ESTADO DE SANTA CATARINA
PROCESSO: PCA 09/00017880
UNIDADE:
Câmara Municipal de Paulo Lopes
RESPONSÁVEL:
José Antônio
Rogério – Presidente da Câmara
ASSUNTO: Prestação de Contas
de Unidade Gestora - exercício 2008
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE
ADMINISTRADOR. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA.
Licitação. Ausência.
A regra geral para a Administração Pública é a realização de
procedimento licitatório a teor do artigo 37, XXI da CF/88 e art. 2º da Lei
Federal n. 8.666/93.
Verba indenizatória por sessão
extraordinária. EC 50/2006. Irregularidade.
Imputação de débito aos Vereadores e Presidente da Câmara Municipal, em
razão do pagamento de
verba indenizatória, pela convocação para sessões extraordinárias, em afronta
ao art. 57, § 7º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional
n. 50, de 14/02/2006.
I - RELATÓRIO
Trata-se de Prestação de Contas da Câmara Municipal de Paulo
Lopes, referente ao exercício financeiro de 2008, de responsabilidade do Sr. José Antônio Rogério – Presidente da Câmara.
A Diretoria de Controle dos Municípios – DMU analisou os documentos
remetidos pela unidade através dos Relatórios nºs 782/2001[1] e
783/2011[2],
sugerindo a citação dos responsáveis em face das seguintes irregularidades:
– realização de despesas
indevidas com diárias para vereadores quando em serviços não relacionados com
as atividades precípuas do Poder Legislativo, caracterizando despesas sem
evidenciação de interesse público (ilegítimas), em desacordo com o art. 4º c/c
12, § 1º da Lei Federal nº 4.320/64;
– recebimento indevido de verba
indenizatória, em razão da convocação de sessão extraordinária pela Câmara
Municipal, em afronta ao art. 57, § 7º da Constituição Federal, com a redação
dada pela Emenda Constitucional nº 50, de 14/02/2006;
– ausência
de realização de processo licitatório objetivando a contratação de telefonia
celular, em desacordo com o disposto no artigo 37, XXI, da Constituição Federal
e artigo 2º da Lei Federal nº 8.666/93.
As
citações[3]
foram procedidas, tendo sido apresentadas as alegações de defesa pelos
Vereadores Luciana Espíndula[4],
José Antônio Rogério[5],
Maury Laudelino Raupp[6],
Oziel Evaldo Silva[7], Robson Luis Bittencourt
Liberato[8],
Luciano Manoel Silvano[9] e
Nadir Carlos Rodrigues[10]dos
responsáveis[11]. Os vereadores Aldo
Laurentino e João dos Passos Custódia deixaram transcorrer in albis o prazo para defesa, não obstante terem recebido as
notificações[12].
A DMU, ao reinstruir o feito,
elaborou o Relatório nº 881/2012[13] concluindo por
julgar as contas irregulares, com imputação de débito a cada Vereador, em face
do recebimento de valores considerados irregulares – verba indenizatória em
razão da convocação para sessões extraordinárias – bem como aplicação de multa
ao Sr. José Antônio Rogério, Presidente da Câmara, pela autorização de tais
pagamentos aos beneficiados e, ainda, pela contratação de serviços de telefonia
sem a realização do devido processo licitatório.
O Ministério Público junto ao Tribunal de
Contas exarou o Parecer nºMPTC/12.415/2012[14] acompanhando
o corpo instrutivo.
Vieram os autos conclusos.
II - DISCUSSÃO
A DMU
sugeriu a aplicação de débitos e multas em razão das irregularidades
encontradas no curso da instrução, as quais passo a examinar em contraste com as razões de defesa apresentadas
pelos responsáveis.
II.1
– Recebimento indevido de verba
indenizatória, em razão da convocação de sessão extraordinária pela Câmara
Municipal, em afronta ao art. 57, §7º da Constituição Federal, com a redação
dada pela Emenda Constitucional nº 50, de 14/02/2006 (item 4.3.2, do Relatório
DMU nº881/2012).
Quanto ao pagamento da convocação
extraordinária aos vereadores ocorrida
no exercício de 2008, correta a análise e conclusão a que chegou o corpo
instrutivo. Extrai-se dos autos que a Câmara de Vereadores de Paulo Lopes realizou
despesas no montante de R$ 3.746,25, referentes ao pagamento de verbas
indenizatórias aos vereadores em razão da convocação para sessão legislativa
extraordinária, em afronta ao art. 57, § 7º, da Constituição Federal, com
redação dada pela Emenda Constitucional n. 50, de 14/02/2006.
Destaco
que a partir de 15/02/2006, data da publicação da referida Emenda
Constitucional, é vedado o pagamento de verba indenizatória aos Vereadores
Municipais em razão da convocação para sessão extraordinária, nos seguintes
termos:
Art. 5. O Congresso
Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de
julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro.
[...]
§ 7º Na sessão legislativa extraordinária, o
Congresso Nacional somente deliberará sobre a matéria para a qual foi
convocado, ressalvada a hipótese do § 8º deste artigo, vedado o pagamento de
parcela indenizatória, em razão da convocação.
A
alegação dos responsáveis que, uníssonos, sustentaram que o pagamento de
sessões extraordinárias estava amparado pela Lei Orgânica do Município e que a
E.C. nº 50/2006 não se aplicaria ao Poder Legislativo Municipal, mas tão
somente ao Poder Legislativo Federal, não merece guarida, em face do que
estatui o Princípio da Simetria que é um norteador dos entes federados na
elaboração de suas Cartas ou Leis Orgânicas. Sobre o assunto assim se
manifestou este Tribunal:
Em razão do princípio da Simetria, entendido como aquele
que identifica as normas da Constituição Federal que podem ou devem ser reproduzidas
perante Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais, homogeneizando o
modelo federativo brasileiro, os efeitos do art. 57, § 7º, da Constituição
Federal, com a redação da Emenda Constitucional n. 50/2006, de 14/02/2006,
também devem ser observadas pelo Município.
A partir do dia 15/02/2006, data da publicação da Emenda
Constitucional n. 50/2006, as sessões legislativas ordinárias ocorrem do dia 02
de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro, estando proibido
o pagamento de verba indenizatória aos vereadores municipais em razão de
convocação para sessão extraordinária.
Decisão n. 1161/2007, exarada nos autos de CON
06/00464814 (vide Parecer COG n. 520/2006)
Ressalta-se
que o art. 29 da Constituição Federal, ao conceder a autonomia
administrativa-política aos municípios, limitou esse poder à obediência das
diretrizes constitucionalmente estabelecidas. Assim, o Município de Paulo Lopes,
em respeito ao Princípio da Simetria, deveria ter acompanhado as alterações
trazidas pela Emenda Constitucional nº 50
a partir de sua vigência.
Cumpre
assinalar que o Tribunal de Contas do Estado – não obstante as ressalvas deste
Relator – pacificou o entendimento de responsabilizar cada vereador acerca do
valor percebido para evitar o enriquecimento ilícito, com esteio no princípio
da eficiência, buscando-se, por seu turno, o pronto ressarcimento ao erário.
II.2 Ausência de procedimento licitatório para contratação de serviços de
telefonia móvel, no montante de R$11.779.79, infringindo o disposto no art. 37,
XXI da Constituição Federal e os arts. 2º da Lei Federal nº 8.666/93,
configurando burla ao procedimento licitatório (Item 4.2.1 do Relatório
nº881/2012).
Sobre
a irregularidade em tela, o Presidente da Câmara sustentou que “as despesas referentes à contratação de
serviços de telefonia móvel foram realizadas sem licitação uma vez que os
valores contratados não ultrapassariam o valor máximo de R$ 8.000,00 (oito mil
reais)”, o que “seria o caso de
contratação direta por dispensa (art. 24, Ii da Lei 8.666/93)”[15];
fez juntada de documento (propostas de serviços e condições contratuais) da
operadora de telefonia móvel[16].
Ademais,
salientou o responsável que haveria ainda uma “razão de ordem técnica, a qual deve ser levada em consideração”
para a contratação feita, posto que “foi
levado em conta o fato de que havia dois vereadores que têm residência e base
eleitoral em bairros do município aonde somente a operadora de telefonia móvel
contratada é que disponibilizava sinal nesses dois locais”[17],
razão pela qual pugnou pela regularidade da contratação.
O
corpo instrutivo refuta os argumentos de defesa de que a proposta apresentada
pela operadora representaria um custo inferior ao limite da dispensa de
licitação, pois já nos exercícios anteriores, a própria Câmara utilizava-se
destes serviços em montantes, superiores à dispensa de licitação: em 2006 foram
gastos R$ 8.732,21 e em 2007 R$ 16.238,06. Além disso, consigna a DMU que em
contato feito com a Câmara foram remetidos novos documentos[18]
(diferenciando, alguns destes, dos já enviados pelo Presidente, junto aos seus
argumentos de defesa[19]),
e que os mesmos não apresentavam data e a especificação clara dos valores e
serviços contratados.
Dos
fatos e documentos postos à análise, entendo que assiste razão ao corpo
instrutivo desta Casa.
Além
da imprecisão dos dados preenchidos nos documentos juntados, que nada mais são
do que reproduções de um contrato padronizado de empresa de telefonia, no que
diz respeito ao “Plano de Serviço”
contratado; “Valor Inicial de Referência”;
“Prazo”; valor da “Assinatura do Plano”; e “Dados da Aquisição de Produtos e Serviços”,
tem-se que a Câmara enviou mais recentemente, quando solicitado pelo órgão
instrutivo, o documento de fls. 500, denominado como PROPOSTA
EXCLUSIVA para a Câmara Municipal de Paulo Lopes, com valores
díspares do mencionado contrato padronizado. Além disso, ressalta-se que nenhum
dos documentos fazem menção à data da proposta e, por conseguinte, da sua
vigência.
Afora
tudo isto, fato inconteste é que consta consignado nos registros contábeis da
Câmara Municipal, como despesas realizadas no exercício de 2008, em face da
contratação de serviços de telefonia móvel, o valor de R$ 11.779,79, superior, portanto,
ao consignado nos arrazoados de defesa.
Tal matéria
já foi objeto de prejulgado emanado por esta Corte de Contas, lavrado nos
seguintes termos:
Prejulgado 2078
1. A contratação de
serviço de telefonia móvel deve ser realizada mediante regular processo
licitatório, em obediência aos arts. 37, XXI, da Constituição Federal e 2º da
Lei n. 8.666/93, ressalvadas as hipóteses de dispensa e inexigibilidade de
licitação.
2. A contratação de
serviço de telefonia móvel mediante dispensa de licitação é possível desde que
observadas às condições e o percentual estabelecidos no art. 24, II, da Lei n.
8.666/93.
3. Quando houver mais
de um prestador de serviço de telefonia móvel em determinado município, o fato
de somente um deles operar em todo o território municipal não autoriza, por si
só, a celebração de contrato por inexigibilidade de licitação. É necessário
demonstrar que a capacidade de atender toda a extensão do território é condição
determinante para a satisfação das necessidades da Administração.
Se fosse o caso de inexigibilidade de licitação, pelo suposto fato de
somente a contratada possuir a capacidade técnica para atender à demanda
contratual da Câmara, conforme suscitado pelo Presidente da Casa Legislativa,
deveria este ter formalizado, em autos específicos, tal situação.
Ora, as contratações diretas pressupõem o cumprimento pela Administração
de requisitos definidos pela própria lei de licitações[20],
devendo se comprovar e documentar a presença de elementos justificadores, o que
não foi o caso nos presentes autos.
Diante do exposto, impõe-se sanção pecuniária ao responsável pelo ato
tido como irregular. Neste particular, pondero como
razoável aplicar ao gestor multa que deve se afastar do mínimo legal, tendo em vista o teor da
irregularidade, ante a conduta dissociada daquela que se espera do agente público,
no caso, responsável pelo Poder Legislativo Municipal, bem como das
consequências manifestas à ordem jurídica.
III – VOTO
Diante
do exposto, e considerando que os autos foram apreciados na forma regimental,
submeto a matéria à apreciação do Egrégio Plenário, propugnando pela adoção da
seguinte proposta de VOTO:
1. Julgar irregulares, com
imputação de débito, na forma do art.18,
III, alínea “b” e “c”,
c/c o art.21, caput, da Lei Complementar nº202/2000,
as contas anuais de 2008, referentes a atos de gestão da Câmara Municipal de
Paulo Lopes, e condenar os Responsáveis abaixo discriminados, ao pagamento das quantias devidamente especificadas nominalmente,
em razão do recebimento de valores relativos ao pagamento de verbas indenizatórias aos vereadores pela convocação
para sessão legislativa extraordinária, em afronta ao art.57, §7º, da
Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional nº50, de
14/02/2006 (item 4.3.2 do Relatório
Técnico nº881/2012), fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias a contar da
publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte para
comprovarem, perante este Tribunal, o recolhimento do valor do débito aos
cofres públicos municipais, atualizados monetariamente e acrescidos dos juros
legais (artigos 40 e 44 da Lei Complementar n. 202/2000), calculados a partir
da data da ocorrência do fato gerador do débito, sem o que, fica desde logo
autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial (artigo 43, II, da
Lei Complementar n. 202/2000):
NOME |
CPF |
ENDEREÇO |
VALOR (R$) |
José Antônio Rogério Presidente da Câmara Municipal |
613.396.109-06 |
Rua Severo Costa, n. 139, Paulo Lopes/SC - CEP 88.490-000 |
416,25 |
Aldo Laurentino Vereador |
245.478.919-15 |
Rua Semeão Bernadino Leal, n. 5705, Paulo Lopes – CEP 88.490-000 |
416,25 |
João dos Passos Custódia - Vereador |
522.157.849-20 |
Rua Manoel Bernadino da Silva, s/n. Paulo Lopes – CEP 88.490-000 |
416,25 |
Luciana Espíndula Vereador |
897.945.919-04 |
Rua Geral Morro Agudo do Freitas, s/n. Paulo Lopes – CEP 88.490-000 |
416,25 |
Luciano Manoel Silvano - Vereador |
986.114.299-15 |
Rua Geral Morro Agudo do Freitas, n. 1.830, Paulo Lopes – CEP
88.490-000 |
416,25 |
Maury Laudelino Raupp - Vereador |
341.925.579-91 |
Rua Severo Costa, n. s/n., Paulo Lopes – CEP 88.490-000 |
416,25 |
Nadir Carlos Rodrigues - Vereador |
415.919.099-53 |
Rua José Valter da Costa, s/n., Paulo Lopes - CEP 88.490-00 |
416,25 |
Oziel Evaldo Silva Vereador |
942.178.909-15 |
Rua Amadeu Antônio Moisés, s/n., Paulo Lopes - CEP 88.490-000 |
416,25 |
Robson Luis Bittencourt Liberato Vereador |
942.174.679-15 |
Rua Milena Zili, n. 2, Paulo Lopes - CEP 88.490-000 |
416,25 |
2. Aplicar ao Sr. José Antônio Rogério, já qualificado, com base no art. 70, II, da Lei
Complementar nº 202/2000, a multa de R$
1.000,00 (mil reais), em face da ausência
de procedimento licitatório para contratação de serviços de telefonia móvel, no
montante de R$ 11.779,79, infringindo o disposto no art. 37, XXI da Constituição
Federal e os art. 2º da Lei Federal nº 8.666/93, configurando burla ao
procedimento licitatório, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da
publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar
ao Tribunal de Contas o recolhimento da multa ao Tesouro do Estado, sem o que
fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial,
observado o disposto nos arts. 43, II e 71 da citada Lei Complementar (Item 4.2.1 do Relatório nº 881/2012).
3. Ressalvar
que o exame das contas em questão não envolve o resultado de eventuais
auditorias oriundas de denúncias, representações e outras, que devem integrar
processos específicos, a serem submetidos à apreciação deste Tribunal de
Contas, bem como não envolve o exame de atos relativos à Pessoal, Licitações e
Contratos;
4. Dar ciência desta Decisão, bem como do Relatório Técnico nº 881/2012 e do Voto que
a fundamentam, aos Responsáveis, Sr. José Antônio Rogério – Presidente da
Câmara Municipal no exercício de 2008, aos Vereadores Aldo Laurentino, João dos Passos Custódia, Luciana Espíndula, Luciano
Manoel Silvano, Maury Laudelino Raupp, Nadir Carlos Rodrigues, Oziel Evaldo
Silva e Robson Luis Bittencourt Liberato e ao interessado, Sr. Jucinei
de Souza – atual Presidente da Câmara Municipal de Paulo Lopes.
Gabinete, em 04 de setembro de 2012.
Cleber Muniz Gavi
Auditor
Substituto de Conselheiro
Relator
[1] Fls. 37 a 47.
[2] Fls. 48 a 51.
[3] Ofícios de fls. 53 a 61 e ARs-MP de fls. 62 a 66.
[4] Fls. 67 a 71.
[5] Fls. 72 a 180.
[6] Fls. 182 a 184.
[7] Fls. 185 a 189.
[8] Fls. 190 a 292.
[9] Fls. 293 a 395.
[10] Fls. 396 a 498.
[11] Fls. 67 a 498.
[12] Fls. 62 e 63, respectivamente.
[13] Fls. 504 a 524.
[14] Fls. 525 a 529.
[15] Fls. 73.
[16] Fls. 79 a 82.
[17] Fls. 74.
[18] Fls. 500 a 503.
[19] Vide nota de referência n.16.
[20] Vide arts. 7º, 14 ou 17, conforme o caso.