PROCESSO Nº

LCC 10/00690617

UNIDADE GESTORA

Prefeitura Municipal de Blumenau

RESPONSÁVEIS

Fernando César Lenzi, Secretário da Administração à época

Carlos Renato Volles, Diretor de Compras e Licitações à época

Fábio Weidgenant, Pregoeiro à época

INTERESSADOS

João Paulo Karam Kleinubing, Prefeito Municipal à época

Napoleão Bernardes, atual Prefeito Municipal

ESPÉCIE

Processo Licitatório

ASSUNTO

Pregão Presencial nº 367/2010 - registro de preços e aquisição de móveis escolares para ensino fundamental e educação infantil, no valor previsto de R$ 5.292.310,12.

 

 

 

LICITAÇÃO. CONVÊNIO. PREVALÊNCIA DE RECURSOS ORIUNDOS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO.

O controle externo de convênios com prevalência de recursos oriundos da União, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município.

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

Tratam os autos de exame do processo licitatório – Pregão Presencial nº 367/2010, instaurado pela Prefeitura Municipal de Blumenau, cujo objeto é o registro de preços e aquisição de móveis escolares para ensino fundamental e educação infantil, no valor previsto de R$ 5.292.310,12 (cinco milhões duzentos e noventa e dois mil trezentos e dez reais e doze centavos). Os presentes autos decorreram da Comunicação nº 367/2010, recebida pela Ouvidoria deste Tribunal em 16 de agosto de 2010.

A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações (DLC), elaborou o Relatório de Instrução Preliminar nº 281/2011 sugerindo a audiência nos seguintes termos (fls. 11-33):

3.1.  Determinar a audiência do Sr. Fernando Cesar Lenzi, CPF 716.500.759-87, Rua Benjamin Constant, 2438 Aptº 1210  - Vila Nova, 89035-100 - Blumenau – SC, Secretário da Administração do Município de Blumenau, .nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, para, no prazo de 30 dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b, do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), apresentar alegações de defesa acerca da solicitação antecipada de amostra, sendo que a exigência deve ser imposta somente ao licitante provisoriamente colocado em primeiro lugar no certame, em cumprimento com o princípio da legalidade inerente a todo certame público, previsto no art. 37, caput e inciso XXI, da Constituição Federal, c/c arts. 3º, I, e 45, da Lei 8.666/93, (item 2.1 deste Relatório) e alegações de defesa acerca da exigência exorbitante, para fins de comprovação da qualificação técnica, de laudos do CREA, NR 17, normas da NBR 9178, INMETRO de acordo com a NBR ISO/TEC 17026, além de Registro do CREA, e CONFEA Resolução 417 de 27/03/1998, Certificado de Regularidade do Cadastro Técnico Federal do IBAMA, carta do fabricante assinada e com firma reconhecida, em descumprimento ao preceito contido no  artigo 3º, § 1º, I c/c artigo 30, inciso II, da Lei nº 8.666/93 (item 2.2  e subitens 2.2.1 a 2.2.5 deste Relatório), irregularidade esta, ensejadora de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000.

 

O Sr. Fernando Cesar Lenzi, Secretário da Administração do Município de Blumenau à época, apresentou suas alegações de defesa (fls. 36-43).

Após a análise das justificativas do responsável, a  DLC, por meio do Relatório de Reinstrução nº 813/2011 (fls. 56-67),  sugeriu a este Relator o seguinte encaminhamento:

3.1.  Conhecer do edital do Pregão Presencial    87/2010, que trata da aquisição de móveis, da Prefeitura Municipal de Blumenau, encaminhado a este Tribunal por meio documental, para considerar irregular, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, o ato examinado.

3.2.  Aplicar multa ao Sr. Fernando Cesar Lenzi, CPF 716.500.75987, Rua Benjamin Constant, 2438 Aptº 1210 - Vila Nova, 89035-100 - Blumenau – SC, Secretário da Administração do Município de Blumenau, com fundamento no art. 70,  II,  da Lei Complementar nº  202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109,  II, do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contaso recolhimento ao Tesouro do Estado da multa cominada, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43,  II,  e 71 da citada Lei Complementar em face de:

3.2.1. Solicitação antecipada de amostra, em descumprimento ao princípio da legalidade inerente a todo certame público, previsto no art. 37, caput e inciso XXI, da Constituição Federal, c/c arts. 3º, I, e 45, da Lei nº 8.666/93 (item 2.1 deste Relatório);

3.2.2. Exigência exorbitante de documentos para fins de qualificação  técnica, em descumprimento ao preceito  contido no artigo  3º,  §  1º, I  c/c artigo 30, inciso  II,  da Lei    8.666/93 (item 2.2 e subitens 2.2.1 a 2.2.5 deste Relatório).

3.3. Dar Ciência deste Relatório ao Sr. Fernando Cesar Lenzi e à Sra. Marli Zieker Bento, ao interessado, Sr. João Paulo Karam Kleinubing e à Prefeitura Municipal de Blumenau.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPjTC) corroborou com a manifestação da área técnica (fls. 68-81).

Por meio do despacho de fl. 82, determinei a juntada aos autos do pregão presencial objeto do processo, do respectivo contrato, bem como da comunicação que originou estes autos. Diante desta determinação, a DLC proferiu o Relatório nº 505/2012 pela realização de diligência à Unidade Gestora para a vinda da documentação exigida (fls. 83-84), sugestão novamente acolhida pelo Ministério Público Especial, e que foi prontamente autorizado por este Relator (fl. 85).

A Prefeitura Municipal de Blumenau acostou os documentos requeridos nas fls. 88-720.

A DLC, através do Relatório nº 646/2012 (fls. 721-723), reiterou os termos da conclusão do Relatório nº 813/2011 (fls. 56-67), no que foi acompanhada pelo Parecer nº 14926/2012 do MPjTC (fls. 724-726).

Após verificar que os signatários do instrumento de licitação em voga foram, além do Sr. Fernando César Lenzi, Secretário Municipal de Administração à época, os Srs. Carlos Renato Volles, Diretor de Compras e Licitações à época, e Fábio Weidgenant, Pregoeiro à época, determinei a realização da audiência também destes dois últimos em face das restrições constatadas nestes autos (fl. 727).

As justificativas foram acostadas nas fls. 732-736 e fls. 738-744.

A diretoria técnica elaborou o Relatório de Reinstrução nº 182/2013 apresentando as seguintes sugestões de encaminhamento (fls. 747-759):

3.1. Encaminhar os autos ao Tribunal de Contas da União – TCU, ante a incompetência desta Corte de Contas para a análise da matéria relatada, conforme o disposto no inciso VI do artigo 71 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (item 2.2 do presente Relatório).

Ou, se o Relator não entender desta forma:

3.2. Considerar irregular, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar Estadual nº 202, de 15 de dezembro de 2000, o Pregão Presencial nº 87/2010 da Prefeitura Municipal de Blumenau, em face das seguintes irregularidades:

3.2.1. Solicitação antecipada de amostra, prevista no item 4.1.8 do Edital do referido Pregão, contrariando o princípio da legalidade inerente a todo certame público, previsto no art. 37, caput e inciso XXI, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, c/c arts. 3º, I, e 45, da Lei Federal nº 8.666/93, e em desacordo com a ordem dos procedimentos estabelecidos no art. 43 do mesmo diploma legal (item 2.1 do presente Relatório e item 2.1 do Relatório DLC nº 281/11, fls. 11 a 33); e

3.2.2. Exigência exorbitante de documentos para fins de qualificação técnica e exigidas na proposta de preços, previstos nas alíneas ‘b’ a ‘h’ do item 4.1.9 do Edital do referido Pregão, contrariando o disposto no artigo 30 da Lei Federal nº 8.666/93 e no inciso I do §1º do artigo 3º do mesmo diploma legal c/c o ‘in fine’ do inciso XXI do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (item 2.1 do presente Relatório e item 2.2 do Relatório DLC nº 281/11, fls. 11 a 33).

3.3. Aplicar multa a cada um dos responsáveis abaixo discriminados, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar Estadual nº 202, de 15 de dezembro de 2000, c/c o art. 109, II do Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), em face das irregularidades apontadas no Edital de Pregão Presencial nº 87/10 da Prefeitura Municipal de Blumenau e descritas nos itens 3.2.1 e 3.2.2 da Conclusão do presente Relatório, fixando-lhe o prazo de 30 dias, a contar da publicação do Acórdão no Diário Oficial Eletrônico - DOTC-e, para comprovar ao Tribunal de Contas o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da citada Lei Complementar:

3.3.1. Sr. Carlos Renato Volles, inscrito no CPF sob o nº 867.569.829-15, com endereço na Rua Hermann Huscher, 377 – Bloco A - Ap. 504 – Vila Formosa - Blumenau/SC;

3.3.2. Sr. Fábio Weidgenant, inscrito no CPF sob o nº 936.095.749-68, com endereço na Rua Rui Barbosa, 341 – Bairro Progresso - Blumenau/SC; e

3.3.3. Sr. Fernando César Lenzi, inscrito no CPF sob o nº 716.500.759-87, com endereço na Rua Benjamin Constant, 2438 - Ap. 1210 – Vila Nova - Blumenau/SC.

3.4. Dar ciência do Relatório, do Voto do Relator e da Decisão, ao Sr. Napoleão Bernardes, ao Sr. Carlos Renato Volles, ao Sr. Fábio Weidgenant, ao Sr. Fernando César Lenzi, à Assessoria Jurídica e ao responsável pelo Controle Interno da Prefeitura Municipal de Blumenau. (grifos do original)

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPjTC) exarou o Parecer nº 17121/2013 (fls. 760-763) e manifestou-se pela remessa dos autos ao Tribunal de Contas da União.

Vieram os autos a este Gabinete.

É o relatório.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

Inicialmente, destaco que registro de preços e aquisições de móveis escolares para ensino fundamental e educação infantil, os quais estavam sendo executados por meio Pregão Presencial nº 367/2010 em análise neste processo, tiveram origem no Convênio nº 70002/2008 e seus aditivos (fls. 204-222), o qual foi celebrado entre o Ministério da Educação, através do Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação (FNDE), e o Município de Blumenau.

Segundo o convênio e seus aditivos, o valor total do projeto foi de R$ 4.688.709,80 (quatro milhões seiscentos e oitenta e oito mil setecentos e oito reais e oitenta centavos), sendo que, segundo a Subcláusula primeira da Cláusula Quinta, o poder convenente (Município de Blumenau), a título de contrapartida financeira, participaria do projeto com 1% do valor. Portanto, o poder concedente (União) proveria o montante de R$ 4.641.822,71 (quatro milhões seiscentos e quarenta e um mil oitocentos e vinte e dois reais e setenta e um centavos), correspondendo à 99% dos recursos, enquanto o poder convenente (Município de Blumenau), ofereceria contrapartida no valor de R$ 46.887,09 (quarenta e seis mil oitocentos e oitenta e sete reais e nove centavos), que perfaz 1% dos recursos para a aquisição do mobiliário escolar.

A Cláusula Décima Terceira afirma que a apuração de dano ao erário em face da inexecução ou execução deficiente do Convênio, por meio da instauração de Tomada de Contas Especial, deve ser realizada pelo poder concedente (União) ou pelo Tribunal de Contas da União.

Tal disposição já permite vislumbrar que a competência para a apuração e sanção das eventuais ilegalidades e danos decorrentes da sua execução é do Tribunal de Contas da União.

Ademais, conforme bem apontou a área técnica, esta Corte de Contas tem precedentes recentes em que, no caso de exame da regularidade da aplicação de recursos oriundos de Convênios entre a União e o Estado de Santa Catarina na qual o valor predominante vier do Governo Federal, os autos devem ser remetidos ao Tribunal de Contas da União. São eles os processos nº REP 10/00797411[1], nº REP 10/00824400[2], nº REP 12/00175392[3], nº REP 12/00108288[4], nº REP 12/00163700[5] e nº REP 12/00050930[6].

Além da predominância de recursos da União, os votos aprovados pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas ressaltam que os órgãos federais, no caso os Ministérios concedentes, são os gestores do Convênio, executores das transferências e têm, conforme cláusulas do convênio, ingerência nas atividades de controle e fiscalização.

No âmbito do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, ocorreu entendimento divergente apenas no parecer do MPjTC da lavra do Sr. Diogo Rodrigo Ringenberg no processo nº REP 12/00040039 ainda em tramitação nesta Corte, donde, ao se deparar com situação semelhante a tratada nestes autos, suscita não haver sustentação legal para a interpretação que vem sendo dada, pois "mesmo que apenas R$ 1,00 fosse o valor da contrapartida haveria justificativa para a atuação da Corte [Estadual]".

Todavia, manifesto minha preocupação quanto ao encaminhamento que vem sendo dado por esta Corte aos processos que envolvem o exame de execução de convênios com recursos predominantemente federais, mas acrescidos de contrapartida advinda dos cofres públicos do Estado de Santa Catarina, sobretudo ante precedentes recentes do Tribunal de Contas da União em face do exame destes convênios envolvendo em menor volume valores dos demais entes da federação.

Quando da análise de Tomada de Contas Especial que envolvem convênios entre a União e os Estados ou Municípios com a utilização de recursos predominantemente daquele e contrapartida destes, o TCU vem firmando precedentes de que a sua fiscalização fica adstrita aos recursos federais, motivo pelo qual, na conclusão da ocorrência de dano ao erário, a condenação em débito do responsável se dá com base na proporcionalidade da participação financeira entre concedente e convenente, com comunicação ao Tribunal de Contas Estadual de origem para providências quanto aos valores de originados dos cofres municipais e estaduais. Neste sentido, destaco os Acórdãos nº 4473/2012[7], nº 6727/2012[8], nº 1615/2013[9] e 1084/2013[10] trazendo excerto deste último com a conclusão no sentido exposto:

Aos Tribunais de Contas dos Estados e dos Municípios e Ministério Público Estadual
90. Conforme demonstrado no subitem 10.2, alínea l da instrução anterior (peça 8, p. 52), além do prejuízo à União restou configurado dano ao erário municipal no valor de R$ 13.200,00, calculado com base na proporcionalidade de participação financeira  do concedente e do convenente. Desse modo, e considerando que a competência do Tribunal, no que concerne à fiscalização de transferências voluntárias, está adstrita aos recursos federais, faz-se necessário encaminhar cópia integral da deliberação que o Tribunal vier a adotar ao Tribunal de Contas responsável pelo controle externo do município em questão, como também ao Ministério Público Estadual competente, para as providências a cargo desses órgãos. (grifei)

 

Portanto, a atuação desta Corte de Contas de relegar a competência para se fiscalizar todo o convênio que, ainda que em menor proporção, envolva recursos estaduais e municipais, ao Tribunal de Contas da União, deve ser avaliada com parcimônia, sobretudo quando se verifica a ocorrência de dano ao erário, dadas as decisões recentes sobre o tema, o que pode acarretar a manutenção dos prejuízos aos entes federativos que se submetem a este Tribunal.

Acrescento que nos citados votos da Corte Federal consta como uma das medidas na conclusão apenas informação ao Tribunal de Contas Estadual considerando haver indícios de prejuízos aos cofres públicos do Município, mas sem interferir na independência decisória das Cortes de Contas Estaduais:

Encaminhar cópia deste Acórdão, acompanhado do Relatório e do Voto que o fundamentam [...] ao Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso e ao Ministério Público do Estado do Mato Grosso, considerando haver indícios de prejuízo aos cofres do Município de Campo Novo do Parecis/MT [...]

 

Diante desta situação, entendo necessário tecer alguns argumentos para reforçar a competência do TCU, inclusive para com a necessidade e possibilidade, no ordenamento jurídico vigente, de que, naquela instância, já sejam sanados os prejuízos ocorridos aos erários municipal e estadual decorrentes de ilegalidades ocorridas na consecução de convênios.

O convênio é a expressão mais pura do desdobramento do federalismo cooperativo no Brasil, que se define, segundo Pedro Lenza[11], como o modelo em que "as atribuições serão exercidas de modo comum ou concorrente, estabelecendo-se uma verdadeira aproximação entre os entes federativos, que deverão atuar em conjunto".

Segundo Paulo Bonavides[12], a ausência de alcance do federalismo cooperativo em esferas além dos poderes executivos dos entes da federação decorre somente da "omissão de ânimo democrático com que ele foi aqui introduzido", e ressalta a necessidade de "igual inspiração numa nova fase de evolução do federalismo dualista norte-americano", ou seja, de avançar a cooperação em outras esferas de poder dos entes federados, em que cito como exemplo o âmbito de fiscalização.

Após este início, o constitucionalista realça a necessidade de se por em prática o federalismo cooperativo de teor democrático, que é "assentado nos três princípios cardeais de toda Constituição Federal legítima: o princípio da subsidiaridade, o princípio da solidariedade e o princípio da pluralidade".

No caso dos convênios, na medida em que o federalismo cooperativo se vislumbra na aplicação dos recursos de forma una, deveria ocorrer a sua fiscalização somente única. Deste ponto retiro dois desdobramentos: o porquê de a fiscalização não ser também em conjunto, e a quem se deve atribuir a competência.

A inviabilidade da fiscalização em conjunto pelo TCU e pelos Tribunais de Contas Estaduais, a meu ver, decorre da impossibilidade de se separar os valores estaduais e federais quando da aplicação no projeto. Além disso, afasta a celeridade na fiscalização, o que viola o princípio constitucional da eficiência, e ainda pode ocasionar a excrescência de decisões conflitantes em duas esferas federativas sobre o mesmo caso concreto.

Por fim, chega-se ao problema da competência para e a necessidade de se estabelecer uma jurisdição administrativa fiscalizatória, sancionatória e mandamental única sobre todos os recursos que são empreendidos para a realização do convênio.

Citando novamente Paulo Bonavides[13], o presente ponto pode ser caracterizado como um aspecto de "crise federativa", a qual deve abrir horizontes para uma solução pelos mecanismos do federalismo[14].

Esta resposta pode advir da subsunção lógica do exame das normas que regem a competência do Tribunal de Contas da União[15] e Tribunais de Contas Estaduais, que não tratam especificamente sobre o convênio e dos desdobramentos da formação do Estado federal brasileiro e, dada as seguidas remessas dos processos semelhantes a este analisado ao Tribunal de Contas da União, e do federalismo cooperativo no âmbito dos tribunais de contas, buscando-se assim o interesse público na fiscalização da boa aplicação dos recursos do erário, seja ele, advindo da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios.

Por outro lado, a solução pode advir da teoria americana dos poder implícitos já debatida e aplicada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Supremo Tribunal Federal em voto da lavra do Relator Celso de Mello, donde se reconheceu o poder implícito de concessão de medidas cautelares pelo TCU no exercício das suas atribuições[16].

Nesta teoria, a outorga de competência expressa (de fiscalizar os convênios da União com os Estados e Municípios) a determinado órgão estatal importa em deferimento implícito, a esse mesmo órgão, dos meios necessários à integral realização dos fins que lhe foram atribuídos (no caso de encontrado o dano ao erário, atribuir débito com vistas a buscar o interesse público de ver ressarcida a totalidade dos dinheiros providos pelo erário, seja ele a União, os Estados, o Distrito Federal ou os Municípios).

Feitas as considerações as quais entendo pertinentes sobre o encaminhamento do presente processo ao Tribunal de Contas da União, e em face das reiteradas decisões desta Casa pela incompetência em matéria que envolva recursos preponderantemente repassados pela União, proponho a remessa dos presentes autos ao Tribunal de Contas da União, órgão competente para a apuração das irregularidades aqui constatadas, com o posterior arquivamento do presente processo.

 

III – PROPOSTA DE VOTO

 

Diante do exposto, submeto a presente matéria ao Egrégio Plenário, propugnando pela adoção da seguinte proposta de voto:

1 – Determinar à Secretaria Geral que proceda a remessa de cópias digitalizadas da inicial (fls. 03-10), do edital do pregão presencial em exame (fls. 249-285), do convênio federal e respectivos termos aditivos que originaram os recursos (fls.  204-222), do Relatório de Reinstrução nº 182/2013 (fls. 747-759), do voto do Relator e decisão colegiada desta Corte de Contas, ao Tribunal de Contas da União (TCU), SECEX - SC, ante a incompetência desta Corte de Contas para a análise da matéria relatada.

2 – Dar ciência da Decisão aos Interessados, ao Sr. Fernando César Lenzi, Secretário da Administração à época, ao Sr. Carlos Renato Volles, Diretor de Compras e Licitações à época, ao Sr. Fábio Weidgenant, Pregoeiro à época e ao Controle Interno da Prefeitura Municipal de Blumenau.

3 –  Determinar o arquivamento do presente processo.

Gabinete, em 02 de setembro de 2013

 

Auditor Gerson dos Santos Sicca

Relator

 



[1] REP 10/00797411; Acórdão nº 842; Relator Auditor Cleber Muniz Gavi; Sessão Ordinária de 25.04.2011; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 732 de 04.05.2011.

[2] REP 10/00824400; Acórdão nº 972; Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall; Sessão Ordinária de 04.05.2011; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 736 de 10.05.2011.

[3] REP 12/00175392; Acórdão nº 5785; Relator Conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Jr.; Sessão Ordinária de 26.11.2012; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 1136 de 02.01.2013.

[4] REP 12/00108288; Acórdão nº 937; Relator Conselheiro Luiz Roberto Herbst; Sessão Ordinária de 06.05.2013; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 1239 de 05.06.2013.

[5] REP 12/00163700; Acórdão nº 1251; Relator Auditor Cleber Muniz Gavi; Sessão Ordinária de 03.06.2013; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 1259 de 03.07.2013.

[6] REP 12/00050930; Acórdão nº 1250; Relator Auditor Cleber Muniz Gavi; Sessão Ordinária de 03.06.2013; Publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (DOTC-e) nº 1259 de 03.07.2013.

[7] TCU. Tomada de Contas Especial nº 020.462/2009-6; Acórdão nº 4473/2012. Segunda Câmara; Rel. Min. Augusto Nardes; Sessão Extraordinária de 26.06.2012.

[8] TCU. Tomada de Contas Especial nº 022.142/2009-6; Acórdão nº 6727/2012; Segunda Câmara; Rel. Min. Aroldo Cedraz; Sessão Ordinária de 11.09.2012.

[9] TCU. Tomada de Contas Especial nº 021.450/2009-0; Acórdão nº 1615/2013; Primeira Câmara; Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues; Sessão Ordinária de 26.03.2013.

[10] TCU. Tomada de Contas Especial nº 020.313/2009-6; Acórdão nº 1084/2013; Segunda Câmara; Rel. Min. Aroldo Cedraz; Sessão Ordinária de 12.03.2013.

[11] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 420.

[12] BONAVIDES, Paulo. A Constituição Aberta. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 433-435

[13] BONAVIDES, Paulo. A Constituição Aberta. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 436

[14] Segundo Paulo Bonavides: "O federalismo é dinâmico e deve possuir a necessária elasticidade para responder com adequação às exigências novas que vão surgindo impostas por realidades imprevisíveis, oriundas da mudança social e das transformações materiais na Sociedade contemporânea." (p. 436).

[15] Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: [...]II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público; [...]VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município;

[16] STF. Tribunal Pleno. Mandado de Segurança nº 26.547-MC/DF. Relator Min. Celso de Mello. Julgado em 23.05.2007. Publicado no Diário de Justiça de 29.05.2007.