ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

 

PROCESSO:             REC 09/00552174

UG/CLIENTE:                       Prefeitura Municipal de Barra Velha

RESPONSÁVEL:      João Pedro Woitexem – Ex-Assessor jurídico

                                      Valter Marina Zimmermann – Ex-Prefeito

                                      Eurides dos Santos – Ex-Assessor Jurídico contratado

INTERESSADO:       João Pedro Woitexem

ASSUNTO:                 Recurso de Reconsideração contra Decisão n.º 1056/2009 proferida nos autos do processo TCE 02/07330387

 

 

 

RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. DÉBITO. MULTA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. CONVITE. EDITAL. PUBLICIDADE.

1. Em razão do disposto no art. 4º da Lei n.º 9.527/97, na Administração Pública os honorários de sucumbência pertencem ao Poder Público, ressalvada a hipótese de contratação de advogados em contrato de risco ad exitum.

 

 

 

I - RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Senhor João Pedro Woitexem, ex-assessor jurídico do Município de Barra Velha nomeado para o exercício de cargo comissionado no ano de 2002, contra o Acórdão n. 1056/2009, publicado no DOTC-e de 12/08/2009, proferido nos autos do processo TCE n.º 02/07330387 que julgou irregulares com imputação de débito a Tomada de Contas Especial referente às irregularidades constatadas em auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Barra Velha, em decorrência de Denúncia formulada a esta Corte de Contas, e condenou o responsável ao pagamento de R$ 6.941,91 (seis mil novecentos e quarenta e um reais e noventa e um centavos), referente ao recebimento de honorários advocatícios de sucumbência indevidamente, pertencentes à Fazenda Pública, caracterizando renúncia de receita, em contrariedade aos princípios da eficiência e da economicidade.

Os autos foram encaminhados à Consultoria Geral - COG que, por meio do parecer n. 91/2011 (fls. 28/40), manifestou-se pelo conhecimento e no mérito negar provimento.

O Ministério Público Especial, por meio do parecer n. 2836/2011 (fls. 41), acompanhou o entendimento adotado pela COG.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

 

II – DISCUSSÃO

 

Ab initio, o presente recurso merece ser conhecido, uma vez que o responsável possui legitimidade para recorrer, o reclamo é adequado e tempestivo. A decisão combatida foi publicada no DOTC-e n. 312, em 12/08/2009 e o recurso foi oferecido em 25/08/2009, respeitado, pois, o trintídio legal.

Passo ao exame da questão devolvida à Corte.

II. 1 Débito em razão dos honorários de sucumbência percebidos indevidamente pelo advogado  João Pedro Woitexem.

Alega o recorrente que os honorários de sucumbência percebidos por advogado empregado podem ser negociados com seu constituinte, e não havendo disposição legal em contrário, dividindo os honorários, pertencem sim ao advogado da parte vencedora (recorrente). Aduz que a decisão ofende Lei Federal (n.º 8.906/94) e Constituição, uma vez que se trata de verba de natureza alimentar.

Seguindo posicionamento desta casa, emanado dos Prejulgados 1199[i],1700, 1740 e 1982[ii], a COG manteve o débito imputado ao responsável.

O recorrente, Sr. João Pedro Woitexem, foi admitido no Município, por meio da Portaria n.º 071/2002 (fl.16) para exercer o cargo em Comissão de Assessor Jurídico, conforme Lei Municipal n.º 299/2001 (fl.10).

O valor do débito, imputado em solidariedade ao Prefeito Municipal, diz respeito ao montante de honorários de sucumbências percebidos pelo recorrente na condição de representação judicial da Fazenda Municipal, valores que recebeu em concomitância com a contraprestação dos serviços prestados e a remuneração do cargo em comissão.  

A tese defendida no prejulgado 1199 e 1740 admite a percepção, pelos advogados contratados, dos honorários de sucumbência como forma de remuneração, desde que esta seja a única forma de pagamento pelos serviços prestados, e que seja objeto de um contrato de risco (ad exitum). Em relação aos advogados ocupantes de cargo público (provimento efetivo ou em comissão) a regra da não percepção dos honorários sucumbenciais advém do disposto no art. 4.º da Lei n.º 9.527/97, que excluiu a aplicação do Capítulo V, Título I, do Estatuto da Advocacia à Administração Pública de União, dos Estados do Distrito Federal e dos Municípios.

Não havendo aplicação do art. 21 do Estatuto da Advocacia[iii] aos advogados servidores públicos, o STF, no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n.º 205787/RS, interpretando a contrario sensu o disposto no art. 21 afirmou que nas causas onde for parte o empregador, ou pessoa por este representada, os honorários de sucumbência revertem-se em favor do próprio empregador e não ao advogado empregado.

Desta interpretação se extrai a natureza de receita pública dos honorários de sucumbência quando for parte vencedora a Fazenda Pública, uma vez que eles não são excluídos, mas devido à pessoa diversa do advogado empregado.

No mesmo sentido o STJ se manifestou nos seguintes julgados: Agravo Regimental no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 970240/SC, j.16/11/2010; Resp 848517/PR, j.13/11/2007; Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 824399/GO, j. 24/04/2007; Resp 668.586/SP, j. 3/10/06, sendo o mesmo entendimento defendido no âmbito do Tribunal de Contas da União.

Poder-se-ia argumentar também que o disposto no art. 24, §3º do Estatuto declara nula qualquer disposição que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência, entretanto o próprio Supremo já declarou inconstitucional este dispositivo, em razão da interpretação conforme que se conferiu ao art. 21 e seu parágrafo único, onde preserva a liberdade contratual quanto à destinação destes honorários fixados judicialmente (ADIN 1.194-4, j.11/09/09).

Assim, ao contrário do alegado pelo recorrente, existe disposição legal expressa em sentido contrário, art. 4.º da Lei n.º 9.527/97, acerca da percepção dos honorários de sucumbência.

Por todo o exposto, não há motivos para alteração do entendimento exarado na Decisão n.º 1056/2009, que determinou a devolução aos cofres públicos dos valores percebidos pelos procuradores judiciais do Município a título de honorários de sucumbência, em solidariedade ao Prefeito Municipal, valores estes que pertencem ao patrimônio da municipalidade.

 

III – VOTO

Ante o exposto, considerando as razões expendidas, o Parecer nº COG 91/2011 e o Parecer nº MPTC 2836/2011, proponho ao Egrégio Plenário a adoção do seguinte voto:

1. Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão 1056/2009, proferido na Sessão Ordinária do dia 29/07/2009, no Processo PCA n.º 07/00189289, e, no mérito, negar provimento.

2. Dar ciência desta Decisão, bem como do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Parecer COG 91/2011, ao Sr. João Pedro Woitexem, recorrente, e à Prefeitura Municipal de Barra Velha.

 

Gabinete, em 03 de agosto de 2011.

 

Cleber Muniz Gavi

Auditor Substituto de Conselheiro

Relator



[i] 1. Somente é admissível o contrato de risco (ad exitum) na Administração Pública quando o Poder Público não despender qualquer valor, sendo a remuneração do contratado exclusivamente os honorários pela sucumbência devidos pela parte vencida, nos montantes determinados pelo juízo na sentença condenatória.
2. Não é admissível a celebração de contrato pela Administração Pública onde esteja previsto que o contratado perceberá, a título de remuneração, um percentual sobre as receitas auferidas pelo ente com as ações administrativas ou judiciais exitosas promovidas pelo contratado, pois neste caso seria imperiosa a inclusão de cláusula contendo o valor do contrato e observância das normas orçamentárias e financeiras, que exigem previsão de receitas e despesas.

3. O contrato de risco (ad exitum) não exonera a administração da realização do processo licitatório, salvo os casos de dispensa de licitação e inexigibilidade previstos em lei.

[ii] 1. Nos termos do § 1º do art. 3º da Lei n. 8.906/94, os servidores dos órgãos da Administração Direta, das autarquias e das fundações públicas, seja no âmbito federal, estadual, distrital ou municipal, a cujos cargos correspondem as atividades de advocacia, se submetem ao regime instituído pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, mas são regidos pelas normas estipendiárias específicas dos servidores de cada esfera de Poder.

2. Os honorários de sucumbência previstos pelo art. 21 da Lei n. 8.906/94 são inaplicáveis aos servidores públicos regidos por um regime jurídico específico, alcançando apenas as atividades de advocacia desenvolvidas pelos profissionais liberais e advogados empregados; neste último caso, dependendo de acordo entre as partes.

3. As disposições constantes do Capítulo V, Título I, da Lei n. 8.906 (Estatuto da Advocacia), de 04 de julho de 1994, não se aplicam à Administração Pública Direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como às autarquias, às fundações instituídas pelo Poder Público, às empresas públicas e sociedades de economia mista, a teor do art. 4º da Lei nº 9.527, de 10 de dezembro de 1997.
4. Considerando o que dispõe o art. 4º, da Lei Federal n. 9.527/97, e o fato da legislação federal ser hierarquicamente superior à legislação municipal, os arts. 4º, 5º, 6º e 9º da Lei Municipal n. 3.387/96 encontram-se tacitamente revogados.

[iii] Lei n.º 8.906/94 - Art. 21. Nas causas em que for parte o empregador, ou pessoa por este representada, os honorários de sucumbência são devidos aos advogados empregados.