Gabinete
Conselheiro Julio Garcia
PROCESSO: REV
09/00568178
UNIDADE: Prefeitura Municipal de Brusque
INTERESSADO: Ciro Marcial Roza
ASSUNTO: Pedido de Revisão em face do acórdão nº 1.106/2008, proferido nos autos
do Processo TCE 03/01097607.
VOTO nº GC-JG/2010/0047
I - RELATÓRIO
Trata
o processo de Pedido de Revisão proposto pelo Senhor Ciro Marcial Roza,
alicerçado no artigo 83 da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas cumulado com o
artigo 143 de seu Regimento Interno,
em face do Acórdão nº 1.106/2008 que julgou irregular, com imputação de débito,
as contas referentes à tomada de contas especial no processo TCE 03/01097607.
As
razões da Revisão constam das fls. 02 a 10, sendo acompanhadas dos documentos
de fls. 11 a 324.
Seguindo
o trâmite normal, os autos foram submetidos ao exame da Consultoria Geral que
expediu o Parecer nº 660/09 (fls. 325-329), propondo a admissibilidade da
Revisão e, quanto ao mérito, o seu desprovimento porque o pedido não se
enquadraria nas hipóteses elencadas no artigo 83 da Lei Complementar nº
202/2000.
O
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, por sua vez, no Parecer de nº 6252/2009
(fls. 330-337), manifestou-se pelo provimento da Revisão para cancelar o débito
imputado ao responsável.
Vieram
os autos conclusos.
É
o relatório.
II - DISCUSSÃO
Trata-se
de pedido de revisão de acórdão que imputou débito ao recorrente no valor de R$
383.604,41 (trezentos e oitenta e três mil, seiscentos e quatro reais e
quarenta e um centavos), em face do cancelamento ex officio de créditos
tributários inscritos em dívida ativa municipal, sem autorização em lei
específica da época da concessão da remissão, e ainda em razão da ausência de
procedimentos administrativos e judiciais para sua cobrança, conforme consta
registrado na contabilidade no Demonstrativo das Variações Patrimoniais - Anexo
15 da Lei (federal) n. 4.320/64, em desacordo com o art. 39, caput e §§ 1º, 2º
e 4º, c/c o art. 83 da Lei (federal) n. 4.320/64; caracterizando, ainda,
renúncia de receita, nos termos do art. 14 da Lei Complementar (federal) n.
101/00, e afronta ao princípio da legalidade, previsto no caput do art. 37 da
Constituição Federal.
Alegou
o requerente 1) que os atos
administrativos que fundamentaram o cancelamento dos créditos tributários,
adjetivados de ilegais, foram praticados pelo Prefeito Hilário Zen através do
Decreto nº 3835/97; 2) que em
cumprimento ao referido decreto foi publicado no Diário Oficial do Município
(de 17/07/1998), a relação das empresas baixadas do cadastro econômico de
contribuintes; 3) que não há nenhum
ato praticado pelo autor, na condição de prefeito municipal, que tenha de
qualquer modo contribuído para extinção do crédito tributário por remissão,
fundado no malfadado decreto; 4) que
tão logo tomou conhecimento da suposta irregularidade administrativa,
decorrente da ciência da tomada de contas especial, encaminhou projeto de lei,
posteriormente sancionado, regularizando a situação, considerando incobráveis
os créditos nele relacionados; 5) que
o único ato praticado pelo autor foi sancionar a lei declaratória passada pelo
crivo do parlamento municipal; 6)
que a única conduta passível de ser a ele atribuída, no exercício de 2001,
cinge-se à ausência de procedimentos administrativos e judiciais para a
cobrança da dívida ativa; 7) que
seria ilegal condená-lo à indenização aos cofres públicos de créditos cuja
cobrança deixou de se concretizar, seja porque impossível a adoção de
procedimentos administrativos e judiciais, diante dos efeitos dos atos administrativos
anteriormente editados, bem como por inexistir ação ou omissão dolosa do autor
para fundamentar o ressarcimento determinado.
Pediu
que no caso de condenação lhe seja aplicada no máximo a multa prevista no
artigo 21 da Lei Complementar nº 202/2000, citando precedentes desta Corte que
assim procederam.
Para
fundamentar seu pedido, anotou o autor que os documentos que embasaram o
acórdão cuja revisão pleiteia eram insuficientes para amparar a condenação e
que foi desconsiderado pelo Tribunal de Contas outros documentos constantes dos
autos com eficácia sobre a prova produzida. Deste modo, pediu a concessão de
medida liminar para suspender os efeitos do acórdão combatido e a procedência
da revisão para o fim de anular a sua condenação.
Inicialmente,
verifico que o pedido é próprio, tempestivo, foi manejado por parte legítima e
fundamentado especialmente na possível desconsideração, pelo Tribunal, de
documentos constantes dos autos com eficácia sobre a prova produzida,
atendendo, assim, os requisitos do artigo 83 da Lei Orgânica do Tribunal de
Contas.
No
mérito, acompanho o Ministério Público Especial quando afirma que a
irresignação merece prosperar, sendo que os documentos constantes dos autos merecedores de nova
ponderação são os seguintes: cópia do Decreto Municipal nº 3835/97 (fls. 129), cópia
do Decreto Municipal nº 3138/95 (fls. 130/169), cópia do Boletim Oficial do
Município, de 17-04-98 (fls. 170/217) e cópia da Lei Municipal nº 2783/2004
(fls. 222/242).
Segundo o parquet, por meio do Decreto Municipal nº 3835, de 30-05-97, foi alterado o Decreto nº 3138/95, regulamentador do Código Tributário Municipal, acrescentando-se dispositivos prevendo o recadastramento de contribuintes, bem como a baixa ex officio daqueles que não atendessem a convocação, dentro do prazo legal. Já no Boletim Oficial do Município, de 17-04-98, consta a relação das empresas baixadas ex officio do cadastro de contribuintes do Município, em conformidade com as disposições dos Decretos nºs 3835/07 e 3138/95, bem como do Edital de Convocação nº 001, de 05-09-97. Assim, infere-se que em gestão municipal anterior à do recorrente, foi efetuado um recadastramento de contribuintes, que culminou com a baixa ex officio de empresas, mais precisamente em 17-04-98, data de publicação da relação (fls. 175-217).
Conforme apontou o requerente, durante sua gestão, mais precisamente no ano de 2001, foi procedido o levantamento de valores, por exercício, para o devido ajuizamento de ações. No entanto, com a constatação da existência de empresas baixadas ex officio, houve o cancelamento dos valores correspondentes, para que não ocorresse o ajuizamento de ações referentes a contribuintes inexistentes, ou de créditos já atingidos pela prescrição. Nesse ponto, entendeu o Ministério Público Especial que, o ajuizamento de ações no exercício de 2001, para cobrança de dívida ativa referente a empresas baixadas no exercício de 1998, e cujos créditos tributários remontavam a exercícios anteriores a 1997, antes de propiciar resultados eficazes ao Município, poderia propiciar transtornos, como, por exemplo, a propositura de ações atingidas pela prescrição.
O pensamento de nossa Procuradoria de Contas é razoável e leva a idéia de que a responsabilidade pela ausência de cobrança da referida dívida ativa não pode ser atribuída de maneira exclusiva ao prefeito do ano de 2001. Ademais, concordo que a condenação do responsável no ressarcimento ao erário depende da existência de dolo ou, no mínimo, de culpa, elementos que não restaram cabalmente comprovados nos autos. No caso sob análise, não foi demonstrado que os valores devidos pelas empresas baixadas em 1998 deixaram de ingressar nos cofres públicos por responsabilidade do recorrente.
Por outro lado, consta-se que o débito atribuído ao responsável, no valor de R$ 383.604,41 na data do acórdão, foi obtido mediante estimativa, o que ofende, na visão deste relator, o princípio do devido processo legal e do contraditório e da ampla defesa, uma vez que a quantificação do dano, para fins de imputação de débito, deve ser precisa, não comportando indefinição quanto ao seu montante, ponderações, percentual médio, ou probabilidades.
Assim,
em consonância com a opinião da Procuradoria de Contas, não vislumbro como
possa ser imputado o valor de R$ 383.604,41, a título de débito, ao
responsável, motivo pelo qual entendo deva ser modificado o acórdão recorrido
para cancelar a referida imputação. Nesse sentido, existem inúmeras decisões
desse Tribunal, por meio das quais foram julgadas irregulares as contas, sem
imputação de débito, por irregularidades referentes à ausência de providências
para cobrança de dívida ativa, baixa de créditos tributários inscritos em
dívida ativa e renúncia de receita. Cito os acórdãos nº 565/2008, 49/2007,
2575/2006, 1085/2006, 2/2009, 2983/2004, 165/2001, 1980/2003, 317/2009 e 2261/2006.
A
única irregularidade que pode ser atribuída ao gestor de 2001 é o cancelamento
da dívida sem lei autorizativa à época do fato. No entanto, ainda que a conduta
atente contra o princípio da legalidade, não significa, necessariamente, um
correspondente dano ao erário. Para tal irregularidade, poder-se-ia até mesmo cogitar
a aplicação de multa prevista no art. 70, II, da Lei Complementar nº 202/2000,
todavia, como a sanção não foi aplicada na decisão guerreada, não cabe a sua
aplicação em sede de revisão.
Ao arremate, pondero que a Lei nº 2873/2004, ainda que editada em momento inadequado, veio convalidar a extinção dos créditos tributários referentes àquelas empresas baixadas em 1998.
III - VOTO
Ante o exposto, estando os autos instruídos na forma Regimental, propondo a este egrégio Plenário o seguinte voto:
1
- Conhecer do Pedido de Revisão proposto pelo senhor Ciro Marcial
Roza, nos termos do artigo 83 da Lei Complementar 202/2000, para, no mérito, dar-lhe parcial provimento, modificando
o item 6.1 do Acórdão 1106/2008 que passa a ter a seguinte redação:
“6.1
– “Julgar irregulares, sem imputação de débito, com fundamento no art. 18,
inciso III, alínea "c", c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei
Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas
Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da análise das contas
anuais de 2001 da Prefeitura Municipal de Brusque.”
2 - Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do
Relator que a fundamentam, ao senhor Ciro Marcial Roza, à Prefeitura Municipal
de Brusque e à Câmara Municipal do mesmo município.
Gabinete, em 23 de fevereiro 2010.
Conselheiro
Julio Garcia
Relator