportar as alegações apresentadas nos itens 3.3 e 3.4, onde demonstra que a entidade foi adequada, mas se na época seria a mais adequada é difícil mencionar tendo em vista que nenhuma entidade no município já efetuado o referido serviço, até porque se instituiu o programa "Casa Lar" e, portanto era novo. Quanto aos custos entendemos que também foram os menores, pois temos que analisarmos os seguintes pontos: Gastos com Veículo, o município dificilmente poderia deixar um veículo a disposição do abrigo (podemos falar em dia e noite), o que levaria a aquisição de um veículo, bem como de um motorista o que já elevaria o custo, sendo que ainda haveria grande possibilidade horas extras; quanto a contratação da equipe que trabalhou na casa, seria outro pessoal que o município deveria contratar, de acordo com seu Plano de Cargos e Salários (valor acima dos contratados), muito provavelmente por concurso, sendo que se trata de um programa, que pode ser provisório, caso encerrasse o programa, de que forma ficaria estes contratados.

Segundo a reanálise procedida pela DMU, a qual é acatada por esta Relatora, todo o processo de implantação do programa de abrigo para crianças e adolescentes na cidade de Gaspar foi acompanhado pelo Ministério Público e durante seu funcionamento, participaram além do MP, o Poder Judiciário, a Procuradoria do Município, representantes dos Conselhos Municipais da Infância e Adolescência dos Municípios envolvidos, professoras e pelo coordenador de programas sociais.

Acrescenta ainda a Diretoria Técnica que a existência de atas de reuniões entre as partes anteriormente elencadas, prévias à celebração dos convênios, além do estudo para a implantação do programa abrigo “semente do amanhã” tornam controverso o descumprimento dos Princípios da Motivação, Isonomia e Impessoalidade.

 

7. Ausência de fiscalização e controle pelos poderes públicos municipais envolvidos na operação, sobre a execução dos convênios firmados com a Conferência Vicentina, deixando a municipalidade de exercer as atribuições a ela delegadas nos citados convênios em suas Cláusulas Terceira, inciso II, e no artigo 116 c/c 54, caput, da Lei Federal n. 8.666/93;

De acordo com a instrução, as administrações municipais envolvidas omitiram-se na fiscalização e controle sobre a execução/operação do convênio de execução do programa de abrigamento, contrariando a Cláusula Terceira, inciso II, dos convênios, o que impediu ao longo do tempo a visualização dos problemas e irregularidades posteriormente verificados e a sua conseqüente e necessária adequação.

A DMU, ao proceder a reanálise dos autos, consignou que as atas de cinco reuniões realizadas entre os exercícios de 2002 e 2004 (fls. 352, 356 a 358, 484 a 487, 488 a 490 e 536 a 542) demonstram a preocupação dos órgãos públicos em exercer as atribuições previstas nos convênios.

Além disso, consignou a Diretoria Técnica, outros fatos e documentos também demonstram que a fiscalização era realizada, tais como: plano de trabalho, prestações de contas, preocupação com as prestações de contas, constante às fls. 244, avaliação do abrigo, entre outros.

De fato, verifico que as atas das reuniões comprovam que a execução dos convênios era supervisionada e fiscalizada pelo Poder Público, razão pela qual considero sanada a irregularidade apontada pela Instrução.

 

8. Irregularidades apontadas no processo de prestação de contas dos recursos recebidos pela Conferência Vicentina, desconsiderando o previsto nas Cláusulas Quarta, inciso V, dos diversos convênios firmados, no artigo 116, § 3º, da Lei Federal n. 8666/93 e nos artigos 44, caput, e incisos I, III, V, VII e IX. 47, 49, 50, 51 e 52, caput, e incisos I, II e III, da Resolução n. TC-16/94 de 21 de dezembro de 1994, e, finalmente, confrontando com o estabelecido no art. 70, caput e Parágrafo único, da Constituição Federal, tal como descrito no item 6 do Relatório nº 100/05.

Foi apontado pela Instrução, relativamente às prestações de contas apresentadas pela Conferência Vicentina, em suma, que:

- não foi apresentada declaração pelo responsável, aposta nos documentos comprobatórios das despesas, certificando que o material foi recebido ou que o serviço foi prestado, e que está conforme as especificações nele consignadas, contrariando o artigo 44, VII, da Resolução nº TC-16/94;

- o responsável pela aplicação de dinheiros públicos não justificou o seu bom e regular emprego, na conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades competentes, contrariando o artigo 49 da resolução nº TC-16/94;

- os prazos regulamentares para a apresentação das prestações de contas não foram cumpridos, em desatendimento ao artigo 52 da Resolução nº TC-16/94.

Da análise realizada pela DMU extrai-se que foi carimbada e assinada, nos documentos comprobatórios das despesas, declaração que certifica que os serviços e materiais constantes deste documento foram prestados e entregues, o que sana a primeira irregularidade.

Quanto ao apontamento inicial, corroborado pela DMU, de que o responsável pela aplicação de dinheiros públicos não justificou o seu bom e regular emprego, na conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades competentes, verifico ser pertinente discordar do posicionamento adotado, tendo em vista que dita justificativa decorre, entre outros fatores, da adequada execução do objeto conveniado e da ausência de desvio na aplicação dos serviços públicos, não sendo necessária mera declaração formal do conveniado relativa ao emprego dos recursos que lhe foram repassados, tendo em vista que as contas foram prestadas.

 

 

VOTO

 

A Representação apresentada pelo representante do Ministério Público Estadual noticiava irregularidades constantes das prestações de contas apresentadas pela Conferência Vicentina, entidade que realizou convênio com as Prefeituras Municipais de Gaspar, Ilhota e Luiz para executar o Programa de Abrigamento – Casa Lar – nos exercícios de 2003 e 2004.

As irregularidades diziam respeito ao pagamento de despesas com manutenção e combustível para automóvel da Conferência Vicentina, aquisição de medicamentos, vestuário, e fundamentaram a manifestação pelo Ministério Público Estadual acerca da não renovação do convênio com referida entidade para o exercício de 2004.

Com relação a tais despesas, a de maior monta foi despendida com a manutenção e aquisição de combustível para automóvel da Conferência Vicentina, que era usado no transporte dos menores desabrigados. Conforme já assinalado na fundamentação desta proposta de voto, a despeito de tais despesas não constarem de forma objetiva do plano de trabalho proposto, considero que são regulares em função de estar previsto no objeto do convênio que os recursos repassados destinariam-se ao referido transporte.

A Inspeção realizada por este Tribunal apontou ainda, exorbitando a análise disciplinada pelo artigo 65 da LC nº 202/00, supostos problemas na escolha da entidade para a execução do convênio, ausência de plano de trabalho, ausência de fiscalização etc., que teriam favorecido á “má aplicação dos recursos”.

Da análise dos autos depreendo que o que ocorreu resultou da falta de estrutura e organização das Prefeituras envolvidas, que não prestaram correta orientação à conveniada acerca das peculiaridades técnicas que deveriam fazer parte das prestações de contas, e ainda que em momento algum foi suscitado o desvio ou a má aplicação dos recursos.

 

Isso posto e considerando-se:

 

a)  Que foi efetuada a audiência dos Responsáveis;

b)  Que houve manifestação à audiência, justificando as irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório de Inspeção nº 100/05;

c)  O conteúdo do Relatório DMU nº 1314/2008; e

d)  O Parecer nº 5361/2008 do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas;

 

Sugere-se ao Egrégio Plenário a seguinte proposta de Voto:

 

1. Acolher as justificativas apresentadas pelo Responsável e determinar o arquivamento dos autos.

2. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório DMU nº 1314/2008, ao Representante e aos Representados:

 – Sr. Sérgio Hammes, diretor-presidente da Conferência Vicentina de Gaspar à época da vigência dos convênios em discussão;

- Sr. Pedro Celso Zuchi, ex-Prefeito de Gaspar;

- Sra. Maria de Souza e Silva Mass, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Gaspar entre janeiro e 13 de outubro de 2003;

- Sra. Lídia Regina Dehmer Schramm, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Gaspar entre 14 de outubro de 2003 e 06 de janeiro de 2005;

- Sr. Roberto da Silva, Prefeito Municipal de Ilhota e Gestor do Fundo Municipal da Infância e da Adolescência;

- Sr. Paulo Drun, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Ilhota entre 01 de setembro de 2003 e 31 de dezembro de 2004; e

- Sr. Dialison Cleber Vitti, Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Ilhota entre 05 de outubro de 2002 e 31 de agosto de 2003.

 

 

Gabinete, em 27 de outubro de 2008.

 

 

Sabrina Nunes Iocken

Relatora