TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete do Auditor Gerson dos Santos Sicca

  PROCESSO N.

 

PCP 08/00161386

 

 

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UG/CLIENTE

 

Município de Calmon 

 

 

 

RESPONSÁVEL

 

Sr. João Batista de Geroni - Prefeito Municipal

 

 

 

ASSUNTO

 

Prestação de Contas do Prefeito referente ao exercício de 2007. 

 

Déficit orçamentário. Déficit financeiro. Insuficiência de caixa.

Déficit orçamentário não absorvido ou parcialmente absorvido por superávit financeiro preexistente configura restrição gravíssima, fator de rejeição das contas anuais prestadas pelo Prefeito.

O uso dos instrumentos de planejamento previstos na LRF contribui para minimizar a perspectiva de ocorrer déficit orçamentário. A frustração de receitas não pode ser alegada como justificativa se tais instrumentos sinalizavam, durante o exercício, para a limitação de empenho e movimentação financeira, conforme dispõe o art. 9º da LRF.

Majoração. Subsídios. Revisão. Reajuste. Vício de iniciativa.

A revisão geral anual, prevista no art. 37, X da CRFB, consiste na recomposição das perdas do poder aquisitivo decorrentes do processo inflacionário em determinado período. Já o reajuste decorre da majoração em percentual superior à recomposição de perda do poder aquisitivo decorrente de processo inflacionário em determinado período. A adoção da terminologia "revisão" ou "reajuste", por si só, não define a natureza da majoração.

O vício de iniciativa existente na lei de revisão ou reajuste das remunerações não prejudica a harmonia e o equilíbrio entre os Poderes, porque é suprimido com o crivo do Poder Legislativo na aprovação da Lei.

Abertura de Crédito Adicional

A transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, de que trata o art. 167, VI, da Constituição Federal, devem ocorrer mediante prévia autorização legislativa específica, sendo incabível previsão neste sentido na Lei Orçamentária Anual.

A abertura de crédito adicional especial também requer lei autorizativa específica.

FUNDEB.

O descumprimento isolado de algum dispositivo da Lei n. 11.494/2007 (Lei do FUNDEB), no caso do exame de prestação de contas, pode ser tolerado no exercício de 2007, tendo em vista serem muito recentes as obrigações impostas ao município pela Lei Federal.

Impropriedades contábeis. Confiabilidade das demonstrações contábeis. 

A existência de muitas impropriedades contábeis, com valores expressivos, relevância percentual e repercussão em vários demonstrativos contábeis pode comprometer a higidez das contas apresentadas e evidenciar a inadequação do Balanço Geral
Anual quanto à posição financeira, orçamentária e patrimonial. 

 

 

I - RELATÓRIO

 

 

Referem-se os autos à Prestação de Contas do Prefeito Municipal de Calmon, Sr. João Batista de Geroni, relativa ao exercício de 2007, em cumprimento ao disposto no art. 31, §§ 1.º e 2.º da Constituição Federal, art. 113, da Constituição Estadual, e arts. 50 a 59 da Lei Complementar n.º 202, de 15 de dezembro de 2000.

O Órgão Instrutivo desta Corte de Contas - Diretoria de Controle de Municípios, após emitir o Relatório n. 959/2008 e providenciar a oitiva do responsável, analisando suas justificativas e contra-razões para as restrições evidenciadas no Relatório de Instrução (fs. 327/344), concluiu pela manutenção das restrições descritas abaixo, conforme teor do Relatório de Reinstrução n. 3716/2008. 

I - A. RESTRIÇÕES DE ORDEM CONSTITUCIONAL:

I.A.1. Pagamento indevido dos subsídios de agentes políticos do Executivo Municipal - Prefeito e Vice-Prefeito, através de Lei de iniciativa do Poder Executivo, sem atender ao disposto nos artigos 29, V c/c 39, § 4º e 37, X, da Constituição Federal e artigo 111, VI da Constituição Estadual, repercutindo em pagamento a maior no montante de R$ 4.907,07 (R$ 3.774,69 - Prefeito e R$ 1.132,38, Vice-Prefeito) (item B.1.1, deste Relatório);

I.A.2. Despesas com remuneração dos profissionais do magistério no valor de R$ 662.276,46, representando 58,75% das transferências do FUNDEB (R$1.127.296,37), quando o percentual constitucional de 60% representaria gastos da ordem R$ 676.377,82, configurando, portanto, aplicação a MENOR de R$ 14.101,36 ou 1,25%, em descumprimento ao artigo 60, inciso XII, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (item A.5.1.2.1);

I.A.3. Abertura de créditos adicionais especiais, no montante de R$ 155.000,00, sem Lei autorizativa específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, inciso V, c/c artigo 165, § 8° da Constituição Federal/88 (item B.2.1);

I.A.4. Abertura de créditos adicionais suplementares, por conta de transposição, remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, no montante de R$ 172.777,75, sem prévia autorização legislativa específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, inciso V e VI da Constituição Federal/88 (item B.2.2);

I.A.5. Conta de Ativo Financeiro Disponível - Bancos Conta Movimento - apresentando saldo negativo de R$ 142.692,55, no Balanço Financeiro - Anexo 13, caracterizando fragilidade do Setor de Finanças e, principalmente, do Controle Interno, em desacordo com inciso II, do artigo 74, da Constituição Federal, com Princípios Gerais de Contabilidade e com artigo 4º, da Resolução nº TC 16/94 (item B.3.1).

I - B. RESTRIÇÕES DE ORDEM LEGAL:

I.B.1.  Déficit de execução orçamentária do Município ajustado (Consolidado) da ordem de R$ 596.807,17, representando 8,72% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 1,05 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 - LRF (item A.2.a);

I.B.2.  Déficit de execução orçamentária da Unidade Prefeitura (orçamento centralizado) da ordem de R$ 292.034,36, representando 4,27% da sua receita arrecadada no exercício em exame, o que equivale a 0,51 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei nº 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar nº 101/2000 - LRF (item A.2.b);

I.B.3. Déficit financeiro do Município ajustado (Consolidado) da ordem de R$ 2.088.547,53, resultantes do déficit financeiro remanescente do exercício anterior e do déficit orçamentário ocorrido no exercício em exame, correspondendo a 30,53% da Receita Arrecadada do Município no exercício em exame (R$ 6.841.941,62) e, tomando-se por base a arrecadação média mensal do exercício em questão, equivale a 3,66 arrecadações mensais, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei nº 4320/64 e artigo 1º da Lei Complementar nº 101/2000 - LRF (item A.4.2.2.1);

I.B.4. Despesas com pessoal do Município no valor de R$ 3.728.077,65, representando 56,57% da Receita Corrente (R$ 6.589.697,33), quando o percentual constitucional máximo de 50% representaria gastos da ordem de R$ 3.294.848,67, configurando, portanto, aplicação a MAIOR de R$ 433.288,99 ou 6,57%, em descumprimento ao artigo 116, da Lei Orgânica do Município de Calmon (item A.5.3.1.a.1);

I.B.5. Despesas com manutenção e desenvolvimento da educação básica no valor de R$ 894.854,17, representando 79,38% dos recursos oriundos da receita do FUNDEB (R$ 1.127.296,37), quando o percentual legal de 95% representaria gastos da ordem de R$ 1.070.931,55, configurando, portanto, aplicação a MENOR de R$ 176.077,38 ou 15,62%, em descumprimento ao artigo 21, da Lei n° 11.494/2007 (item A.5.1.3.1);

I.B.6. Despesas com pessoal do Poder Executivo no valor de R$ 3.656.875,99, representando 55,49% da Receita Corrente Líquida (R$ 6.589.697,33), quando o percentual legal máximo de 54% representaria gastos da ordem de R$ 3.558.436,56, configurando, portanto, aplicação a MAIOR de R$ 98.439,43 ou 1,49%, em descumprimento ao artigo 20, III, "b", da Lei Complementar n° 101/2000, ressalvado o disposto no artigo 23 da citada Lei (item A.5.3.2.1);

I.B.7. Realização de despesas, inclusive relativas a pessoal e encargos, no montante de R$ 375.149,65, liquidadas e não empenhadas no exercício de 2007, em desacordo com o artigo 60 da Lei n° 4.320/64 (item B.5.1);

I.B.8. Meta Fiscal de Resultado Primário prevista na LDO nº 454, de 24 de novembro de 2006, em conformidade com a L.C. nº 101/2000, art. 4º, § 1º e art. 9º, não realizada no exercício de 2007 (item A.6.1.2.1);

I.B.9. Divergência no valor de R$ 9.614,50, entre o saldo patrimonial demonstrado no Balanço Patrimonial (R$ 430.450,96) e o apurado nas Variações Patrimoniais (R$ 420.836,46), em descumprimento ao artigo 85, da Lei n° 4.320/64 (item B.4.1);

I.B.10. Balanço Geral do Município (Consolidado), não demonstrando adequadamente a situação financeira, orçamentária e patrimonial do exercício, em virtude do apontado nos itens B.4.1, B.5.1 e B.5.2, deste Relatório, em desacordo ao estabelecido nos artigos 101 a 105 da Lei n° 4.320/64 e no artigo 53 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000 - Lei Orgânica do TCE/SC (item B.5.3.1);

I.B.11. Ausência da remessa do Parecer do Conselho do Fundeb, em desacordo com o artigo 27, caput e § único, da Lei n° 11.494/07 (item B.6.1).

I - C. RESTRIÇÕES DE ORDEM REGULAMENTAR:

I.C.1. Atraso de 28 dias na remessa do Balanço Consolidado do Município de Calmon, em descumprimento ao artigo 20, da Resolução TC n° 16/94 (item B.6.2);

I.C.2. Ausência de remessa dos Relatórios de Controle Interno referentes aos 1°, 2°, 3°, 4°, 5° e 6° bimestres de 2007, em descumprimento ao art. 5º, § 3º da Resolução nº TC - 16/94, alterada pela Resolução nº TC - 11/2004 (item A.7.1)..

 

 

A DMU, em sua análise, conclui também possa o Tribunal de Contas recomendar ao Chefe do Poder Executivo a adoção de providências com vistas à correção das deficiências de natureza contábil constantes dos itens B.3.1, B.4.1, B.5.1 e B.5.2 do corpo do relatório e à Câmara de Vereadores, anotação e verificação de acatamento, pelo Poder Executivo, das demais observações constantes do Relatório de análise das contas de 2007. 

O Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas, nos termos do Parecer n. 6070/2008 (fs. 419/434), manifesta-se pela REJEIÇÃO das contas, concluindo que o Balanço Geral do Município de Calmon representa da forma inadequada a posição financeira, orçamentária e patrimonial do Ente, dentre outras razões, em função de que:

...

b) Não aplicou, pelo menos, 60% dos recursos recebidos do FUNDEB para remuneração dos profissionais do magistério, conforme exige o art. 22 da Lei n. 11.494/2007;

c) Não aplicou, pelo menos, 95% dos recursos recebidos do FUNDEB em despesas com manutenção e desenvolvimento do Ensino da Educação Básica, conforme exige o artigo 21 da Lei n. 11.494/2007;

...

e) Os gastos com pessoal do Poder Executivo no exercício em exame ficaram acima do limite máximo de 54% da Receita Corrente Líquida, descumprindo o exigido pelo artigo 20, III da Lei de Responsabilidade Fiscal;

f) O resultado da execução orçamentária do exercício em exame não foi satisfatório, pois apresentou um déficit da ordem de R$ 596.807,17, cerca de 8,72% da receita arrecadada no exercício em tela, em descumprimento ao princípio do equilíbrio financeiro, conforme exige o artigo 48, “b” da Lei n. 4.320/64 e artigo 1°, § 1° da LRF; e

g) O resultado financeiro do exercício foi péssimo, na medida em que apresentou um preocupante déficit da ordem de R$ 2.088.547,53, representando 30,53% da receita arrecadada no exercício, descumprindo, portanto, ao princípio do equilíbrio de caixa exigido pelo artigo 48, “b” da Lei n. 4.320/64 e artigo 1°, § 1° da Lei de Responsabilidade Fiscal. (Parecer n. 6070/2008, fs. 423/424).

 

Entende também que há irregularidade no reajuste concedido aos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo (Prefeito e Vice-Prefeito), pois em se caracterizando como reajuste, como é o seu entendimento, restou comprovado o desrespeito à Constituição Federal, em razão da existência de vício de iniciativa (a Lei Municipal n. 469/2007 foi proposta pelo Chefe do Poder Executivo).

Refere-se também às ausências de remessa dos relatórios de controle interno, sem, entretanto, apor sugestão para formar autos apartados ou recomendação em relação à restrição.

Sugere, por outro lado, que este Tribunal determine à Prefeitura Municipal de Calmon a aplicação do valor remanescente do FUNDEB de 2007 no primeiro trimestre de 2008 (R$ 176.077,38), conforme preceitua a Lei Federal n. 11.494/2007.

Este é o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Diante da permanência das diversas restrições apontadas pela equipe técnica, algumas graves e gravíssimas e, considerando também a manifestação do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, que em síntese, pede pela Rejeição das Contas do Município de Calmon, no exercício de 2007, organizei esta fundamentação por tópicos, em alinhamento às restrições extraídas do Relatório de Contas Anuais, de forma a subsidiar na profundidade necessária a minha proposta de voto.


a) Quanto ao pagamento indevido dos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo (item I.A.1 da conclusão do Relatório da DMU)

A Diretoria Técnica apontou a irregularidade na majoração dos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo em razão de que a Lei n. 469/2007, de iniciativa do Poder Executivo, além de conceder reposição das perdas inflacionárias com base no IGP-M da FGV (4,64%), também promoveu reajuste salarial de 7,48%.

De acordo com a equipe de fiscalização, o aumento concedido aos servidores públicos, na esteira da Lei que também promoveu a revisão das remunerações, não poderia ser aplicado ao Prefeito e Vice-Prefeito porque a referida Lei (Lei Municipal n. 469/2007) teve iniciativa no próprio Poder Executivo, motivo pelo qual estaria inquinada de vício de iniciativa.

Sobre este aspecto (vício de iniciativa) tenho acompanhado o entendimento de que a sua ocorrência, no caso de reajustes aos agentes políticos do Poder Executivo, não prejudica a harmonia e o equilíbrio entre os Poderes, já que eventuais conseqüências daí decorrentes são amenizadas em razão do crivo do Poder Legislativo na aprovação da Lei.

Esta linha interpretativa foi construída pelo Auditor Substituto de Conselheiro Cleber Muniz Gavi, originalmente apresentada como fundamentação da proposta de voto do Parecer Prévio n. 107/2007, Processo PCP 07/00027114, referente à prestação de Contas do Prefeito de Arabutã, no exercício de 2006, cujo teor transcrevo abaixo: 

Não se nega que são inúmeras as decisões do Supremo Tribunal Federal considerando inconstitucional diplomas normativos inquinados por vício de iniciativa. Mas é importante salientar que se tratam de hipóteses bem particularizadas; com uma característica que, embora sutil, é importantíssima para distinção da situação sob análise. Com efeito, a jurisprudência da Suprema Corte invariavelmente se reporta a casos em que uma lei cuja iniciativa pertença ao Executivo tem sua gênese no próprio Legislativo (o contrário, portanto, do que se está analisando).

Em que pese a intensa pesquisa realizada, não se constatou a existência de um julgado sequer na qual haja sido uma lei declarada inconstitucional por um vício de iniciativa do Poder Executivo. Todas as decisões, reitere-se, aludem a vícios de iniciativa do Poder Legislativo.

Tal particularidade muito embora ainda não tenha sido explicitada pela doutrina ou jurisprudência provavelmente decorre do fato de que, mesmo nos casos em que o Poder Executivo de forma aparentemente ilegítima encaminha uma determinada proposição normativa, permanecerá o Poder Legislativo com o total controle do processo de formação da lei, podendo simplesmente arquivar o projeto ou dar-lhe seguimento na forma que julgar conveniente quando a iniciativa originariamente lhe pertença.

O mesmo, observe-se, não ocorre na situação inversa, pois se o Poder Legislativo usurpa da competência de iniciativa de lei, surge o risco de o Poder Executivo permanecer totalmente alheio ao processo de formação da norma cuja prerrogativa de proposição lhe foi exclusivamente conferida pelo texto constitucional (lembre-se da possibilidade de o Poder Legislativo derrubar o veto do Poder Executivo).

Assim, antes de se proceder a uma leitura apressada dos precedentes do STF, irradiando seus efeitos sobre situações que somente na aparência são análogas, é curial, capturar o fundamento constitucional e político subjacente a tais decisões, qual seja, a observância da harmonia e do equilíbrio entre os poderes, substancialmente prejudicado na primeira hipótese (vício de iniciativa do Poder Legislativo), mas não na outra (vício de iniciativa do Poder Executivo).

Tais razões, obviamente, não são apresentadas com o fito de solucionar definitivamente a questão, sendo inequívoca a possibilidade de surgimento de outras posições aptas, inclusive, a contrariarem o aqui exposto. Pretende-se, tão-só, demonstrar as dificuldades ainda pendentes sobre à matéria, que retiram a segurança necessária para eventual condenação quanto ao primeiro fato investigado (aumento do subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo Municipal).

Por outro lado, também deve ser considerado que, diante das dúvidas suscitadas, a inexistência de indícios de má-fé por parte dos agentes políticos beneficiados com tais acréscimos financeiros faz presumir que eventual apuração formalizada por esta Corte muito provavelmente redundará, ao final, na conclusão de que não é cabível eventual condenação destinada a restituição dos valores auferidos.

Cabe lembrar que o Poder Judiciário tem sido adverso a condenações de ressarcimento de verbas de natureza alimentar quando configurada a boa-fé do beneficiário, devendo o Tribunal de Contas avaliar, sob todas as perceptivas, a razoabilidade de sua atuação e o grau de efetividade de suas futuras decisões. Não se pretende afirmar que tal fundamento deve ser aplicado para todo e qualquer caso, pois ele apenas ganha importância na situação analisada porque conjugado com o outro fator citado acima (existe notória e fundamentada controvérsia sobre a matéria no âmbito deste Tribunal). Por conseguinte, será rechaçada por este relator qualquer tentativa de utilização da presente manifestação em circunstâncias distintas.

Diante dessas considerações, manifesto minha posição pelo afastamento da necessidade de criação de procedimento específico para apurar a regularidade afeta a concessão de reajuste aos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo de Arabutã.

(Gavi, C.M.. Proposta de Voto do Processo PCP 07/00027114, 2007)

 

Diante do exposto, entendo que a restrição possa ser superada pela aposição de recomendação, para que o Município, ao pretender reajustar as remunerações dos agentes políticos do Poder Executivo, faça através de lei de iniciativa do Poder Legislativo. 

b) Quanto aos déficits orçamentário e financeiro e o não alcance de metas fiscais

A ocorrência de déficit orçamentário quando não absorvido por superávit financeiro do exercício anterior é considerada por este Tribunal de Contas como restrição gravíssima e fator de rejeição das contas, conforme dispõe a Portaria n. 233/2003, art. 3°, item VI, cujo objetivo é estabelecer critérios para as deliberações do Pleno quanto às contas dos municípios catarinenses.

O teor da restrição apontada pelo Órgão Instrutivo é o seguinte:

I.B.1 - Déficit de execução orçamentária do Município ajustado (Consolidado) da ordem de R$ 596.807,17, representando 8,72% da receita arrecadada do Município no exercício em exame, o que equivale a 1,05 arrecadação mensal - média mensal do exercício, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei n. 4.320/64 e artigo 1º, § 1º, da Lei Complementar n. 101/2000 - LRF (item A.2.a, deste Relatório);

A gravidade desta restrição está no fato do déficit orçamentário estar conjugado com o déficit financeiro.

O município já acusava no início do exercício de 2007 um déficit financeiro de R$ 1.019.844,44 (f. 20), situação que indicava fragilidade na capacidade de pagamento das obrigações municipais e, portanto, a necessidade de cumprir à risca o equilíbrio orçamentário. Contudo, conforme apurou a equipe de instrução, o Município gastou mais do que arrecadou no exercício (R$ 596.807,17), piorando a situação financeira que já se apresentava deficitária. 

Ao final do exercício financeiro de 2007 o déficit financeiro consolidado alcançou a cifra de R$ 2.088.547,53, valor que representa 30,53% da receita arrecadada pelo Município ou, na média, 3,66 arrecadações mensais, conforme registra a restrição I.B.3 da conclusão do Relatório, abaixo transcrita:

I.B.3. Déficit financeiro do Município ajustado (Consolidado) da ordem de R$ 2.088.547,53, resultantes do déficit financeiro remanescente do exercício anterior e do déficit orçamentário ocorrido no exercício em exame, correspondendo a 30,53% da Receita Arrecadada do Município no exercício em exame (R$ 6.841.941,62) e, tomando-se por base a arrecadação média mensal do exercício em questão, equivale a 3,66 arrecadações mensais, em desacordo ao artigo 48, "b" da Lei nº 4320/64 e artigo 1º da Lei Complementar nº 101/2000 - LRF (item A.4.2.2.1);

No mesmo diapasão da manifestação do Ministério Público, ressalto a inconveniência de tão significativa fragilidade financeira do Município de Calmon. Confrontando-se o valor do Ativo Financeiro ao Passivo Financeiro, tem-se que para cada R$ 1,00 de dívida de curto prazo o ente dispõe de apenas R$ 0,13 (treze centavos) de disponibilidades, incluindo os recursos vinculados. O indicador demonstra claramente a incapacidade de o Município cumprir suas obrigações financeiras de curto prazo.

No âmbito privado, empresas com tal realidade são avaliadas como insolventes, ou seja, apresentam claras perspectivas de falir.

Na área pública, apesar dessa perspectiva de falência inexistir, tem-se uma série de repercussões negativas que prejudicam bastante o andamento administrativo, como a dificuldade em contratar a preços módicos, dado o descrédito quanto ao cumprimento dos prazos de pagamento contratado, possível crise na gestão de recursos humanos, dada a perspectiva de atraso na folha de pagamento e mesmo das obrigações sociais e trabalhistas, entre outras repercussões bastante indesejadas que podem comprometer a eficiência e eficácia de toda a gestão.

Registre-se que a Unidade Centralizada - Prefeitura Municipal também contribuiu com a formação do déficit orçamentário em R$ 292.034,36 (vide restrição I.B.2 da conclusão do Relatório).

Os argumentos trazidos pelo responsável, para sanear ou amenizar o problema do déficit orçamentário apurado dão conta que houve frustração nas receitas orçamentárias face ao não ingresso das receitas de convênio previstas.

A Instrução rebateu as justificativas dizendo que não houve comprovação documental da frustração de receitas alegadas pelo responsável. Entretanto, analisando o Comparativo da Receita Orçada com a Arrecadada – demonstrativo do Anexo 10 da Lei n. 4.320/64 (fs. 199/202), comprova-se a veracidade da argumentação oferecida pelo responsável. A frustração ocorreu especialmente nas transferências de capital, eis que foram previstos R$ 1.053.000,00 e arrecadados apenas R$ 192.500,00.

Apesar de verdadeira a justificativa, não creio que possa amenizar ou ressalvar a ocorrência do déficit orçamentário não coberto por superávit financeiro. Como justificativa reporto-me aos instrumentos previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal para garantir o alcance de um dos seus principais objetivos: o equilíbrio fiscal.

Com o aumento de importância da Lei de Diretrizes Orçamentárias, onde são incluídas instruções para a formação da reserva de contingência e definidas as metas fiscais de arrecadação, despesa e de resultados; além de instruir objetivamente sobre os critérios para limitação de empenho e movimentação financeira, quando as referidas metas indicarem resultados que possam comprometer o equilíbrio fiscal (art. 9 da Lei Complementar n. 101/2000 – LRF), viu-se o administrador público diante da necessidade de profissionalizar sua gestão, adotando postura mais conservadora e prudente na administração dos recursos públicos.

Registre-se também que as metas bimestrais de arrecadação ficaram sempre aquém do planejado (vide item A.6.2 do corpo do Relatório), de maneira que ao final do exercício adveio um resultado primário bem abaixo do previsto. Tais registros obrigariam o gestor a restringir os gastos públicos a partir do momento em que a primeira meta bimestral de arrecadação não havia sido alcançada, a teor da instrução contida no art. 9° da LRF.

Verifica-se também que a previsão de reserva de contingência não cumpriria o propósito de atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevisíveis, conforme dispõe o art. 5°, III, ‘b’. O valor previsto no orçamento para 2007 (R$ 20.000,00) era de antemão insuficiente aos propósitos aos quais se destinava, representando apenas 0,30% da receita corrente líquida do exercício sob exame.

Por outro lado, estimativas das receitas orçamentárias devem sempre estar calcadas em metodologia objetiva, devendo-se salientar que dentre as perspectivas esperadas deve o administrador público optar pelo conservadorismo

Esses aspectos evidenciam o descuido da administração municipal quanto à necessidade de adoção de uma política fiscal restritiva, a fim de que fosse assegurado o equilíbrio orçamentário durante o exercício ou um desejável superávit orçamentário que pudesse contribuir com a minimização da fragilidade financeira herdada do exercício anterior.

Por todo exposto e, considerando o teor da Portaria 233/2003, que dentre os critérios objetivos para as deliberações do Pleno nas contas dos municípios catarinenses, classifica como gravíssima e fator de rejeição a ocorrência de déficit orçamentário, quando não absorvido por superávit financeiro (item VI do art. 3° da Portaria n. 233/2003), manifesto opinião similar a do Ministério Público de Contas, qual seja a de propugnar pela rejeição das Contas de 2007 do Município de Calmon.

c) Outras restrições evidenciadas no Corpo do Relatório

Além do desequilíbrio orçamentário e financeiro, as contas anuais de Calmon também apresentam outras restrições graves que, no seu conjunto depõem contra a adequação do Balanço Anual quanto à posição financeira, orçamentária e patrimonial do Município, assim como comprometem a observância dos princípios fundamentais de contabilidade aplicados à administração pública, conforme o art. 48 da Lei Complementar n. 202/2000 (Lei Orgânica deste Tribunal).

As referidas restrições são as seguintes:

Na área de educação, não foram cumpridos dois limites importantes: as despesas com a remuneração dos profissionais do magistério ficaram abaixo do limite mínimo de 60% dos recursos do FUNDEB (item I.A.2) e as despesas com manutenção e desenvolvimento da educação básica representaram 79,38% dos recursos oriundos do FUNDEB, quando a Lei Federal instrui para um limite mínimo de 95% (item I.B.5);

Foram abertos créditos adicionais suplementares e especiais sem lei autorizativa específica (itens I.A.3 e I.A.4) e despesas foram liquidadas sem prévio empenho (item I.B.7);

As despesas de pessoal do Município e do Poder Executivo apresentaram-se acima dos limites da Lei Orgânica do Município e LRF, respectivamente (itens I.B.4 e I.B.6).

Há impropriedades contábeis (itens I.A.5, I.B.7 e I.B.9 da conclusão e B.5.2 do corpo do relatório) que fizeram a Instrução concluir que o Balanço Geral do Município não demonstra adequadamente a situação financeira, orçamentária e patrimonial no exercício.

c.1) Limites referentes à educação

No caso do não cumprimento da aplicação mínima na remuneração dos profissionais do magistério tenho manifestado posição no sentido de ressalvar no parecer prévio a existência de tal irregularidade, alertando também ao Município de que sua ocorrência pode repercutir na rejeição das contas em exercícios futuros, dada a gravidade da restrição.

A Origem não concorda com os cálculos elaborados pela DMU, pois entende que ultrapassou o percentual de 60%. Todavia, não juntou aos autos demonstrativos que pudessem comprovar sua tese à equipe de auditores fiscais. 

O fundamento que justifica minha percepção de que a não aplicação do mínimo de 60% na remuneração dos profissionais do ensino básico é restrição de considerável gravidade é o fato de que a Constituição Federal claramente confere relevância destacada a esse aspecto da utilização dos recursos componentes do FUNDEB. Por via de conseqüência, não há justificativa para conferir tratamento distinto daquele conferido a outras restrições constitucionais, como não cumprimento dos limites mínimos previstos para educação e saúde.

Sob outro enfoque, quando se procura avaliar a efetividade da aplicação dos recursos públicos, construí argumento de que o não cumprimento desse limite mínimo prejudica sobremaneira o objetivo de melhorar a educação básica – objetivo primordial quando da criação do FUDEF, atualmente FUNDEB.

A efetividade no processo ensino-aprendizagem, principalmente no estrato da educação básica, está intrinsecamente relacionada ao profissionalismo e à competência do professor. Professores bem remunerados e bem capacitados apresentam maior potencialidade de retorno à sociedade, pois se dedicam a profissão e não formulam planos profissionais outros que não o exercício do magistério.

Quando as remunerações são baixas, perdem-se os melhores professores. Estes saem das escolas públicas deixando uma lacuna que normalmente demora a ser preenchida, face aos custos e ao tempo necessário para selecionar novo profissional e capacitá-lo ao trabalho. Pior, entretanto, é que perder um professor que decidiu por outro projeto, mas ainda se encontra no cargo. Ou seja, apenas de corpo presente, mas não de espírito. 

Grandes professores do ensino básico são referências para muitos cidadãos. Ajudaram a formar o caráter, contribuíram para tomada de importantes decisões pessoais como a escolha profissional, com repercussão também na sociedade. Assim enxergo a situação.

Outro aspecto que deve ser observado dá conta de que, dentre os diversos itens de custeio da manutenção do ensino básico, a remuneração do professor é quase sempre o item de maior relevância monetária, daí porque a aplicação do percentual mínimo de 60% dos recursos do FUNDEB, na remuneração dos profissionais do magistério, deve ser entendida como essencial no para o desenvolvimento do ensino básico.

A restrição contida no item I.B.5 da conclusão do relatório, entendo que isoladamente possa ser tolerada, a menos que o percentual fique muito aquém do estabelecido na Lei do FUNDEB (Lei n. 11.494/2007). No caso em tela, verifica-se que o valor aplicado (R$ 1.127.296,37) representa 79,38% do total de recursos recebidos do Fundo para manter e desenvolver a educação básica.

A Lei Federal admite que sejam aplicados 5% dos recursos ingressos no exercício seguinte ao que houve o ingresso. Para o Município de Calmon, faltaram ser aplicados R$ 176.077,38 (15,62% dos recursos recebidos do FUNDEB em 2007). Além da discussão pontual em relação ao valor não aplicado, o fato é que a restrição não está isolada. 

c.2) Abertura de créditos adicionais sem lei autorizativa e realização de despesas sem empenho prévio.

A equipe de auditores fiscais apontou três restrições que prejudicam a participação do Poder Legislativo nas decisões públicas, além do descumprimento constitucional ou legal apontado.

A duas primeiras são: 

I.A.3. Abertura de Créditos Adicionais Especiais, no montante de R$ 155.000,00, sem Lei Autorizativa Específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, inciso V, c/c artigo 165, § 8° da Constituição Federal/88 (item B.2.1);

I.A.4. Abertura de Créditos Adicionais Suplementares, por conta de transposição, remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, no montante de R$ 172.777,75, sem prévia autorização legislativa específica, em desacordo com o disposto no artigo 167, inciso V e VI da Constituição Federal/88 (item B.2.2);

 

Apesar das restrições transcritas acima ainda não estarem classificadas dentre aquelas gravíssimas e fator de rejeição das contas, pela Portaria n. 233/2003, são graves porque reduzem o poder do legislador que tem dentre suas competências autorizar a realização da despesa pública por meio do orçamento.  

O Chefe do Poder Executivo, ao promover alterações orçamentárias por ato próprio estabelece suas prioridades na aplicação dos recursos públicos em detrimento do exercício legislativo.

Registre-se que autorizações genéricas na lei orçamentária anual, que permitem a transposições, remanejamentos ou transferências de recursos de uma programação para outra ou de um órgão para outro são consideradas irregulares por esta Corte de Contas, conforme posição cristalizada no Prejulgado n. 1312.

A restrição abaixo transcrita também fragiliza a participação legislativa porque além de constituir-se flagrante desrespeito a norma legal, também evidencia a realização de despesa pública sem a autorização legislativa. Aponta a Instrução:

I.B.7. Realização de despesas, inclusive relativas a pessoal e encargos, no montante de R$ 375.149,65, liquidadas e não empenhadas no exercício de 2007, em desacordo com o artigo 60 da Lei n° 4.320/64 (item B.5.1);

O responsável não refutou a restrição, apenas explicou o motivo da realização das despesas sem que tivessem sido empenhadas. Diz que se destinaram a manutenção de atividades essenciais na área de saúde.

c.3) As despesas de pessoal do Município e do Poder Executivo apresentaram-se acima dos limites (itens I.B.4 e I.B.6)

O Município não cumpriu com os limites de pessoal definidos em sua Lei Orgânica e na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

A Instrução apurou que o gasto com pessoal do Poder Executivo representa 55,49% da receita corrente líquida, enquanto que o limite legal é de 54% (art. 20, III, ‘b’ da Lei Complementar n. 101/2000). O valor gasto além do permitido foi de R$ 98.439,43 e, conforme dispõe o parágrafo único do art. 22 da mesma lei, sujeita-se o Poder Executivo às regras que impedem o aumento da despesa de pessoal até que seja restabelecido o limite legal.

No caso do limite de pessoal do Município, a transgressão foi da Lei Orgânica do Município que, em seu art. 116, definiu como limite máximo de gastos com pessoal 50% da receita corrente líquida e não 60% como define a LRF.

De acordo com a equipe de fiscalização, o total de gastos com pessoal do Município (56,57%) ultrapassou em R$ 433.228,99 o limite estabelecido na Lei Orgânica do Município. O valor possui expressividade e a restrição também contribui para a formação do meu juízo sobre contas ora objeto de análise.

Novamente, o responsável argumentou que os gastos foram necessários para manter o alto custo decorrente de atividades essenciais do Município, principalmente com a contratação de pessoal na área de saúde. 

Comparando com o percentual gasto em 2006 (48,92%), verifica-se que o comprometimento da receita corrente líquida (RCL) aumentou 6,57 p.p. (de 48,92% para 55,49%). Entretanto, verificando-se a variação nominal do montante de gastos com pessoal percebe-se que o aumento foi significativo (24,99%[1]) e, portanto, concluo ter havido negligência do gestor responsável e de sua equipe de controle interno quanto ao acompanhamento do limite de gastos com pessoal. 

c.4) Impropriedades contábeis

Impropriedades contábeis também não estão dentre aquelas consideradas gravíssimas pela Portaria n. 233/2003 deste Tribunal de Contas, e entendidas como fator de rejeição das contas do município. Entretanto, quando alcançam relevância monetária, podem comprometer a confiabilidade das informações contábeis e a adequação do Balanço Geral Anual, quanto à posição financeira, orçamentária e patrimonial do ente, inclusive prejudicando o processo de apuração dos limites legais e constitucionais, o alcance das metas de resultado, enfim, comprometer todo o resultado da análise técnica e, por conseqüência, o próprio Parecer Prévio. 

A equipe de auditores fiscais, ao identificar três restrições de origem contábil (itens I.A.5 e I.B.9 da conclusão e B.5.2 do corpo do relatório), concluiu que o Balanço Geral do Município não demonstra adequadamente a situação financeira, orçamentária e patrimonial no exercício, registrando sua convicção no item I.B.10 da conclusão do Relatório, abaixo transcrito:

I.B.10. Balanço Geral do Município (Consolidado), não demonstrando adequadamente a situação financeira, orçamentária e patrimonial do exercício, em virtude do apontado nos itens B.4.1, B.5.1 e B.5.2, deste Relatório, em desacordo ao estabelecido nos artigos 101 a 105 da Lei n° 4.320/64 e no artigo 53 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000 - Lei Orgânica do TCE/SC (item B.5.3.1);

O responsável apresentou defesa em cada uma das irregularidades, procurando explicar os motivos das divergências subjacentes à restrição I.B.10. Pontualmente, para esta divergência, não produziu argumentos para defesa, pois se as restrições motivadoras fossem saneadas, também esta seria.

A Instrução manteve todas as restrições, ora pela ausência de documentos comprobatórios, ora pela ausência de providências para adequação dos demonstrativos, ou também porque algumas alegações apenas confirmaram a existência de erro de contabilização. 

Acrescento como motivo para a inadequação do Balanço Anual de 2007 do Município de Calmon a restrição contida no item I.A.5 da conclusão do Relatório. Sem dúvida, é irregularidade que compromete o conjunto das demonstrações contábeis, por evidenciar uma conta de Ativo Financeiro Disponível com saldo negativo. Além de afrontar Princípio Contábil aplicado à Contabilidade Pública, pois a natureza da conta é devedora e não credora, evidencia deficiência no Setor Financeiro e fragilidade na atuação do órgão de controle interno, o qual deve zelar também pela adequação do Balanço Geral do Município.

Ressalte-se também que há restrição quanto ao item I.A.5. 

Diante de todo exposto e considerando em resumo:

Que o processo obedeceu ao trâmite regimental, sendo instruído por equipe técnica da DMU e contendo manifestação por escrito do Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas (art. 108, II da LOTC);  

Que foi prevista reserva de contingência no valor de R$ 20.000,00, correspondente a 0,30% da receita corrente líquida do exercício de 2007, valor que considero insuficiente para atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevisíveis;  

Que não foram cumpridos os limites de gastos com pessoal do Município e do Poder Executivo, conforme registram as restrições I.B.4 e I.B.6 da conclusão do relatório;

Que não foi respeitado o princípio do equilíbrio das contas públicas, em consonância às instruções da Lei n. 4.320/64 e Lei de Responsabilidade Fiscal, sendo deficitários o resultado da execução orçamentária e o resultado financeiro apresentado no exercício (restrições I.B.1 e I.B.3 da conclusão do relatório); 

Que a situação financeira evidenciada no Balanço Patrimonial Consolidado do Município de Calmon, em demonstração referente ao dia 31/12/2007 é extremamente inconveniente e comprometedora do seu futuro, por apresentar-se deficitária em R$ 2.088.547,53, correspondente a 30,53% da receita municipal ou, na média, 3,66 arrecadações e indicar incapacidade do Município de Calmon cumprir suas obrigações financeiras de curto prazo, porque possui apenas treze centavos para cada real de dívida de curto prazo;

Que apesar do Município ter aplicado o equivalente a 33,96% da Receita decorrente de Impostos em Educação, cumprindo o disposto no art. 212 da Carta Magna, não cumpriu o limite mínimo de 60% dos recursos do FUNDEB na remuneração dos profissionais do magistério, assim como aplicou 79,38% dos recursos do FUNDEB no ensino básico, quando o determinado pela Lei Federal é 95%. 

Que há impropriedades contábeis, não saneadas, que comprometem a adequação do Balanço Geral do Município quanto a situação financeira, orçamentária e patrimonial no exercício.

Considerando esses fatos e mais o que dos autos consta, PROPONHO:

III – PROPOSTA DE VOTO

1. Recomendar à Egrégia Câmara Municipal a Rejeição das contas do Prefeito Municipal de Calmon, relativas ao exercício de 2007, em face das restrições apontadas no Relatório DMU n. 3.716/2008, em especial a ocorrência de déficit orçamentário, equivalente à 8,72% da receita arrecadada do Município no exercício, em desacordo aos arts. 48, alínea "b", da Lei Federal n. 4.320/64 e 1º, § 1º, da Lei Complementar n. 101/2000;

2. Recomendar ao Chefe do Poder Executivo de Calmon que, com o envolvimento e responsabilização do órgão de controle interno, tome providências para:

2.1. Promover esforço fiscal a fim de obter superávit orçamentário, até que seja restabelecido o equilíbrio financeiro do Município;

2.2. Adequar as alterações orçamentárias de modo que as transposições, remanejamentos ou transferências de recursos sejam realizadas em conformidade ao Prejulgado n. 1312.

2.3. Revisar a metodologia de cálculo para estimativa do valor consignado no orçamento a título de Reserva de Contingência, considerado insuficiente para atender passivos contingentes e outros riscos e eventos fiscais imprevisíveis;

2.4. Assegurar o cumprimento integral das obrigações impostas ao Município por conta da Lei Federal n. 11.494/2007 (Lei de criação do FUNDEB), evitando a ocorrência das restrições I.A.2 e I.B.5 da conclusão do Relatório; 

2.5. Eliminar o percentual excedente dos gastos de pessoal do Poder Executivo, até que seja respeitado o limite legal de 54% da receita corrente líquida do Município, nos termos do art. 23 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/2000) e promover a adequação ao limite estabelecido na Lei Orgânica do Município de Calmon;

2.6. Prevenir e corrigir as deficiências de natureza contábil evidenciadas nos itens I.A.5, I.B.9, I.B.10 da conclusão do Relatório;

2.7. Assegurar a observância dos prazos regulamentares para remessa dos relatórios de controle interno e do próprio Balanço Consolidado do Município a este Tribunal de Contas, evitando restrições como a indicada no item I.C.1 e I.C.2 da conclusão do Relatório da DMU; e

2.8. Constituir procedimento adequado quando de nova revisão geral de que trata o art. 37, X, da Constituição Federal, definindo o índice de inflação a ser adotado, a data-base escolhida, o período de apuração e, quando se tratar de reajuste aos subsídios do Prefeito, Vice-Prefeito e Secretários municipais, que seja através de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, nos termos do art. 29, V, da Constituição Federal (ítem I.A.1 da conclusão do Relatório da DMU); 

3. Recomendar à Câmara de Vereadores anotação e verificação de acatamento, pelo Poder Executivo, das recomendações descritas nesta deliberação, assim como as demais observações constantes do Relatório DMU n. 3.716/2008.

 

 

Florianópolis, em 04 de dezembro de 2008.

 

 

 

 

 

Gerson dos Santos Sicca

Auditor Relator

 

 



[1] Despesas de pessoal do Poder Executivo para efeito de cálculo em 2006 = R$ 2.925.685,21; Em 2007 = R$ 3.656.875,99. Fontes: Relatório n. 2965/2007 – relatório de contas anuais de Calmon, ref. 2006; Relatório n. 3716/2008 – relatório de contas anuais de Calmon, ref. 2007.