PROCESSO Nº

Fl. 355

LCC 08/00417445

UNIDADE GESTORA

CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A.

RESPONSÁVEL

Eduardo Carvalho Sitonio – Diretor Presidente à época

INTERESSADO

Alfredo Felipe da Luz Sobrinho – Diretor Presidente à época

ESPÉCIE

Dispensa de Licitação

ASSUNTO

Licitação nº 062/2008

 

LICITAÇÃO. DISPENSA. EMERGÊNCIA. DESÍDIA.

A desídia da Administração, que não se programou de forma adequada para realizar a licitação tempestivamente, quando previsíveis as dificuldades que poderiam decorrer em razão da complexidade do objeto, não justifica a contratação direta.

Além da adoção das formalidades previstas no art. 26 e seu parágrafo único da Lei nº 8.666/93 são pressupostos da aplicação do caso de dispensa preconizado no art. 24, inciso IV, da mesma Lei:

1) que a situação adversa dada como de emergência ou de calamidade pública não tenha sido originada, total ou parcialmente, da falta de planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos disponíveis, ou seja, que ela não possa, em alguma medida, ser atribuída à culpa ou dolo do agente público que tinha o dever de agir para prevenir a ocorrência de tal situação;

2) que exista urgência concreta e efetiva do atendimento à situação decorrente do estado emergencial ou calamitoso, para afastar risco de danos a segurança de pessoas, obras, serviços e outros bens, públicos e particulares;

3) que o risco, além de concreto e efetivamente provável mostre-se iminente e especialmente gravoso;

4) que a imediata efetivação, por meio de contratação com terceiro, de determinadas obras, serviços ou compras, segundo as especificações e quantitativos tecnicamente apurados, seja o meio adequado, efetivo e eficiente para afastar o risco iminente detectado, considerado o prazo máximo de 180 dias;

 

LICITAÇÃO. DISPENSA. PREÇO. JUSTIFICATIVA. NECESSIDADE.

A existência de elementos indicando que os preços contratados estão dentro de uma estimativa feita pela Unidade Gestora pode permitir o afastamento da caracterização de grave infração à norma legal, embora a justificativa formal dos preços contratados seja a mais acertada quando tratar-se de dispensa ou inexigibilidade de licitação.

 

LICITAÇÃO. DISPENSA. EDITAL. CLÁUSULA ABUSIVA.

A cláusula contratual e/ou editalícia que interfira na organização empresarial da contratada pode constituir cláusula abusiva contrária ao princípio da livre iniciativa, o que caracterizaria grave infração passível de multa.

A pequena vigência contratual, o indicativo de alteração da redação da cláusula apontada como abusiva e a reduzida possibilidade desta falha gerar consequências negativas na execução do contrato podem motivar a descaracterização de grave infração.

 

 

I – RELATÓRIO

 

Tratam os autos da análise da dispensa de licitação nº 062/08, da CELESC Distribuição S.A., enviada a este Tribunal em cumprimento ao disposto na Instrução Normativa nº TC-01/2002.

O aludido processo de dispensa de licitação originou-se de solicitação do Departamento de Administração sustentando a urgência de se proceder a renovação do contrato e a necessidade da continuidade dos serviços de vigilância (fl. 07). O parecer nº 018/08 de 15 de janeiro de 2008 (fls. 15-17) e a manifestação de 21 de janeiro de 2008 (fls. 18 e 19) da auditoria interna foram favoráveis à referida contratação. Por deliberação da Diretoria Colegiada em 25 de janeiro de 2008 (fl. 21) o processo de dispensa de licitação foi aprovado por um período de 90 dias.

A Inspetoria 2, Divisão 5, da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações – DLC elaborou o relatório de instrução nº 307/2008, sugerindo a audiência do Responsável, para apresentar manifestação sobre as seguintes restrições:

3.1.1. Ausência de caracterização da situação emergencial, em desacordo com o art. 24, IV, da Lei 8.666/93 (item 2.1 deste relatório);

3.1.2. Ausência de justificativa do preço para os lotes I e II, em desacordo com o inciso III do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/93 (item 2.2.3 deste relatório);

3.1.3. Previsão de cláusula abusiva, contrariando o princípio da livre iniciativa esculpido pelo art. 1º, IV da Constituição Federal e em desacordo com o art. 37, caput, da Constituição Federal e arts. 3º e 68 da Lei 8.666/93 (item 2.3 deste relatório).

 

Foi determinada a realização da audiência (fl. 326) e embora esta tenha sido dirigida e recebida pelo Responsável (fls. 327 e 328), este deixou de manifestar-se, vindo aos autos as justificativas prestadas pelo Chefe da Divisão de Apoio Operacional, Sr. José Carlos Ferreira Junior e pelo Chefe do Departamento de Administração, Sr. Silvio Cesar Gonzaga, nos termos do Memo nº CPA 4035/2008 datado de 19/12/2008 (fls. 335 e 336)[1].

Após, a DLC elaborou o relatório nº 161/2009, mantendo as mesmas restrições do relatório anterior, sugerindo a irregularidade da dispensa de licitação nº 062/2008, com aplicação de multas ao Responsável (fls. 339-353).

O Ministério Público acompanhou o posicionamento da Área Técnica (fls. 273-274).

É o relatório.

 

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

Três foram as restrições apontadas pela instrução, as quais passo à devida análise:

 

1. Ausência de caracterização da situação emergencial, em desacordo com o art. 24, IV, da Lei 8.666/93.

A dispensa de licitação nº 062/08 destinou-se à contratação de serviços de vigilância, fundando-se no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/93.

Os Chefes do Departamento de Administração e da Divisão de Apoio Operacional da CELESC Distribuição (fl. 07) solicitaram autorização para contratar em “caráter emergencial” serviços de vigilância por 3 (três) meses, com fundamento no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/93.

A Auditoria Interna da Unidade manifestou-se às fls. 232, entendendo que o processo de Dispensa de Licitação n. 62/2008 obedeceu aos preceitos legais não encontrando óbice para a formalização dos contratos com as empresas Ondrepsb, Orcali e Casvig. Na reunião de Diretoria nº 08/2008 realizada em 03/03/2008, Deliberação nº 056/2008 (fl. 305), a Diretoria Colegiada resolveu homologar os contratos emergenciais nº 42.435 (Casvig Catarinense de Segurança e Vigilância Ltda., no valor de R$ 342.854,39), nº 42.438 (Ondrepsb Serviços de Guarda e Vigilância Ltda., no valor de R$ 143.181,27), nº 42.437 (Orcali Serviços de Segurança Ltda., no valor de R$ 136.287,61), todos relativos a serviços de vigilância/segurança a serem prestados por 90 (noventa) dias a partir de 29/02/2008.

Importante referir que a Sra. Ranúzia Ancelmo Freitas Santiago, Chefe da Divisão de Apoio Operacional, e Sr. Silvio César Gonzaga, Chefe do Departamento de Administração, afirmam que o edital nº 705/2007, com prazo inicial de abertura previsto para o dia 03/12/2007, sofreu quatro impugnações e oito questionamentos, e que quanto ao contrato anterior “a licitação foi aberta no ano de 1999 e assinada apenas no ano de 2002, devido aos inúmeros entraves para o retardamento deste procedimento licitatório, como questionamentos e impugnações” (fl. 07 e 14).

Apresentadas as razões externadas para a contratação direta de serviços de vigilância deve-se indagar sobre a substância desses argumentos.

Como alegado em resposta à audiência (fls. 335 e 336), não se nega que os serviços de vigilância são de suma importância para a defesa do patrimônio, principalmente diante do crescente agravamento da insegurança pública em nosso país. Assim, é praticamente impossível deixar uma empresa com grande patrimônio a ser protegido sem qualquer cobertura de segurança privada, o que, caso ocorresse, poderia acarretar graves prejuízos.

Entretanto, isso não significa que a contratação direta seja admitida em qualquer hipótese. É cediço o entendimento de que a desídia administrativa não é motivo suficiente para justificar a dispensa de licitação, sendo essencial que o administrador público preveja as situações e, dentro de um plano de atuação que considere o tempo necessário para concluir a licitação, adote todas as medidas cabíveis.

No caso concreto, a própria Unidade Gestora relata que o processo de licitação levou quase três anos para chegar ao seu termo final, tendo iniciado em 1999 e sido concluído apenas em 2002. Mesmo assim, a CELESC Distribuição não levou em conta as dificuldades da licitação anterior e aguardou praticamente o final do contrato, previsto para 28 de fevereiro de 2008, para iniciar nova licitação, já que o edital de concorrência nº 705/07 foi publicado em novembro de 2007.

Ora se o objeto é complexo, como relata a Unidade Gestora, e sendo previsível a complexidade do processo licitatório, resta evidente que o certame deveria ter sido desencadeado com maior antecedência, a fim de evitar a situação que ora se apresenta, em que a CELESC já realizou mais de uma dispensa de licitação por não ter conseguido concluir a concorrência nº 705/07.

Ademais, a alegada necessidade de várias reformulações no edital não é justificativa plausível. Os serviços de vigilância são contratados habitualmente pela Administração Pública e a sua forma de prestação não constitui novidade. Além disso, é inconcebível que uma empresa do porte da CELESC Distribuição S.A. não consiga projetar as condições relevantes para a contratação, principalmente porque havia contrato em vigor, durante o qual poderiam ser avaliadas as circunstâncias, a fim de aperfeiçoar a licitação que seria iniciada. Por fim, a falta de planejamento fica evidente quando se verifica que já no mês seguinte à publicação do edital de concorrência 705/07, foi solicitada autorização para contratação direta.

Portanto, correta a conclusão a que chegou a Área Técnica. A Unidade Gestora não agiu de forma providente, o que acabou sendo fator determinante para tornar inevitável a contratação direta.

No tocante à sanção a ser aplicada em razão da irregularidade, entendo que é agravante a evidente desídia da Administração Pública, que mesmo sabedora dos problemas ocorridos na licitação anterior não iniciou o certame para a futura contratação com a antecedência necessária, justificando a gradação da sanção no percentual de 30% (trinta por cento) do valor constante do caput do art. 70, da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, estando dentre os limites máximo e mínimo prescritos pelo inciso II do artigo 109 do Regimento Interno desta Corte de Contas.

 

2. Ausência de justificativa do preço para os lotes I e II, em desacordo com o inciso III do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.666/93.

O Chefe da Divisão de Apoio Operacional, Sr. José Carlos Ferreira Junior e o Chefe do Departamento de Administração, Sr. Silvio Cesar Gonzaga, em resposta à audiência afirmam que (fl. 335-336):

“Os postos contratados seguem planilha de custo definida pela Administração. Esta planilha engloba todos os custos previstos para o fornecimento e prestação do serviço.

Dentro do PCDL temos orçamento de três empresas, sendo um para cada Lote, os postos prestados nos três lotes são semelhantes, alterando apenas o município onde o serviço é prestado.

Analisando a Planilha de Custo das três empresas verifica-se que todos os preços são semelhantes, caracterizando assim que os preços estão a nível de mercado. Pois três empresas diferentes trabalham com preços semelhantes.”

 

Uma vez fundamentada a dispensa de licitação na emergência fica o Responsável obrigado a, além de comprovar a existência da situação emergencial, justificar o preço pago.  O inciso III do parágrafo único do art. 26 da Lei nº 8.666/93 é claro ao prever que o processo de dispensa de licitação deverá ser instruído com a justificativa do preço. Esta justificativa é elemento essencial para a lisura do procedimento licitatório e deve estar estampada quando da decisão pela dispensa, ou seja, antes da efetivação do contrato.

Conquanto não haja uma justificativa formal dos preços contratados, o processo de dispensa de licitação contém o quadro de preços máximos por lote e tipo de postos de trabalho (fls. 42-48) e a composição dos custos estimados (fls. 57-82). Portanto, esse detalhamento, ante a ausência de outros elementos que indiquem a contratação por preços exorbitantes, evidencia que os preços contratados estão dentro de uma estimativa feita pela Unidade Gestora, o que permite o afastamento da restrição, sem prejuízo de recomendação no sentido de que em futuras licitações sejam adotadas providências para o máximo cumprimento do art. 26, §único, III, da Lei de Licitações.

 

3. Previsão de cláusula abusiva, contrariando o princípio da livre iniciativa esculpido pelo art. 1º, IV da Constituição Federal e em desacordo com o art. 37, caput, da Constituição Federal e arts. 3º e 68 da Lei 8.666/93.

A existência de cláusula abusiva deve ser vedada sempre que restringir o caráter competitivo da licitação.

Na situação em análise, o conteúdo atacado pela DLC nos três contratos é o mesmo, qual seja:

Cláusula Quinta – Dos Direitos e Responsabilidades da Contratada

A CONTRATADA obriga-se a prestar os serviços nas dependências e conforme programações indicadas pela CELESC Distribuição S.A.

Parágrafo Primeiro: Os empregados da CONTRATADA deverão apresentar-se antes de iniciar os seus serviços, uniformizados, e obedecerão à disciplina imposta pela CELESC Distribuição S.A., no local de trabalho, podendo a CELESC Distribuição S.A. exigir a substituição de qualquer pessoa, a qualquer tempo, cujo comportamento julgue impróprio. Esta substituição deverá ocorrer num prazo máximo de 24 horas, com a finalidade de não prejudicar a continuidade dos serviços.

 

Verifica-se que as empresas contratadas são as mesmas que vinham prestando serviços à Unidade. Verifica-se ainda a pequena vigência contratual (90 dias) e o indicativo de alteração da redação da cláusula apontada como abusiva. Com isso, existe reduzida possibilidade desta falha gerar consequências negativas na execução do contrato, sendo razoável que se afaste a caracterização de grave infração a norma legal.

Por fim, entendo que a recomendação à Unidade para que adote providências no sentido de evitar cláusulas contratuais que possam interferir no âmbito privado da empresa contratada, por ora, é medida suficiente.

 

 

III – PROPOSTA DE VOTO

 

Diante do exposto, submeto ao Egrégio Plenário a seguinte proposta de voto:

1. Conhecer do Relatório de Instrução que trata da análise da Dispensa de Licitação nº 062/2008 e dos contratos de prestação de serviços de vigilância dela decorrentes, da CELESC Distribuição S.A., encaminhados a este Tribunal por meio documental, para considerá-los irregulares, com fundamento no art. 36, § 2º, alínea “a”, da Lei Complementar n. 202/2000.

2. Aplicar ao Sr. Eduardo Carvalho Sitonio – ex-Diretor Presidente da CELESC Distribuição S.A., CPF nº 223.915.339-34, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, a multa no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), em face da ausência de caracterização de situação emergencial, em desacordo com o disposto no inciso IV do artigo 24 da Lei nº 8.666/93 (item 3.1.1.1 do relatório nº DLC/INSP2/DIV5 - 161/2009), fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

3. Recomendar à Unidade que em futuras licitações sejam adotadas providências:

3.1. para o máximo cumprimento do inciso III do parágrafo único do artigo 26 da Lei de Licitações, a fim de que haja a devida justificativa do preço contratado e,

3.2. no sentido de evitar cláusulas contratuais que possam interferir no âmbito privado da empresa contratada.

4. Dar ciência do Acórdão, desse Relatório e Proposta de Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório nº DLC/INSP2/DIV5 - 161/2009 (fls. 339-353), ao Sr. Eduardo Carvalho Sitonio, Ex-Diretor Presidente da CELESC Distribuição S.A., e ao Sr. Alfredo Felipe da Luz Sobrinho, atual Diretor Presidente da Empresa.

 

Gabinete, em 08 de março de 2010.

 

 

Auditor Gerson dos Santos Sicca

Relator



[1] Registra-se que não há procuração do Responsável para estes manifestarem-se em nome dele.