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ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO Gabinete do Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Junior |
PROCESSO
Nº |
REP 08/00479718 |
UNIDADE |
Secretaria de Estado da Administração |
INTERESSADO |
Valquíria Lazzari de Lima Bastos |
ASSUNTO |
Contratação temporária irregular. |
REPRESENTAÇÃO.
CONTRATO TEMPORÁRIO. PRAZO. EXCESSO. LEI AUTORIZATIVA.
Verificada
a existência de lei válida e eficaz a autorizar a prorrogação de contrato
temporário de pessoal enquanto processado concurso público, há que se afastar a
responsabilidade do gestor pelo excesso do prazo de duração do contrato.
RELATÓRIO
Tratam os autos de representação[1]
oriunda da 6ª Vara do Trabalho de Florianópolis, encaminhada por ordem da Dra.
Valquíria Lazzari de Lima Bastos, juíza do Trabalho, noticiando situação que
configura a contratação temporária irregular de Mabel Cristina Falconi Motta,
posto que a relação laboral firmada com o Estado perdurou de 01 de setembro de
1993 a 31 de janeiro de 2007, ou seja, por mais de treze anos consecutivos.
Submetida ao rito ordinário a representação foi
conhecida, efetivando-se inicialmente a audiência do Secretário de Estado da
Administração, à época o Senhor Antônio Marcos Gavazzoni, no sentido de
informar e esclarecer quanto ao seguinte:
- Lei que
autorizou a contratação temporária.
- A
natureza da atividade temporária exercida pela contratada.
- Justificativa
referente à manutenção do contrato após a segunda prorrogação de prazo do
instrumento, haja vista que é permitido ao contrato temporário ser prorrogado
apenas uma vez por igual período dentro do limite de dois anos, de acordo com o
art. 445 e 451 da CLT, considerando-se sua regência pela CLT[2].
Em resposta foram prestados os esclarecimentos e
justificavas abaixo:
- A Lei
que amparou tal contratação foi a Lei n. 9.186, de 10 de agosto de 1993.
- Quanto
à natureza temporária das atividades exercidas pelo contratado, ela se deu pela
necessidade de mão de obra especializada para o atendimento nas Unidades
Hospitalares do Estado e pelo fato de não haver concurso público em andamento
para a contratação.
-
Justificando a manutenção do contrato após a segunda prorrogação informou que
tal fato deveu-se ao advento de leis que autorizavam tais prorrogações, como as
leis: Lei n. 9.186, de 10 de agosto de 1993, Lei n. 9.886, de 19 de julho de
1995, Lei n. 10.215, de 24 de setembro de 1996, Lei n. 10.463, de 20 de julho
de 1997, Lei n. 11.178, de 16 de setembro de 1999 e Lei n. 12.068, de 27 de
dezembro de 2001[3].
Por se verificar a duplicidade de documentos e do
objeto constante do processo REP 09/00077514, com o inserto nos presentes autos,
determinou-se a desautuação daquele[4].
De posse das justificativas apresentadas pela
Secretaria de Estado da Saúde, a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, por
entender não esclarecidas a natureza temporária da atividade exercida pela
contratada, dado o excesso de prazo da duração contratual, bem como a razão da
manutenção do contrato após a segunda prorrogação, propôs a audiência de todos os
Secretários de Estado da Saúde titulares da Pasta no período de vigência do
contrato[5].
Realizadas as audiências[6],
o Senhor Luiz Eduardo Cherem e a Senhora Carmem Emília Bonfá Zanotto
ratificaram as informações prestadas pela Secretaria de Estado da Saúde,
destacando que havia uma forte pressão por parte dos servidores temporários
sobre os membros do Poder Legislativo Estadual, que acabavam por aprovar as
Leis destacadas pela Diretoria de Recursos Humanos - DIRH, as quais, por sua
vez, autorizavam a prorrogação dos contratos[7].
O Senhor Carlos Clarimundo Dornelles Schöeller
sustenta sua defesa no argumento de que as sanções estariam prescritas frente à
sua pessoa, posto que atuou como Secretário de Estado no período de 03 de julho
de 1997 a 31 de dezembro de 1998[8].
O Ex-Secretário de Estado da Saúde, Senhor Eni José
Voltolini acompanhou as razões apresentadas pelo Secretário em exercício à
época, Luiz Eduardo Cherem, que, como visto, pautam-se pelos esclarecimentos
prestados pela Diretoria de Recursos Humanos - DIRH[9],
procedimento também adotado pelos Senhores João Guizzo Filho[10]
e Ronald Moura Fiúza[11].
O Senhor João José Cândido da Silva, titular da
Pasta da Saúde entre 31 de maio de 2000 e 31 de dezembro de 2002, requer a sua
exclusão da relação processual frente à ausência de competência do Secretário
de Estado de Saúde para nomear aprovados em concurso público ou contratar
pessoal em caráter temporário, posto que tal mister era alvedrio da Secretaria
de Estado da Administração, firmado pelo Governador do Estado, sem olvidar das
autorizações legislativas que permitiam a prorrogação dos contratos[12].
O Senhor Carlos Fernando Coruja Agostini, por meio
de Procurador regularmente constituído, alega que:
1. No período em que exerceu o cargo de Secretário
de Estado da Saúde (02/01/2003 a 05/04/2004) nenhum ato administrativo de sua
autoria foi expedido no sentido de prorrogar ou manter os contratos de trabalho
temporários apontados como irregulares.
2. A Comunicação Interna Circular n. 3.175/02,
emitida em 11.12.02, portanto, um mês antes de assumir o cargo, esclarecia e
determinava o seguinte:
- Todos os servidores contratados pela Secretaria
de Estado da Saúde amparados nas diversas leis a partir de 1993 até 1999
estavam com seus contratos prorrogados até a realização do concurso público e a
devida nomeação dos aprovados.
- Os servidores admitidos com amparo na Lei 12.068,
de dezembro de 2001, tiveram seus contratos prorrogados por 01 (um) ano,
conforme previa a referida Lei.
- Por não terem sido nomeados até o momento os
candidatos aprovados no concurso público, classificados conforme as vagas
expostas no edital, os servidores contratados deveriam continuar normalmente em
suas atividades, aguardando a promoção das nomeações que ficariam a cargo da
nova administração, devendo somente ocorrer as rescisões quando fossem
assinadas e publicadas tais nomeações.
3. Como se observa, houve o simples cumprimento de
uma regra de transição, a qual visou a manutenção e a regularidade na prestação
do serviço público de saúde.
4. Não poderia haver a dispensa do pessoal
contratado temporariamente enquanto não se desse a substituição e assunção dos
concursados na rotina dos trabalhos, sob pena de prejudicar a prestação dos
serviços públicos de saúde, com eminente prejuízo da população usuária do SUS.
5. A gestão de recursos humanos do Estado é da
responsabilidade da Secretaria de Estado da Administração, conforme art. 46, incisos
I e II da Lei Complementar n. 243, de 30 de janeiro de 2003, o que evidencia a
ilegitimidade passiva do titular da Pasta da Saúde.
6. A responsabilidade pelo ingresso, movimentação e
lotação dos servidores públicos estaduais é da Secretaria de Estado da
Administração.
7. As prorrogações, embora não implementadas, por
esse ex-gestor, estavam amparadas em atos administrativos de gestões anteriores
e respaldadas em legislação estadual autorizativa, as quais carregam presunção
de constitucionalidade, não podendo ter seu comando questionado pela frágil
alegação de eventual inconstitucionalidade.
8. Traz manifestação do Poder Judiciário Estadual,
no seguinte sentido:
- Diante desse panorama, vê-se que as inúmeras leis
estaduais editadas davam suporte às contratações temporárias realizadas pelos
agentes públicos, muito embora se possa questionar acerca da legalidade das
sucessivas prorrogações, não há que se falar em ato de improbidade
administrativa, na medida em que não se vislumbra a ocorrência de dolo quando
os réus agiam em cumprimento à legislação válida e eficaz (trecho extraído da
sentença proferida nos autos da ACP – 023.06.380274-3, em anexo, julgada
improcedente)[13].
Laborando no Relatório de Reinstrução[14],
a DAP sustenta entendimento com o qual propugna pela aplicação de multa aos
ex-gestores da Secretaria de Estado da Saúde, cujos argumentos sintetizo:
- os atos são irregulares e esse exame cabe ao
Tribunal de Contas nos termos do artigo 36, § 2º, alínea “a” da LC n. 202/2000;
- a ausência de dolo ou má-fé afastam a improbidade
administrativa, mas não eximem a responsabilidade dos gestores de regularizarem
a situação, dado a extrapolação do prazo dos contratos temporários;
- o artigo 6º da Lei n. 9.886 de 19 de julho de
1995 dispõe que as admissões e dispensas serão processadas mediante portaria
baixada pelo Secretario da Saúde, o que bem demonstra a responsabilidade destes
e afasta a relação com a Secretaria de Estado de Administração;
- a Constituição Federal não dá sustentação às Leis
Estaduais que autorizaram a prorrogação dos contratos e, nesse sentido, pode o
Tribunal de Contas manifestar-se para afastar a aplicabilidade das mesmas,
conforme o disposto no artigo 151 de seu Regimento Interno.
O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas,
por meio de parecer do Procurador Diogo Roberto Ringenberg[15],
alinha-se à proposta da Diretoria Técnica, manifestando-se pela aplicação de
sanção pecuniária fundamentada no artigo 70, II, da Lei Complementar n.
202/2000.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
O fato veiculado na representação denota de forma
inequívoca o desvio da regra constitucional concernente à contratação
temporária de excepcional interesse público, posto que excede, em muito, o
prazo regular de vigência de contratos dessa natureza.
Entendimento pacífico desta Corte de Contas,
consignado no prejulgado 055, tem assentado que os contratos por prazo
determinado terão a duração máxima de dois anos, podendo ser prorrogados uma
única vez, desde que a soma dos períodos não ultrapasse o prazo máximo.
Aduz, ainda, que somente após seis meses do término
do primeiro contrato por prazo determinado, é que outro poderá ser firmado com
as mesmas partes.
Portanto, indubitável resta que em muito se
extrapolou a vigência do contrato firmado entre o Estado e a Senhora Mabel
Cristina Falconi Motta, que perdurou por mais de treze anos.
Ocorre que, como historiado nos autos, não se trata
de um caso isolado, mas de uma realidade verificada na Secretaria de Estado de
Saúde que tardou em realizar concurso público para provimento de cargos de seu
quadro de pessoal e que contou com a conivência legal a dar amparo às
sucessivas prorrogações dos contratos temporários.
A realização de concurso, por sua vez, não é algo
que se faz repentinamente. Exige planejamento e previsão conforme disposto no
artigo 169 da Constituição Federal, que, por sua vez, exige dotação
orçamentária e autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, não
se restringindo destarte à vontade ou ação exclusiva de um Secretário de Estado
da Saúde. Constitui uma política pública que ultrapassa as possibilidades e
competência de seu cargo.
É consabido que ao administrador cabe examinar a
constitucionalidade das leis a que se submete e optar por afastar-se de seu
comando, desde que empreenda medidas corretivas e promova, por meio do órgão
competente, a declaração de inconstitucionalidade.
Porém, há que se ponderar o fato de se estar diante
de uma área sensível de atuação por parte do Estado, qual seja, a da saúde,
onde decisões descompassadas do gestor, negando aplicabilidade às leis que
autorizavam a prorrogação dos contratos temporários, poderiam gerar o caos na
já delicada situação do atendimento médico à população, haja vista a não admissão
por meio de concurso público de pessoal qualificado para a substituição dos
temporários.
Assim, não vislumbro na conduta dos agentes, que
tiveram suas práticas escudadas em legislação válida e eficaz, gravidade que dê
azo à aplicação de sanção pecuniária, sobretudo frente ao disposto no artigo 1º
da Lei n. 11.178, de 16 de setembro de 1999, que autorizou a prorrogação do
prazo dos contratos dos servidores admitidos em caráter temporário, no âmbito da
Secretaria de Estado da Saúde, até a realização de concurso público, seguindo a
esteira de precedente desta Corte de Contas, processo REP 09/00077433,
deliberado em 23 de fevereiro de 2011, cuja relatoria coube ao Exmo.
Conselheiro Herneus de Nadal.
VOTO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos,
relativos à representação de irregularidades praticadas no âmbito da Secretaria
de Estado da Saúde, relativo ao contrato temporário firmado com Mabel Cristina
Falconi Motta.
Considerando que foi oportunizado e exercido o
contraditório e a ampla defesa dos responsáveis, conforme manifestações de fls.
184/239 dos autos;
Considerando-se a necessidade de continuidade do
atendimento médico pela Secretaria de Estado da Saúde, serviço de natureza
essencial à população;
Considerando-se a existência de leis estaduais
válidas e eficazes que autorizaram a prorrogação do contrato temporário além do
prazo máximo de dois anos;
Considerando que já se encontra regularizada a
situação com o provimento de cargos por servidores concursados em substituição
aos contratados temporariamente;
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas
pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei
Complementar n. 202/2000, decide:
6.1. Acolher as justificativas apresentadas pelos
Responsáveis e determinar o arquivamento dos autos.
6.2. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto
do Relator que a fundamentam, aos Representantes e aos Representados Senhores
João Guizzo Filho, Ronald Moura Fiúza, Carlos Clarimundo Dornelles Schöeller,
Eni José Voltolini, João José Cândido da Silva, Carlos Fernando Agostini Luiz
Eduardo Cherem e à Sra. Carmem Emília Bonfá Zanotto, todos ex-Secretários de
Estado da Saúde.
Gabinete, em 27 de maio de 2011.
Adircélio
de Moraes Ferreira Junior
Conselheiro
Relator
[1] Fls. 02-06.
[2] Relatório DCE/INSP.4/2399/08, fls.
18-23.
[3] Fl. 42.
[4] Despacho de fls. 184-185.
[5] Relatório de Instrução n.
1012/2009, fls. 187-193.
[6] FLs. 196-208.
[7] Fls. 210-211.
[8] Fls. 213-214.
[9] Fls. 217-218.
[10] Fls. 220-221.
[11] Fl. 228.
[12] Fls. 223-225.
[13] Fls. 236-239.
[14] Fls. 290-298.
[15] Parecer n. MPTC/1.013/2011, fls.
300-305.