ESTADO DE SANTA CATARINA

 

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

 

GABINETE DO AUDITOR GERSON DOS SANTOS SICCA

 

PROCESSO Nº

REP 11/00190241

UNIDADES GESTORAS

Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC

 Secretaria de Estado da Administração – SEA

RESPONSÁVEIS

Jorginho dos Santos Mello

 Ex-Presidente da ALESC (01/02/2009 a 31/01/2010)

 Gelson Luís Merísio, Presidente da ALESC (01/02/2010 a 31/12/2010 e atual), e Paulo Eli, Ex-Secretário da SEA (24/03/2010 a 31/12/2010)

ASSUNTO:

Concessão de vantagem remuneratória sem amparo constitucional

 

 

 

 

 

 

 

I-FUNDAMENTAÇÃO

 

Tratam os autos de Representação interposta pelo Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas, por meio do Procurador Diogo Roberto Ringenberg, na qual relata possível irregularidade na concessão de vantagem remuneratória a servidores estaduais que tenham exercido mandato eletivo, prevista no §2º do art. 31 da Lei Complementar Estadual nº 485, de 11/01/2010.

De acordo com o Representante, a aludida Lei criou a possibilidade de que servidores públicos estaduais que tenham exercido mandato eletivo continuem a perceber em sua remuneração parcela anteriormente recebida a título de subsídio. Assevera que há notícias de possíveis beneficiados na CIDASC, DEINFRA e DER, e que o Diário Oficial do Estado do dia 11/11/2010 concedeu à professora estadual Odete de Jesus Prestes do Nascimento o direito de ter adicionado ao vencimento do seu cargo efetivo o equivalente a 100% (cem por cento) do valor do cargo de Deputado Estadual.

A Representação aponta as seguintes irregularidades quanto à vantagem prevista na Lei Complementar n° 485/2010: a) inconstitucionalidade formal, fato este relatado na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2010.027007-9/0000-00, proposta pelo Ministério Público Estadual perante o Tribunal de Justiça, em razão da publicação imediata do texto legal, antes da apreciação do veto pelo Legislativo, e de vício de iniciativa; b) nulidade por ausência de estimativa do impacto orçamentário-financeiro, nos termos dos arts. 15 a 17 da Lei Complementar n° 101/2000; c) afronta aos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, pois se caracteriza como vantagem alheia ao cargo exercido pelo servidor público; d) no caso da possível beneficiada, Sra. Odete de Jesus Prestes do Nascimento, a incorporação da vantagem transforma os subsídios em aposentadoria, sem a observância do princípio contributivo, e caracteriza nova modalidade de aposentadoria especial, invadindo o campo normativo da União.

Diante disso, requereu o Representante a concessão de medida cautelar, inaudita altera pars, para que se determine “à Assembléia Legislativa de Santa Catarina se abstenha de conceder a vantagem remuneratória criada pelo parágrafo 2° do art. 31 da Lei Complementar n° 485/2010, e que, caso já tenha iniciado algum pagamento com este fundamento, que o suspenda até decisão final da Corte” (fl. 40).

Propugnou o Representante, ainda, pela comunicação dos fatos ao Ministério Público Federal, para que o órgão, se assim entender pertinente, proponha Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

Os autos foram à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP, que elaborou o Relatório n° 2019/2011 (fls.796-806), cuja conclusão é a que segue:

 

5.1 – Em preliminar, conhecer da denúncia formulada pelo Exmo. Sr. Diogo Roberto Ringenberg, Procurador do Ministério Público de Contas – MPTC/SC, respeitante à irregularidade na concessão de vantagem remuneratória a servidores que tenham exercido mandato eletivo, com supedâneo no art. 31, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010, nos termos dos arts. 65 e 66 da Lei Complementar Estadual – LCE nº 202/2000 c/c arts. 100 a 102 do Regimento Interno deste Tribunal de Contas - Resolução n° TC-06/2001, com as alterações estatuídas pelo art. 5º da Resolução n° TC-05/2005.

5.2 – Diligenciar por ofício as unidades gestoras abaixo, com fulcro no artigo 3º da LCE nº 202/2000, para que encaminhem, no prazo de 30 (trinta) dias, os documentos e esclarecimentos necessários à instrução dos autos, além de outros que assim entenderem:

 

5.2.1- que a Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC providencie:

5.2.1.1- a relação dos servidores estaduais que atualmente ocupam o cargo de Deputado Estadual, juntamente com os licenciados por motivos diversos;

5.2.1.2- os servidores beneficiados e os contracheques já pagos desde a implantação da vantagem pessoal com fulcro no art. 31, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010; e

5.2.1.3- os pareceres e deliberações da Comissão de Tributação e Finanças da ALESC acerca do impacto financeiro e orçamentário do Substitutivo Global do Projeto de Lei nº 0063.0/2009, caso tenham sido elaborados;

5.2.2- que a Secretaria de Estado da Administração – SEA encaminhe:

5.2.2.1- a relação dos servidores públicos que tenham exercido mandato eletivo nas últimas 04 (quatro) legislaturas federais, estaduais e municipais desde 1998, bem como nas legislaturas atuais

5.2.2.2- os atos administrativos concessórios do adicional previsto no art. 31, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010 (apostilas), acompanhados de publicação, e

5.2.2.3- a relação dos servidores estaduais contemplados com a sobredita vantagem pessoal e os contracheques já pagos desde a sua implantação.

5.3- Fixar a urgência na tramitação dos autos, em razão da gravidade das irregularidades elencadas (Itens 2, 3 e 4), conforme estabelecem o art. 127, V, do Regimento Interno c/c art. 45, caput, §3º, V, §§4º e 5º, da Resolução nº TC-09/2002 c/ redação da Resolução nº TC-23/2007;

5.4 – Determinar à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP deste Tribunal, que sejam adotadas as demais providências, incluindo diligências complementares, inspeções e auditorias que se fizerem necessárias junto à Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC e à Secretaria de Estado da Administração – SEA, com vistas à apuração do fato apontado como irregular nos presente autos.

 

Posteriormente, o Deputado Estadual Dirceu Dresch solicitou máxima urgência na apreciação da Representação, e trouxe documentos aos autos. Diante da existência de pedido cautelar, solicitei ao Ministério Público o processo (fls.809-812).

Em parecer lavrado pelo Procurador Geral, Dr. Mauro André Flores Pedrozo, o Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas opinou pelo conhecimento da Representação (fls.814-817).

Determinei a juntada dos documentos enviados pelo Deputado Dirceu Dresch.

Nas Sessões de 04 e 06 de julho do corrente ano o processo foi adiado. Após, a Sra. Odete de Jesus Prestes do Nascimento requereu a juntada de documentos aos autos. Estes versam sobre o seu pleito de ter reconhecido o direito previsto no §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010. Determinei a juntada ao feito.

É o relatório.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

II.1. Quanto aos pressupostos de admissibilidade;

 

A análise dos pressupostos de admissibilidade foi devidamente tratada pela Diretoria de Controle de Atos de Pessoal, de maneira que reproduzo aqui trecho do Relatório n° 2019/2011 (fls. 797-800):

 

Termos em que, o representante, na condição de agente público que, em virtude do cargo ocupado, qual seja, o de procurador do Parquet Especial, obteve o conhecimento de irregularidade na gestão pública, integra o rol de legitimados a noticiar a sua prática ao controle externo concentrado, bem como a responsabilidade a ser apurada refere-se aos gestores da Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC e da Secretaria de Estado da Administração – SEA, ambas sob a jurisdição deste Tribunal de Contas.

O objeto noticiado, de igual modo, ao se referir a vícios de constitucionalidade do diploma legal que sustenta a expedição de atos administrativos concessivos de vantagem funcional, dirigidos à Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010 e à Apostila nº 38 de 11/11/2010, esta última, em favor da servidora aposentada Sra. Odete de Jesus Prestes do Nascimento, matrícula nº 132.639-2-01, inscreve-se na competência do Tribunal de Contas, como ínsito nos arts. 1º, XVI, e 29, §1º, da Lei Complementar Estadual – LCE nº 202/2000, ao qual cumpre decidir sobre representação formulada por agente público, como a que se reporte à ilegalidade ou irregularidade de ato ou contrato por carência de legitimidade e/ou economicidade.

Cuida a representação de expor a inconstitucionalidade formal e material do diploma legal aprovado, desde o processo legislativo até a produção de efeitos concretos, a saber: a invasão de competência em razão da matéria, nos planos estadual e federal; o fracionamento da publicação do texto legal; a subversão ao concurso público; a omissão à prévia estimativa do impacto orçamentário-financeiro; a inobservância aos princípios da moralidade e da impessoalidade; e, por último, a apostila concessória da vantagem pessoal indevida, a contrastar, respectivamente, em ordem, com os arts. 50, §2º, II e IV, e 54, §§4º e 5º, da Constituição Estadual/89 e arts. 37, caput, II, 40, §3º, da Constituição Federal/88 (e alterações posteriores), além de afrontar os arts. 15, 16 e 17 da Lei Complementar Federal nº 101/2000, sendo que ao final limita-se a questionar o §2º do art. 31 da Lei Complementar Estadual nº 485/2010, que abaixo transcreve-se:

LEI Complementar Nº 485, de 11 de janeiro de 2010

 

(...)

Art. 31. As disposições desta Lei Complementar se aplicam aos servidores inativos beneficiados pela paridade entre proventos e vencimentos, nos termos do art. 7º, da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e nos arts. 2º e 3º, parágrafo único, da Emenda Constitucional nº 47, de 05 de julho de 2005, observados os critérios e condições estabelecidos na Lei Complementar nº 83, de 18 de março de 1993, e nas demais normas legais pertinentes.

§1º (...)

§ 2º A vantagem nominalmente identificável decorrente do art. 1º da Lei nº 6.800, de 23 de junho de 1986, será devida na forma estabelecida pela Lei Complementar nº 43, de 20 de janeiro de 1992, calculada de acordo com o inciso I, do art. 1º da Lei Complementar nº 83, de 1993, alterado pelo art. 8º da Lei Complementar nº 112, de 31 de janeiro de 1994, ao servidor público que tenha solicitado a averbação do exercício do mandato eletivo (grifo nosso) nos assentos funcionais do órgão de lotação do seu cargo efetivo, no prazo de 5 (cinco) anos após o término do cumprimento do mandato, cabendo a responsabilidade pelo pagamento da vantagem ao Poder onde se constitui o direito, conforme previsto no art. 2º da Lei Complementar nº 106, de 07 de janeiro de 1994.

(...)

Acerca do controle de constitucionalidade de lei e atos públicos em sede de jurisdição de contas, bem asseverou UADI LAMMÊGO BULOS, in Constituição Federal anotada – 4 ed. rev. atual. até a EC Nº 35/2001, SP: Saraiva, 2002, p. 815, em que se extrai:

“No âmbito das atribuições constitucionais dos Tribunais de Contas, destacadas ao longo dos onze incisos a seguir detalhados, há um aspecto que cumpre ser enfatizado.

Conforme a Súmula 347 do Supremo Tribunal Federal (grifo nosso), ‘o Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público’.

Significa dizer que os Tribunais de Contas, embora não detenham competência para declarar a inconstitucionalidade das leis ou dos atos normativos em abstrato, pois essa prerrogativa é do Supremo Tribunal Federal, poderá, no caso concreto, reconhecer a desconformidade formal ou material de normas jurídicas, incompatíveis com a manifestação constituinte originária.

Sendo assim, os Tribunais de Contas podem deixar de aplicar ato por considerá-lo inconstitucional, bem como sustar outros atos praticados com base em leis vulneradoras da Constituição (art. 71, X). Reitere-se que essa faculdade é na via incidental, no caso concreto, portanto.”

Com efeito, delineiam-se os arts. 149 a 153 do Regimento Interno que disciplinam a processualística do incidente de inconstitucionalidade pelo Tribunal Pleno, cuja deliberação que, por dois terços dos membros, negar cumprimento à lei ou ato considerado inconstitucional, vinculará os julgados vindouros de casos análogos.

Fora juntada farta documentação sobre o alegado, da qual bastam os seguintes indícios de prova, todos fotocopiados: o Projeto de Lei Complementar nº PLC/0063.0/2009 de fls. 181 a 189, dispondo sobre o quadro de pessoal dos serviços jurídicos das autarquias, fundações e outras providências, contendo 23 artigos e 02 anexos; o Substitutivo Global do Projeto de Lei nº 0063.0/2009 de fls. 212 a 226, desta feita, com 37 artigos e 06 anexos, e assim contemplando um universo superior de beneficiários, com aumento de despesa pública, incluindo os servidores que haviam concluído mandato eletivo; a Lei Complementar nº 485 de 11/01/2010 de fls. 73 a 83, reunindo o quantum substituído pelo Poder Legislativo, cujo texto final, publicado no DOE nº 18.764 de 11/01/2010, acusa o veto à alínea “a” do inciso II do art. 20; e a parte faltante/fração do projeto aprovado de fls. 84, diante da derrubada do veto pelos parlamentares, então publicada no DOE nº 18.818 de 31/03/2010.                    

Por oportuno, ainda colhe-se a Ação Direta de Inconstitucionalidade  TJSC nº 2010.02700-9 de fls. 65 a 72, proposta pelo Ministério Público Estadual – MPSC, que aponta os vícios formais e materiais da LCE nº 485/2010, e pede, ao final, a sua declaração de inconstitucionalidade por inteiro; e o extrato de publicação da Apostila nº 38 de 11/11/2010 no DOE nº 18.971 de 17/11/2010 às fls. 62, documento este que materializa a vantagem pessoal de 100% (cem por cento) do valor do cargo de Deputado Estadual à servidora supracitada.

Importa notar que a providência judicial adotada pelo MPSC, muito embora propugne o expurgo integral do diploma legal atacado, dado o elenco de vícios constitucionais que aponta, não ataca o ponto capital ventilado pelo representante do Parquet Especial, qual seja, o §2º do art. 31 da LCE nº 485/2010, que autoriza toda sorte de adição do subsídio de mandato eletivo aos rendimentos do servidor público até 05 (cinco) anos após o exercício, revelando-se, portanto, na instituição de regime estatutário excepcional, atribuído a poucos agentes públicos, sem que se perceba um fundamento plausível, o que, por certo, eleva a importância e a urgência da jurisdição de contas no feito.

Nas informações prestadas ao Tribunal de Justiça às fls. 311 a 323, a ALESC sustenta, em síntese, que cumpriu o devido processo legislativo, sem máculas, cujo substitutivo global ao projeto de origem do Poder Executivo fez-se a título de “inclusão de elementos aperfeiçoadores da espécie”, de modo que o controle de constitucionalidade não pode utilizado como meio de se extirpar “do mundo jurídico o planejamento governamental, com a consequente imposição de seqüelas.”

A Procuradoria Geral do Estado – PGE às fls. 525 a 550, por sua vez, argumenta não haver qualquer vício constitucional, seja formal e/ou material, da LCE nº 485/2010 que possa fomentar a sua exclusão, ainda que parcialmente, da ordem jurídica, e acrescenta que as publicações em épocas distintas de partes do mesmo diploma legal, em face do veto derrubado, não o deslegitima, pois somente afetaria aos aprovados do último concurso público para o cargo de assistente jurídico (Edital nº 001/2010) por ocasião da posse dos convocados, quando então teriam que comprovar a filiação profissional (OAB/SC), por já estar em vigor o texto legal sem vetos, de vez que tal quesito não era exigível por ocasião das provas de seleção de candidatos.

Em que pesem os argumentos a favor e contra a demanda, cumpre-se aprofundar a investigação com as providências legais, dada à relevância da matéria para o regular controle dos gastos com pessoal na administração pública, cujo deslinde reputa-se a momento processual próprio, uma vez reconhecida a admissibilidade do questionamento.”

 

No que concerne à legitimidade para o ingresso da Representação, o Ministério Público, em seu parecer, “invoca preliminar quanto ao titular que representa o Parquet Especial que atua junto ao Tribunal de Contas do Estado”, defendendo o seguinte:

 

“A Lei Complementar 202/2000, no Título IV disciplina o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas. Estabelece no art. 107 que suas funções são exercidas e operacionalizadas pela Procuradoria-Geral junto ao Tribunal de Contas. Fixa no § 1° do art. 107 que a titularidade do Parquet é exercida pelo Procurador-Geral, a quem compete dirigir o órgão. E o art. 108 fixa as competências do Procurador-Geral, admitindo que tais funções, na qual está inserida a de titularidade do Órgão Ministerial, poderá ser delegada (art. 109) por ato do Procurador-Geral ao Procurador-Geral Adjunto e aos Procuradores.

Assim temos no regramento fixado na Lei Orgânica do Tribunal de Contas, as condições de exercício do cargo de Procurador-Geral, inserindo neste regramento a representatitividade, a direção e a titularidade da função.

E dando curso a esta regra principal, o ordenamento jurídico próprio define outras regras que defluem das já citadas acima, disciplinando procedimentos diversos.

Desta forma, configurada a matéria tratada nos autos como representação, necessário observar na própria Lei Orgânica seu disciplinamento, que se encontra no art. 66.

Mas, a regra geral sobre representações está inserida no artigo 66 da Lei Orgânica do TCE, e vale para todos os agentes públicos. Para os procuradores de contas, aplica-se como norma especial o art. 108, caput e inciso I, conforme segue:

 

“Art. 108 - Compete ao Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, em sua missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, além de outras estabelecidas no Regimento Interno, as seguintes atribuições:

I – Promover a defesa da ordem jurídica requerendo, perante o Tribunal de Contas do Estado, as medidas de interesse da justiça, da Administração e do Erário;

 

Nestes termos, o regramento estabelecido na Lei Complementar 202/2000 é claro, ao fixar que em se tratando de matéria a ser representada ao Tribunal, a competência é do Procurador-Geral.

A normatização da Lei Complementar 202/2000 deve ser interpretada, no que pertine ao Ministério Público junto a Tribunal de Contas, a partir da combinação de suas regras com as fixadas no Regimento Interno da Procuradoria Geral junto ao Tribunal de Contas- RI/PGjTCE, que define com clareza as funções dos cargos e as competências privativas do Procurador-Geral.

Assim, o RI/PGjTCE estabelece no art. 18 e 19:

CAPÍTULO I

Das atribuições do Procurador Geral junto ao Tribunal de Contas

Art.18 – compete ao Procurador Geral, em sua missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, as seguintes atribuições:

I – promover a defesa da ordem jurídica requerendo perante o Tribunal de Contas do Estado, as medidas de interesse da Justiça;

CAPÍTULO II

Das atribuições dos Procuradores

Art.19 – O cargo de Procurador, na ordem hierárquica da Procuradoria, vem logo após ao de Procurador Geral, e tem as seguintes atribuições:

I – por delegação do Procurador-Geral:

a)     - praticar um ou todos previstos nos incisos I a VIII do artigo 18 do presente Regimento. (grifamos)

 

Portanto, a prática de atos por Procurador, inclusive a representação ao Tribunal de Contas, dar-se-á na hipótese de existência de ato de delegação do Procurador-Geral.

O expediente encaminhado ao Tribunal de Contas, já configurado como Representação, tem sua origem em ato cuja iniciativa deveria ter a chancela do Procurador-Geral, com fundamento no art. 108, inciso II da Lei Complementar 202/2000 e art. 18, I do RI/PGjTCE.

Neste sentido, diante dos fatos narrados na inicial e expostos no relatório n° 2019/2011, apresentado pela DAP, ostentando indícios de prejuízos ao Erário, este Procurador – Geral, manifesta-se pelo saneamento de eventual vício quanto à capacidade de representação, neste momento, formulada por Procurador deste Ministério Público Especial.

 

O Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas faz referência aos arts. 107, §1°, e 108 da Lei Complementar n° 202/2000. O primeiro preceito define que o Ministério Público é exercido pela Procuradoria-Geral junto ao Tribunal de Contas, enquanto que o último preceito citado define a competência do Procurador-Geral para promover a defesa da ordem jurídica requerendo, perante o Tribunal de Contas do Estado, as medidas de interesse da justiça, da Administração e do Erário.

Além disso, ressalta o disposto no caput do art. 109 da Lei Complementar n° 202/2000, segundo o qual "Ao Procurador-Geral-Adjunto e aos Procuradores junto ao Tribunal de Contas compete, por delegação do Procurador-Geral, exercer as funções previstas no artigo anterior.”

Embora tenha o Procurador-Geral manifestado sua aquiescência com os termos da Representação, o tema atinente à legitimidade do Representante deve ser apreciado, pois a este assiste o direito de ter a devida resposta quanto ao cumprimento dos requisitos de admissibilidade, considerado os termos do petitório por ele submetido à apreciação desta Corte.

Dispõem os arts. 107 e 108 da Lei Complementar n° 202/2000:

 

Art. 107. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ao qual se aplicam os princípios institucionais da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional e administrativa, é exercido pela Procuradoria-Geral junto ao Tribunal de Contas e compõe-se de um Procurador Geral, um Procurador-Geral-Adjunto e três Procuradores, bacharéis em Direito.

(...);

Art. 108. Compete ao Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, em sua missão de guarda da lei e fiscal de sua execução, além de outras estabelecidas no Regimento Interno, as seguintes atribuições:

I - promover a defesa da ordem jurídica requerendo, perante o Tribunal de Contas do Estado, as medidas de interesse da Justiça, da Administração e do Erário;

II - comparecer às sessões do Tribunal e dizer do direito, verbalmente ou por escrito, em todos os processos sujeitos à deliberação do Tribunal, exceto os relativos à matéria administrativa do Tribunal, sendo obrigatória a sua manifestação por escrito nos processos de prestação e tomada de contas e nos concernentes à fiscalização de atos e contratos e de apreciação dos atos de admissão de pessoal e de concessão de aposentadorias, reformas e pensões;

III - promover, junto à Procuradoria-Geral do Estado ou, conforme o caso, perante os dirigentes das entidades jurisdicionadas do Tribunal, no prazo de sessenta dias contados da data do recebimento da documentação respectiva, as medidas previstas no art. 43, inciso II e art. 75 desta Lei, remetendo-lhes as peças processuais, com as orientações necessárias; e

IV - interpor os recursos permitidos em lei.

Art. 109. Ao Procurador-Geral-Adjunto e aos Procuradores junto ao Tribunal de Contas compete, por delegação do Procurador-Geral, exercer as funções previstas no artigo anterior.

 

A conjugação dos arts. 108 e 109 da Lei Complementar n° 202/2000 pode levar a uma inaceitável interpretação que admita a situação de cargo público sem função, o que subverte totalmente a lógica do direito administrativo no que concerne a regime de pessoal. Ora, o art. 108 da Lei Complementar define as competências do Procurador-Geral junto ao Ministério Público, dentre elas a de requerer perante o Tribunal de Contas as medidas de interesse da justiça e de manifestar-se “por escrito nos processos de prestação e tomada de contas e nos concernentes à fiscalização de atos e contratos e de apreciação dos atos de admissão de pessoal e de concessão de aposentadorias, reformas e pensões” Já o art. 109 consigna que as atribuições conferidas ao Procurador-Geral podem ser delegadas aos demais Procuradores. Por outro lado, inexiste preceito que defina as atribuições do Procurador junto ao Tribunal de Contas.

Com isso, se a competência para manifestar-se nos processos em trâmite no Tribunal, de requerer a este medidas no interesse da justiça e do erário, entre outras atribuições, é do Procurador-Geral, e somente por delegação podem ser exercidas pelos Procuradores, conclui-se que a Lei Complementar n° 202/2000 alicerçou um sistema em que o cargo de Procurador do Ministério Público não possui funções previstas em Lei, eis que as funções apenas serão atreladas ao cargo na hipótese de delegação.

Nesse cenário, seria possível que nenhum ato de delegação fosse editado, ou até mesmo que as funções para o cargo fossem previstas apenas no Regimento Interno e delegadas aos Procuradores, utilizando-se para tanto da possibilidade conferida pelo caput do art. 108 de ampliar as competências no ato infralegal.

Dessa forma, o ideal seria que a Lei definisse com precisão quais as competências do Procurador-Geral e dos Procuradores, inclusive para precisar a atribuição referente ao poder de Representação por membros do Ministério Público.

À primeira vista, o formato adotado para a definição das competências dos membros do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas afronta a Constituição Federal, por prever cargos cujas funções são definidas em ato inferior à Lei, editado pelo Chefe do órgão, o que até mesmo pode comprometer a independência funcional ínsita à atividade do Procurador.

De todo modo, a questão constitucional é de elevada indagação, e uma resposta conclusiva nesta oportunidade é desnecessária, pois o Procurador que interpôs a Representação tem nítida legitimidade para requerer medidas a este Tribunal, nos termos do art. 66 da Lei Complementar n° 202/2000. Conquanto os termos da Lei determinem que o requerimento de providências ao Tribunal formulado pelo Ministério Público deva ser feito pelo Procurador-Geral ou por Procurador que tenha recebido delegação deste, nada impede que um membro do Parquet, na condição de agente público que tomou conhecimento de irregularidade, ingresse com Representação.

Isso porque a interpretação dos dispositivos legais não pode levar a conclusões despropositadas, principalmente quando haja franca contrariedade ao desígnio de máxima abrangência da regra que confere a qualquer cidadão, associação, sindicato ou partido político a pretensão de denunciar ao Tribunal de Contas irregularidades ou ilegalidades (art. 74, § 2°, da Constituição Federal). Por via de conseqüência, afrontaria a lógica eventual entendimento que retirasse do Procurador junto ao Ministério Público do Tribunal de Contas o poder de Representação.

Pelo exposto, concluo pelo preenchimento do requisito de admissibilidade quanto à legitimidade, devendo constar como Representante o Dr. Diogo Roberto Ringenberg, na qualidade de agente público que vem a esta Corte relatar irregularidades das quais tomou conhecimento e que merecem a devida apreciação.

 

II.2. Análise do pedido de medida cautelar

 

A Área Técnica referiu a existência de importantes questões constitucionais dignas de análise. Entretanto, considerou ausente o requisito da urgência, tendo suportado sua conclusão nos seguintes argumentos (fl.800):

 

O mesmo não se pode dizer da urgência no deferimento de liminar neste momento, como forma de prevenir a inutilidade de possível provimento condenatório, de vez que os autos padecem de dados concretos sobre o pagamento em curso da vantagem remuneratória vergastada, bem como se trata de despesa de trato sucessivo e por prazo indeterminado, haja vista o vínculo estável dos prováveis beneficiários ao quadro de pessoal da administração pública, o que asseguraria a devolução de recursos públicos indevidamente auferidos acaso a demanda evolua para uma tomada de contas especial.”

 

O provimento requerido pelo Representante requer o enfrentamento da indagação atinente à possibilidade de os Tribunais de Contas utilizarem do poder de cautela.

Primeiramente, é importante dizer que o poder geral de cautela é um instituto ligado estritamente à discricionariedade do julgador, atuando como elemento integrativo da plena eficácia da atividade jurisdicional. Nesse sentido, lembra Humberto Theodoro Júnior que os provimentos de natureza cautelar não se ligam à declaração do direito, tampouco promovem sua realização; têm, antes, natureza instrumental, atendendo de forma temporária e emergencial, “a uma necessidade de segurança, perante uma situação que se impõe como relevante para a futura atuação jurisdicional definitiva”.[1]

No âmbito dos Tribunais de Contas, a utilização do poder geral de cautela é medida indispensável à realização de suas competências fiscalizadoras. Cuida-se da teoria dos poderes implícitos, cunhada pela construção jurisprudencial norte-americana (doutrina dos inherent powers), e que pode ser resumida na ideia de que a Constituição, ao atribuir expressa competência a um ente estatal, confere também os meios e instrumentos necessários à efetivação desse poder, ainda que de maneira implícita.

Assim, o Tribunal de Contas, de forma análoga àquele pertencente ao Poder Judiciário, pode se utilizar de medida cautelar com o fito de garantir a eficácia do provimento final.

Essa possibilidade foi assentada pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do Mandado de Segurança nº 24.510/DF. Naquela ocasião, o Min. Celso de Mello apresentou o seguinte voto:

Entendo, Senhor Presidente, que o poder cautelar também compõe a esfera de atribuições institucionais do Tribunal de Contas, pois se acha instrumentalmente vocacionado a tornar efetivo o exercício, por essa Alta Corte, das múltiplas e relevantes competências que lhe foram diretamente outorgadas pelo próprio texto da Constituição da República.

Isso significa que a atribuição de poderes explícitos, ao Tribunal de Contas, tais como enunciados no art. 71 da Lei Fundamental da República, supõe que se reconheça, a essa Corte, ainda que por implicitude, a possibilidade de conceder provimentos cautelares vocacionados a conferir real efetividade às suas deliberações finais, permitindo, assim, que se neutralizem situações de lesividade, atual ou iminente, ao erário público.

Impende considerar, no ponto, em ordem a legitimar esse entendimento, a formulação que se fez em torno dos poderes implícitos, cuja doutrina, construída pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América, no célebre caso McCULLOCH v. MARYLAND (1819), enfatiza que a outorga de competência expressa a determinado órgão estatal importa em deferimento implícito, a esse mesmo órgão, dos meios necessários à integral realização dos fins que lhe foram atribuídos.

[...]

Na realidade, o exercício do poder de cautela, pelo Tribunal de Contas, destina-se a garantir a própria utilidade da deliberação final a ser por ele tomada, em ordem a impedir que o eventual retardamento na apreciação do mérito da questão suscitada culmine por afetar, comprometer e frustrar o resultado definitivo do exame da controvérsia. (grifo nosso)

 

Diante do precedente, são desnecessárias maiores digressões. É evidente, portanto, que não há óbice ao deferimento, por esta Corte de Contas, de medida de tal natureza, haja vista que o entendimento em sentido contrário impede esta Casa de exercer suas atribuições de forma plena, especialmente em matérias como a dos presentes autos, cujo possível impacto financeiro ao erário demanda atuação imediata.

Em que pese a ausência de disposição expressa no Regimento Interno desta Corte, tal qual ocorre no Tribunal de Contas da União[2], são perfeitamente aplicáveis, de maneira subsidiária, as disposições gerais do Código de Processo Civil, conforme autoriza o art.  308 do Regimento Interno deste Tribunal de Contas. Nesse momento, imperioso mencionar as expressas previsões dos artigos 797 e 804 do CPC, que autorizam a concessão de medida cautelar como forma de preservar a eficácia da decisão.

Para que o julgador utilize-se da medida, dois são os requisitos previstos pela legislação pátria, indissociáveis para a concessão da medida cautelar: o fumus boni iuris, ou seja, hão de serem plausíveis os argumentos invocados pelo demandante, e o periculum in mora, que se reflete na iminência de lesão irreparável ou de difícil reparação ao direito demandado. Ambos os requisitos hoje consagrados na lei processual brasileira já eram observados no art. 7º da antiga Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 1.533/51).

Ressalte-se que os citados artigos permitem, inclusive, o deferimento sem a oitiva da parte contrária. Apesar de a hipótese constituir exceção, isso decorre da própria natureza jurídica do provimento cautelar. Sendo ele de caráter precário, emergencial e temporário, pode ocorrer que as circunstâncias fáticas demandem uma atuação imediata, incompatível com a abertura de prazo à manifestação da parte. Ressalte-se que, ante a natureza apenas assecuratória da medida, não há prejuízo à ampla defesa e ao contraditório da parte, uma vez que estes lhe serão garantidos em momento oportuno.

Em caso análogo[3], o Tribunal de Contas da União firmou entendimento, à luz da própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a medida cautelar,

[...] dada sua precariedade, não representa um juízo definitivo acerca da matéria. Assim, no decorrer do feito, haverá oportunidade de assegurar a ampla defesa e o contraditório, que serão ofertados por este Tribunal por ocasião da análise do mérito do relatório de auditoria e das justificativas que vierem a ser apresentadas pela Valec e pelas empresas contratadas. (grifo nosso)

 

Assentada a possibilidade de concessão de cautelar em processo na esfera de jurisdição dos Tribunais de Contas, passo a apreciar o cumprimento dos requisitos exigidos para da medida.

No que toca ao fumus boni iuris, observo a presença de irregularidades na vantagem criada em benefícios de servidores que tenham exercido mandato parlamentar.

O Governador do Estado enviou à Assembleia Legislativa o Projeto de Lei n° PLC/0063.0/2009 (fl. 177), cujo texto dispunha sobre o quadro de pessoal dos serviços jurídicos das autarquias e fundações, além de outras providências. O texto do Projeto de Lei (fls. 181-188) em nenhum momento dispôs sobre a vantagem questionada pela Representação, que surgiu no “Substitutivo Global” ao Projeto, proposto em 09/12/2009 (fls.212-224 e 289).

Assim, a documentação acostada aos autos demonstra a ocorrência de vício de iniciativa, eis que a proposição de origem legislativa que implique aumento de despesa viola o inciso I do art. 52 da Constituição Estadual, principalmente porque o dispêndio criado não tem como fonte de recursos a anulação de despesas (art. 122, § 4°, da Constituição Estadual). Por outro lado, ainda que se entenda que o pagamento venha a ser feito pelo Legislativo, a irregularidade assumirá ainda maior gravidade, pois estará sendo criada vantagem a servidores que sequer fazem parte do quadro funcional da Assembleia.

Por outro lado, conforme o art. 15 da Lei Complementar n° 101/2000 serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesas ou assunção de obrigações que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17 da mesma Lei, preceitos esses que estatuem o seguinte:

 Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:

I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;

II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições.

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.

§ 3º Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 4º As normas do caput constituem condição prévia para:

I - empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens ou execução de obras;

II - desapropriação de imóveis urbanos a que se refere o § 3º do art. 182 da Constituição

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.”

 

Afora isso, há outro aspecto que indica a irregularidade da vantagem criada. Para que se possa compreender adequadamente a questão, é fundamental que se esclareça o significado do disposto no §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485, de 11 de janeiro de 2010, cuja redação possui a complexidade habitual em preceitos legais que criam vantagens contrárias à isonomia.

 Estabelece o aludido preceito:

 

“Art. 31. (...).

§ 2º A vantagem nominalmente identificável decorrente do art. 1º da Lei nº 6.800, de 23 de junho de 1986, será devida na forma estabelecida pela Lei Complementar nº 43, de 20 de janeiro de 1992, calculada de acordo com o inciso I, do art. 1º da Lei Complementar nº 83, de 1993, alterado pelo art. 8º da Lei Complementar nº 112, de 31 de janeiro de 1994, ao servidor público que tenha solicitado a averbação do exercício do mandato eletivo nos assentos funcionais do órgão de lotação do seu cargo efetivo, no prazo de 5 (cinco) anos após o término do cumprimento do mandato, cabendo a responsabilidade pelo pagamento da vantagem ao Poder onde se constitui o direito, conforme previsto no art. 2º da Lei Complementar nº 106, de 07 de janeiro de 1994.”

 

O texto normativo objeto de análise remete a cinco leis, sem externar na sua redação qual a vantagem de que está tratando, o que, obviamente, obstaculiza sobremaneira a captação do sentido da regra por pessoas que não se debrucem atentamente sobre ela. A seguir, passa-se a destrinchar o significado do preceito.

A primeira referência feita pelo § 2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010 é ao art. 1º da Lei Estadual nº 6.800, de 23 de junho de 1986. Infelizmente, a expectativa do leitor de buscar no art. 1º a identificação cristalina da dita vantagem nominalmente identificável não é facilmente atingida com a simples leitura dos seus termos, isso porque o artigo trata da alteração dos artigos 42, 49, 81, 89 e 90 da Lei nº 6.745, de 28 de dezembro de 1985 (estatuto dos servidores públicos do Estado de Santa Catarina), conferindo nova redação aos mesmos. Eis o texto do mencionado art. 1º:

 

“Art. 1º Os artigos 42, 49, 81, 89 e 90 da Lei nº 6.745, de 28 de dezembro de 1985, ficam acrescidos dos seguintes parágrafos:

“Art. 42.

................................................................................................................

...........................................................................................................................................................

§ 2º Para efeito de Licença-Prêmio, considerar-se-á o tempo de serviço prestado ao Estado em suas Fundações, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Autarquias.

...............................................................................................................................

Art.49. ...................................................................................................................

Parágrafo único. É garantida a promoção por tempo de serviço e a progresso por merecimento a funcionários estatutários à colocados à disposição de Empresas ou órgãos vinculados ou subordinados às Secretarias de Estado e ao Gabinete do Governador que estejam no exercício de cargo em comissão.

...............................................................................................................................

Art.81. ...................................................................................................................

Parágrafo único. Ficam assegurado o salário mínimo profissional de acordo com o fixado em Lei.

...............................................................................................................................

Art. 89. ..................................................................................................................

...........................................................................................................................................................

§ 1º A hora noturna será considerada de cinqüenta e dois minutos.

...............................................................................................................................

 

 

Art.90. ...................................................................................................................

...........................................................................................................................................................

§ 6º Para os efeitos do previsto no “caput” deste artigo e no item II, considerar-se-á cargo em comissão o exercício pelo funcionário público no cumprimento de mandato eletivo que exija o seu afastamento.”

 

A única referência feita pelas redações apresentadas pelo art. 1º da Lei nº 6.800/86 a mandato eletivo está no então novo texto do §6º do art. 90 da Lei nº 6.745/85.

O art. 90 da Lei nº 6.745/85, que permitia a agregação pelo servidor público de valor referente a cargo comissionado ou função de confiança desde que transcorrido determinado período de tempo foi revogado pela Lei Complementar nº 36/91, o que significou lúcida intervenção do legislador, já que é notório o impacto financeiro que essa modalidade de vantagem traz aos cofres públicos.

Pois bem. O art. 90 previa no seu inciso II que no caso de cargo comissionado o valor a ser considerado seria a diferença do valor referente a este e o vencimento do cargo efetivo.

A leitura conjunta do inciso II do art. 90 com o §6º do mesmo artigo, incorporado a ele pela Lei nº 6.800/86, já demonstra a incrível benesse concedida aos detentores de mandato eletivo já nos idos de 1986. Sendo o “cumprimento de mandato eletivo” considerado “cargo comissionado”, criou-se para parlamentares o direito de agregar parcelas da sua remuneração ao vencimento do cargo efetivo!

Essa, portanto, é a vantagem nominalmente identificável a que se refere o indigitado §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010. O art. 90 da Lei n٥ 6.745/85 foi revogado em 1991, e aqueles que incorporaram vantagens com base no preceito mantiveram-na como vantagem pessoal, a fim de preservar o direito adquirido. Obviamente, não há que se falar em agregação quanto a períodos posteriores a 1991.

Seguimos na tentativa de descortinar o significado do §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010. O preceito estatui que a “vantagem nominalmente identificável decorrente do art. 1º da Lei nº 6.800, de 23 de junho de 1986”, que nada mais é do que a agregação de parcelas da remuneração de parlamentar, “será devida na forma estabelecida pela Lei Complementar nº 43, de 20 de janeiro de 1992”. Esta Lei tratou da vantagem nominalmente identificada, prevendo seu pagamento aos servidores públicos, e o seu cálculo observou o inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 83/93 (preceito também mencionado no §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010). Dispôs o inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 83/93:

 

Art.1º É facultado ao servidor público estadual optar, no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da vigência da presente Lei Complementar, pela nova fórmula de cálculo da Vantagem Nominalmente Identificável, a seguir definida, em substituição ao critério determinado no § 1º, do artigo 3º, da Lei Complementar nº 43, de 20 de janeiro de 1992 e alterações posteriores:

I - para as incorporações decorrentes do exercício de cargo comissionado, inclusive substituições - o valor da vantagem corresponderá à diferença entre o valor de vencimento do cargo de provimento comissionado, conforme valores fixados na tabela constante do Anexo I, desta Lei Complementar, e o valor de vencimento do cargo de provimento efetivo acrescido da Gratificação de Atividade no Serviço Público; e

 

Posteriormente, o art. 8º da Lei Complementar nº 112/1994 alterou o inciso I do art. 1º acima citado, que passou a ter a seguinte redação:

 

"(...);

I para as incorporações decorrentes do exercício de cargo comissionado, inclusive substituições, o valor da vantagem corresponderá à diferença entre o valor do vencimento do cargo de provimento comissionado, conforme valores fixados na tabela constante do Anexo I, desta Lei Complementar, e o valor de vencimento do cargo de provimento efetivo acrescido da Gratificação Complementar de Vencimento; e"

 

Feita a devida digressão, é possível visualizar a natureza da vantagem concedida aos detentores de mandato eletivo.

Primeiro, o art. 90 da Lei nº 6.745/85 previu a agregação de parcelas decorrentes do exercício de função gratificada ou cargo comissionado. A Lei nº 6.800/86 equiparou a este o mandato eletivo.

Em 1991, a Lei Complementar nº 36 eliminou a possibilidade de agregação de qualquer valor a título de exercício de função gratificada ou cargo comissionado.

Em 1992, a Lei Complementar nº 43, no intento de abolir qualquer forma de vinculação ou equiparação e preservar o direito adquirido daqueles que já haviam obtido a agregação, passou a manter o pagamento dessas parcelas, apenas para quem já havia adquirido o direito, a título de vantagem pessoal nominalmente identificável. Em suma, manteve-se o valor nominal, totalmente desvinculado da remuneração do cargo comissionado ou função gratificada que serviu de base â agregação.

Em 2010, a Lei Complementar nº 485/2010 procurou alterar a natureza jurídica da vantagem pessoal nominalmente identificável prevista na Lei nº 43/92. Estranhamente, o legislador deixou de tratá-la como parcela desvinculada de cargo comissionado ou função gratificada e passou a considerá-la como instituto jurídico destinado a garantir a agregação de valor percebido em razão de mandato eletivo, e isso para períodos posteriores a 1991, quando foi extinta essa modalidade de vantagem.

Ora a única interpretação juridicamente possível para o §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010 seria a que vê no preceito o reconhecimento de algo que já havia sido garantido pela Lei Complementar nº 43/92. Senão vejamos.

A vantagem pessoal decorrente do art. 1º da Lei nº 6.800/86, mencionada no artigo acima mencionado, nada mais é do que a parcela agregada a título de exercício de função gratificada ou cargo comissionado.

Como o art. 1º da Lei nº 6.800/86, no que toca à matéria aqui tratada, apenas incluiu o §6º ao art. 90 da Lei nº 6745/85, para equiparar mandato eletivo a exercício de cargo comissionado, com isso ampliando a incidência da regra da agregação, e como o art. 90 foi revogado pela Lei Complementar nº 36/91, pode-se dizer, com total segurança, que a suposta vantagem do art. 1º da Lei nº 6.800/86 não existe como vantagem autônoma, de modo que a revogação do art. 90 representou também a revogação do seu § 6º, inserido por aquela Lei.

Fácil concluir que a vantagem nominalmente identificável tratada no §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010 somente é devida a quem agregou a vantagem na forma do art. 90 da Lei nº 6.745/85 e até a data de sua revogação. Pretender abarcar períodos de mandato eletivo posteriores a 1991 significa trazer de volta o art. 90, o que é absolutamente inadmissível, já que o mesmo foi expressamente revogado.

Logo, aplica-se o art. 90 da Lei nº 6.745/85, inclusive com o seu §6º, incluído pela Lei nº 6.800/86, apenas para períodos de mandato eletivo anteriores a sua revogação.

Quanto ao texto do §2º do art. 31 da Lei Complementar nº 485/2010, trata-se de letra inócua, pois o art. 1º da Lei nº 6800/86 simplesmente incluiu parágrafo ao art. 90 da Lei nº 6.745/85 e, revogado este, também deixou de existir no mundo jurídico. Ainda que se queira defender que a Lei nº 485/2010 expressamente previu a repristinação do art. 1º da Lei nº 6.800/86, agindo nos termos §3º do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil, não o teria feito em relação ao restante do art. 90 da Lei nº 6.745/85, que sem sombra de dúvida continua revogado.

Portanto, mesmo na defesa de uma suposta repristinação operada pela Lei Complementar nº 485/2010 não há que se falar no mesmo efeito quanto à regra que previu a agregação. Logo, teria voltado a vigorar o §6º do art. 90, que equiparou o exercício de mandato eletivo ao de cargo comissionado, mas não o caput e os seus demais parágrafos, que estatuíam o direito à agregação e os termos em que isso ocorreria.

Como se pode facilmente verificar após a leitura da legislação pertinente, o art. 1º da Lei nº 6.800/86 jamais criou vantagem pessoal nominalmente identificável. Da mesma forma, isoladamente a regra não possui qualquer significado, pois serviu apenas para incluir um parágrafo ao art. 90, esse sim o que definiu em seu caput o direito â agregação. Sem o caput, trazer de volta qualquer um dos seus parágrafos não significa nada, pois inexiste atualmente regra que preveja a agregação. O que há é apenas a previsão de vantagem pessoal nominalmente identificável, cujo valor original era o referente à agregação obtida por exercício de função gratificada ou cargo comissionado antes da revogação expressa do art.90 da Lei nº 6.745/85.

Em suma, afora questões pertinentes ao juízo de constitucionalidade que necessariamente deve ser formulado em relação ao §2º do art. 31 da Lei Complementar 4852010, é assente que a invocação do art. 1º da Lei nº 6.800/86 apenas pode servir para reafirmar o direito daqueles que já agregaram por períodos anteriores a 1991. Para períodos posteriores, a novel legislação representa regra sem nexo, que por acessória depende necessariamente da sua vinculação a uma regra principal criadora de determinada vantagem. Inexistente a regra principal, a eventual repristinação do §6º da Lei nº 6.800/86 criou norma que vagará no sistema jurídico sem qualquer aplicabilidade. Sem dúvida, uma criação que, além de confusa, agrediu os mais comezinhos mandamentos da técnica legislativa.

Não salva a norma o fato dela se referir a regras que definiram a vantagem pessoal nominalmente identificável e a sua forma de cálculo. Ora, em todas elas é evidente a referência à agregação na forma do art. 90 da Lei nº 6.745/85. Logo, para agregações por períodos anteriores a sua revogação.

Pretender incluir na vantagem nominalmente identificada períodos posteriores configura inexplicável enxerto, desnaturando totalmente o regime das agregações que vigorou até 1991, bem como as subseqüentes regras que protegeram os direitos adquiridos.

Caso intentasse o legislador retornar ao passado, para ressuscitar o instituto da agregação, deveria tê-lo feito expressamente, prevendo o período de tempo necessário para a obtenção da vantagem e as condições para tanto. O que não se deve tolerar é a inserção de regra obscura e cuja melhor interpretação cria uma verdadeira monstruosidade jurídica para daí extrair-se determinado direito.

Dessa forma, há fortes elementos de denotam a irregularidade da vantagem criada pelo § 1° da Lei Complementar n° 485/2010, de modo que presente o fumus boni iuris exigível para a concessão da medida cautelar.

Superado este ponto, indaga-se sobre a presença do periculum in mora.

A Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP considerou ausente o requisito, isso porque não há dados concretos sobre o pagamento da vantagem. Além disso, os servidores possuem vínculo permanente com a administração pública, o que asseguraria a devolução dos valores.

Todavia, não posso acompanhar o posicionamento do Corpo Instrutivo.

Em primeiro lugar, há a devida comprovação de que a Lei já está sendo aplicada, como prova o documento de fl. 12. Mediante a Apostila n° 38, de 11/11/2010, o Secretário de Estado da Administração à época, Sr. Paulo Eli, concedeu à ODETE DE JESUS PRESTES DO NASCIMENTO “o direito de ter adicionado ao vencimento do cargo efetivo, passando a integrá-lo para todos os efeitos legais a importância equivalente a 100% (cem por cento) do valor do cargo do Deputado Estadual da estrutura da Assembléia Legislativa de Santa Catarina, nos termos do artigo 90, da Lei n°, da Lei n° 6.745/85, com § 6°, acrescido pela Lei n° 6.800/86, com nova redação dada pelo artigo 24 da Lei n° 7373/88, o artigo 219 da Lei n° 6.844/96, e nos termos do artigo 31, § 2° da Lei Complementar n° 485/2010.”

Quanto a este ato, relatado na Representação, há prova concreta da aplicação da Lei, cujos termos evidenciam sua ilegitimidade. Logo, nada impede que quanto a este ato possa a Corte de Conta deliberar, sem prejuízo de posterior apuração de outros atos que deram aplicação à Lei, sendo recomendável, inclusive, que se busque junto à Secretaria de Estado da Administração as informações necessárias para garantir a efetiva proteção do Erário Público.

O segundo argumento apontado pela Instrução também não procede. São notórias as dificuldades para recompor o Erário Público nos casos de vantagens irregulares concedidas aos servidores públicos, principalmente em razão da ampla aplicação do princípio da boa-fé, que praticamente impede o estorno de qualquer quantia à administração pública. Cabe lembrar que persiste neste Tribunal discussão sobre a extensão da responsabilidade em casos dessa ordem, inclusive com argumentos sobre a inviabilidade de imputar-se débito ao gestor que não foi diretamente beneficiado com os pagamentos. Por via de consequência, caso isentado o gestor, e com a incidência do princípio da boa-fé, o que impede a cobrança dos valores junto aos servidores, restará o erário público totalmente desprotegido.

Nesse contexto, é fundamental que o Tribunal de Contas adote todos os meios juridicamente admissíveis para cessar prontamente a irregularidade e evitar o dano irreparável, diante da evidente dificuldade de estornar os valores aos cofres públicos. Os pagamentos à servidora beneficiada pela Apostila n° 38 estão sendo feitos regularmente, e a extensão do dano amplia-se a cada mês, o que determina a pronta intervenção desta Corte.

Cabe considerar que afronta a melhor interpretação do direito a total desconsideração da supremacia do interesse público. A servidora beneficiada pela Apostila n° 38 continuará recebendo a remuneração inerente ao seu cargo até a decisão final. Na eventualidade de reversão da cautelar, terá direito a receber os valores que não lhe foram pagos em virtude da decisão deste Tribunal.

A concessão da medida cautelar inaudita altera pars, além de juridicamente admissível, não trará prejuízos ao exercício do contraditório e da ampla defesa, eis que as partes envolvidas serão chamadas ao processo, para que possam produzir provas no momento oportuno e, caso queiram, recorrer da decisão.

Dessa forma, neste momento já se pode identificar a responsabilidade pelo ato e a beneficiária, pelo que é possível o deferimento de medida cautelar, sem prejuízo de eventual ampliação de seu alcance em momento posterior, na hipótese em que comprovados outros atos que deram aplicabilidade à Lei.

Ademais, a medida cautelar, além de determinar a cessação do pagamento decorrente da Apostila n° 38, da Secretaria de Estado da Administração, deve impedir a aplicação da Lei pelo administrador a partir desta data.

Quanto à identificação do Responsável nesta fase processual, apenas para efeito de cumprimento da medida cautelar, a determinação deve ser dirigida ao agente da administração que editou determinado ato calcado em Lei acoimada de vícios que maculam sua legitimidade, bem como ao ordenador de despesa da Assembleia Legislativa, para que não haja pagamento com fundamento na norma ora questionada.

Por outro vértice, deve-se dar ciência da Decisão à Sra. Odete de Jesus Prestes do Nascimento, a fim de que possa acompanhar o feito, respeitando-se assim o contraditório e a ampla defesa, e, caso queira, adote as medidas que considere necessárias.

 

 

 

 

 

III – PROPOSTA DE VOTO

 

Estando os autos instruídos na forma regimental, submeto a presente matéria ao Egrégio Plenário, propugnando, com fundamento no parágrafo 3º do art. 96 da Resolução nº TC-06/2001, alterado pelo art. 4º da Resolução nº TC-05/2005 e Instrução Normativa nº TC-01/2002, pela adoção da seguinte Proposta de Voto:

6.1. Conhecer da Representação, que versa sobre irregularidades quanto à vantagem pessoal concedida pelo §2° do art. 31 da Lei Complementar Estadual n° 485/2010 a servidores que tenham exercido mandato eletivo, por preencher os pressupostos de admissibilidade previstos no art. 65 e 66 da Lei Complementar n° 202/2000.

6.2. Conceder a medida cautelar, com fulcro no poder geral de cautela reconhecido ao Tribunal de Contas, no art. 308 do Regimento Interno da Corte e, por analogia, na Instrução Normativa n° 05/2008, para determinar ao Secretário de Estado da Administração, Sr. Milton Martini e ao Sr. César Luiz Belloni Faria, Consultor Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, que, até decisão ulterior deste Tribunal:

6.2.1. adotem as medidas necessárias para suspender o pagamento da vantagem concedida à servidora Odete de Jesus Prestes do Nascimento pela Apostila n° 38, de 11 de novembro de 2010, dando ciência do ato suspensivo à beneficiária e comunicando as providências a este Tribunal no prazo de 15 dias, a contar da comunicação da Decisão;

6.2.2. abstenham-se de aplicar o §2° do art. 31 da Lei Complementar Estadual n° 485/2010, para o fim de conceder qualquer vantagem a servidor público com fundamento no aludido preceito ou determinar pagamento sob o mesmo título;

 

6.3. Diligenciar por ofício as unidades gestoras abaixo, com fulcro no artigo 3º da Lei Complementar Estadual nº 202/2000, para que encaminhem, no prazo de 30 (trinta) dias, os documentos e esclarecimentos necessários à instrução dos autos, além de outros que assim entenderem:

 

6.3.1. Que o Sr. César Luiz Belloni Faria, Consultor Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC providencie:

 

6.3.1.1. a relação dos servidores estaduais que atualmente ocupam o cargo de Deputado Estadual, juntamente com os licenciados por motivos diversos;

 

6.3.1.2. os servidores beneficiados e os contracheques já pagos desde a implantação da vantagem pessoal com fulcro no art. 31, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010;  

 

6.3.1.3. os pareceres e deliberações da Comissão de Tributação e Finanças da ALESC acerca do impacto financeiro e orçamentário do Substitutivo Global do Projeto de Lei nº 0063.0/2009, caso tenham sido elaborados;

 

6.3.2. que o Sr. Milton Martini, Secretário de Estado da Administração – SEA encaminhe:

6.3.2.1. a relação dos servidores públicos que tenham exercido mandato eletivo nas últimas 04 (quatro) legislaturas federais, estaduais e municipais, bem como nas legislaturas atuais;

 

6.3.2.2. os atos administrativos concessórios do adicional previsto no art. 31, §2º, da Lei Complementar Estadual nº 485 de 11/01/2010 (apostilas), acompanhados de publicação;

 

6.3.2.3. a relação dos servidores estaduais contemplados com a sobredita vantagem pessoal e os contracheques já pagos desde a sua implantação.

6.4. Fixar a urgência na tramitação dos autos, em razão da gravidade das irregularidades elencadas (Itens 2, 3 e 4), conforme estabelecem o art. 127, V, do Regimento Interno c/c art. 45, caput, §3º, V, §§4º e 5º, da Resolução nº TC-09/2002 c/ redação da Resolução nº TC-23/2007, a fim de que a Diretoria de Controle de Atos de Pessoal –DAP realize a devida instrução processual e identifique os Responsáveis.

6.5. Determinar à Diretoria de Controle de Atos de Pessoal – DAP deste Tribunal, que sejam adotadas as demais providências, incluindo diligências complementares, inspeções e auditorias que se fizerem necessárias junto à Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina – ALESC e à Secretaria de Estado da Administração – SEA, com vistas à apuração do fato apontado como irregular nos presente autos.

6.6. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Proposta de Voto do Relator, bem como da inicial da Representação e do Relatório n° 2019/2011 (fls.796-806), ao Representante, Procurador Diogo Roberto Ringenberg, ao Sr. César Luiz Belloni Faria, Consultor Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, ao Sr. Milton Martini, Secretário de Estado da Administração, e à Sra. Odete de Jesus Prestes do Nascimento, servidora pública estadual, CPF n°  339.475.119-49, residente e domiciliada à rua  São José, n. 176, apto 801, Balneário, Florianópolis/SC, CEP 88075-310.

 

 

                                               Gabinete, em 08 de julho de 2011.

 

 

Auditor Gerson dos Santos Sicca

Relator

 



[1] Theodoro Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2, 42ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 543

[2] O artigo 276 Regimento Interno do TCU prevê expressamente a possibilidade de expedição de medidas cautelares para prevenir lesão ao erário e garantir a efetividade de suas decisões.

[3] AC-0593-12/09-P, Rel. Min. Aroldo Cedraz, Sessão de 01/04/09.