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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO GABINETE DO CONSELHEIRO ADIRCÉLIO DE MORAES FERREIRA JUNIOR |
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PROCESSO N. |
CON-09/00578564 |
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UNIDADE GESTORA |
Prefeitura Municipal de São Francisco do Sul |
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INTERESSADO |
Luís Roberto de
Oliveira |
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ASSUNTO |
Implantação de registro eletrônico de presença
para os servidores públicos |
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Município.
Instituição do registro de ponto eletrônico para servidores ocupantes de cargos
comissionados e agentes políticos. Horas extras
O Município, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho
dos servidores públicos municipais, pode instituir o regime de ponto eletrônico
para os servidores públicos, efetivos e comissionados.
O pagamento de horas extras aos servidores públicos,
efetivos e comissionados, está condicionado
às hipóteses excepcionais e temporárias, mediante prévia autorização e justificativa
por escrito do superior imediato, sendo necessário a existência de lei que
autorize tal pagamento.
Os agentes políticos, dada as peculiaridades do cargo, que
incluem a liberdade e independência no exercício de suas funções, não se
submetem à jornada de trabalho comum aos servidores públicos.
Não há óbice a que
seja instituído um sistema de registro de presença dos agentes políticos,
contudo esse mecanismo, por si só, não é suficiente para comprovar o
cumprimento ou não dos seus deveres funcionais, dada as características de suas
atividades, não alcançando, portanto, os objetivos a que se propõe.
Os agentes políticos não se sujeitam ao cumprimento da jornada de
trabalho comum aos servidores públicos, o que, consequentemente, também não
gera o direito ao recebimento de horas extras, sobremodo diante do disposto no
§ 4º do art. 39 da Constituição Federal, que estabelece a remuneração dos
agentes políticos exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o
acréscimo de qualquer adicional .
1 RELATÓRIO
Trata-se de consulta formulada pelo Sr. Luiz
Roberto de Oliveira, Prefeito Municipal de São Francisco do Sul, indagando
acerca da legalidade da Administração
Municipal poder exigir dos ocupantes de cargos comissionados, e também, de
Agentes Políticos, o registro eletrônico de presença (entrada e saída) nos
respectivos locais de trabalho, sem o risco de vir responder pelo pagamento de
serviços extraordinários, diante do controle de ponto imposto.
A Consultoria Geral, mediante o Parecer n. COG-670/09[1],
considerou cumpridos os requisitos de admissibilidade da peça indagativa,
propondo a seguinte resposta ao Consulente:
1.
O Município, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho dos servidores
públicos municipais, pode instituir o regime de ponto eletrônico para os
servidores públicos, efetivos e comissionados.
2.
Não comporta ao Município instituir sistema de registro de ponto aos
agentes políticos, em razão da liberdade funcional necessária ao cargo.
O Ministério Público, em manifestação por
meio do Parecer n. 1769/2010[2],
da lavra da Procuradora Cibelly Farias, apresentou a resposta de mérito nos
seguintes termos:
1.
O Município pode
instituir regime de ponto eletrônico a fim de regulamentar a jornada de
servidores públicos efetivos e comissionados;
2.
Não obstante a
adoção do sistema de registro de ponto (eletrônico) ou não, a Administração
está sujeita ao pagamento por serviços extraordinários aos servidores que
laboram além da jornada normal de trabalho, conforme determina a legislação
vigente, condicionado às hipóteses excepcionais e temporárias, mediante prévia autorização e justificativa por
escrito do superior imediato.
3.
Não há óbice a que seja instituído um sistema de
registro de presença dos agentes políticos, incluindo-se vereadores, para fins
de averiguar a presença desses agentes nos locais de trabalho e aferir a
liquidação de despesa quanto à remuneração paga aos referidos agentes.
2 FUNDAMENTAÇÃO
Analisando o teor da Consulta, verifico que a
Consultoria discorreu adequadamente acerca da natureza do cargo comissionado,
destacando que a sua diferença essencial em relação ao cargo efetivo é a forma
de seu provimento e desprovimento, estabelecido pela Constituição Federal,
visando à liberdade do administrador para o seu preenchimento e exoneração, com
base no elemento confiança que o cargo comissionado apresenta.
Partindo desse princípio, a COG pondera que o pagamento de horas extras a cargo comissionado
dependeria de previsão legal específica e estaria condicionado ainda à
ocorrência de situações excepcionais de interesse público. Observa a COG que a
legislação municipal, no caso, a Lei Complementar n. 8/2003[3]
veda expressamente o pagamento de horas extras a ocupantes de cargos em
comissão.
Não obstante tais ponderações, a Consultoria Geral
não traz para a conclusão de seu parecer resposta específica quanto à
possibilidade de pagamento de horas extras a cargo comissionado.
Quanto ao tema, a Representante do Ministério
Público junto a este Tribunal traz à tona a divergência doutrinária e
jurisprudencial existente, tendo em vista que para alguns é indevido o
pagamento de horas extras ao ocupante de cargo comissionado, com base no que
dispõe o § 1º do art. 19 da Lei 8.112/90[4]
e para outros o seu pagamento torna-se devido por força do § 3º do art. 39 da
Constituição Federal[5].
Frente a isso, a Procuradora do MPTC manifesta-se
pela possibilidade de pagamento de horas extras ao servidor ocupante de cargo
comissionado que labore além da jornada normal de trabalho, desde que haja
previsão legal autorizando tal pagamento e a prestação de serviço
extraordinário se configure como hipótese excepcional e temporária e se dê com
a prévia autorização e justificativa por escrito do superior imediato.
Este Relator, sopesando todos os
argumentos e fundamentos legais suscitados, filia-se ao posicionamento acima
descrito, qual seja, pelo cabimento do pagamento a horas extras aos servidores,
inclusive comissionados, desde que haja permissão legal, no caso em exame, lei municipal, que ampare tais
pagamentos, representando com isso o desejo do legislador municipal – no
exercício da competência que a constituição lhe confere, como unidade
federativa autônoma, para disciplinar a remuneração de seus servidores.
Além disso, importa verificar o preenchimento de
outros requisitos para a autorização de pagamento de horas extras – os quais
seriam extensivos aos demais servidores públicos – quais sejam, controle rígido
acerca das horas efetivamente trabalhadas e ainda, como bem destacou a
Representante do Ministério Público junto a este Tribunal, que a prestação de
serviço extraordinário se configure como hipótese excepcional e temporária e se
dê com a prévia autorização e justificativa por escrito do superior imediato.
Mesmo em se tratando de processo de consulta – que
versa sobre interpretação de lei ou questão formulada em tese – considero
pertinente observar que no Município de São Francisco do Sul, a lei que rege os
servidores públicos municipais[6]
não confere aos servidores comissionados o direito à percepção de horas extras,
conforme dispõe o seu art. 64.
No tocante ao item
relacionado ao controle de ponto dos
agentes políticos, a Consultoria Geral, por meio do Parecer
COG-670/09, discorre sobre as características de tais cargos, afirmando que os
mesmos precisam de ampla liberdade
funcional e maior resguardo para desempenharem suas funções, concluindo que não comporta ao Município
instituir sistema de registro de ponto aos agentes políticos, em razão da
liberdade funcional necessária ao cargo.
Acolho as ponderações da Consultoria Geral quanto
às peculiaridades do exercício de tais funções políticas, mas deixo de
acompanhar a conclusão da Consultoria Geral quanto à impossibilidade de instituição
de ponto eletrônico de presença para agentes políticos, mas de igual forma não
me filio ao raciocínio defendido pela Representante do Ministério Público, que
propõe resposta ao Consulente no sentido de que a instituição de registro ponto
de presença dos agentes políticos serve para aferir a liquidação de despesa
quanto à remuneração paga aos referidos agentes, pelas razões que passo a expor.
Meu posicionamento no sentido de não ser suficiente
o registro de ponto para fins de comprovação de correta liquidação de despesa, fundamenta-se
no fato de que tais agentes, no exercício da função política, não se submetem à
jornada de trabalho comum aos servidores públicos, não obstante terem o dever
de cumprir com suas atribuições e desempenhar com zelo as suas atividades.
Importa destacar que as atribuições dos agentes
políticos transcendem o ambiente exclusivo do recinto do órgão público, sendo
que, no caso dos vereadores, prefeitos e vice-prefeitos, o exercício de suas funções
envolve visitas às comunidades, a outros órgãos públicos, organizações sociais,
etc., participação em reuniões em diversos locais, além de uma série de outras
hipóteses que variam conforme a realidade de cada município.
Ademais, ressalta-se que há registros em ata quanto
às participações de tais agentes em sessões plenárias, administrativas, em
reuniões de comissões, etc., sendo que essas são apenas algumas das formas para
se verificar a participação efetiva dos mesmos no desempenho de seus deveres
funcionais.
Assim, entendo que o sistema de ponto eletrônico para
agentes políticos, por si só, não alcança a eficácia necessária para fins de
verificar o cumprimento ou não das atribuições atinentes a tais cargos, sendo
que a aferição de tal aspecto deve advir de um controle mais amplo, que envolve
não só o controle realizado pela própria administração – esse levando em
consideração as características peculiares do cargo - como também se torna mais
eficiente quando engloba o controle social, tendo como participantes a
população, as entidades organizadas, a imprensa e os órgãos de controle.
Contudo, considero que, em tese, não há
impedimento para a instituição de ponto eletrônico para os agentes políticos. Porém,
em virtude de os mesmos não se submeterem ao mesmo regime de cumprimento de
jornada de trabalho que se aplica aos servidores públicos, tendo em vista as diferentes
características de seu cargo, a implantação de tal controle, em princípio, não
se justifica, posto que não alcançaria os objetivos a que se propõe. No
entanto, cabe ao Administrador Público Municipal, no uso de sua
discricionariedade, concluir pela oportunidade e conveniência de sua adoção.
Nesse sentido, cabe registrar a manifestação do Conselho
Nacional de Justiça – CNJ, ao analisar o Recurso Administrativo em Pedido de Providências
n. 200810000002920, em que acolheu o Voto do Relator[7],
posicionando-se pela não submissão do magistrado a controle de ponto dada às
características do cargo. Vejamos:
Ementa:
Pedido
de Providências. Pedido para implantação de sistema de ponto eletrônico para
controle de freqüência e assiduidade dos Magistrados do Tribunal de Justiça do
Estado do Maranhão. Ausência de comprovação de qualquer irregularidade ou da
necessidade de se implantar tal sistema – “Apesar do dever do juiz de cumprir
os deveres do cargo, o exercício da função jurisdicional deve realizar-se com
liberdade e independência. O controle do cumprimento desses deveres é imposição
legal, nos termos do art. 35 da LOMAN, que prevê os deveres do magistrado
relativos à pontualidade. Não há, todavia, critério rígido e previamente
estabelecido para esse controle, ou cargo horária estabelecida, considerando
que ao julgador se concede margem de liberdade para melhor atender à atividade
jurisdicional”.
Na fundamentação de seu Voto, o Relator
faz uma analogia entre os magistrados e os agentes públicos que exercem cargos
de direção no Poder Executivo e Legislativo, que considero interessante abaixo
reproduzir, uma vez que os argumentos utilizados são aplicáveis ao caso em
exame (grifei):
O ponto
eletrônico é inegavelmente uma forma restritiva de controle de freqüência que,
apesar de potencialmente ser capaz de solucionar as dificuldades de controle
que eventualmente existam, cria dificuldades maiores, na medida em que retira a
liberdade do magistrado de definir, no contexto de sua comarca e sem prejuízo
do interesse público, qual a melhor forma e horário de trabalho.
Embora
seja extremamente adequada para o controle de certas atividades, funcionando
inclusive como forma de proteção de direitos – já que pode ser utilizado como
prova da carga horária cumprida pelo empregado – o ponto eletrônico é, em
princípio, inadequado ao controle do exercício da Magistratura.
E a
hipótese dos magistrados, no caso em exame, não constitui exceção, considerando
que parte expressiva desses profissionais, tanto no contexto do poder público,
quanto na iniciativa privada, em razão da posição hierárquica que possuem e das
funções que desempenham, não tem sua carga horária controlada na forma que a
entidade autora requer. É a hipótese dos agentes políticos que exercem cargos
de direção no Poder Executivo (Presidente, Governador e Prefeito) ou no
Legislativo (Senador, Deputado e Vereador).
Destaca-se que outras decisões[8] têm sido proferidas pelo
Conselho – CNJ, reiterando o entendimento acima descrito, no sentido de que não
há critério legalmente estabelecido preestabelecido para o controle de ponto ou
carga horária de magistrado – o que este Relator considera plenamente aplicável
ao caso dos vereadores, quanto ao questionamento suscitado por meio da presente
Consulta.
3 PROPOSTA DE
DECISÃO
Pelas razões expostas e considerando o que dos
autos consta, submeto à apreciação do Egrégio Tribunal Pleno a seguinte
proposta de decisão:
3.1. Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e
formalidades preconizados no Regimento Interno deste Tribunal.
3.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:
1.
O
Município, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho dos servidores públicos
municipais, pode instituir o regime de ponto eletrônico para os servidores
públicos, efetivos e comissionados.
2.
O pagamento
de horas extras aos servidores públicos, efetivos e comissionados, está condicionado
às hipóteses excepcionais e temporárias, mediante prévia autorização e justificativa por
escrito do superior imediato, sendo necessário a existência de lei que autorize
tal pagamento.
3.
Os agentes políticos, dada as peculiaridades do cargo, que incluem
a liberdade e independência no exercício de suas funções, não se submetem à
jornada de trabalho comum aos servidores públicos, o que, consequentemente, também não gera o
direito ao recebimento de horas extras, sobremodo diante do disposto no § 4º do
art. 39 da Constituição Federal, que estabelece a remuneração dos agentes
políticos exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o
acréscimo de qualquer adicional.
4.
Não há óbice, em tese, para
a instituição de um sistema de registro de presença dos agentes políticos,
contudo, esse mecanismo, por si só, não é suficiente para comprovar o cumprimento
ou não dos seus deveres funcionais, dada as características de suas atividades, não alcançando, portanto, os objetivos
a que se propõe.
3.3. Determinar ao Consulente que, em futuras
consultas, encaminhe parecer de sua assessoria jurídica, nos termos do art.
104, V, do Regimento Interno do Tribunal de Contas.
3.4. Dar ciência desta Decisão, do Parecer n. COG-670/2009 e Voto do Relator que a fundamentam, à Prefeitura
Municipal de São Francisco do Sul.
3.5.
Determinar
o arquivamento dos autos.
Gabinete do Conselheiro, em 16
de fevereiro de 2011.
Adircélio de Moraes Ferreira Junior
Conselheiro Relator
[1] Fls. 3-8
[2] fls. 9-15
[3] Estatuto dos Servidores Públicos
Municipais de São Francisco do Sul
[4] Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada
em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a
duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites
mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 8.270, de 17.12.91)
§ 1o O
ocupante de cargo em comissão ou função de confiança submete-se a regime de
integral dedicação ao serviço, observado o disposto no art. 120, podendo ser
convocado sempre que houver interesse da Administração. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
[5] que confere aos servidores públicos o direito à percepção de horas extras
previstas no inciso XVI do art. 7º da Constituição Federal
[6] Lei Complementar n. 8, de 30/10/2003
[7] Conselheiro Rui Stoco
[8] Processo n. 2008.10.00.001014-0,
Relator Conselheiro Altino Pedrozo dos Santos