ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

Gabinete da Auditora Sabrina Nunes Iocken

 

PROCESSO N.º: REC 10/00690021

 

 

 

UNIDADE GESTORA: Prefeitura Municipal de Porto Belo

 

 

INTERESSADO: Sr. Sérgio Luiz Biehler e outros

 

 

ASSUNTO: Reconsideração – art. 77 da LC 202/2000 – Da decisão exarada do Processo TCE-05/00520399 – irregularidades praticadas nos exercícios 2001 a 2004.

 

 

 

 

RELATÓRIO

 

Tratam os autos de Recurso de Reconsideração (fls. 03/67) interposto pelos Srs. Sérgio Luiz Biehler, Carlos Roberto de Souza, Débora Regina Bertemes, Edison Luiz Leal Junior e Vilmar Fronza, contra o Acórdão nº 0555/2010, por meio da qual foram julgadas irregulares, com imputação de débito, as contas relativas à TCE 05/00520399, da Prefeitura Municipal de Porto Belo, nos seguintes termos:

Acórdão nº 0555/2010

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Porto Belo, decorrente de Representação formulada a este Tribunal, com abrangência sobre irregularidades praticadas nos exercícios de 2001 a 2004, e CONDENAR, SOLIDARIAMENTE, os Srs. SéRGIO LUIZ BIEHLER - ex-Prefeito Municipal de Porto Belo, CPF n. 176.357.720-15, CARLOS ROBERTO DE SOUZA - Secretário de Administração daquele Município no período de 2001 a outubro de 2003, CPF n. 499.620.609-82, DéBORA REGINA BERTEMES - Secretária de Administração daquele Município no período de novembro de 2003 a março de 2004, CPF n. 907.992.759-72, EDISON LUIZ LEAL JúNIOR - Diretor de Finanças da Prefeitura Municipal de Porto Belo nos exercícios de 2001 a 2004, CPF n. 027.075.169-61, e VILMAR FRONZA - Contador daquela Prefeitura nos exercícios de 2001 a 2004, CPF 292.571.749-72, ao pagamento dos montantes a seguir especificados, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):

6.1.1. R$ 102.994,59 (cento e dois mil, novecentos e noventa e quatro reais e cinquenta e nove centavos), referente a despesas com serviços de desassoreamento, reparos mecânicos, elétricos e de solda em ônibus e maquinário pesado, aquisição de peças, lubrificantes, pneus e câmaras, em favor da Indústria Metalúrgica e Construções Ltda. - IMECON, empresa que não poderia ter prestado tais serviços à municipalidade uma vez que seu objeto social não contempla a natureza dos serviços e bens contratualmente fornecidos e, ainda, porque a empresa nunca funcionou no endereço informado, além de ter o seu registro público cancelado em 2001, não podendo realizar atividades em 2003, havendo documentos inidôneos na comprovação dos gastos públicos efetuados, contrariando frontalmente os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insertos no art. 37, caput, da Constituição Federal, além das normas financeiras da despesa pública dispostas no art. 63 da Lei n. 4.320/64 (item 1.1 do Relatório DMU);

6.1.2. R$ 19.803,31 (dezenove mil, oitocentos e três reais e trinta e um centavos), concernente a despesas com serviços de recauchutagem, mecânica e solda em viaturas da frota municipal, em favor da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda., que não poderia ter prestado serviços à municipalidade uma vez que seu objeto social não contempla a natureza dos serviços e bens contratualmente fornecidos e, ainda, porque a empresa nunca funcionou no endereço informado, além de ter o seu registro público cancelado em 2001, não podendo realizar atividades em 2002 e 2003, havendo documentos inidôneos na comprovação dos gastos públicos efetuados, importando em mácula aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insertos no art. 37, caput, da Constituição Federal, além das normas financeiras da despesa pública dispostas no art. 63 da Lei n. 4.320/64 (item 1.2 do Relatório DMU);

6.1.3. R$ 15.933,33 (quinze mil, novecentos e trinta e três reais e trinta e três centavos), pertinente a despesas em favor da Indústria Metalúrgica e Construções Ltda. - IMECON e da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda. sem comprovação do recebimento do citado montante pelas favorecidas, valor esse quitado com cheque nominal à própria Prefeitura e endossado pelo Prefeito Municipal, sendo sacado "na boca do caixa", de modo irregular, sem comprovação de aplicação dos valores, caracterizando desvio de verba pública e despesas não abrangidas no conceito de gastos próprios dos órgãos do Governo e da administração centralizada disposto no art. 4º c/c o art. 12 da Lei n. 4.320/64 (item 1.3 do Relatório DMU);

6.1.4. R$ 4.450,00 (quatro mil, quatrocentos e cinquenta reais), referente a despesas em favor da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda. sem comprovação do recebimento do citado montante pela favorecida, valor esse quitado com cheque nominal à própria Prefeitura e endossado pelo Prefeito Municipal, sendo sacado "na boca do caixa", de modo irregular, sem comprovação de aplicação dos valores, caracterizando desvio de verba pública e despesas não abrangidas no conceito de gastos próprios dos órgãos do Governo e da administração centralizada disposto no art. 4º c/c o art. 12 da Lei n. 4.320/64 (item 1.3 do Relatório DMU).

6.2. Comunicar imediatamente ao Ministério Público Estadual acerca dos fatos apurados por este Tribunal para a tomada de providências que julgar pertinentes, para fins de subsidiar eventuais medidas em face da possível tipificação de ilícitos cíveis e penais, com fundamento nos arts. 59, XI, da Constituição Estadual, 1º, XIV, e 18, § 3º, da Lei Complementar n. 202/2000, 7º da Lei n. 7.347/85, 43, VIII, da Lei n. 8.625/93 e 24, § 2º, c/c art. 40 do Decreto-lei n. 3.689/41, e conforme o Termo de Cooperação firmado entre esta Corte de Contas e o douto Parquet.

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 5787/2008:

6.3.1. aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação;

6.3.2. ao Representante no Processo n. RPA-05/00520399

6.3.3. à Prefeitura Municipal de Porto Belo.

 

Os recorrentes apresentaram suas razões para que o Recurso de Reconsideração fosse recebido, bem como fossem reconhecidas as preliminares argüidas e a nulidade do Relatório de Auditoria nº 871/2007 e do Relatório de Reinstrução nº 5.787/2008, além de canceladas as imputações de débito.

Ato contínuo, a COG, em seu Parecer nº COG-25/2011 (fls. 68/96), manifestou-se por conhecer do Recurso de Reconsideração e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, cancelando a responsabilização relativa aos débitos de R$ 102.994,59, 19.803,31 e 15.933,33, imputados aos Recorrentes, constantes dos itens 6.1.1, 6.1.2 e 6.1.3 da deliberação recorrida, bem como ratificar os seus demais termos.

De forma diversa foi o entendimento do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas exposado no Parecer nº MPTC/934/2011 (fls. 97/102), o qual se manifestou nos seguintes termos:

1)         pelo conhecimento do Recurso de Reconsideração interposto pelos Srs. Carlos Roberto de Souza, Débora Regina Bertemes, Edison Luiz Leal Júnior, Sérgio Luiz Biehler e Vilmar Fronza, por atender os requisitos da Lei Complementar nº 202/2000 (art. 77).

2)         no mérito, pela negativa de provimento, para manter-se integralmente a decisão combatida.

3)         pela comunicação da decisão aos recorrentes, à Prefeitura Municipal de Porto Belo, à Câmara Municipal de Porto Belo e à Prefeitura Municipal de Porto Belo e ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

É o relatório.

 

 

 

PROPOSTA DE VOTO

 

Vindo os autos à apreciação desta Relatora, verifico que, de fato, conforme asseveraram a COG e o MPTC, o presente recurso atende a todos os pressupostos de admissibilidade previstos pela LC nº 202/00, razão pela qual deve ser conhecido por esta Corte de Contas.

Com a finalidade de sistematizar a presente proposta de voto, passo a analisar o pedido do Requerente que deu fundamento ao presente Recurso, em face dos novos argumentos, documentos e pareceres juntados aos autos.

 

DAS PRELIMINARES

 

1)            Nulidade do procedimento de fiscalização promovido pela Comissão Especial de Inquérito.

 

Em suas razões, os recorrentes alegam, em suma, que não houve irregularidade na contratação das empresas Indústria Metalúrgica e Construções Ltda. – IMECON e Via Brasil Transportes e Construções Ltda.; que serviços foram regularmente prestados e que os materiais corretamente fornecidos, tudo a preço de mercado e com excelente resultado custo benefício.

Alegam também que os membros da Comissão Especial de Inquérito tinham amplo conhecimento de que as empresas contratadas prestavam serviços e forneciam materiais ao município de Porto Belo e a outros municípios da região;

Ainda de acordo com os recorrentes, houve motivação política na instauração da comissão de inquérito, pois os vereadores esperavam até as vésperas das eleições (2004) para fiscalizar os respectivos atos relacionados aos exercícios de 2002 e 2003.

Os recorrentes sustentam também que não é de responsabilidade do município efetuar a respectiva fiscalização de eventuais pendências das empresas com órgãos federais e estaduais.

Por fim, os recorrentes apontam suposta contratação irregular de advogada para auxiliar nos trabalhos da comissão de inquérito.

Em seu Parecer nº 25/2011, a COG destaca que eventual desvio de conduta dos membros da comissão de inquérito deveriam ter sido questionados à época, em procedimento próprio, conforme as regras da Câmara Municipal de Porto Belo e que este Tribunal realizou a análise de admissibilidade da Representação com base na regra contida no artigo 65, §1º, da Lei Complementar nº 202/00.

Nesse sentido, a Consultoria Geral conclui que os fatos relatados não geram nulidade processual.

O MPTC (Parecer nº 934/2011) acatou a manifestação da Consultoria Geral.

Analisando os autos, verifico ser pertinente acompanhar os entendimentos exposados pela COG e pelo MPTC, no sentido de afastar a preliminar levantada pelos recorrentes.

Destaco que eventuais divergências políticas em âmbito municipal não influenciaram a análise técnica promovida por este Tribunal, que se baseou não só nos fatos descritos na inicial, mas também na documentação acostada aos autos, não tendo o condão de gerar qualquer nulidade nos procedimentos realizados até este momento.

 

 

 

2)            Nulidade do procedimento de fiscalização do Tribunal de Contas por fraude processual.

Foi apontado pelos recorrentes que o princípio do devido processo legal foi violado, prejudicando-lhe no que diz respeito ao exercício do contraditório e da ampla defesa, pois não foi observada a ordem cronológica dos documentos, que estavam em desordem; e ainda foram juntados ao processo 90 (noventa) documentos que não tem qualquer relação com o processo sob exame ou de forma repetida, inclusive para sugerir a imputação de débito.

Os recorrentes alegam ainda que o processo foi violado após sua constituição original, havendo dupla numeração das páginas e uma e rasura.

Em sua análise, a COG (Parecer nº 25/2011) destaca que meras alegações de fraude processual são insuficientes para que seja declarada a nulidade processual e que nos autos não há qualquer prova ou indício que sustente as alegações dos recorrentes quanto à tentativa de induzir a erro os Conselheiros desta Corte de Contas.

Foi destacado ainda pela Consultoria Geral que havia documentos relativos a outras empresas porque a comissão de inquérito estava fiscalizando outros atos praticados pelo Poder Executivo Municipal, sendo que não havia razão para que tais documentos fossem excluídos do processo.

Quanto ao argumento de que havia documentos repetidos e em desordem, a Consultoria Geral destaca que os mesmos foram apresentados a este Tribunal pelos próprios recorrentes quando apresentaram em 10/03/2008 a peça de defesa (fl. 551-556) e os documentos de fls. 557-626.

Por meio do Parecer nº 934/2011, o MPTC acompanhar a manifestação da Consultoria Geral.

Analisando novamente os autos, verifico ser pertinente acatar os entendimentos exposados pela COG e pelo MPTC, no sentido de afastar a preliminar levantada pelos recorrentes, tendo em vista que não há nos autos qualquer prova ou indício que sustente as alegações dos recorrentes de que a documentação constante do processo foi introduzida no intuito de induzir a erro os Conselheiros desta Corte de Contas.

Destaco que foi demonstrado pela Consultoria Geral desta Casa que a juntada de documentos repetidos e a desordem nos documentos foi causada pelos próprios recorrentes.

Nesse sentido, fica afastada a preliminar apresentada pelos recorrentes.

 

 

3)            Nulidade do procedimento de fiscalização do Tribunal de Contas por ter sido acolhido o Relatório Final da Comissão Especial de Inquérito.

 

Foi alegado pelos recorrentes, em suma, que não foram realizados quaisquer levantamentos pela equipe de auditoria e que o Relatório nº 871/2007 não representa o resultado de auditoria, inspeção ou qualquer outro tipo de levantamento executado pelos auditores deste Tribunal, sendo apenas fruto de transcrições do Relatório Final da Comissão Especial de Inquérito – CEI, cujas anotações coincidem até nos centavos dos valores indicados como irregulares pela Comissão.

De acordo com a Consultoria Geral (Parecer nº 25/2011), em suma, a utilização dos documentos de despesa já indicados no processo instaurado pela comissão de inquérito era plenamente justificável, pois os achados de auditoria decorreram diretamente desses documentos, tendo inclusive sido produzidos pelos próprios recorrentes.

O MPTC, ao exarar o Parecer nº 934/2011, também acompanhou a manifestação da Consultoria Geral.

Analisando os autos verifico que, de fato, a utilização dos documentos que faziam parte do relatório produzido pela comissão de inquérito foi um procedimento natural, decorrente do próprio conteúdo da Representação admitida por esta Corte de Contas, sendo que não foi apresentado pelos recorrentes qualquer fato ou argumento capaz de gerar a declaração de nulidade do processo.

Sendo assim, afasto novamente a preliminar apresentada pelos recorrentes, acatando as manifestações da Consultoria Geral e do Ministério Público de Contas.

 

DO MÉRITO

 

A análise do mérito será realizada de acordo com os itens constantes do Acórdão nº 555/2010, conforme segue abaixo. Destaco que a análise relativa aos itens 6.1.1 e 6.1.2 do acórdão recorrido será feita de forma conjunta, já que os fundamentos para a imputação de débito e as razões recursais são praticamente as mesmas.

 

1. R$ 102.994,59 (cento e dois mil, novecentos e noventa e quatro reais e cinquenta e nove centavos), referente a despesas com serviços de desassoreamento, reparos mecânicos, elétricos e de solda em ônibus e maquinário pesado, aquisição de peças, lubrificantes, pneus e câmaras, em favor da Indústria Metalúrgica e Construções Ltda. - IMECON, empresa que não poderia ter prestado tais serviços à municipalidade uma vez que seu objeto social não contempla a natureza dos serviços e bens contratualmente fornecidos e, ainda, porque a empresa nunca funcionou no endereço informado, além de ter o seu registro público cancelado em 2001, não podendo realizar atividades em 2003, havendo documentos inidôneos na comprovação dos gastos públicos efetuados, contrariando frontalmente os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insertos no art. 37, caput, da Constituição Federal, além das normas financeiras da despesa pública dispostas no art. 63 da Lei n. 4.320/64.

2. R$ 19.803,31 (dezenove mil, oitocentos e três reais e trinta e um centavos), concernente a despesas com serviços de recauchutagem, mecânica e solda em viaturas da frota municipal, em favor da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda., que não poderia ter prestado serviços à municipalidade uma vez que seu objeto social não contempla a natureza dos serviços e bens contratualmente fornecidos e, ainda, porque a empresa nunca funcionou no endereço informado, além de ter o seu registro público cancelado em 2001, não podendo realizar atividades em 2002 e 2003, havendo documentos inidôneos na comprovação dos gastos públicos efetuados, importando em mácula aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, insertos no art. 37, caput, da Constituição Federal, além das normas financeiras da despesa pública dispostas no art. 63 da Lei n. 4.320/64.

Os recorrentes alegam, em suma, que nada impede que uma empresa realize atividade distinta de descrita no seu contrato social e que “todos os produtos e serviços contratados foram devidamente prestados e/ou fornecidos, tudo a preço de mercado e com excelente resultado custo-benefício”.

Quanto ao endereço da empresa, os recorrentes alegam que não foi considerado pelos auditores o endereço constante da 2ª alteração contratual.

Em sua análise (Parecer nº 25/2011), a Consultoria Geral destaca que em nenhum momento nos autos houve a demonstração de que os serviços mencionados nas notas fiscais indicadas às fls. 506 não foram prestados e que o fato da empresa atuar irregularmente sob o ponto de vista fiscal ou mesmo não estar localizada no endereço indicado no contrato social não é suficiente para justificar a imputação de débito.

A COG ressalta que não foram considerados documentos de forma repetitiva e esclarece que a atuação da empresa em ramo distinto ao que consta em seu contrato social é irregular, trazendo à tona o artigo 27, I, c/c o artigo 28, III, da Lei nº 8.666/93 e ainda diversos dispositivos do Código Civil, mas que não há como considerar inválidos os atos de comércio praticados por sociedade que atua de forma irregular.

A Consultoria Geral verifica ainda que, “ao contrário do afirmado pela Diretoria Técnica, o art. 63 da lei n. 4.320/64, para fins da liquidação da despesa, não se exige unicamente a apresentação de nota fiscal. Esta é exigida para efeitos tributários e por norma diversa daquela apresentada como justificadora da imputação de débito [...]”.

Por fim, o Órgão Consultivo traz à discussão o conceito de dano ao erário, concluindo que este resta caracterizado quando o município realiza um desembolso financeiro para pagar um bem/serviço sem que haja a devida contraprestação, o que não se verifica no caso em tela, pois não constam dos autos provas que demonstrem que os serviços ou bens indicados nas notas fiscais não tenham sido efetivamente prestados ou entregues. Por fim, a Consultoria Geral conclui que não há razão para subsistirem as imputações de débito constantes dos itens 6.1.1 e 6.1.2 do acórdão recorrido.

Em seu parecer (934/2011), o MPTC discorda do posicionamento da Consultoria Geral, sustentando, em síntese, que a prestação de contas é dever do Administrador Público, trazendo aos autos o conteúdo do MS nº 20.335, no qual o STF decidiu que “[...] Em direito financeiro cabe ao ordenador de despesas provar que não é responsável pelas infrações que lhe são imputadas, das leis e regulamentos na aplicação do dinheiro público. [...]”.

Ainda de acordo com o MPTC, foi demonstrada a ocorrência de uma série de irregularidades que não permitem que as despesas sejam consideradas lícitas, não se tratando de meras irregularidades de natureza formal.

Nesse sentido, o MPTC assevera que:

Assim, não são os documentos de fls. 81, 84, 86, 89, 92, 95, 99, 103, 106, 108, 112, 113, 117, 121, 125, 129, 134, 140 e 142 que não comprovam a inexistência da prestação dos serviços, mas a falta de comprovação efetiva, de uma comprovação que não fosse apenas de papel, aliada a todo um conjunto probatório muito desfavorável aos recorrentes, que orientou, corretamente, o e. Conselheiro Luiz Roberto Herbst, a propugnar pela ilicitude das referidas despesas, no que foi seguido, à unanimidade, pelos seus pares.

Por fim, o MPTC manifesta-se por conhecer do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento.

Analisando os autos, destaco inicialmente que a imputação de débito foi fundamentada na ocorrência de quatro irregularidades verificadas nas despesas realizadas pela Prefeitura Municipal de Porto Belo, quais sejam:

a)  A empresa IMECON não poderia ter prestado os serviços à Prefeitura tendo em vista que o seu objeto social não contemplava a natureza dos bens e serviços fornecidos;

b)  A empresa IMECON não funcionava no endereço informado;

c)  A empresa IMECON teve o seu registro público cancelado em 2001, não podendo realizar atividades em 2003; e

d)  As despesas foram comprovadas com documentos inidôneos.

Conforme asseverou a Consultoria Geral desta Casa, a imputação de débito não se justifica em face da empresa não funcionar no endereço informado ou mesmo atuar de forma irregular perante o fisco.

Quanto à comprovação da despesa com documentos inidôneos, verifico que ao fazer tal apontamento a DMU (Relatório nº 5787/2008) considerou irregular a comprovação das despesas mediante a apresentação de faturas. Contudo, conforme consta do parecer da COG, o artigo 63 da Lei nº 4.320/64 não exige que necessariamente seja apresentada nota fiscal para fins de comprovação da despesa, admitindo a utilização do contrato, da nota de empenho ou mesmo de comprovantes de entrega do material ou da prestação do serviço.

Lei nº 4.320/64

Art. 63 - A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.

§ 1º - Essa verificação tem por fim apurar:

I - a origem e o objeto do que se deve pagar;

II - a importância exata a pagar;

III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.

§ 2º - A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

Por fim, é mister acrescentar que em momento algum foi suscitado pela comissão de inquérito ou pela equipe de auditoria que os serviços não tenham sido prestados pelas contratadas.

Sendo assim, constato que apesar de terem sido demonstradas irregularidades na atuação das empresas contratadas, não foram configuradas as hipóteses de “dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado” e “desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos”, que poderiam ensejar a imputação de débito aos responsáveis, nos termos do artigo 15, §3º, da Lei Complementar nº 202/00.

Diante do exposto, acato a manifestação da Consultoria Geral no sentido de que não há razão para subsistirem as imputações de débito constantes dos itens 6.1.1 e 6.1.2 do acórdão recorrido, razão pela qual manifesto-me pelo seu cancelamento.

 

3. R$ 15.933,33 (quinze mil, novecentos e trinta e três reais e trinta e três centavos), pertinente a despesas em favor da Indústria Metalúrgica e Construções Ltda. - IMECON e da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda. sem comprovação do recebimento do citado montante pelas favorecidas, valor esse quitado com cheque nominal à própria Prefeitura e endossado pelo Prefeito Municipal, sendo sacado "na boca do caixa", de modo irregular, sem comprovação de aplicação dos valores, caracterizando desvio de verba pública e despesas não abrangidas no conceito de gastos próprios dos órgãos do Governo e da administração centralizada disposto no art. 4º c/c o art. 12 da Lei n. 4.320/64.

De acordo com os recorrentes, os cheques e os respectivos valores que teriam sido nominados à própria Prefeitura e sacados na boca do caixa não foram indicados e numerados pela equipe de auditoria, sendo que o apontamento feito pela equipe de auditoria era inconsistente.

Além disso, os recorrentes alegam que esse fato não foi apontado pela comissão de inquérito e que nos cheques de fls. 408, 409, 415 e 416 do processo TCE 05/00520399 constam as assinaturas do Prefeito Municipal à época e do Secretário de Finanças, e os cheques de fls. 411, 412 e 414 foram assinados pelo Prefeito Municipal á época e pelo Diretor de Finanças.

Em sua análise, a Consultoria Geral desta Casa (Parecer nº 25/2011) verifica que os documentos que deram suporte ao apontamento feito pela equipe de auditoria foram identificados nas fls. 121 a 123 e 414 do processo TCE 05/00520399.

A COG verifica ainda que a imputação de débito decorreu da interpretação de que as ordens de pagamento acostadas às fls. 122 comprovariam o fato de que o Prefeito Municipal e o Diretor de Finanças teriam sacado no caixa a quantia de R$ 15.933,33.

Sendo assim, a Consultoria Geral constata que não existem provas nos autos do processo de tomada de contas especial que demonstrem que os pagamentos foram realizados em favor do Prefeito Municipal e do Diretor de Finanças, podendo ser verificado no documento de fl. 122, apesar de sua qualidade reprográfica precária, que o Sr. Marco Antônio Sampaio Guerra, sócio da empresa IMECON, foi o beneficiário da ordem de pagamento.

Ainda de acordo com a Consultoria Geral:

Assim, apesar de não ter figurado a própria empresa como beneficiada, uma vez que não há se confundir a pessoa do sócio com a empresa, este fato não pode levar à conclusão de que houve desvio de recursos públicos. E mais, não se comprovou que os serviços não foram prestados. No caso, há irregularidade formal no ato de liquidação da despesa, uma vez que o procedimento previsto no art. 63 da Lei n. 4.320/64 é destinado a verificar a origem, o objeto do que se deve pagar; a importância exata a pagar e a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação. Contudo, este fato não foi considerado para fins de imposição de penalidade de multa no acórdão recorrido.

Por fim, a COG opina pelo cancelamento da restrição apontada no item 6.1.3 do acórdão recorrido em virtude de não existirem elementos suficientes para se caracterizar o dano ao erário.

O MPTC (Parecer nº 934/2011) manifestou-se pela manutenção da imputação de débito, pelos mesmos fundamentos já descritos nos itens 1 e 2.

Analisando os autos, verifico ser pertinente acompanhar os termos do parecer exarado pela Consultoria Geral.

Destaco que a imputação de débito foi fundamentada nas ordens bancárias constantes da fl. 122 do processo de tomada de contas especial, nas quais consta como beneficiário o sócio proprietário da empresa contratada e não os emitentes, os então Prefeito Municipal e Diretor Financeiro.

Sendo assim, manifesto-me pelo cancelamento do débito imputado por meio do item 6.1.3 do acórdão recorrido.

 

4. R$ 4.450,00 (quatro mil, quatrocentos e cinquenta reais), referente a despesas em favor da empresa Via Brasil Transportes e Construções Ltda. sem comprovação do recebimento do citado montante pela favorecida, valor esse quitado com cheque nominal à própria Prefeitura e endossado pelo Prefeito Municipal, sendo sacado "na boca do caixa", de modo irregular, sem comprovação de aplicação dos valores, caracterizando desvio de verba pública e despesas não abrangidas no conceito de gastos próprios dos órgãos do Governo e da administração centralizada disposto no art. 4º c/c o art. 12 da Lei n. 4.320/64.

Em suas razões recursais, os recorrentes admitem que o cheque nº 003377 foi sacado na boca do caixa, justificando que foi adotado tal procedimento para atender a um pedido do proprietário da empresa que estaria “em viagem necessitando dos recursos em espécie, pois só estaria no município após o expediente bancário”.

De acordo com os recorrentes, não houve a caracterização de desvio de recursos ou de locupletamento de quem quer que seja, tendo tudo sido realizado de forma clara e transparente.

Os recorrentes alegam ainda que somente estaria caracterizado o desvio de recursos públicos se a despesa não tivesse sido liquidada, o que evidenciaria que os serviços não teriam sido prestados ou que os materiais não teriam sido fornecidos, ou no caso em que houvesse o pagamento em duplicidade em virtude do mesmo objeto, o que não teria se verificado no caso em tela.

Ao final, os recorrentes alegam que a prova do desvio deveria ter sido feita pelos auditores.

Em sua análise, a Consultoria Geral desta Casa (Parecer nº 25/2011) não acata as razões apresentadas pelos recorrentes, destacando que foi plenamente demonstrado que o cheque nº 003377 foi emitido em nome da própria Prefeitura Municipal de Porto belo, tendo sido sacado pelo Sr. Sérgio Luiz Biehler, ex-Prefeito Municipal, e pelo Sr. Edison Luiz Leal Júnior, ex-Diretor de Finanças.

Além disso, a COG destaca que não foram apresentadas provas de que a empresa recebeu o pagamento indicado no cheque e que esta comprovação caberia às próprias autoridades, as quais autorizaram o referido pagamento e retiraram a quantia para, conforme alegado, posteriormente repassá-la para a empresa.

Por fim, a COG opina pela manutenção da restrição constante do item 6.1.4 do acórdão recorrido, ressaltando que:

Assim, restou plenamente caracterizado a ausência de liquidação, não pelo fato de os serviços não terem sido prestados, pois este não foi a causa da restrição, mas sim, pelo fato de que não foi comprovado ter sido o pagamento efetuado a quem detinha o direito a seu recebimento, posto que a liquidação é a fase da execução das despesas em que se deve verificar o direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito, identificando a origem e o objeto do que se deve pagar; a importância exata a pagar e a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação, nos exatos termos do disposto no art. 63 da Lei n. 4.320/64.

O MPTC, por meio do Parecer nº 934/2011, manifestou-se pela manutenção da imputação de débito, pelos mesmos fundamentos já descritos nos itens 1 e 2.

Analisando os autos, destaco inicialmente que a irregularidade que ensejou a imputação de débito que consta do item 6.1.4 do acórdão recorrido diz respeito à realização de despesas sem comprovação do recebimento do montante pela empresa credora, pois o valor foi quitado por meio de cheque nominal à própria Prefeitura, o qual foi sacado na “boca do caixa” pelo Sr. Sérgio Luiz Biehler, ex-Prefeito Municipal, e pelo Sr. Edison Luiz Leal Júnior, ex-Diretor de Finanças.

Conforme asseverou a Consultoria Geral, os próprios recorrentes admitem a ocorrência desta irregularidade, tentando justificar que o procedimento foi realizado a pedido da própria empresa, tendo em vista que o seu representante estaria viajando e não poderia comparecer à agência bancária para retirar o pagamento.

Contudo, também conforme foi constatado pela Consultoria Geral, verifico que, apesar de ter sido alegado pelos recorrentes, não consta dos autos qualquer prova de que os recorrentes teriam efetivamente repassado os valores à empresa credora.

Sendo assim, diante da ausência de demonstração de que os valores tenham sido pagos à empresa credora, acato a manifestação da Consultoria Geral no sentido de manter a imputação de débito constante do item 6.1.4 do acórdão recorrido.

Observo, contudo, que a irregularidade que ensejou a imputação de débito por este Tribunal de Contas foi praticada pelos Srs. Sérgio Luiz Biehler, ex-Prefeito Municipal, e Edison Luiz Leal Júnior, ex-Diretor de Finanças, os quais são responsáveis pela emissão do cheque nº 03377 (fl. 414) e pelo posterior saque na “boca do caixa”.

Sendo assim, não há fundamento para manter-se a condenação solidária aos demais agentes arrolados no Acórdão nº 0555/2010, razão pela qual verifico ser pertinente retificar o item 6.1 do referido acórdão, condenando solidariamente ao pagamento do montante especificado somente o Sr. Sérgio Luiz Biehler, ex-Prefeito Municipal, e o Sr. Edison Luiz Leal Júnior, ex-Diretor de Finanças.

 

 

Diante do exposto, acatando a manifestação da Consultoria Geral, apresento ao Egrégio Plenário a seguinte Proposta de Voto:

 

1. Conhecer do Recurso de Reconsideração interposto nos termos do art. 77 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, contra o Acórdão nº 0555/2010, exarada na Sessão Ordinária de 16/08/2010, nos autos do Processo nº TCE 05/00520399, e no mérito dar provimento parcial para:

1.1. Alterar o item 6.1 do acórdão recorrido, que passa a ter a seguinte redação:

6.1. Julgar irregulares, com imputação de débito, com fundamento no art. 18, inciso III, alínea "c", c/c o art. 21, caput, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Porto Belo, decorrente de Representação formulada a este Tribunal, com abrangência sobre irregularidades praticadas nos exercícios de 2001 a 2004, e CONDENAR, SOLIDARIAMENTE, os Srs. SéRGIO LUIZ BIEHLER - ex-Prefeito Municipal de Porto Belo, CPF n. 176.357.720-15, e  EDISON LUIZ LEAL JúNIOR - Diretor de Finanças da Prefeitura Municipal de Porto Belo nos exercícios de 2001 a 2004, CPF n. 027.075.169-61, ao pagamento do montante a seguir especificado, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento dos valores dos débitos aos cofres do Município, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros legais (arts. 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir das datas de ocorrência dos fatos geradores dos débitos, sem o quê, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (art. 43, II, da Lei Complementar n. 202/2000):

 

1.2. Cancelar a responsabilização relativa aos débitos de R$ 102.994,59, 19.803,31 e 15.933,33, imputados aos Recorrentes, constantes dos itens 6.1.1, 6.1.2 e 6.1.3 da Deliberação Recorrida.

1.3. Ratificar os demais termos da Deliberação Recorrida.

2. Dar ciência da Decisão, Relatório e Voto do Relator e Parecer da Consultoria Geral ao Sr. Carlos Roberto de Souza, à Sra. Débora Regina Bertemes, ao Sr. Edison Luiz Leal Júnior, ao Sr. Sergio Luiz Biehler, ao Sr. Vilmar Fronza, à Prefeitura Municipal de Porto Belo, à Câmara Municipal de Porto Belo e ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

 

Florianópolis, 07 de março de 2012.

 

 

Auditora Sabrina Nunes Iocken

Relatora